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Fundamentos metodológicos

Quando avaliar?

Em arquitetura paisagista, a avaliação é uma estratégia de investigação que pode ser aplicada para a apreciação dos espaços exteriores sob diversos pontos de vista, e utilizando uma grande variedade de métodos e técnicas. Swaffield e Deming (2011) classificam-na de construtiva e dedutiva, prescrevendo-a como estratégia para casos em que se pretende comparar um estado de referência, como uma paisagem pré-existente, com os resultados

da implementação de projetos, planos, ações de gestão, programas, ou determinadas práticas. Os mesmos autores adiantam como exemplos os casos em que é necessário classificar propostas de projeto, medir o sucesso ou insucesso de investimentos públicos, justificar propostas de planeamento, e defender ações de projeto.

A avaliação considera à partida um corpo teórico que fundamenta a ação de avaliar, isto é,

―rather than theory emerging inductively or reflexively from research activity (o que é habitual

quando está em causa a aplicação do método científico clássico), theory is already assumed

and embedded within the normative parameters used‖ (Swaffield & Deming 2011, p.39).

A associação norte-americana dos arquitetos paisagistas (ASLA), no seu boletim de fevereiro de 1974, onde enumerava as suas prioridades, evoca já a absoluta necessidade de avaliação dos espaços construídos e a criação de uma plataforma de dados daí provenientes, como via para melhorar o desempenho profissional dos arquitetos paisagistas:

―The systematic analysis and evaluation of completed works provides the greatest potential for obtaining the kind of data and knowledge essential to improving a professional performance.The findings would be of value for the continual interactive updating of educational programmes as well as for the prediction of impact of design-planning decisions by providing a more substantive information base on which to make such decisions.‖ (ASLA

1974 apud Friedmann et al. 1978, p.4)

Parte destas razões estão incluídas numa síntese mais alargada de Friedmann, Zimring e Ervin Zube (1978), que aponta cinco razões que justificam a avaliação de um determinado lugar:

 Para aumentar o conhecimento sobre o comportamento das pessoas e documentar a sua interação com o ambiente construído;

 Para incorporar como parte do processo de projeto e sua execução, atuando como mecanismo de ―feedback‖, de modo a incluir os dados resultantes da avaliação no apoio à decisão, melhorarando os espaços construídos e a programação de novos espaços;

 Para providenciar um suporte de dados a integrar na educação de novos projetistas e ainda para a formação contínua daqueles que já se encontram na prática profissional;

 Para obter os dados necessários para a análise da eficiência das políticas urbanas e programas que, ou apoiam, ou condicionam o projeto dos espaços;

 Para desenvolver a capacidade de prever a satisfação dos utilizadores dos espaços e a adequação das soluções, no que se refere ao seu impacte ambiental.

Duarte (2002, p.2) reforça estas aplicações referindo-se aos objetivos da avaliação, que se baseia primeiramente na ―recolha de dados sobre a perceção, significado, comportamento e

métodos de utilização dos utentes do parque, relativamente às características físicas, funcionais e sociais‖, para depois se focar na contribuição ―para a melhoria dos processos de criação e gestão dos parques urbanos e de um modo particular, para apoiar a gestão e manutenção‖. Estas aplicações são afinal uma das razões porque a avaliação de espaços

ocupados por pessoas se baseia muito frequentemente em métodos de ciências sociais, aplicados à investigação em espaços verdes e em arquitetura paisagista. Do mesmo modo como, por exemplo, o design participativo, ou participação pública com vista ao projeto.

Quando não avaliar?

A avaliação dos espaços físicos ocupados é muito útil se equacionarmos as suas aplicações anteriormente apresentadas. Porém devemos apontar as situações em que essa avaliação se pode tornar contraproducente. Desde logo se não for possível definir com clareza o objeto da avaliação, pois não é eficiente uma avaliação se o seu objeto for tão flexível que não seja possível descrever uma situação de referência. Também, por outro lado, se se conhecer à partida que os resultados da avaliação não contribuem para melhorar o objeto de avaliação (Theobald 1979), i.e., não fará sentido iniciar um processo de avaliação, se o seu contributo for desprezado à partida.

Se a avaliação é especialmente orientada para a verificação do cumprimento de objetivos – e.g. perceber se os objetivos definidos em fase de projeto são cumpridos aquando da utilização de um parque – há a considerar algumas situações adversas à elaboração de uma avaliação, adaptadas de Tripodi et al. (1971): quando os objetivos não são claros, torna-se difícil perceber o sentido da avaliação; quando se percebe à partida que a avaliação não vai ter impacto na decisão pelo facto de o objeto de avaliação se demonstrar competente à partida; quando o objeto de avaliação se encontra em alteração, tornando difícil definir uma situação de referência a avaliar; se as desvantagens de avaliar são maiores do que as vantagens. Estas quatro circunstâncias foram determinadas tendo como objeto de avaliação os programas sociais na área da saúde, educação e bem-estar, muito embora seja possível traçar o paralelismo para o objeto de avaliação em causa nesta tese.

Há ainda a considerar a disponibilidade de recursos. O processo de avaliação é moroso, exige um orçamento significativo e envolve investigadores treinados (Theobald 1979; Friedmann et al. 1978).

