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Finalidade e objetivos da investigação

Nos últimos anos em Portugal, tem-se assistido a um investimento excecional e consequente aumento da área de espaço verde urbano disponível, destinado ao recreio e lazer, bem como à valorização do ambiente das cidades. O papel dos programas de regeneração urbana, como é o caso do Programa Polis, impulsionado pelo sucesso de casos anteriores como a Expo 98, em Lisboa (MAOT 2000; Partidário & Nunes Correia 2004; Correia Guedes et al. 2009), muito contribuiu para esse fenómeno. Com o Programa Polis – para a regeneração urbana – muitas cidades, de dimensão pequena e média, encontraram forma de reabilitar os seus espaços públicos e criar espaços verdes em dimensão e diversidade, como não dispunham até então.

Este aumento da área verde, não é contudo concorrente com o desenvolvimento de estratégias de avaliação. O relatório de auditoria do Tribunal de Contas de Junho de 2004, conclui aliás que ―não podem ser considerados satisfatórios os resultados obtidos pelo

Coordenador Nacional e pelo Gabinete Coordenador na montagem de um sistema de recolha e tratamento de informação que permitisse a monitorização das muitas intervenções em curso‖ (2004, p.11). Por outras palavras, a sociedade investe nesta categoria de

espaços para infraestruturar a cidade, sem que procure compreender a posteriori o seu impacto nessa qualidade do ambiente urbano e em última instância na qualidade de vida das populações.

Muitos espaços verdes foram construídos ou requalificados, como são exemplo os listados na tabela de inventário da Figura 59. Todavia, até à data, ainda não foi conduzida qualquer avaliação sobre a sua ocupação, o modo como são utilizados e a satisfação dos seus utilizadores. Não obstante, o processo que esteve na base da intervenção do Programa Polis contemplou métodos de participação pública, tanto para a definição dos Planos Estratégicos, como a jusante, até à discussão pública dos projetos. Mesmo assim há que distinguir o projeto (ou o plano) participado, da avaliação participada após a ocupação dos espaços intervencionados.

A avaliação ex-post, para além de revelar os aspetos de sucesso e de fracasso, permite tirar conclusões com as quais se pode aprender de modo a minimizar futuros erros. No caso das específicas e orientadas para a ocupação dos espaços exteriores construídos, a avaliação pode mesmo providenciar a informação necessária para instruir nova abordagem projetual (Marcus & Francis 1998), afinando a adequação do espaço às necessidades e preferências dos seus utilizadores, para o que é necessário perceber como são estes espaços utilizados e qual a avaliação dos utilizadores e seus níveis de satisfação. Facto é que os espaços

verdes produzidos no âmbito do programa Polis não foram foco de avaliação pós- ocupacional, quer por iniciativa central (ou governamental, da coordenação do próprio programa), quer por outra qualquer iniciativa integrada.

Noutra esfera, há um grande défice de investigação científica, produzida para o contexto Português, sobre este tipo de avaliação de espaços verdes, e a total ausência de informação objetiva sobre o padrão de utilização dos parques verdes para o nosso contexto. Há alguns estudos conducentes a teses que abordam parcialmente estes aspetos no âmbito de outras análises descritivas muito especializadas (Almeida 2006; Paiva 2012; Quintas 2013; Fadigas 1993; Ribeiro & Barão 2006). A tese de Almeida (2006) é sobre o valor das árvores e floresta urbana, procurando contudo inquirir também sobre o grau de satisfação dos utilizadores dos espaços verdes de Lisboa, a de Fadigas (1993) conducente à classificação dos espaços verdes e a investigação de Ribeiro e Brandão (2006) relaciona os recursos de cinco casos de estudo de corredores verdes com as atividades que estes proporcionam. Estudos de avaliação da qualidade estética, que relacionam fatores ambientais e de conforto humano com o valor social dos rios urbanos, desenvolvidos no âmbito do projeto Urbem, (IST et al. 2004; Batista e Silva et al. 2005; Ramos et al. 2009; Batista e Silva et al. 2013), neste caso com uma aplicação à ribeira das Jardas, alvo de intervenção no âmbito do Polis, para a criação do Parque da Ribeira das Jardas (Agualva- Cacém).

