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Feuerstein e a mediação da aprendizagem na educação a distância

A abordagem de Reuven Feuerstein e suas contribuições para a análise da mediação pedagógica

2.4 Feuerstein e a mediação da aprendizagem na educação a distância

Apesar de Feuerstein não ter, até então, desenvolvido nenhum trabalho que envolva diretamente o campo da educação a distância, suas contribuições abrangem todo o sistema educacional, em todas as faixas etárias, possibilitando a aplicação de seus pressupostos em várias áreas e situações. Para exemplificar a utilização das teorias de Feuerstein em contextos educacionais a distância tem-se o trabalho desenvolvido por Raabe, Silva e Giraffa (2005), que emprega a Teoria da Experiência de Aprendizagem Mediada e os critérios universais de mediação para o desenvolvimento de uma proposta educacional junto a alunos com dificuldades de aprendizagem em cursos a distância.

O estudo de Raabe, Silva e Giraffa (2005) trata-se de uma proposta que segue os norteamentos dos critérios mediacionais, aplicando-os em contexto de sala de aula a distância, junto a alunos com dificuldades de aprendizagem na disciplina de logaritmos de cursos na área tecnológica. Os resultados mostram que é possível o trabalho da mediação no contexto da Ead e que a mediação, conforme Feuerstein, tem gerado resultados satisfatórios no que tange ao processo de ensino/aprendizagem dos alunos com dificuldades.

A concepção de educação que permeia a filosofia e prática desse teórico vislumbra os processos de ensino e aprendizagem como muito mais do que a transmissão de conteúdos específicos, com uma preocupação com o produto final. A aquisição de conhecimento é um caminho que envolve a construção de processos cognitivos na promoção tanto de operações mentais, quanto de conceitos específicos. Dessa forma, todo processo de ensino/aprendizagem deveria levar o indivíduo a uma nova forma de relacionar-se com o mundo, fazendo com que ele fosse capaz de criar,

nesse mundo, formas mais adequadas de responder às suas exigências. (Gomes, 2002, p. 249)

Essa prática educacional defendida por Feuerstein e todos os seus colaboradores, é entendida neste trabalho como uma das formas de contemplar as exigências de uma educação com reflexos e influências pós-modernas apontadas por Oliveira (2006) e Moran (2006), dentre vários autores. Uma prática capaz de realmente contribuir com as novas formas de promover a aprendizagem e o desenvolvimento humano em todas as faixas etárias, inclusive na fase adulta, no contexto da educação a distância.

Segundo Gomes (2002) é função da educação construir indivíduos pensadores e não apenas pessoas bem (in) formadas, mesmo porque a informação muda a cada instante. A concepção de que o ser humano é modificável e está em constante evolução faz uma interface direta com as exigências da Era da Flexibilidade ou da Reflexibilidade, como previa Belloni (2001).

A sociedade passa por transformações radicais que modificam não apenas suas estruturas, mas principalmente a forma de produção do pensamento das pessoas (Gomes, 2002; Moran, Masetto & Behrens 2006; Oliveira, 2006; Marinho, 2002; Morin, 2001; Perrenoud, 2000; Pretto, 2001; Ramal, 2002). A educação não se ausenta dessa transformação, pelo contrário, sofre com a coexistência de paradigmas educacionais distintos e contrapostos: o paradigma sustentado por uma perspectiva estática da inteligência, cuja participação do aluno no processo de ensino/aprendizagem é passiva e o paradigma educacional, que prevê o desenvolvimento como um processo contínuo e constante, tendo uma participação ativa do aluno em seu processo de construção do saber.

No anseio de construir novas formas de responder às transformações sociais e as demandas que dela surgem, instituições educacionais, incluindo muitas que oferecem

cursos a distância, procuram ter uma postura inovadora, buscando novos recursos, novos materiais e novas formas de transmitir o conhecimento, mas acabam retornando a uma prática vinculada às formas tradicionais de ensino. (Masetto, 2006) Trata-se da influência da ainda presente prática da “educação bancária” como apontava Freire (1979; 1983), uma concepção de educação onde o aluno é visto como uma caixa de depósito de saber, o professor deposita nesta caixa o que ele imagina e/ou julga ser necessário para o aluno. (Rigoni, 2005)

Ainda segundo Rigoni (2005), os resquícios da educação bancária também influenciam o aluno. Em sua experiência na Universidade de Caxias do Sul com o curso de Formação de Educação a Distância, Rigoni comenta que os alunos também têm uma dificuldade de perceberem-se como agentes de seus processos de aprendizagem e se vêem como receptáculos de informação, não existindo a tão almejada autonomia de aprendizagem, que é considerada elemento central da formação de adultos, principalmente na educação a distância.