A avaliação participada

Uma das características que distingue os métodos de design participativo daqueles empregues na avaliação de espaços verdes, é a ocupação atual do espaço. O projeto de um espaço exterior público é vulgarmente assente numa situação de referência, que virá a sofrer alterações de objetivo e função após a execução. A avaliação pode também ser uma forma de instrução do design, contribuindo para a participação pública no processo de requalificação (Figura 50). Tal sucede se a avaliação incorporar métodos de participação pública e se porventura os seus resultados manifestem prioridades de intervenção. Veja-se por exemplo a intervenção no Bryant Park, em Nova Iorque, entre 1988 e 1992, coordenada por Daniel Biederman. A avaliação deste parque, de acordo com os princípios desenvolvidos por William H. Whyte (1980), serviu para transformar o espaço que, até então, era um antro de toxicodependência e delinquência: ―He (Whyte) noted in 1980 that Bryant Park is

dangerous. It has become the territory of dope dealers and mugglers (…)‖ (Tate 2001, p.25).

Figura 50 - Ciclo de projeto-avaliação-projeto (Friedmann et al. 1978, p.21). O foco desta investigação incide sobre a ―fase de avaliação‖, assinalada pela área tracejada.

Trata-se então de avaliação participada, dado que grande parte da recolha de dados provém dos utilizadores, de forma direta (e.g. entrevista) ou indireta (e.g. observação) e visa a adequação dos espaços às necessidades e preferências das pessoas.

A avaliação pós-ocupacional – ―post-occupancy evaluation‖ (POE)

A prática deste tipo de avaliação tem sido consistentemente designada de avaliação pós- ocupacional, ou ―post-occupancy evaluation‖ (Marcus & Francis 1997; Goličnik & Ward Thompson 2010; Moore & Cosco 2010; Nager & Wentworth 1978) metodologia aplicada para avaliar a ocupação de um dado espaço exterior na perspetiva dos utilizadores, procurando conhecer as suas preferências, necessidades e níveis de satisfação. Este tipo de investigação tem como parte do seu alicerce a psicologia ambiental, especialmente as teorias da perceção da paisagem, da psico-evolução, ―affordances‖ (Gibson 1979), ou do ―place attachement‖ (Shumaker e Taylor 1983), o que vai de encontro ao anteriormente exposto sobre a necessidade de invocar métodos de participação da população e compreender o significado dos resultados, à luz da relação que as pessoas estabelecem com os lugares.

A metodologia de POE é um caso de abordagem multi-método que visa avaliar um espaço ocupado, considerando a apreciação da sua performance. No âmbito do projeto Urbem (IST et al. 2004), discute-se as vantagens de uma avaliação multi-método, no caso aplicada à avaliação estética. Os autores citam Mingers (2001) para o justificar, apontando que esta abordagem é a mais competente para lidar com a complexidade multidimensional do nosso meio e por isso pode gerar novas perspetivas e confiança nos resultados pela validação entre métodos. Esta abordagem possibilita também o posicionamento multidimensional (como adianta o mesmo autor, citando Habermas) considerando por um lado os aspetos físicos, por outro os relacionados com as experiências, valores e emoções da esfera individual e, ainda por outro, o domínio social, em que todos participamos e é pautado por códigos, significados e recursos que determinam as nossas ações.

Aplicações da POE

Pode ser uma avaliação realizada pelas equipas de projeto como benchmarking, ou forma de aferir as próprias soluções, comparando-as com outros projetos com o intuito de medir o sucesso e melhorar a eficácias dessas soluções (Augustin & Coleman 2012). Os mesmos autores (2012, p.257), a respeito da utilização da POE a priori salientam que ―a well-planned

POE will collect useful information about the ramifications of design decisions and generate insights for use on future projects‖. A POE pode por outro lado especificar a apreciação do

espaço construído, dos ambientes exteriores, para perceber a sua utilização atual, detetar as soluções que funcionam, os erros e faltas de adequação, na perspetiva da interação das pessoas com espaço (Marcus & Francis 1997). Clare Cooper Marcus e Carolyn Francis (1998, p.345), nesta sequência, definem POE como ―a systematic evaluation of a designed

avaliar diferentes tipos de espaços exteriores como praças e largos (Gehl 2008; Whyte 1980; Joardar & Neill 1978; Rutledge 1975), a ocupação dos espaços verdes pelas crianças (Hussein 2012b; Hussein 2012a; Moore & Cosco 2010; Cosco 2006), espaços verdes de proximidade em áreas residenciais (Cooper Marcus et al. 1998; Francis et al. 1984; Sommer 1983; Cooper 1975), parques e jardins (Ward Thompson 2010; Goličnik & Ward Thompson 2010; Goličnik 2005; Francis 1987), incluindo normalmente métodos de observação e mapeamento de comportamento, inquérito mas também inventário, pesquisa em arquivo e análise documental.

Em suma, o objeto de investigação desta tese é a avaliação pós-ocupacional do parque verde urbano contemporâneo, com foco no universo disponível de parques construídos no âmbito da 1ª Componente do Programa Polis, do qual se selecionam cinco casos de estudo. O objetivo, também coincidente com a lacuna de investigação, é compreender o padrão de ocupação; as necessidades, preferências e níveis de satisfação dos utilizadores dos parques; e generalizar um modelo espacial de parque verde urbano a partir da síntese da avaliação.