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Uma metáfora interessante sobre a atuação dos Estados Unidos no Caribe é elaborada por Luis Araquistán, autor de La agonia Antillana que após recorrer várias ilhas da região e conhecer a realidade econômica e social das Antilhas diz que o imperialismo yanqui sobre elas pode ser comparado ao Juggernaut, ídolo do templo de Vishnu “señor del mundo y, al paso de la carroza donde los sacan en procesión todos los años, los fanáticos peregrinos índios que acuden de todo el país se arrojan bajo las pesadas ruedas y se dejan triturar en voluntarias y salvaje holocaustos” (1928, p. 15). O autor completa que “también en esas regiones de América abundan los que, deslumbrados por el poderio y la riqueza de Juggernaut del Norte, permiten pasiva y a veces gozosamente que las ruedas de la carroza triunfal del ídolo-hierro y oro aplaste la soberanía de sus pátrias” (1928, p.15).

A contradição de interesses inerentes às nações caribenhas mediante a dependência dos Estados Unidos coloca em xeque sua autonomia para decidir seu próprio futuro, revela ainda que o amadurecimento de uma visão nacionalista, no caso de Cuba, é ativada pelo choque de posições adotadas pelas classes dirigentes

e da sua aproximação ou distanciamento aos interesses econômicos e políticos dos Estados Unidos sobre o país.

A relação Cuba/Estados Unidos se confunde em vários momentos da história da maior das Antilhas, mas é no século XX que a relação entre os dois países mais se aproxima devido a um interesse comum: a produção do açúcar e a sua exportação.

La cercania y el carácter complementario de sus economias han producido, desde la época colonial de Cuba, una estrecha relación económica con los Estados Unidos. Así los Estados Unidos llegaron a ser la metrópoli económica de Cuba desde mucho antes que los cubanos lograran independizarse de España, y ello se há reflejado de modo decisivo en nuestra economia, manteníendose como nación esencialmente agrícola y monoproductora, y haciendo del azúcar – nuestro principal producto para el interés norteamericano –, la base de la economia cubana (MARRERO, 1970, p. 13).

O açúcar foi a base econômica do país mais importante no século XIX e continuou sendo nas primeiras décadas do século XX o seu principal produto de exportação. A sociedade e a cultura cubana estão completamente envolvidas na atmosfera criada em torno à cana-de-açúcar e ao tabaco, outro produto também importante economicamente para o país. O etnólogo Fernando Ortiz descreve perfeitamente a importância deles para Cuba em seu livro Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar. De naturezas distintas “la caña de azúcar y el tabaco son todo contraste” diz Ortiz (1991, p.53).

O açúcar foi responsável pelo ajiaco étnico que o país experimentou logo que se iniciou o século XX. Uma grande quantidade de mão-de-obra atraída pela prosperidade que o produto proporcionava a Cuba, provocou a migração de milhares de trabalhadores que cruzavam o Atlântico, caso dos espanhóis, ou o próprio mar Caribe, caso dos trabalhadores das nações vizinhas a Cuba, atraídos para a indústria ou para as plantações de cana na maior das Antilhas.

A situação de país monoprodutor, totalmente dependente da indústria açucareira, em alguns momentos é a causa da total instabilidade econômica do país. O açúcar, responsável por 82% da exportação nessas três primeiras décadas tem em Cuba um ambiente favorável para a sua produção, devido: 1) mais de 65% da área total de Cuba ser plana ou ondulada o que facilita a plantação, o cultivo, o corte e o transporte da cana; 2) a fertilidade do solo cubano fez com que a produção da cana se desse por mais de dez anos consecutivos; 3) o clima de Cuba é livre das

baixas temperaturas que matam a planta; 4) a proximidade do mercado norte- americano favoreceu uma grande vantagem comercial para a ilha; 5) a condição insular de Cuba, sua configuração alargada e a abundância de baías, favoreceram aos hacendados no transporte do açúcar, pois nenhum engenho ou Central esteve a mais de 60 km da costa, o que diminuia o custo, barateando o transporte do açúcar até os portos de embarque.

