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Formas de organização e articulação da sociedade civil

CAPÍTULO 3 – Sociedade Civil nos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e

3.5 Formas de organização e articulação da sociedade civil

O vínculo entre os conselheiros e suas organizações, segmentos e a própria sociedade civil tem-se mostrado frágil. São perceptíveis as dificuldades encontradas pelos conselheiros em fazer com que os assuntos e as pautas do espaço que representa cheguem até o conselho e também fazer o caminho contrário, ou seja, que os assuntos debatidos e decididos no conselho cheguem às organizações, aos segmentos e aos espaços de articulação da sociedade civil.

Nessa situação, é comum os conselheiros emitirem opiniões e adotar posicionamentos individuais, ou de uma parcela pouco representativa de conselheiros. Em várias experiências, onde a sociedade civil consegue manter um fórum ou espaço similar de encontro, debates e articulação, fica facilitada a construção de unidade. Ocorre que a maior parte dos fóruns está fragilizada, e parte da sociedade civil não participa organicamente desses espaços.

[...] temos uma participação no Fórum, então o que é discutido lá é nossa referência enquanto sociedade civil. Aí fica o questionamento: e as outras pessoas? Elas estão discutindo onde, quais são as ideias colocadas? Fica esse ponto de interrogação. É o quadro, mas é aquilo que eu estou falando, há uma referência muito grande no Fórum Municipal. As posições são colocadas e são muito respeitadas, inclusive, para os outros membros da sociedade civil, para não criar expressivamente essa fragilidade. Fica meio vergonhoso, imagina, o fórum colocar algo e essas pessoas forem contra. Mas, espera aí, então, porque estão sendo contra, se o espaço do fórum é o espaço da sociedade civil discutir? Essas pessoas estão discutindo onde? Então, quando coloca na mesa, é aceito. Tem toda uma discussão em cima disso, mas uma dificuldade, inclusive, porque alguns também da sociedade civil têm essa postura: aceita, mas não aceita. (Entrevistado 1).

Tínhamos uma prática mais forte nesse processo, quando articulávamos e chamávamos essa reunião da sociedade civil como Fórum DCA. Era mais forte, porque tinham, além da participação da sociedade civil que estava no conselho, várias outras organizações, que não estavam no conselho, mas pautavam as instituições do conselho. Do último ano, da metade do outro mandato para cá, essa discussão ficou mais voltada apenas para as entidades da sociedade civil que estavam no conselho. Conseguimos fazer uma ou duas reuniões, principalmente no início do governo atual, agora, chamando representantes dessas redes locais, dos fóruns locais. Foi uma experiência boa, que teve cerca de 15 regiões administrativas

representadas. Essa representação vinha sempre junto com alguma entidade da sociedade civil que não tinha muito hábito de participar mas, com o convite, se mobilizou e participou, mas ultimamente, as últimas experiências, são reuniões que a própria sociedade civil que está no conselho chama e esse grupo senta e define e delibera algumas coisas. Agora, vamos ter a necessidade desse grupo, que o grupo do conselho do mandato passado eram só dez de cada segmento, estado e sociedade civil e agora aumentou para 15 representantes de cada segmento. Hoje, vamos ter 15 representantes da sociedade civil, e aí significa que vamos ter que debater mais entre nós. Estamos com a iniciativa de continuar com essa metodologia, sempre antes da reunião plenária do conselho, sentar para dialogar sobre algumas coisas e levar as decisões mais consistentes para o pleno. Tem essa possibilidade, que vamos testar agora. Como o grupo é novo, 50% se renovou, são entidades que não eram conselheiras, ou eram conselheiras já em mandatos bem antigos, então, vamos tentar ver como vai ser o interesse desse grupo de fortalecer esses encontros antes da plenária, e, de preferência, ver se conseguimos trazer para esses encontros outras entidades, que só participam mesmo do conselho de arquibancada. É mais ou menos uma forma de reativar o fórum de entidades que defendem direitos de crianças e adolescentes. mas reativar por um motivo mais exato. Reativar, deliberar junto com a sociedade civil que está no conselho e pautar o conselho, por exemplo. Chamar todo mundo para ter incidência junto com o conselho com relação ao governo, por exemplo. Seria um ponto mais específico, não para discutir o direito da criança e, a partir dali, ter posições que saem fora desse âmbito do conselho, desse âmbito da articulação política. É mais ou menos localizar isso, porque, se não, não vamos conseguir mais uma vez ter adesão desse grupo todo. São coisas mais exatas, que estão sendo pensadas um pouco com essa metodologia.

(Entrevistado 6).

