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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC – SP

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(1)

PUC – SP

 

 

 

 

EDSON MAURICIO CABRAL

 

 

 

 

A participação da sociedade civil nos Conselhos Municipais

dos Direitos da Criança e do Adolescente

Possibilidades e limites

 

 

 

Mestrado em Serviço Social

 

 

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

 

 

 

EDSON MAURICIO CABRAL

 

 

 

A participação da sociedade civil nos Conselhos Municipais

dos Direitos da Criança e do Adolescente

Possibilidades e limites

 

 

 

Dissertação apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de mestre em Serviço social, sob orientação da Professora Dra. Rosangela Dias Oliveira da Paz

 

 

SÃO PAULO 2013

(3)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

BANCA EXAMINADORA

_________________________  

_______________________________________  

_______________________________________  

_______________________________________  

_______________________________________  

 

 

 

 

(4)

DEDICATÓRIA  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Aos meus pais, Gilberto e Natalina, ao meu irmão, Gilberto,

e à minha irmã Teresinha, que, longe ou perto, estão

sempre presentes.

A Arlete, pela amorosa companhia, pelo cuidado e

atenção.

À minha filha Mariana, que a cada dia me desafia na tarefa

de ser pai.

(5)

AGRADECIMENTOS

O produto de um trabalho é o seu objeto final. Neste caso, um

documento, uma dissertação.

Contudo, para que este produto final esteja pronto, todo um disciplinado

processo de elaboração fez-se necessário. Esse processo, apesar dos muitos

momentos solitários, não é um trabalho só. É eminentemente coletivo.

E este momento é de agradecimento a todas e todos que contribuíram

para que este produto final esteja pronto e seja entregue. Logicamente que o

produto também faz parte de toda uma trajetória de vida (profissional, pessoal,

política, afetiva, militante). Seria então tarefa das mais difíceis agradecer a

todas e todos que dela compartilharam.

À professora Dra. Rosangela Dias Oliveira da Paz, pelo trabalho de

orientação, pela atenção tranquila, mas rigorosa, e por apostar na possibilidade

de que este trabalho se concretizaria.

Ao Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social da PUC São

Paulo, pela acolhida e oportunidade de retomada, revisão e atualização de

conhecimentos fundamentais para o exercício profissional e por ter me

despertado novamente para o prazer do estudo e da pesquisa.

Aos docentes da PUC e professores convidados, com quem tive a

oportunidade de cursar disciplinas, atividades complementares, compartilhar

momentos de debates e reflexões, pela qualidade e compromisso com a tarefa

de ensinar. Ao Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Movimentos Sociais

(Nemos), espaço de reflexões coletivas das mais importantes.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(CNPq), pelo suporte financeiro concedido por meio da bolsa de estudos.

Aos companheiros da Rompenuve Consultoria Socioambiental, pela

compreensão e apoio nesse processo e, principalmente, pelas reflexões sobre

o tema que me propus a trabalhar e que também é objeto de nossa prática

profissional cotidiana.

À professora Dra. Maria Lúcia Carvalho da Silva e ao professor Dr. Luiz

Eduardo Wanderley, pelas críticas, sugestões e orientações valiosas quando

(6)

Em especial, aos conselheiros de Direitos dos Conselhos dos Direitos da

Criança e do Adolescente e também aos militantes e especialistas que

estiveram no momento de elaboração do Estatuto da Criança e do

Adolescente, por terem contribuído com este trabalho por meio das entrevistas

concedidas.

A Arlete, pelo apoio incondicional, compreensão, dicas, cuidados, e

convivência.

À minha filha Mariana e ao João Vitor, pelo apoio no trabalho de

transcrição das entrevistas. Ao meu amigo e compadre, Aurelino José Ferreira

Filho, pela leitura crítica e preciosas sugestões.

Aos companheiros e companheiras militantes do Fórum Estadual de

Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo, espaço que

me ofereceu referências concretas de luta coletiva por mudanças sociais.

Às companheiras e companheiros do Conselho Regional de Serviço

Social do Estado de São Paulo (Cress–SP), pelos momentos de convivência,

reflexão e trabalho conjunto na direção política da categoria.

(7)

RESUMO

Esta dissertação trata da temática da participação da sociedade civil nos

Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente. A perspectiva

teórico-metodológica adotada está ancorada na teoria social crítica e a principal

referência teórica é a do marxista italiano Antonio Gramsci. O objetivo central é

contribuir para esse debate, ao buscar compreender os limites estruturais e as

potencialidades de atuação da sociedade civil nos Conselhos Municipais dos

Direitos da Criança e do Adolescente. Entender se tais espaços são

importantes como oportunidade de luta pela construção de uma nova

hegemonia. Cotejar o que foi idealizado quando da elaboração do estatuto e o

que tem sido praticado, a partir de um olhar da sociedade civil, até porque esta

foi a protagonista da luta pela conquista dessa avançada legislação. O estudo

parte de pesquisa bibliográfica sobre os temas em questão, além de entrevistas

com militantes especialistas que contribuíram na elaboração do Estatuto da

Criança e do Adolescente e conselheiros municipais dos direitos da criança e

do adolescente, e, ainda, do produto de uma formação continuada ofertada aos

12 Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente das cidades-sede da

Copa do Mundo FIFA 2014. Conclui-se que a base de análise sobre os

conselhos tem que considerar sua ancoragem institucional e societal, ou seja,

qual o lugar que essa instância ocupa na estrutura do Estado e como se

relaciona com a sociedade em geral.

(8)

ABSTRACT

This dissertation was concerned with the involvement of civil society in

the Municipal Councils for the Rights of Children and Adolescents. The

theoretical and methodology perspective adopted was anchored in critical social

theory and the main theoretical reference was to the Italian Marxist Antonio

Gramsci. The central aim of this thesis was to provide a contribution to this

debate by seeking to understand the structural limits of performance and

potential of civil society in the Municipal Councils for the Rights of Children and

Adolescents. Understanding whether these spaces are important as an

opportunity to fight for the construction of a new hegemony. Collate what was

envisioned when drafting the statute and what has been done, from a

perspective of civil society, because this was the protagonist of the struggle for

this advanced legislation. The study conducted bibliographic research on the

issues in question, as well as interviews with activists who were experts in

drafting the Statute of Children and Adolescents and municipal councilors of the

rights of children and adolescents and also the product of a continuing

education offered to 12 Councils Rights of Children and Adolescents of the host

cities of the FIFA World Cup 2014. The study concluded that the basis of

analysis of the Councils have to consider its institutional and societal anchoring,

ie, what place they occupy in the councils of the state structure and how they

relate to society in general.  

