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Fenómenos psico-fisiológicos

LISTA DE SIGLAS

2.4 Sistemas de interpretação

2.4.2 Fenómenos psico-fisiológicos

São igualmente sistemas de interpretação os fenómenos psico-fisiológicos, já anteriormente referidos, como a força e o dinamismo das modificações do espaço e do ordenamento dos equilíbrios criados. No entanto, estes fenómenos podem ainda ser classificados como: princípios de disposição e estruturação e princípios de configuração da percepção. Princípios de disposição e estruturação

Da mesma forma que alguns dos factores evidenciados antes prevalecem no sentido de maior influência sobre o sujeito, os princípios de disposição e estruturação (objectos, formas e profundidade) desenvolvidos pela teoria da Gestalt são também inclinações visuais que exercem influências sobre o indivíduo.

À tendência para distinguirmos ou destacarmos facilmente a forma do fundo segue-se a manipulação desta, o que pode deixar resultados visuais perturbantes, por exemplo os desenvolvidos por Escher (1898-1972) no seu trabalho gráfico. Quer no sentido da indiferenciação forma–fundo (metamorfoses, mundos impossíveis e infinitos), quer na reversibilidade forma–fundo, em que a orientação da imagem é ambígua, sujeitando-se ao ponto de concentração (ver exemplos na figura 2.17).

43 O sujeito tem tendência para prestar especial atenção ao que se repete, como uma informação ou um símbolo que

é mostrado e visto com alguma frequência.

44 O sujeito tem tendência para percepcionar mais facilmente estímulos em movimento como quando acenam para

chamar por nós numa multidão.

45 Esta questão é especialmente relevante neste projecto. Conforme vamos ter oportunidade de ver na segunda parte

do capítulo III, sobre os estudos de caso de pictogramas farmacêuticos, a questão cultural está nitidamente presente em alguns dos estudos de caso e, quase nula noutros.

Figura 2.17: A distinção forma – fundo: (da esquerda para a direita)

Vaso de Rubin; Boring women, Gestalt Picture; Saxophone player and lady; desconhecido

Distinguir forma–fundo é tão natural e intrínseco quanto reunir elementos agrupados e

associados num mesmo espaço (figura 2.18). Wertheimer46 analisou as formas perceptivas nas

leis da organização onde as tendências perceptivas do campo visual são guiadas por princípios tais como a proximidade (aproximar-se de elementos comuns à mesma forma), a semelhança ou similaridade (afinidade ou parecença à mesma estrutura), a continuidade (sequência de elementos pertencentes à mesma unidade ou atracções para terminar o quase completo) e a simetria (tendências para associar componentes proporcionais). Para a teoria da percepção Gestalt a força de atracção, nas correspondências dos elementos visuais,

representa as leis de agrupamentos. Para Wertheimer também. Com base nas relações visuais em que quanto maior a sua proximidade, maior a atracção, o indivíduo tende a ligar ou

associar os elementos visuais mais próximos na construção mental de conjuntos ou formas. O elemento maior representa maior proximidade e o menor, distância. A semelhança ou

similaridade representa, na linguagem visual, os elementos opostos que se repelem e, os semelhantes que se atraem. Desta forma, o indivíduo completa as ligações que faltam, relacionando-as de imediato e com maior vigor, principalmente as mais semelhantes, tais como a forma, o tamanho, a textura ou o tom.

Figura 2.18: Gestalt: ilusões ópticas para agrupar elementos

Outros fenómenos psico-fisiológicos são utilizados para um melhor conhecimento da linguagem visual tais como a sobreposição ou seja, elementos claros sobre escuros expandem-se e elementos escuros sobre claros contraem-se.

A tensão visual não só é influenciada pelas relações elementares na estrutura, como também pela preferência do olhar pelo ângulo inferior esquerdo. O olhar que tende a percorrer uma verticalidade, seguidamente uma horizontalidade e, de seguida a zona inferior esquerda do campo perceptivo. Das inúmeras explicações para esta preferência, a explicação mais razoável parece-nos ser o facto de os ocidentais lerem e escreverem da esquerda para a direita, embora as culturas que lêem de cima para baixo ou da direita para a esquerda dêem igual prevalência ao campo perceptivo inferior esquerdo.

Existem várias constâncias resultantes de experiências anteriores que originam a dedução de certos objectos, mesmo sem os percepcionarmos na sua totalidade. São elas: constância da forma, constância de tamanho, o brilho e a cor. A constância da forma permite-nos,

independentemente da configuração distorcida de determinado objecto que nos é conhecido, saber sempre qual a sua forma real. A constância de tamanho resume-se à tendência para vermos e mantermos no nosso cérebro/córtex qualquer forma ou pessoa habitual sempre que o seu tamanho real seja distorcido ou por mais que se distancie (figura 2.19). O brilho e a cor são igualmente constâncias pois, independentemente da luminosidade a que os objectos ou formas usuais estejam sujeitos, nós sabemos à priori qual a sua cor ou brilho.