A investigação com foco no programa tem permitido várias abordagens, algumas tocando os espaços verdes. Paiva (2012) aborda uma apreciação de natureza descritiva e analítica, muito extensiva e bem representativa da intervenção do Programa Polis nas cidades. Remata com um caso de estudo em detalhe – Coimbra – focando as obras do Parque Dr. Manuel Braga, o Parque do Mondego e o enquadramento do Mosteiro de Stª Clara a Velha, sobre os quais apresenta desenhos síntese do uso e apropriação do espaço com base na observação empírica.

Considerando em particular o foco no programa Polis, é possível encontrar dissertações de natureza académica e relatórios técnicos (estes sobretudo vocacionados para avaliações

ex-ante). Apresentam abordagens da avaliação dos aspetos relacionados com o estudo da

política, processo e governança relativos ao programa (Baptista 2009; Partidário & Nunes Correia 2004; Simplício 2000; Queirós & Vale 2005; Ribeiro 2007), questões de planeamento relacionadas com a temática de requalificação urbana (Fernandes 2002; Bernardino da Silva 2010; Quintino de Barros 2008), abordagens de resposta aos objetivos gerais do programa (Rodrigues & Silva 2007; MAOT 2002; Pita do Nascimento 2008), a avaliação geral das componentes ambientais (Ferreira 2006; Rocha 2011), outras

abordagens de análise descritiva dos espaços verdes (Fonseca 2009), a avaliação da qualidade visual (Batista e Silva et al. 2013).

Há contudo uma necessidade evidente de avaliar a qualidade dos espaços verdes públicos que a sociedade gera e disponibiliza para ocupação pelas pessoas, percebendo se estes respondem aos seus objetivos, mas também na sua complexidade e valores enquanto lugares e utensílios. Há um grande défice de investigação focada na avaliação dos espaços verdes públicos e concretamente dos parques verdes públicos em Portugal. Especialmente a avaliação de parques que considere de forma agregada, a vocação e ocupação pelos utilizadores, os seus requisitos e satisfação, mas também as qualidades espaciais e funcionais destes lugares. A primeira tende a ser por vezes ignorada nas valorações, ou avaliações de carácter económico; e relativamente à segunda, não parece normalmente haver nos estudos de avaliação sociológica o foco na avaliação dos utilizadores tendo em conta a implicação no desenho do espaço.

Facto é que daquele extraordinário investimento na criação e requalificação de espaços verdes urbanos, proporcionado pelo programa Polis, parte resultou em parques verdes urbanos e que estes carecem de avaliação pós-ocupacional, ao que a presente investigação pretende dar resposta.

Desde 2004 e ao longo de dez anos, que iniciaram com uma pesquisa sobre a obra dos arquitetos paisagista na Área Metropolitana do Porto – resultando na descrição e crítica de 29 espaços verdes (Meireles-Rodrigues & Farinha-Marques sem data) – o autor desta tese tem procurado compreender se os parques que hoje fazemos são espaços competentes e de qualidade e se e como é possível aferir essa condição. Da observação empírica de campo e pesquisa documental, bem como da experiência da prática profissional e no ensino do projeto e construção de parques verdes urbanos, podem generalizar-se algumas tendências sobre o seu custo, conceito, estrutura formal, função e ocupação, qualidade visual e manutenção. Veja-se a este respeito a preocupação de Judith Stilgenbauer (2012, p.13) ―over the past two decades landscape architects have begun to rethink their

approaches to designing, implementing, and maintaining under-utilized, input-intensive existing urban open spaces, urban leftover spaces, disturbed sites, and outdated urban infrastructure systems‖

As intervenções contemporâneas em Portugal, parecem seguir uma tendência para um desenho de elevada intensidade e custo; uma tendência para ―parafrasear‖ um estilo formal emergente e global; o projeto dos parques não parece ser baseado no conhecimento das preferências e necessidades dos utilizadores, no entanto a taxa de utilização dos parques é

muitas vezes considerada um fator de sucesso pelas autarquias, o que muitas vezes apenas revela a falta de alternativas; tem-se verificado ainda que muitos espaços se degradam muito rapidamente e por vezes logo após a sua construção. Este resultado não é apanágio do nosso contexto. Pergunta também Laurie Olin: ―the twentieth century has experienced

widespread examples of both the best and worst of these [places]. How could nations that have so many trained professionals have produced such banal, dysfunctional, unsupportive environments? (…) In part from ignorance regarding human needs and behaviour‖ (2007,

p.xii).