 

 

(9)

LISTA DE SIGLAS

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBIA Fundação Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência

CDCA Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente

CEBs Comunidades Eclesiais de Base

CF Constituição Federal

CMAS Conselho Municipal de Assistência Social

CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

CME Conselho Municipal de Educação

CMSA Conselho Municipal de Saúde

CNPJ Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

COMDICA Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

COMPETI Comissão Estadual do Programa de Erradicação do Trabalho

Infantil

CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente

CRESS Conselho Regional de Serviço Social

CT Conselho Tutelar

DBF Declaração de Benefícios Fiscais

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

FAS Fundação de Ação Social

FDCA Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente

FEAP Fórum Estadual de Aprendizagem Profissional

FEBEM Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor

FEPETI Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil

FIA Fundo da Infância e Adolescência

FIFA Federation Internationale de Football Association

FMAS Fundo Municipal de Assistência Social

FMDCA Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

FMIA Fundo Municipal da Infância e Adolescência

FUNABEM Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

IBASE Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

(10)

INDICA Instituto para o Desenvolvimento Integral da Criança e do

Adolescente

INESC Instituto de Estudos Socioeconômicos

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LGBT Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais

LOA Lei Orçamentária Anual

MP Ministério Público

NEMOS Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Movimentos Sociais

ONGs Organizações Não Governamentais

ONU Organização das Nações Unidas

PAIR Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento

da Violência Sexual Infanto-Juvenil no Território Brasileiro

PETI Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

PGM Procuradoria-Geral do Município

PPA Plano Plurianual

PT Partido dos Trabalhadores

RH Recursos Humanos

SGD Sistema de Garantia de Direitos

SGDCA Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente

SINASE Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

SMAAS Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social

SNPDCA Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do

Adolescente

SUAS Sistema Único da Assistência Social

(11)

Sumário

INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO 1 – Sociedade Civil e Democracia ... 21

1.1 Sociedade civil – conceito e percurso histórico no Brasil ... 22

1.2 A categoria democracia e suas utilizações ... 31

CAPÍTULO 2 – Conselhos – Expressões da Democracia Participativa ... 38

2.1 Os conselhos na perspectiva socialista ... 39

2.2 Experiências pretéritas de conselhos no Brasil ... 42

2.3 O movimento da infância ... 47

2.4 Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente – uma nova experiência ... 54

CAPÍTULO 3 – Sociedade Civil nos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente – Apontamentos para Análise ... 61

3.1 Expectativa dos atores sobre a participação institucionalizada ... 61

3.2 Lugar dos conselhos na estrutura do estado ... 64

3.3 Condições para a participação nos conselhos ... 70

3.4 Infraestrutura dos conselhos ... 74

3.5 Formas de organização e articulação da sociedade civil ... 76

3.6 Representante versus representado ... 79

3.7 O Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente ... 81

3.8 Funcionamento contínuo dos conselhos ... 86

3.9 Formação continuada para participação nos conselhos ... 87

3.9.1 Experiência formativa com conselhos das 12 cidades-sede da Copa do Mundo FIFA 2014 ... 89

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 101

REFERÊNCIAS ... 107

ANEXOS ... 112

 

(12)

INTRODUÇÃO

A década de 1980 registra marcos importantes, no Brasil, com destaque

para o processo de redemocratização e a elaboração da Constituição de 1988.

Malgrado algumas análises sobre os limites desses processos, que impuseram

necessárias negociações com as forças conservadoras de então, cabe ressaltar

o papel protagônico desempenhado por diversos sujeitos e segmentos da

sociedade nesse período e que garantiu avanços indiscutíveis para o País.

O momento de elaboração da Constituição brasileira de 1988 é

considerado de mobilização e articulação da sociedade civil, organizada para

pressionar os deputados constituintes a inserirem artigos que expressassem os

anseios e as demandas dos variados segmentos sociais. Um desses

movimentos é o da infância e da adolescência. Capitaneado pelo Movimento

Nacional de Meninos e Meninas de Rua1, diversos ativistas, juristas, técnicos e

especialistas2, que trabalhavam com crianças e adolescentes ainda sob a égide

do Código de Menores (Lei 6.697/1979, que vigia até aquele momento)3, já

pressionavam por mudanças qualitativas na forma de abordagem e de atenção

à infância.

Experiências de novas formas, distantes do modelo tradicional de cunho

assistencial coercitivo, já vinham sendo experimentadas e aplicadas por

organizações e movimentos, como o próprio Movimento Nacional de Meninos e

Meninas de Rua e a Pastoral do Menor.

A luta desse segmento social resulta na inserção do artigo 227, na Carta

constitucional, que diz:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à

                                                                                                                          1

O Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua surge em 1985 a partir de um grupo de educadores e técnicos que desenvolviam as chamadas experiências alternativas com os meninos e as meninas de rua, e tinha como diferencial trabalhar o protagonismo do público sujeito e a atuação numa dimensão política.

2

Antonio Carlos Gomes da Costa, Cesare La Rocca, Edson Seda, Wanderlino Nogueira, irmã Maria do Rosário, Reinaldo Bulgarelli, Benedito Rodrigues dos Santos foram alguns desses personagens.

3

(13)

saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Dois anos depois, esse artigo 227 é regulamentado pela Lei 8.069/1990

– Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O ECA rompe com o paradigma da doutrina da situação irregular vigente

até então no Código de Menores, estabelecendo a doutrina da proteção integral

e, portanto, é considerado um documento avançado, pois implica mudança

profunda na forma de compreensão do que é a infância, o que incide também

numa mudança nas políticas voltadas a essa faixa etária. O ECA passa a tratar

juridicamente todas as crianças e adolescentes com idades até 18 anos como

sujeitos de direitos.

O artigo 4o do ECA é considerado uma síntese da doutrina da proteção

integral, pois assim define:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Seguindo a tendência também surgida naquele momento, associada à

abertura democrática do País, a discussão da democracia participativa torna-se

pauta de diversos movimentos sociais.

Inicialmente agindo em contraposição ao Estado, principalmente quando

da ditadura militar, os movimentos, nesse momento, cobram participação mais

ativa na gestão das diversas políticas, nos rumos do País. Não se aceitava mais

o modelo que vigia até então.

Olhando pelo retrovisor, talvez não fosse mais possível perceber de fato

qual era o projeto de País que estava em discussão. Sabia-se o que não se

queria mais: a discricionariedade do Poder Executivo, atuando de maneira

centralizada; a relação entre os poderes da forma como se configurava; o

tratamento seletivo destinado à população; a ausência e baixa qualidade das

(14)

Acreditava-se no pressuposto de que o alargamento da esfera

democrática implicaria mais direitos. A socialização da política era uma aposta

para a consecução de políticas públicas mais efetivas.

A luta, para tanto, foi travada também para que fosse garantida a

democracia participativa, ou seja, a sociedade civil inserida nas discussões e

decisões das políticas públicas e também exercendo o controle social dessas

políticas. O conceito de democracia participativa ganha força a partir da

promulgação da Constituição de 1988 que no parágrafo único, do artigo 1o

estabelece: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de

representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

É necessário compreender, contudo, a magnitude de tais

transformações, as implicações na correlação de forças e os impactos nas

condições de vida dos cidadãos brasileiros.