No ensino superior com alunos na faixa etária jovem e/ou adulta, como é o caso da educação a distância na graduação e pós-graduação, é comum encontrar discursos que remetem a existência de autonomia do aluno no seu processo de aprendizagem. Entretanto, segundo Preti (2000, p. 31), a pressuposição de uma autonomia consolidada traz consigo um desequilíbrio nas relações de poder, pois ser autônomo significa “ter autoridade, força para falar em seu próprio nome, poder professar”, o que não é em nenhum contexto educacional, o caso do aluno. Assim, é necessário reconhecer os papéis desempenhados pelos agentes desse processo educacional. O aluno neste processo está desenvolvendo sua capacidade de autonomia. Tanto aluno quanto professor vão construindo a autonomia, à medida que o cotidiano educacional demanda essa postura.

“Ninguém nasce autônomo, para depois decidir. A autonomia vai se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas”. (Freire, 1996, p.107)

Como explicitado em parágrafos anteriores, Feuerstein dedica seus estudos e a aplicação dos mesmos ao desenvolvimento de autonomia para o indivíduo, utilizando-se para tanto, a Experiência de Aprendizagem Mediada através dos critérios de mediação que são aplicados pelos instrumentos desenvolvidos pelo autor e colaboradores. É a EAM que impulsiona ou propicia o Modificabilidade Cognitiva Estrutural, que por sua vez resulta em uma melhora da adequação do indivíduo às demandas cotidianas e uma autonomia no processo de aprendizagem, possibilitando benefícios significativos para uma aprendizagem por exposição direta aos estímulos.

Acredita-se que a inovação proposta pela educação a distância não está exclusivamente na difusão do conhecimento por meios de comunicação cada vez mais eficientes, mas pela nova possibilidade de abordagem ao indivíduo, pela atual forma de encarar a educação como um processo contínuo e durante toda vida, principalmente para a fase adulta, e na pedagogia própria desse contexto educacional que segundo Moran (2006) ainda está em construção. É neste sentido que a mediação pedagógica é vista como a chave para uma abordagem diferencial, para o estabelecimento de um ambiente promotor de processos de ensino/aprendizagem, com influências em uma prática educacional libertadora, desafiadora (Freire, 1978; 1983)

O uso de tecnologias e de artefatos tecnológicos (computador, sistemas de reprodução de imagens, sistemas de comunicação virtual) por si só não significa uma abordagem inovadora de ensino. Pode-se ter uma prática ultrapassada (onde é o professor que ensina - transmite, deposita o conhecimento - e o aluno que passivamente

aprende - recebe o conhecimento) usando os mais avançados programas e aparelhos tecnológicos. (Masetto, 2006; p. 138-139).

No paradigma educacional emergente, segundo Masetto (2006), “o aluno assume papel de aprendiz ativo e participante (não mais passivo, receptivo e repetidor), de sujeito de ações que o levem a aprender a mudar seu comportamento” (pág. 141), o que não significa que o aluno está sozinho no seu processo de aprendizagem, mas sim que o professor, neste processo, é um parceiro do aluno. Este professor está preocupado em fornecer os subsídios necessários para que esse aluno aprenda a pensar, aprenda a aprender e a aplicar os conteúdos na sua prática, organizando seus estudos de acordo com suas prioridades, para que no futuro possa atuar da forma mais adequada e autônoma às exigências do meio.

Dessa forma, o professor não é mais aquele que detêm o saber e que autoritariamente transfere o conhecimento que julgar apropriado ao seu aluno. Aluno e professor constroem o conhecimento, ambos com participações ativas durante o processo e o professor passa a ser um mediador. Fonseca (1998) aponta ainda, que o professor mediador tem como características a sistematização, a intencionalidade, a orientação para os objetivos cognitivos e o otimismo acerca das expectativas das conquistas de seus alunos.

Por essa perspectiva, Feuerstein nos ajuda a pensar em uma prática pedagógica que contemple o desenvolvimento das capacidades necessárias para uma aprendizagem autônoma. A experiência de aprendizagem mediada realizada por meio dos critérios de mediação sistematiza uma ação capaz de transformar a forma como o individuo pensa e aprende. A modificabilidade alcançada pela EAM, neste sentido, permite a mudança na relação do aluno com seu processo de aprendizagem, viabilizando a meta-aprendizagem e consequentemente, a autonomia.

C

APÍTULO

III

Metodologia