46 Max Wertheimer (1880-1943), um dos fundadores da teoria da Gestalt juntamente com Kurt Koffka e Wolfgang

Figura 2.19: Exemplos sobre constâncias de tamanho: (da esquerda para a direita) Symbols Signs DOT, AIGA 1974 47, “Lost and Fond”, “Baggage Lockers”, “Car Rental”, “Barber Shop”

Princípios de configuração da percepção

Existem ainda outras formas marcantes de configurar a percepção na nossa forma de decifrar os elementos visuais, indissociáveis ao resultado do sentir: a tridimensionalidade ou

profundidade, o movimento e as perturbações.

A tridimensionalidade ou a profundidade (transmitida de forma bidimensional) é reconhecida através de mecanismos próprios tais como os mecanismos fisiológicos (diferente posição dos olhos reorganiza a informação no cérebro de forma a adquirirmos apenas uma só imagem com conhecimento de profundidade e tridimensionalidade), os indícios de movimento (ao movermo-nos, o movimento relativo dos objectos próximos parece mais rápido em relação aos mais longínquos) e os índices ambientais (relativos aos estímulos tais como gradientes de texturas, sombras, interposições, perspectivas, e o aspecto das formas, suas dimensões e proporções, suas linhas e ângulos, suas posições relativas diversas – ponto de vista, distância, luz, entre outros). A sugestão de tridimensionalidade é resultado de múltiplos e hábeis

recursos de linguagem usados em composições no plano bidimensional (figura 2.20). “A

dimensão do espaço total, (tridimensional) conferida pela perspectiva que se consegue imprimir às imagens... Reforçar a espacialidade por meio de ilusões ópticas... na utilização das respectivas grafias.” 48 É a escolha da situação dos elementos no campo, como a

sobreposição de formas, a variação de dimensão das formas, a orientação das linhas no campo, a variação do tom ou densidade de textura que permite iludir e simular profundidade e tridimensionalidade. Para fins técnicos e científicos de desenho são necessários processos de representação rigorosos, facilmente compreensíveis e utilizáveis, que expliquem com

exactidão a forma e medida dos objectos tridimensionais, como é o caso da geometria descritiva.

Figura 2.20: Sugestão de tridimensionalidade

Outra forma de configurar a percepção a partir do movimento ‘real’ baseia-se na alteração de posicionamento relativamente a outros objectos estáticos. No entanto, o movimento é aparente e apenas sugerido. Alguns exemplos diários deste processo são o movimento estroboscópico (sequências rápidas de imagens fixas), fenómeno phi (sequência de lâmpadas que se acendem e apagam em intervalos acelerados), movimento auto-cinético (movimento aparente dum ponto de luz numa imensa escuridão). Numa composição gráfica o movimento é apenas aparente – contudo, a impressão é autêntica e é causada pelas formas que sugerem movimento. Um exemplo disso é quando se repetem formas iguais ou semelhantes num campo visual, duplicando-as com organizações diferentes, sugerindo a ilusão de que as formas se estão a deslocar.

47 O conjunto completo está disponível no site oficial da AIGA (AIGA 2009). 48 (Lage 1998, 53).

Na percepção de uma composição gráfica a sensação de equilíbrio é condicionada pela distribuição no campo visual dos ‘pesos visuais’. Quaisquer que sejam os elementos visuais, ou as combinações, os resultados têm uma força visual diferente, pesam mais uns do que outros, dando lugar a organizações mais equilibradas umas do que outras. O equilíbrio é talvez a mais importante influência psicológica que o indivíduo sofre, pois além do facto de este ser essencialmente físico, ele é também a referência visual mais forte e sólida. A tensão é então o fruto da não estabilidade. Procurando impor à forma um eixo vertical e a base horizontal, o olhar é atraído fortemente e igualmente para ambos os lados, conferindo ao equilíbrio uma maior importância compositora. O processo de ordenação e reconhecimento intuitivo da regularidade por parte do indivíduo tem como base a visualização, mesmo que imaginária, destes dois eixos. Se a falta de equilíbrio e de regularidade são factores de desorientação, podemos concluir que o meio visual é mais eficaz se os seus elementos estiverem

contrabalançados49.

Tanto o equilíbrio como a tensão podem ser relativos. No entanto, o processo de divisão através de dois eixos não visíveis, inato ou adquirido, é sentido e está sempre presente. Por mais hipotética que seja, a presença de desigualdades nos pesos visuais tem grande valor nas decisões compositoras e na forma como resulta a estruturação do campo perceptivo. Existe uma relação directa entre o ‘peso’, ou predomínio das formas, e a regularidade. A

complexidade, a instabilidade e a irregularidade aumentam a tensão visual atraindo o olhar, sejam as formas regulares ou irregulares. Se regulares, a composição é equilibrada, racional e harmoniosa, se irregular, a composição pode ser exagerada, distorcida ou emocional. Em suma, “as variações dos meios visuais envolvem factores compositivos de peso, tamanho e