Primeiro, é importante observar que as leis não têm o poder, por si

próprias, de mudar a realidade. Esta é fruto de uma construção histórica,

pautada nas relações dos sujeitos entre si e com as estruturas econômicas,

políticas, sociais e culturais.

A afirmação faz-se pertinente para a compreensão de que as conquistas

– no caso da Constituição de 1988 e da previsão da democracia participativa –

resultam do movimento histórico de sujeitos e grupos numa correlação de

forças entre classes sociais que possuem interesses e condições

diferenciadas.

Passados 25 anos da promulgação da Constituição e de pouco mais de

20anos do ECA, ainda é possível perceber a dificuldade de reordenamento das

instituições, conforme definido no artigo 259 do próprio ECA4. Vive-se a

contradição da legislação avançada, que aponta para uma mudança de

paradigma, e das velhas práticas, que insistem em não fazer com que tal fato

aconteça na prática, comprometendo a vida de crianças e adolescentes.

Para viabilizar o que está previsto na legislação, o ECA indica a criação

do Sistema de Garantia de Direitos, cujo principal órgão é o Conselho dos

                                                                                                                          4

Art. 259. A União, no prazo de noventa dias contados da publicação deste Estatuto, elaborará projeto de lei dispondo sobre a criação ou adaptação de seus órgãos às diretrizes da política de atendimento fixadas no art. 88 e ao que estabelece o Título V do Livro II.

(15)

Direitos. Com isso, criam-se em todo o Brasil conselhos nas esferas municipais,

estaduais e nacional de governo, além do Distrito Federal. Além dos conselhos,

o ECA prevê a criação dos Fundos da Infância e da Adolescência, ligados a

cada um dos respectivos conselhos. Indicados no mesmo artigo 88 do ECA, no

inciso IV5, os Fundos da Infância e Adolescência têm a função de implantar e

manter programas específicos destinados a crianças, adolescentes e suas

famílias, em consonância com a política de atendimento definida pelo Conselho

dos Direitos.

Para a parcela da sociedade civil organizada na época dos processos de

redemocratização do Brasil e da constituinte, no caso do movimento da infância,

a dupla conquista – legislação avançada e participação institucionalizada –

significa novos marcos, por meio dos quais esses sujeitos históricos devem

operar, no sentido de fazer com que as conquistas formais transformem-se em

conquistas substantivas.

Esta dissertação tem como objetivo refletir sobre a experiência dos

Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente. Mais

especificamente, como a sociedade civil conquistou a possibilidade de participar

da gestão da coisa pública por meio dos conselhos setoriais de política;

participação reconhecida como institucionalizada.

A despeito do curto período histórico dessa experiência, muito já se tem

pesquisado sobre tais instâncias, sob as mais diversas perspectivas, portanto,

esta dissertação não tem a pretensão de ser inovadora na abordagem, ou no

conteúdo, mas, sim, contribuir com o adensamento das reflexões e pesquisas

realizadas e indicar limites e perspectivas de atuação nesses espaços6.

Vasto é o campo de estudo sobre movimentos sociais, sociedade civil,

participação, democracia, Estado, democracia participativa; todos esses temas

estão diretamente imbricados neste trabalho.

A experiência conselhista, a despeito de ser historicamente recente no

Brasil, principalmente no modelo pós 1988, delimita um novo marco para a                                                                                                                          

5

Art. 88. São diretrizes da política de atendimento:

IV - manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente;

6

(16)

categoria da participação, agora dentro da estrutura estatal e tem possibilitado a

vivência de experiências que exigem a continuidade e o adensamento de

estudos para ajudar na compreensão do que tem se apresentado de avanços,

limites e quais os aperfeiçoamentos necessários. Os conselhos são, hoje, fato

inconteste e movimentam milhares de sujeitos da sociedade civil organizada e

do Estado. O que de fato estão produzindo de resultados, ainda é difícil

dimensionar, na totalidade das experiências.

O objetivo central desta dissertação é oferecer uma contribuição para

esse debate, ao buscar compreender os limites estruturais e as potencialidades

de atuação da sociedade civil nos Conselhos Municipais dos Direitos da

Criança e do Adolescente. Entender se tais espaços são importantes como

oportunidade de luta pela construção de uma nova hegemonia. Cotejar o que

foi idealizado quando da elaboração do ECA e o que tem sido praticado, a

partir de um olhar da sociedade civil, até porque essa foi a protagonista da luta

pela conquista dessa avançada legislação.

As perguntas norteadoras deste trabalho são: Os Conselhos Municipais

dos Direitos da Criança e do Adolescente são espaços privilegiados para a

criação de uma nova cultura política e novas relações políticas entre governos

e cidadãos? A atuação da sociedade civil nos conselhos contribui para a

criação de uma nova hegemonia? Como a sociedade civil tem buscado a

unidade política de atuação e construção de uma vontade coletiva? A

sociedade civil deve investir e apostar nesses espaços?

A perspectiva teórico-metodológica adotada é ancorada na teoria social

crítica e a principal referência é a do marxista italiano Antônio Gramsci.

Portanto, as categorias de sociedade civil e de democracia são instrumentais

teóricos centrais para discutir o objeto de estudo proposto, qual seja, os

Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente. Trata-se de

compreender a sociedade civil disputando a hegemonia da sociedade e tendo

como uma das estratégias principais a participação, desde o lugar do Estado,

numa perspectiva de uma sociedade democrática, justa e igualitária. Portanto,

a categoria hegemonia também é de extrema relevância para o estudo da

temática proposta, categoria esta que ocupa posição de destaque na teoria

(17)

Para desenvolver os conceitos de Gramsci, parte-se da contribuição de

seu principal leitor e intérprete no Brasil, Carlos Nelson Coutinho7. No sentido

de estabelecer mediações entre os conteúdos trabalhados pelos autores

marxistas e a interpretação da realidade atual, faz-se importante a leitura de

autores gramscianos e outros não gramscianos, mas que tratam dos temas

aqui pesquisados. Tal bibliografia centra-se nas discussões sobre sociedade

civil, hegemonia, participação, democracia, conselhos setoriais de políticas.

Dos autores, cabe destacar: Norberto Bobbio, Luciano Martorano, Jorge Luís

Acanda, Marco Aurélio Nogueira, Maria da Glória Gohn, Evelina Dagnino,

Luciana Tatagiba, Leonardo Avritzer, Lígia Helena Luchmann, dentre outros.

É importante reconhecer que o autor deste trabalho mantém estreito

envolvimento com as questões aqui analisadas. Portanto, ao mesmo tempo em

que existe o desafio da problematização do tema, também há as visões de

mundo, as inquietações e dúvidas que o autor vivencia em seu trabalho e em

sua militância.