No domínio da especialidade, também a crítica sistematizada e construtiva é quase inexistente em Portugal, isto é, os peritos abstêm-se frequentemente de criticar e assim contribui para esclarecer e consubstanciar o conhecimento. Esta foi aliás uma das forças motrizes para o início da investigação que conduz a esta tese. Uma observação igualmente importante tem a ver com a perceção de que o senso comum, ao invés, exerce a crítica relativamente aos espaços exteriores, muito embora esta não surta efeito por ter habitualmente lugar nos blogs e fóruns na internet ou outras sessões públicas sem consequência, em vez de procurar veículos mais pró-ativos e mobilizadores da sociedade. Será por isso muito importante que se conheça, para o nosso contexto, como é que as pessoas utilizam os parques, inquirir sobre a sua satisfação, quais os atributos necessários para responder às suas necessidades e quais as suas preferências. Analisar ―open space

and human behaviour, asking what do people do? Why? What do they think about their spaces, their lives and their quality? What works and what doesn‘t?‖ (Olin 2007, p.xiv).

Considerando o exposto, esta investigação tem como finalidade o inquérito aos parques verdes urbanos contemporâneos, com o foco naqueles construídos no âmbito do Programa Polis, visando conhecer o padrão de ocupação e as necessidades e preferências dos seus utilizadores e assim poder concluir do seu carácter contemporâneo do parque em Portugal. Para tal pretende-se levar a efeito a avaliação pós-ocupacional de um conjunto de casos de estudo, selecionados daquela população de parques. Consequentemente, a investigação que conduziu a esta tese tem três objetivos fundamentais:

 o primeiro é avaliar a ocupação de uma amostra, geográfica e tipologicamente representativa, dos parques verdes urbanos construídos no âmbito do Programa Polis;

 o segundo é a generalização desta avaliação com vista à dedução sobre o padrão geral de ocupação e as preferências e necessidades dos utilizadores dos parques verdes urbanos, bem como os seus níveis de satisfação;

 o terceiro é a síntese da especificidade do padrão de ocupação e das preferências dos utilizadores no parque em Portugal e a enunciação de um modelo espacial resultante.

Estes objetivos encerram um conjunto de passos que passam pela criação de um inventário dos espaços verdes urbanos criados no âmbito do referido programa; a definição de casos de estudo; a análise da sua utilização e das preferências e necessidades dos utilizadores; e a generalização do padrão de ocupação, e da avaliação dos utilizadores; a comparação com resultados de estudos similares noutros contextos.

Considera-se esta uma matéria de importância central para a arquitetura paisagista – a ocupação e satisfação dos utilizadores no parque urbano em Portugal e a procura da sua especificidade. Já sujeito a estudos em alguns países europeus onde a investigação nesta área científica se encontra mais evoluída, este tema precisa de ser abordado para o nosso contexto. Em Portugal, aliás, a investigação em arquitetura paisagista tem sido focada sobretudo na história da paisagem, na sociologia e antropologia da paisagem, na teorização sobre o objeto e valores da profissão, assim como na epistemologia dos conceitos de paisagem, arquitetura paisagista e arquiteto paisagista, no planeamento e ordenamento do território e noutros aspetos técnico-científicos. Como meio de produzir novo conhecimento, a investigação na área da arquitetura paisagista necessita de aprofundamento e especialização em métodos próprios e de abrir novas perspetivas de investigação e consequente aplicação à prática profissional. Também no domínio da educação – onde a Escola dos arquitetos paisagistas em Portugal é de reconhecida excelência ao nível do ordenamento do território, da cultura concetual do projeto e do desenvolvimento técnico – se antevê necessária uma abordagem cada vez mais integradora das ciências sociais e humanas que se tocam o domínio da paisagem e do espaço exterior.

Tendo em conta estes pressupostos, o parque urbano, como um dos principais objetos da arquitetura paisagista, carece ser estudado sob várias perspetivas. Uma delas é proposta por esta investigação e centra-se em conhecer o parque ocupado e perceber a especificidade dessa ocupação. Os dados sobre o padrão de utilização dos parques e sobre a satisfação das pessoas podem resultam importantes para o domínio da arquitetura paisagista, na medida em que possibilitam otimizar a conceção do parque em Portugal, ajustando as soluções às caraterísticas do utilizador local e à forma como este percebe e se relaciona com o espaço, ao invés de confiar em pressupostos globais e preconceitos criativos. Assim, quer-se que os resultados deste estudo possam ser absorvidos pela prática

profissional e pela academia, e que as questões aqui abordadas, assim se considerem satisfatórias, possam ser incluídas nos modelos de conceção que caracterizem o parque português contemporâneo.