posição.” 50

A ênfase visual é um meio para direccionar especificamente o olhar numa determinada composição visual, ordenando e hierarquizando a informação, dando um destaque maior ou menor dos elementos. As quatro formas básicas de criar ênfase são através da aplicação do tamanho, valor, cor e disposição. A sua utilização apropriada é essencial para comunicar com clareza e serenidade, pois conduz chamadas de atenção que concentram ou direccionam o espectador. A ênfase deve ser vista como um todo e caracteriza-se pelo destaque, tamanho e disposição dos elementos de comunicação visual. O tamanho cria ênfase através do contraste em proporções de formato, tipo, imagem, relação de elementos, dimensão (comprimento e altura) e volume (área e profundidade). Reduzir um elemento a um tamanho pequeno num grande formato pode ser tão poderoso como aumentá-lo para preencher a área total. O valor sugere estrutura visual e massa, o que pode variar entre forte, ou negrito e suave. O contraste de valor isolado entre palavras ou linhas individuais, por exemplo, pode ser eficaz em grandes quantidades de texto ou em textos com tamanho de letra reduzida. A cor destaca e

acrescenta profundidade, assim como a cor tipográfica que pode enfatizar ou contrastar. A disposição, tal como a cor, interage com todos os aspectos da ênfase. A disposição relaciona- se directamente com a área e concentra-se na localização estratégica dos elementos. O contraste é caracterizado por criar e manter o interesse visual, e baseia-se em opostos visuais ou diferenças para distinguir, atrair ou alterar ritmos de leitura (figura 2.21)51. Os opostos

visuais quotidianos também podem funcionar como contraste. O seu uso exagerado pode criar falta de concentração, disputas entre elementos e leituras confusas.

Figura 2.21: Diferentes contrastes sobre “Proibido circular a mais de 100 km/h”

49 Por exemplo, ao círculo conferimos-lhe equilíbrio e estabilidade impondo-lhe um eixo vertical determinante

enquanto forma e um eixo horizontal como referência de suporte.

50 (Dondis 2003, 43)

51 O contraste é uma característica fundamental ao desenvolvimento de qualquer símbolo. Conforme vamos poder

observar na segunda parte do capítulo III, sobre os estudos de caso de símbolos farmacêuticos, os símbolos desenvolvidos e implementados não tem, na maioria das vezes, qualquer contraste visual, daí as muitas deficiências relativas à leitura das formas, linhas e cores.

Na composição visual podemos ainda pretender transmitir harmonia e solidez, nivelamento; subtil ausência de equilíbrio, aguçamento; ou um terceiro aparato ou circunstância da

composição, que se situa entre os dois, ambíguo. O nivelamento, estabilidade ou equilíbrio na composição não oferece surpresa, é totalmente harmonioso; o aguçamento consiste na subtileza ou perspicácia da ausência marcante do equilíbrio. Em ambos há clareza e intenção. Na composição ambígua, o olhar precisa de algum esforço na análise dos componentes visuais. Há uma procura de equilíbrio e evidência por parte do observador, a sua posição não é clara. A composição de natureza ambígua confunde o receptor que, na procura do estável e equilibrado, vê os elementos não definidos com clareza suficiente, provocando tensão. A psicologia da forma, e mais concretamente as leis da Gestalt, regem a simplicidade perceptiva e consideram a composição ambígua, imperfeita, deficiente ou incómoda. O equilíbrio de uma estrutura, ou de formas visuais, devem ver definíveis, óbvias ou subtis, harmónicas ou contrastadas, atractivas ou repulsivas, relacionáveis ou conflituosas, entre outras.

Partindo do princípio de que em todos os campos visuais temos elementos separados, e unidos de certa forma, caracterizamos planos de diferenciação nas composições visuais. O positivo e o negativo não se referem propriamente à escuridão ou luminosidade, mas sim à relação do elemento que domina o nosso olhar, sendo normalmente o positivo o dominante em relação ao negativo.

Sempre que existe uma repetição de uma forma verificamos que há ritmo /movimento. Na linguagem visual, o ritmo é resultante da repetição de uma ou mais formas num determinado espaço, e pode ser mais ou menos regular conforme os intervalos e a posição das formas. O movimento e o equilíbrio são valores que observamos continuamente nas formas de vida mais simples como no nosso próprio corpo, no girar da terra e em todo o Universo. Esses valores estão ligados ao ser humano e à sua maneira de sentir, simulando realidades reais ou aparentes nas composições criadas.

As perturbações são outra forma determinante de percepcionarmos, transmitidas em forma de ilusão, alucinação ou realidade virtual. A ilusão é algo que não corresponde à realidade e ocorre numa percepção viciada por razões que provêm de órgãos sensoriais. A alucinação difere da ilusão pela inexistência do objecto e surge como resultado de doença, pânico, angústia, drogas ou mesmo lesões orgânicas (caso das agnosias). A realidade virtual advém do crescimento da tecnologia possibilitando uma ilusão superior. Através de um capacete e luvas especiais é possível experimentar realidades inexistentes e sofrer sensações autênticas como se tratasse de realidade real.