Numa ciência em que o observador é da mesma natureza que seu

objeto, o observador é ele próprio parte de sua observação. (LÉVY-STRAUSS

apud MINAYO, 2012, p. 13).

Segundo Minayo (2012, p. 27), a “pesquisa social não pode ser definida

de forma estática ou estanque”. Os caminhos são estabelecidos conforme as

contradições e especificidades que permeiam a realidade investigada. Os

instrumentos de investigação devem, assim, estar adequados ao dinamismo

dos pensamentos e conflitos gerados pela correlação de forças e pelas

representações simbólicas naturais do campo social. A pesquisa qualitativa

enfatiza mais o processo do que o produto e valoriza a perspectiva dos sujeitos

participantes sobre o tema proposto.

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se

                                                                                                                          7

(18)

distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes. O universo da produção humana que pode ser resumido no mundo das relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa dificilmente pode ser traduzido em números e indicadores quantitativos. (MINAYO, 2012, p. 21).

O processo de investigação compôs-se da pesquisa bibliográfica teórica,

em que se destacaram os aportes oferecidos pelas disciplinas cursadas e pelas

atividades complementares e também as leituras e pesquisas de textos dos

autores utilizados como referências teóricas deste trabalho, com destaque para

Antônio Gramsci e seu principal leitor e intérprete, Carlos Nelson Coutinho.

Nas referências bibliográficas relacionadas às áreas de participação,

democracia, conselhos, além dos diversos autores já citados, foi de grande

valia a publicação Conselhos dos Direitos: Desafios Teóricos e Práticos das

Experiências de Democratização no Campo da Criança e do Adolescente8, que

faz uma compilação, a partir do banco de teses e dissertações da Coordenação

de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), produzidas no

período de 1990 a 2009, sobre o tema dos Conselhos dos Direitos da Criança e

do Adolescente, tendo sido encontrados 67 trabalhos relacionados com o

assunto.

A pesquisa empírica qualitativa constituiu-se de:

a) Entrevista semiestruturada com dois militantes especialistas que

participaram da elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente. São eles:

Wanderlino Nogueira Neto, ex-professor, procurador de justiça aposentado. Em

18 de dezembro de 2012, foi eleito, na Organização das Nações Unidas (ONU),

para integrar o Comitê para os Direitos da Criança (ONU – Genebra) e tomará

posse em 26 de maio de 2013, e Maria do Rosário Leite Cintra, pedagoga, foi

uma das coordenadoras da Pastoral do Menor e é uma das fundadoras do

Instituto para o Desenvolvimento Integral da Criança e do Adolescente (Indica).

O critério para a seleção foi o reconhecimento notório dessas figuras, no

momento do movimento constituinte, sendo reconhecidas publicamente até

hoje pelo movimento da infância e por outros importantes segmentos como

                                                                                                                          8

(19)

figuras de referência. Neste caso, as entrevistas aplicam-se ao objetivo de

recuperar passagens do momento histórico do qual fizeram parte e

proporcionar a avaliação comparativa com o momento atual. Foi elaborado

roteiro de questões semiestruturadas e as entrevistas foram gravadas e

transcritas. Os sujeitos assinaram termo de consentimento livre e esclarecido,

aceitando participar da pesquisa. Esses especialistas são figuras públicas e

concordaram com a citação de seus nomes no trabalho.

b) Entrevistas semiestruturadas, com sete conselheiros dos direitos da

criança e do adolescente. Para este trabalho, foi elaborado um roteiro para as

entrevistas realizadas por telefone ou Skype. Também foram gravadas e

transcritas e os sujeitos assinaram termo de consentimento livre e esclarecido9

aceitando participar da pesquisa. Seus nomes são mantidos em sigilo, apenas

identificados por sequência numérica.

Os conselheiros escolhidos são representantes da sociedade civil nos

Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, de cidades que são

capitais (São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Natal, Cuiabá, Salvador, além do

Distrito Federal). Todos estão em cumprimento de mandato ou encerraram

seus mandatos no final de 2012 e início de 2013, além de terem ou estarem

cumprindo dois ou mais mandatos10. A decisão pela técnica da entrevista

deu-se para apreender de maneira mais direta e espontânea as compreensões, os

entendimentos, as referências, os valores dos sujeitos sobre a prática do

conselho e o ser conselheiro.

c) Utiliza-se também como material empírico a análise de dados

levantados em atividade de formação realizada com 20 conselheiros de direitos

de dez conselhos, no âmbito do Programa Itaú Criança, da Fundação Itaú

Social11. Essa formação ocorreu em novembro de 2012, e contou com o autor

                                                                                                                          9

Os roteiros das entrevistas estão anexados ao final deste trabalho.

10

Os conselheiros entrevistados já são conhecidos do pesquisador, por causa da atividade profissional que exerce atualmente.

11

(20)

como consultor e moderador da atividade, que teve o nome de Mapeamento da

Situação dos Conselhos. Foi solicitada e concedida autorização da Fundação

Itaú para o uso desse material.

O material coletado foi estudado segundo a técnica de análise de

conteúdo temática, conforme as etapas propostas nessa metodologia:

pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados, e interpretação.

As falas e respostas dos sujeitos da pesquisa são utilizadas como fontes

privilegiadas para o tratamento das hipóteses e questões apresentadas e são

analisadas em articulação com referências teóricas, reflexões e interpretações

do pesquisador.

A pesquisa não objetivou traçar um perfil de cada um dos sujeitos

participantes. Trata-se de encontrar o que é comum na prática dos conselhos,

ou seja, o que está previsto legalmente como atribuições, papéis e

responsabilidades, cotejando com o que havia sido previsto quando da

elaboração do ECA.

Cumpre registrar algumas dificuldades encontradas para efetivar a

pesquisa de campo. Como já é do conhecimento do pesquisador, a mudança

de gestão das prefeituras é sempre um momento de certa turbulência. Em

municípios onde o prefeito consegue a reeleição, diminui o risco de

esvaziamento do conselho, mas quando há troca de gestor, a situação se

complica, visto que, em certas localidades, o conselho fica paralisado, por falta

de quórum, até que o gestor eleito indique os novos conselheiros

governamentais.

Vários são os relatos de paralisação das atividades do conselho em

decorrência da exoneração ou desligamento voluntário dos representantes

governamentais. Em outra situação, não foi possível entrevistar representante

da sociedade civil, pois a eleição não obteve quórum e o conselho está

paralisado por falta de representantes. Enfim, são as mais diversas situações

experimentadas quando do trabalho direto com os conselheiros.

A experiência dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do

Adolescente é relevante e merece ser pesquisada e interpretada. Compreender

as apostas feitas quando da proposição desse modelo, os avanços obtidos, os

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

(21)

limites e desafios colocados, caminhos para o seu aperfeiçoamento, as

possíveis articulações com outras estratégias da sociedade civil organizada, é

uma tarefa urgente para os que acreditam na democracia para além do seu

conteúdo formal. Com este trabalho, espera-se contribuir com essa tarefa.