O exercício da representação implica uma via de mão dupla, ou seja, o representante assume compromissos com os representados e estes contam com o representante para fazer chegar suas demandas nas esferas decisórias. No caso dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, os conselheiros da sociedade civil são, via de regra, eleitos entre seus pares em fóruns próprios. Não há, contudo, instituído, maneiras de controle sobre a ação dos representantes pelos representados (o mecanismo da revogabilidade de mandato tão defendido entre grandes parcelas da sociedade civil junto aos representantes legislativos, não é ainda uma realidade para as representações da sociedade civil). O vínculo entre representantes e representados é muito tênue, quando não inexistente.

Diante disso, a questão da legitimidade se apresenta como um tema dos mais relevantes e complexos a serem enfrentados pela sociedade civil organizada. Cumpridas as formalidades, não há porque discutir a legitimidade dos conselheiros eleitos, pelo menos do ponto de vista formal. Contudo, há muitas outras questões, e bem mais substanciais e desafiadoras, que envolvem o tema da legitimidade. Trata-se, sobretudo de compreender a dimensão da ancoragem social desses espaços, de discutir de fato em nome de quem falam, para quem falam, etc.

No caso da política da infância, essa discussão é polêmica, para o movimento da infância, pois existem grupos que defendem a participação ativa de crianças e adolescentes, inclusive atuando como conselheiros e outros que, em face das limitações legais, concordam que as crianças podem e devem ser ouvidas, mas não ter o papel de conselheiras. Existem experiências de conselhos que tentam contornar essa situação. Lembremos que o protagonismo infanto-juvenil, defendido e praticado inicialmente pelo Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, é um dos paradigmas colocados no ECA. Só é sujeito de direitos quem pode vocalizar de fato suas opiniões e demandas.

Entre sociedade civil e governamental titulares, são 28 titulares, e dois suplentes para cada titular. E um conselho consultivo de adolescentes. Esse conselho consultivo, na alteração da lei, conseguimos aprovar essa questão. Não conseguimos colocar os adolescentes como conselheiros, mas aprovar um conselho consultivo de adolescentes que eles mesmos escolhem no fórum de criança e adolescente específico. E esses adolescentes acompanham, um número de dez adolescentes – cinco titulares e cinco suplentes –, aí eles seguem essa consultoria do conselho deliberando em cima de alguns itens que se interessarem e acharem mais pertinentes dar a opinião deles. (Entrevistado 6).

Sempre convida para que as entidades levem, normalmente jovens, adolescentes e crianças das entidades participantes. Inclusive, tem projeto financiado que vai gerar uma gravação dos adolescentes em razão das atividades do conselho. (Entrevistado 3).

Via de regra, o espaço dos conselhos não se mostra permeável à participação de crianças, adolescentes e mesmo de outros atores e segmentos da sociedade civil. A experiência desses conselhos não demonstra, até o

momento, um investimento na ampliação da participação dos representados, dos sujeitos da política. Nesse caso, a situação agrava-se, ao tratarmos do segmento da infância, portanto, vale a pena conhecer mais aprofundadamente essas experiências de participação de crianças e adolescentes.

Ao entender que a legitimidade se baseia em processos de discussão pública, plural e coletiva (LÜCHMANN, 2005), torna-se necessário verificar como os conselhos lidam com tais possibilidades. Os espaços dos conselhos são pouco acolhedores para a participação, escuta, troca de experiências entre a sociedade e os conselheiros. A forma de organização e condução das reuniões, as pautas propostas, a abordagem dos assuntos, inibem a contribuição de outros sujeitos que não os conselheiros, exceção feita a possíveis especialistas convidados a abordar ou contribuir com alguma discussão. Associado a isso, há o desconhecimento, sobre esses espaços institucionais, da sociedade em geral. Para além das organizações sociais e de um público que possui relação direta com os conselhos e suas temáticas, eles são praticamente desconhecidos. Mesmo entre os que os conhecem, há certa dificuldade de compreender suas características e atribuições.

Não se observa ainda uma relação mais orgânica entre os diversos movimentos sociais e os representantes nos conselhos. A despeito do discurso de valorização, não se observa um investimento mais estratégico e continuado da sociedade civil nesses espaços. Tal postura ainda é resquício, de alguns movimentos, da visão contestatória dos anos 70/80, que compreendem a ação da sociedade civil como oposição e contestação ao Estado. Para tais grupos, a institucionalização aparece com conotação negativa.   Quando o movimento se institucionaliza, ele se burocratiza. Trata-se de aprofundar a reflexão sobre a seguinte questão: Todos os tipos de institucionalização são negativos?