A migração de trabalhadores do Caribe foi uma opção das companies açucareiras que gerou um grande debate na sociedade cubana. Autores como Ramiro Guerra (1976) sustenta que essa corrente migratória teve como função diminuir os salários dos trabalhadores cubanos16; acreditamos que mais que baratear os salários essa migração foi utilizada pelas empresas para desestabilizar orgânicamente os trabalhadores, para dificultar sua integração; serviu aos interesses políticos dessas mesmas empresas para submeter o governo cubano a atuar de acordo com as suas necessidades. Por isso, há que separar o fenômeno da migração antilhana para Cuba em dois períodos e analisá-los separadamente. Durante a primeira fase que vai de 1905 a 1913, os imigrantes antilhanos entram em Cuba de forma clandestina, a legislação sobre imigração não permitia a presença desses trabalhadores no país; sua introdução em Cuba é uma imposição das empresas açucareiras norte-americanas que queriam uma legislação mais flexível para que pudessem obter uma grande quantidade de mão-de-obra para suas safras. Essa reivindição será atendida em 1913 com a modificação da legislação como veremos, devido a pressão da maior empresa norte-americana em Cuba, a United Fruit Company e da Nipe Bay Company que conseguiram uma concessão do governo cubano para contratar trabalhadores antilhanos, no entanto, este foi o primeiro passo pois a aprovação legal para essas contratações só aconteceu realmente com a aprovação da Lei de Imigração de 1917. Nessa primeira fase os trabalhadores antilhanos são atacados pela imprensa conservadora que luta por impedir sua entrada em Cuba. A exploração dessa mão-de-obra pelas empresas e pelos contratistas que atuam em combinação acontece em todos os níveis.

Consideramos que nessa fase o principal papel do trabalhador antilhano é o de intensificar na sociedade cubana a sua prática racista e contrapô-la a uma ação

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econômica das grandes empresas norte-americanas, que em defesa de seus interesses cria uma situação de rivalidade econômica e ideológica entre a burguesia comercial e a latifundiária que embora defendessem a supremacia racial branca tinham interesses comerciais opostos.

Sobre a visão que a elite cubana tinha para o futuro republicano e sobre o novo estado de dependência de Cuba frente ao novo império — Estados Unidos —, Roig de Leuchsenring escreveu o seguinte:

Lo que sucede es que en plena República y en pleno siglo XX, hemos resucitado la trata y la esclavitud y nos empeñamos en que la colonia y con todos los daños para el cubano que fueron el motivo de que las patriotas del siglo pasado se lanzaran a la revolución para lograr la independencia y con ella la vida civilizada, con amplitud de horizontes para desenvolverse, del cubano y del extranjero; patriotas que no se imaginaron nunca, que la República fuera un simple cambio de bandera sino la transformación general y completa del país en leyes, costumbres públicas, procedimientos políticos, económicos y administrativos (1927, p. 22)

As mudanças a que se refere Roig de Leuchsenring, são a nosso ver consequência da implementação de uma política imigratória imposta pelas companies, contrária a vontade da elite criolla que defendia a imigração espanhola. A imigração antilhana é o contraponto do discurso branqueador; a partir de 1913, a segunda fase de intenso trânsito desses trabalhadores para as províncias de Oriente, ativa sua atuação em diversos setores da sociedade cubana projetando-se contra esse discurso imputando uma nova estratificação sócio-racial, que coloca em evidência outros elementos culturais e de organização das comunidades antilhanas que obrigadas ou não, permanecem em Cuba durante o período de entre-safra e resistem ao discurso opositor da imprensa e dos nacionalistas.

A introdução dos trabalhadores antilhanos na indústria açucareira foi uma estratégia das companhias produtoras de açúcar como tínhamos comentado antes, para aumentar e baratear sua produção como atestam vários autores, no entanto, esse foi talvez o aspecto mais evidente do interesse das companies por essa imigração, mas não foi a única. Um jogo de forças de poder foi exposto durante a aprovação da legislação para imigração em Cuba, como veremos mais adiante, que inclui não só a política interna do país, mas também a própria política econômica das indústrias produtoras de açúcar nos Estados Unidos. O problema é que Cuba será o espaço de atuação de um dos ramos açucareiros da indústria norte-americana, e por sua vez terá seus interesses políticos submetidos ao grande trust que se forma em

torno do açúcar com a reativação da indústria e da sua reestruturação com base numa nova tecnologia, muito mais avançada que só poderia funcionar plenamente mediante a contratação de uma grande quantidade de mão-de-obra. Uma rede de relações é formada a partir de então, formando uma pirâmide onde o poder econômico das empresas açucareiras prevalece.

FIGURA 4– ORGANOGRAMA SÓCIO-ECONÔMICO DAS TRÊS PRIMEIRAS DÉCADAS DA REPÚBLICA

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