A dissertação está organizada em três capítulos.

No Capítulo I, abordam-se os conceitos de sociedade civil e democracia,

com o objetivo de compreender tais categorias a partir do referencial teórico

gramsciano. Pretende-se, ainda, entender as mudanças na compreensão da

sociedade civil contemporânea, suas diversas expressões e os interesses em

disputa. A compreensão da categoria democracia, na atualidade, também é

objeto desse capítulo, principalmente quanto aos limites de sua real aplicação

na sociedade capitalista hodierna.

No Capítulo II, analisam-se a democracia participativa, como uma

conquista da sociedade brasileira, e as diversas formas de democracia

existentes e que coexistem na atualidade. Relata-se brevemente a maneira

como o Movimento da Infância organizou-se para questionar o modelo

existente e como construiu alternativas a esse modelo, inserido que estava em

uma conjuntura na qual as oportunidades foram conquistadas. Abordam-se os

conselhos como um dos arranjos possíveis para a efetivação da democracia

participativa, analisando-se sua gênese, natureza e concepção, bem como os

limites colocados para que seja de fato um espaço de decisão participativa.

No Capítulo III, traz-se a experiência dos Conselhos Municipais dos

Direitos da Criança e do Adolescente, cotejando com o que foi idealizado

quando da sua previsão legal. Para tanto, algumas dimensões da prática

dessas instâncias são analisadas, utilizando a pesquisa empírica como

subsídio de estudo dos dilemas e desafios que tem sido colocados nesses

espaços participativos.

As Considerações Finais não têm a intenção de pôr um ponto final na

análise das experiências discutidas nesta pesquisa. Ao contrário, buscam

impulsionar novas e necessárias reflexões, que contribuam para dar

significação às experiências concretas de transformação social, na perspectiva

de uma democracia que signifique a socialização da política e das riquezas

(22)

CAPÍTULO 1 – Sociedade Civil e Democracia

Neste capítulo, são abordados os conceitos de sociedade civil e

democracia, a partir das referências teóricas de Antônio Gramsci (2011),

principalmente contidas em sua obra: Cadernos do Cárcere – volume 3, e de

alguns de seus principais intérpretes, como Carlos Nelson Coutinho (1999)

(2008) (2011), nas obras: De Rousseau a Gramsci; Contra a Corrente: Ensaios

Sobre Democracia e Socialismo; Gramsci: Um Estudo Sobre seu Pensamento

Político; Hugues Portelli (1983), na obra Gramsci e o Bloco Histórico; e

Norberto Bobbio (2002) (2007) nas obras: Ensaios Sobre Gramsci e o Conceito

de Sociedade Civil; Estado, Governo, Sociedade: Para uma Teoria Geral da

Política, a fim de demonstrar as transformações ocorridas nas abordagens e no

tratamento desses conceitos em diversos momentos históricos e a partir dos

projetos políticos em disputa atualmente na sociedade brasileira.

Para discutir as categorias sociedade civil e democracia, a obra de

Antônio Gramsci é de fundamental importância. O pensador italiano trabalha

essas categorias de forma articulada, por isso não é possível analisá-las de

forma estanque, sob pena de reproduzir superficial e equivocadamente os

conceitos. Cabe destacar que a maior parte da obra de Gramsci foi escrita

enquanto esteve preso por sua militância contra o fascismo, o que dificulta a

compreensão de seus escritos, por vezes esparsos e fragmentários.

Para apreender a articulação de sua teoria, faz-se necessário um estudo

acurado de sua obra, tarefa das mais complexas, que não é possível

desenvolver no escopo dessa dissertação. Para tanto, parte-se de autores que

cumpriram essa tarefa de forma ímpar, como Carlos Nelson Coutinho e

Norberto Bobbio, dentre outros12. Salienta-se ainda que os diversos autores

contemporâneos, mesmo os que não se denominam gramscianos, não podem

desconsiderar a contribuição do pensador para o debate sobre esses

conceitos.

Trata-se de uma obra militante, por excelência, voltada a contribuir, de forma original, para o programa estratégico revolucionário dos comunistas na Itália e em todo o mundo. O pensamento político de Gramsci, portanto, está essencialmente vinculado a um projeto

                                                                                                                          12

(23)

revolucionário, na lógica da luta de classes, ao contrário do que muitos agrupamentos políticos e intelectuais socialdemocratas e “neocomunistas” tentaram difundir, buscando domesticar suas ideias, apresentando-as como não conflitantes à ordem capitalista. (COSTA, 2011, p. 7-8).

Além de Gramsci e de diversos dos seus intérpretes, também foi

importante a leitura de autores contemporâneos que discutem esses conceitos

em suas pesquisas e produções, dentre os quais destacam-se Gohn (2008),

Tatagiba e Teixeira (2006), Moroni (2005), Dagnino, Olvera e Panfichi (2006),

Luchmann (2002).

1.1 Sociedade civil – conceito e percurso histórico no Brasil

O conceito de sociedade civil não é só um instrumento de análise, é também um instrumento de projeto – principalmente porque, quando falamos de sociedade civil, estamos falando de construção e/ou desconstrução, de estreitamento ou ampliação de determinados espaços que, em certo sentido, guiam a atividade e o movimento de sujeitos sociais específicos. (ACANDA, 2006, p. 175).

O conceito de sociedade civil pode ser associado, desde seu início, à

necessidade da superação do “estado de natureza”, da ideia de liberdade

individual, em que predominava a lei do mais forte, para a vida em sociedade.

Já na Grécia antiga, para analisar questões da vida cotidiana, Aristóteles

cunha a expressão sociedade civil. Na época, as atividades econômicas eram

voltadas para responder às necessidades individuais e familiares. Contudo, era

na polis (espaço público das leis e do direito) que se buscava garantir o

desenvolvimento pleno das potencialidades humanas, por meio da participação

política. O fundamento da ação coletiva era a ética. Na época, não havia

distinção entre estado e sociedade civil, o que só ocorre na idade moderna.

Conforme Coutinho (2011), para os jusnaturalistas, a sociedade civil

representa a superação do estado primitivo da humanidade e, nesse caso,

sociedade civilizada é sinônimo de sociedade civil. Para superar essa

condição, que impunha ameaças à vida e à propriedade, e para a preservação

(24)

por meio de contrato social. Os principais expoentes dessa corrente são:

Hobbes (1588 a 1679), Locke (1632 a 1704) e Kant (1724 a 1804).

Para Rousseau (2011), o “estado de natureza” é a sociedade harmônica,

onde não existe a propriedade privada. Ele afirma que a sociedade civil é

fundada na propriedade e que tal condição é o motivo principal das discórdias e

desavenças entre os homens.

Em sua obra O Contrato Social, aborda a questão, já considerando que

o homem não pode agir única e exclusivamente conforme seus instintos e

desejos particulares. Ele trabalha conceitos como justiça e moral, além do

conceito de vontade coletiva, retomado posteriormente por Gramsci.

A passagem do estado de natureza ao estado civil produz no homem uma mudança muito significativa, substituindo, em sua conduta, o instinto pela justiça e dando às suas ações a moralidade que antes lhe faltava. É somente então que, a voz do dever sucedendo ao impulso físico e o direito ao apetite, o homem, que até então só havia considerado a si mesmo, vê-se forçado a agir segundo outros princípios e a consultar a razão antes de escutar suas inclinações. (ROUSSEAU, 2011, p. 37).

O contrato social tem a função de evitar a deterioração da boa natureza

humana. A ideia de um contrato social para regular as desigualdades advindas

da instituição da propriedade privada é que dá origem ao Estado. Nessa ideia,

o Estado vai regular a vida em sociedade, de forma que a vontade coletiva se

sobreponha às vontades individuais. O Estado não representa os interesses de

um indivíduo ou de um grupo, mas sim da coletividade, do povo.

Segundo Coutinho (2011), Restrepo (1990) e Bobbio (2007), Hegel, que

sofre influências tanto de Rousseau como, principalmente, de Kant, também

aborda o tema da sociedade civil. Para esses autores, Hegel faz a crítica a

Rousseau ao afirmar que não existe estado de natureza e estado civil, no

sentido de momentos sequenciais. Trata os dois momentos como sociedade

pré-estatal e sociedade estatal. Hegel afirma que a família é a estrutura básica

de satisfação primária e socialização dos indivíduos. Além da família, contudo,

ele propõe outras duas esferas da ação humana: a sociedade civil e o Estado.

A sociedade civil, para ele, é intermediária entre a família e o Estado e

incorpora a esfera econômica, como também os aparatos jurídico-burocrático e

(25)

A primeira forma objetiva de comunidade universalizadora de interesses é a família que seria para o filósofo alemão a figura inicial e ainda natural da “eticidade”, isto é, daquela esfera do ser social que, com base em formas interativas de práxis, estabelece normas comunitárias para a ação dos indivíduos. A terceira e mais universal figura da eticidade seria precisamente o Estado. Mas, como mediação entre a família e o Estado, aparece na formulação hegeliana madura da eticidade uma segunda figura, que ele chama de “sistema dos carecimentos” e do “trabalho dividido”, ou seja, precisamente a esfera da “sociedade civil-burguesa”. (COUTINHO, 2011, p. 45).

Para Hegel, o que motiva a ação humana são os interesses individuais.

A sociedade civil é a esfera em que o homem busca suprir as suas

necessidades e satisfações individuais. A melhor expressão disso é o direito de

propriedade. A forma de suprir suas necessidades é pelo trabalho. Ocorre que

o indivíduo não é capaz de produzir tudo o que necessita e deseja, gerando

uma interdependência. Hegel entende que essa interdependência tem sua

origem na divisão social do trabalho, que gera a vinculação de todos os

indivíduos entre si. Em sua teoria, o Estado assume uma posição de

centralidade, voltada para o interesse comum, para a vontade coletiva.

Toda ação humana é movida por interesses dirigidos à obtenção de bens específicos. Sem interesse, não há ação. O que caracteriza e diferencia a sociedade civil e o Estado é, para Hegel, a natureza, particular ou geral, do interesse que move os homens à ação ou do bem que buscam por meio dela. As ações que derivam de um interesse particular dão origem à sociedade civil. E se inscrevem nela. (RESTREPO, 1990, p. 64).

Ainda segundo Coutinho (2011), Marx rompe com o idealismo de Hegel

ainda jovem, quando escreve a obra Crítica à Filosofia do Direito de Hegel, em

que define que o Estado não é representante da vontade geral, mas expressa

os interesses de classe. Tendo o trabalho como mediação fundamental da

existência e reprodução humanas, Marx estabelece a conexão entre

infraestrutura e superestrutura.

(26)

essa sociedade, de forma que a exigência do predomínio da vontade geral não seja apenas um postulado moral, como em Rousseau, nem uma abstração imaginária, como em Hegel, mas sim algo que possa dispor de bases materiais efetivas. (COUTINHO, 2011, p. 61).

Bobbio (2002), nessa mesma linha de raciocínio, vai atentar para a

distinção que Marx estabelece das visões de sociedade civil, estabelecendo

três pontos antitéticos às definições anteriores. É interessante verificar que

Bobbio parte da análise do que seja o Estado para Marx e Engels, porquanto o

Estado é uma categoria analítica central na obra de Marx. A partir dessa

compreensão, é possível entender o conceito de sociedade civil na teoria

marxiana.

Dessa tríplice antítese, podemos extrair os três elementos fundamentais da doutrina marxiana e engelsiana do Estado: 1) o Estado como aparelho coercitivo, ou, como dissemos, “violência concentrada e organizada da sociedade”: ou seja, uma concepção instrumental do Estado, que é o oposto da concepção finalista ou ética; 2) o Estado como instrumento de dominação de classes, pelo que “o poder político do Estado moderno nada mais é do que um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa: ou seja, uma concepção particularista do Estado, oposta à concepção universalista que é própria de todas as teorias do direito natural, Hegel incluído; 3) o Estado como momento secundário ou subordinado com relação à sociedade civil, pelo que “não é o Estado que condiciona e regula a sociedade civil, mas a sociedade civil que condiciona e regula o Estado”: ou seja, uma concepção negativa do Estado, que é o oposto da concepção positiva própria do pensamento racionalista. (BOBBIO, 2008, p. 46).

E Bobbio (2008, p. 46-47) prossegue:

(27)

Em Gramsci (2011), a sociedade civil faz parte do Estado integral, e não

há separação entre estrutura e superestrutura, pois esses dois momentos são

dialeticamente articulados. Não há predominância de um sobre o outro per se.

Existe uma ligação estrutural entre superestrutura e infraestrutura. Cada

momento histórico é que faz com que um ou outro tenha mais destaque. Para

Gramsci, a sociedade civil é o local onde a luta de classes pela hegemonia

ocorre de forma mais intensa. Hegemonia entendida como a capacidade de

determinada classe dirigir moral e intelectualmente toda a sociedade.

O fato de Gramsci não ter estudado com profundidade a esfera

infraestrutural não significa que ele diminua ou mesmo desconsidere a questão

econômica como fundamental. O autor apenas opta por dedicar-se mais à

superestrutura, até porque Marx já havia, de forma brilhante, trabalhado, com

ênfase, a infraestrutura, além do que a proliferação de movimentos de massa

(sindicatos, partidos, associações) constituiu-se como um fato novo no início do

século XX.

Portelli (1983, p. 23) remete aos Cadernos do Cárcere para afirmar que:

Encontram-se, nos Quaderni, numerosas definições da sociedade civil, todas coincidentes: aí a sociedade civil é, em geral, concebida como “o conjunto dos organismos, vulgarmente ditos privados, que correspondem à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade”. Gramsci opõe a ela a sociedade política (o Estado, no sentido estrito do termo), da qual ela constitui a “base”, o “conteúdo ético”.

Vale ressaltar que, para Gramsci, a sociedade civil não é sinônimo do

bem e o Estado do mal, a correlação de forças, nos momentos concretos, é

que determinam tal leitura. É, contudo, a sociedade civil, o espaço privilegiado

de luta das classes subalternas pela hegemonia da sociedade. O fator mais

importante, em Gramsci, é a percepção de que o fator econômico, apesar de

determinante, não é o único, ou melhor, não atua de forma solitária na

conformação da sociedade, mas a categoria cultura assume importância

inequívoca, entendendo aqui que as formas de dominação cultural/ simbólica

são, por diversas vezes, mais fortes e eficientes na sustentação de um modus

operandi de sociedade e que tais categorias são componentes siamesas da

(28)

Ainda segundo Portelli (1983, p. 22):

(...) a sociedade civil pode ser considerada sob três aspectos complementares:

- como ideologia da classe dirigente, ela abrange todos os ramos da ideologia, da arte à ciência, incluindo a economia, o direito etc.; - como concepção do mundo, difundida em todas as camadas sociais para vinculá-las à classe dirigente, ela se adapta a todos os grupos; advêm daí seus diferentes graus qualitativos: filosofia, religião, senso comum, folclore;

- como direção ideológica da sociedade, articula-se em três níveis essenciais: a ideologia propriamente dita, a “estrutura ideológica” – isto é, as organizações que a criam e difundem -, e o “material” ideológico, isto é: os instrumentos técnicos de difusão da ideologia (sistema escolar, mass media, bibliotecas etc.).

Partindo da compreensão dos conceitos trabalhados por Gramsci,

cumpre perscrutar de que forma a sociedade civil brasileira, em seu percurso

histórico, tem se movimentado na arena da vida em sociedade, quais os

projetos, interesses e as disputas que se colocam na atualidade, quais as

estratégias e os caminhos escolhidos.

Na sociedade brasileira contemporânea, a sociedade civil13 ganha

projeção com o movimento de redemocratização brasileira, tendo seu ápice na

década de 1980, com o movimento constituinte14. Tal movimento é marcado por

grupos ligados ao campo da “esquerda”, também denominado de campo

democrático popular e composto por religiosos ligados às Comunidades

Eclesiais de Base (CEBs) da igreja católica, intelectuais progressistas,

sindicalistas, movimentos e grupos de assessorias a movimentos. Inicialmente,

busca-se fazer frente ao processo de ditadura e de transição lenta, gradual e

segura comandado pelos militares no poder.

A atitude é de contestação e de oposição ao Estado autoritário. Luta-se

por democracia, em um país com uma história de curtos períodos democráticos.

Naquele momento, a democracia pautava-se numa ideia de participação na vida

política do País, na garantia de direitos políticos, civis e sociais. Tais conquistas

                                                                                                                          13

Ao utilizar o conceito sociedade civil, não estamos afirmando que se trata da totalidade da sociedade civil, e sim de grupos ligados ao campo da “esquerda”, conforme informado no decorrer do texto.

14

(29)

devem ser compreendidas dentro do marco da democracia burguesa, porém,

para o momento em que se vivia, eram importantes conquistas, ainda que

consolidadas no quadro da ordem capitalista.

Além da garantia e ampliação de direitos, a Constituição também impõe

mudança na forma de operação do Estado, transformando as formas políticas

existentes até então. A participação institucionalizada passa a ocupar o centro

da arena política e impõe novos e complexos desafios à sociedade civil

organizada. Há um adensamento fantástico da esfera participativa, com

diversos espaços sendo criados ou reconfigurados. Não se trata mais da mera

participação eleitoral, e sim de compartilhar de forma ativa as decisões que

dizem respeito à vida em sociedade.

Esse novo momento faz com que novos e diversos atores sociais

apareçam na arena da política, vocalizando demandas de grupos da sociedade

até então alijados dos processos políticos.

[...] novos atores entraram em cena, destacando-se os movimentos sociais populares urbanos reivindicatórios de bens e serviços públicos e por terra e moradia, assim como parcelas dos então chamados novos movimentos sociais, em luta pelo reconhecimento de direitos sociais e culturais modernos: raça, gênero, sexo, qualidade de vida, meio ambiente, segurança, direitos humanos etc. O polo de identificação destes diferentes atores sociais era a reivindicação de mais liberdade e justiça social. O campo dos novos atores ampliou o leque dos sujeitos históricos em luta pois não tratava mais de lutas concentradas nos sindicatos ou nos partidos políticos. Houve, portanto, uma ampliação e uma pluralização dos grupos organizados, que redundaram na criação de movimentos, associações, instituições e ONGs. (GOHN, 2008, p. 72).

A sociedade civil ganha dimensão muito maior do que a existente até

então, fazendo emergir as diferenças entre esses grupos; diferenças estas para

além de natureza, constituição ou outras. Trata-se de diferentes projetos

políticos, o que demonstra que a sociedade civil é um campo heterogêneo e,

retomando Gramsci, o espaço privilegiado de luta das classes subalternas pela

hegemonia da sociedade.

Utilizamos a noção de projetos políticos para “designar os conjuntos de

(30)

vida em sociedade, que orientam a ação política dos diferentes sujeitos”.

(DAGNINO, OLVERA e PANFICHI, 2006, p. 38).

Passados 25 anos da promulgação da Constituição, pode-se afirmar que

a participação é hoje uma conquista consolidada da sociedade brasileira. Vários

são os artigos da Carta Magna que preveem as práticas participativas na

decisão e no controle das diversas políticas públicas. É possível afirmar,

portanto, que o projeto democrático participativo saiu vitorioso e consolidado, o

que não é uma verdade absoluta, haja vista que o projeto neoliberal e o projeto

autoritário coexistem nessa arena, disputando a hegemonia da sociedade. É,

contudo, impossível negar que a participação e a democracia eleitoral tenham

se consolidado no Brasil como elementos constitutivos da ação política.

O discurso da participação, e da revalorização da sociedade civil,

permeia hoje os diversos projetos em disputa, acarretando aparente

homogeneidade que encobre as diferenças e divergências e mesmo os

antagonismos entre tais projetos e seus grupos de defesa e implementação.

Considerando que a sociedade civil não é monolítica, os diversos

projetos políticos estão em disputa não apenas entre sociedade civil e Estado,

mas no próprio corpo de cada um desses espaços. Rompe-se aqui, mais uma

vez, a visão maniqueísta da sociedade civil como a encarnação do bem e o

Estado como o mal. Também se depreende que existem frações da sociedade

civil que aceitam tacitamente a subordinação e defendem os interesses das

classes hegemônicas e outras que são portadoras de projetos de resistência e

transgressão.

Portanto, a reflexão política dos grupos empenhados em subverter a hegemonia burguesa não deve centrar-se só na confrontação “sociedade civil versus Estado”, mas também, e principalmente, na confrontação “sociedade civil versus sociedade civil”. (ACANDA, 2006, p. 181).

Considerando a relação dialética na luta de classes pela hegemonia,

cabe destacar que a revalorização da sociedade civil dá-se na conjuntura de

uma reforma de cunho neoliberal, como resposta a uma crise do sistema

capitalista, que fez com que seja assumido um conceito de sociedade civil

(31)

Estado, visto como corrupto, ineficiente. Aqui, o discurso do Estado como a

encarnação do mal é assumido pelos segmentos hegemônicos como

sustentação a essas reformas.

Na sociedade civil, ganha espaço o conceito de terceiro setor, discurso

que embasa o projeto da classe hegemônica no poder em oposição ao projeto

de garantia e ampliação dos direitos sociais, por meio de políticas públicas

operadas pelo Estado. A crise, contudo, não existia apenas no discurso, mas

se mostra real nos problemas fiscais do Estado, na inflação, no desemprego

estrutural, no custo do Estado para a manutenção da burocracia etc.

O contexto de retomada da sociedade civil no Brasil ocorre num momento de crise do sistema capitalista mundial e de reformas no sentido de diminuição do Estado e de maior participação da sociedade civil na gestão de políticas públicas e serviços. O terceiro setor ganha força neste contexto numa visão de ação colaborativa, de trabalho em parceria entre Estado e Sociedade.

No novo cenário, a sociedade civil se amplia para se entrelaçar com a sociedade política, colaborando para o caráter contraditório e fragmentado que o Estado passa a ter nos anos 90. Desenvolve-se o novo espaço público denominado público não estatal, onde irão situar-se os conselhos, fóruns, redes e articulações entre a sociedade civil e representantes do poder público para a gestão de parcelas da coisa pública que dizem respeito ao atendimento das demandas sociais. (GOHN, 2008, p. 77).

Na mesma linha da análise de Gohn, Nogueira (2004) faz um estudo

aprofundado do momento das reformas do Estado e afirma que o reformismo,

para responder ao processo de democratização, incorpora quatro ideias:

descentralização, participação, cidadania e sociedade civil. Trata-se de calibrar

o discurso que justifique a reforma, na qual a antinomia “menos Estado e mais

democracia” ganha relevância.

Sob tal perspectiva, o conceito de descentralização é utilizado como

sinônimo de democratização, visando ao fortalecimento de instâncias locais em

detrimento das instâncias nacionais e centralizadoras. A decisão, o controle e a

gestão de diversas políticas públicas torna-se muito mais eficiente no âmbito

local, com ação coordenada e cooperativa entre as diversas esferas de

governo e a sociedade civil. Essa questão expõe de forma clara como os

setores hegemônicos conduziram tal processo, utilizando-se de conceito que

(32)

melhores políticas públicas, de forma a favorecer os seus interesses e

objetivos, o que Coutinho (2010) nomina de operação de mistificação

ideológica.

A sociedade civil brasileira, ao mesmo tempo em que conquista o direito

à participação no processo de redemocratização, tem o desafio de continuar

lutando para que mais democracia signifique de fato maior justiça social,

equidade, direitos, políticas públicas universais e de qualidade. Como se nota,

a esfera da participação institucionalizada não deve significar perda da

autonomia da sociedade civil. Consideramos que existe diferença entre

institucionalização dos atores e institucionalização dos canais de participação.

Há diferença entre os espaços institucionais e os atores que o compõe.

Autonomia deve ser compreendida como a forma de pensar a relação com os

demais. Contudo, ela nunca é absoluta, mas sempre uma relação relativa de

independência.

O momento atual impõe o necessário enfrentamento ao processo de

reforma do Estado e a todo o seu aparato discursivo, mesmo porque este não

encontra mais ressonância na sociedade, desgastada com as promessas que

não se cumpriram. Cabe à sociedade civil organizada continuar investindo no

aprofundamento da democracia e da ação política a partir de valores éticos,

que confrontem as desigualdades, injustiças, e todas as formas de violência e

desrespeito aos direitos de homens e mulheres.

1.2 A categoria democracia e suas utilizações

A conquista de direitos, na história da humanidade, está associada a

lutas de movimentos populares. Inicialmente, os regimes liberais garantiam

direitos apenas aos proprietários e detentores do poder econômico. Nesses

sistemas, a esfera da política era afeita ao Estado, em sentido estrito, conforme

definido por Gramsci (apud COUTINHO, 2008). Ocorre que a existência

humana cria necessidades, as quais, para serem satisfeitas, impõem a

organização de grupos que lutem por sua realização. Por meio dessas lutas,

(33)

de associação sindical, a associação em partidos, os direito de greve. Muitas

dessas conquistas ocorrem por meio de revoluções burguesas, como, por

exemplo, a Revolução Francesa, que teve como corolário a instituição da

democracia formal na França. Os sujeitos coletivos vocalizam suas demandas

por meio de associações, agremiações, partidos, entidades, significando a

ampliação dos espaços das disputas políticas e do exercício da política.

Com a complexificação das sociedades, a ação política deixa de estar

restrita apenas aos burocratas do Estado, porta-vozes dos interesses das

classes dominantes, havendo uma ampliação do espaço da política, bem como

dos sujeitos envolvidos. “[...] o Estado, ao se ‘ampliar’, deixou de ser o

instrumento exclusivo de uma classe para se converter na arena privilegiada da

luta de classes...” (COUTINHO, 2008, p. 29). Nessa afirmativa, Coutinho utiliza

o conceito de Estado ampliado de Gramsci, ou seja, a sociedade política e a

sociedade civil em relação dialética.

A luta de classes nas sociedades mais desenvolvidas, que Gramsci

cunha de “ocidentais”15, trava-se, sobretudo, no espaço da sociedade civil.

Trata-se, em última instância, de ampliar a conquista de espaços no interior do

próprio Estado, construindo estratégias que façam com que a classe

hegemônica se veja impelida a atender às reivindicações das massas

organizadas.

[...] democracia é sinônimo de soberania popular. Ou seja: podemos defini-la como a presença efetiva das condições sociais e institucionais que possibilitam ao conjunto dos cidadãos a participação ativa na formação do governo e, em consequência, no controle da vida social. (COUTINHO, 2008, p. 50).

Democracia, na perspectiva gramsciana, também é um instrumento de

projeto. Trata-se de um processo político que objetiva a superação da lógica de

produção e reprodução da sociedade capitalista. O que está em jogo é a

emancipação humana; a socialização da riqueza produzida. Conforme já

abordado, o móvel da luta é a disputa pela hegemonia.

                                                                                                                          15

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