• Nenhum resultado encontrado

Formas de trabalho e ganhos com a reciclagem

No documento ARI ROCHA DA SILVA 2018 (páginas 141-148)

4 ESPAÇO SOCIAL DE TRABALHO E O PERFIL DO CATADOR EM PASSO

4.1. ADENSAMENTO E ACELERAÇÃO URBANA NA REGIÃO DA PRODUÇÃO

4.2.1 Características básicas dos catadores

4.2.1.3 Formas de trabalho e ganhos com a reciclagem

Fonte: questionário socioeconômico elaborado pelo autor (2015).

4.2.1.3 Formas de trabalho e ganhos com a reciclagem

a) Participação em Associações / Cooperativas de Trabalho

Na amostra selecionada, 60,8% são catadores que não participam de uma estrutura de trabalho coletivo formal (associação / cooperativa) e 39,2% fazem parte de uma organização com essa denominação, como mostra o Gráfico 8, na sequência. Admitimos, todavia, que os não associados estão sub-representados em

relação ao cômputo geral de catadores na cidade. Embora o estrato “não associado” seja maior em números absolutos e relativos, 73 não associados e 47 associados, a maioria dos associados foi questionada nesta pesquisa (existiam 59 associados em novembro de 2015 – ano de referência deste levantamento –, ou seja, 78% dos associados participaram da pesquisa), diferentemente dos não associados que possuem uma ampla maioria de trabalhadores exercendo suas atividades nas ruas de forma autônoma, individualmente ou em conjunto com membros de suas famílias.

Gráfico 8 – Estratificação em idade dos catadores, em números absolutos e em percentuais

INTEGRA ASSOCIAÇÃO DE TRABALHO Qt. % cit. Sim 47 39,2% Não 73 60,8% Total 120 100,0% 39,2% 60,8%

Fonte: questionário socioeconômico elaborado pelo autor (2015).

b) Atividades executadas na reciclagem

Para melhor entendimento, perguntamos quais são as principais atividades que executam, independentemente de serem associados a uma organização ou não. Os números não se diferenciam muito (Gráfico 9); apenas no que concerne à forma da “catação agendada com o doador”, visto que este trabalho pode ser feito por um catador que trabalha individualmente ou por um associado que recolhe doações e as leva para a organização a qual está vinculado. Nessa questão, o catador poderia escolher mais de uma forma de atividade principal que executa, mas poucos optaram por essa alternativa, preferindo escolher apenas uma forma-padrão de trabalho na catação.

Gráfico 9 – Estratificação por principais atividades que os catadores executam, em números absolutos e em percentuais

PRINCIPAIS ATIVIDADES QUE EXECUTAM

Qt. % cit. Reciclagem na associação 46 35,1%

Catação na rua 66 50,4%

Catação agendada com o doador 11 8,4%

outras formas 8 6,1%

35,1%

50,4% 8,4%

6,1%

Fonte: questionário socioeconômico elaborado pelo autor (2015).

c) Média de ganhos financeiros na reciclagem

Em relação aos ganhos de trabalho, esse é um aspecto difícil de dimensionar de forma abrangente. Alguns, inclusive, deixaram de responder tal quesito por não terem ainda muita dimensão dos ganhos com esta atividade. Muitos catadores começaram na atividade há pouco tempo ou trabalham de forma irregular, não estabelecendo um parâmetro único e satisfatório para avaliar a média de ganhos durante um mês. Além disso, acreditamos que exista uma sazonalidade do mercado que demanda materiais específicos e de valores diferenciados em certos momentos de maior ou menor procura no mercado, o que flexibiliza o próprio preço do material em determinados períodos de mais retração ou expansão dos negócios de produtos recicláveis. Nesse sentido, há uma demanda por produtos que dizem respeito às próprias contingências do mercado internacional globalizado que conflui numa cadeia de ações diretas e indiretas e tem relação com o nível local das atividades e dos ganhos dos catadores.

De qualquer forma, podemos perceber que os valores em reais, coluna esquerda do Gráfico 10, têm quantidades de ganhos nominais variáveis por parte dos catadores e certa paridade de índices percentuais relacionados aos ganhos desses trabalhadores. Observa-se, dessa forma, uma heterogeneidade de registro nas escalas de valores ganhos, sem nenhuma escala que predomine a representatividade dos ganhos obtidos nesta amostra.

Uma tabela cruzada mais adiante talvez possa elucidar melhor quando forem comparados os ganhos com a variável “ser associado ou não ser associado a um

empreendimento coletivo”. Porém, desde já podemos buscar compreender este quesito, não de forma definitiva, mas pelo menos no sentido de questionar como se estabelece esta diferença de ganhos entre catadores que executam uma profissão em comum. Dentre outras expressões da realidade dos catadores, podemos começar a ver, de forma mais concreta, registros das diferenças das condições de trabalho, planejamento e engenhosidade estratégica e tática dos trabalhadores que desenvolvem as ações de reciclagem de forma integral ou parcial. E esses registros podem ajudar-nos a perceber a heterogeneidade dos sujeitos pesquisados em suas expressões laborais e rendimentos financeiros. Cabe lembrar que a pergunta é rendimento financeiro relacionado à catação, o que deixa à parte rendimentos adquiridos de outras possíveis tarefas e trabalhos executados por estes mesmos catadores.

Gráfico 10 – Estratificação por média de ganhos por catador, em números absolutos e em percentuais

MÉDIA DE GANHOS COM A RECICLAGEM (MÊS) Qt. % cit. Não resposta 18 15,0% 50 A 200 5 4,2% 201 A 400 18 15,0% 401 A 600 15 12,5% 601 A 800 21 17,5% 801 A 1.000 4 3,3% 1.001 A 1.500 20 16,7% 1501 A 2.000 13 10,8% 2.001 A 2.500 2 1,7% Mais que 2.500 4 3,3% Total 120 100,0% 15,0% 4,2% 15,0% 12,5% 17,5% 3,3% 16,7% 10,8% 1,7% 3,3%

Fonte: questionário socioeconômico elaborado pelo autor (2015).

Analisando mais detidamente os números do Gráfico 10, observamos que os três maiores índices percentuais já nos proporcionam uma visão espaçada na ordem das escalas, pois 15% dos questionados disseram que ganham em média de 201 a 400 reais por mês na catação, valor baixo em termos financeiros, comparado ao salário-mínimo nacional; o maior índice percentual, que, inclusive, se encontra no

meio da tabela, representa 17,5% da amostra, na escala de 601 a 800 reais, valor abaixo ou equivalente ao salário-mínimo do ano de referência deste levantamento (2015)35; o outro percentual, equivalente às representações anteriores, está na escala de 1.001 a 1.500 reais, com índice percentual de 16,7% dos respondentes nesta faixa escalar. Isso apenas confirma a diferenças de ganhos entre os catadores; todavia, não esboça definitivamente as condições de vida desses trabalhadores, pois podem desenvolver a reciclagem de forma integral ou parcial por opção própria ou pela disponibilidade de executar outras tarefas de trabalhos fora da reciclagem. Não podemos, com isso, definir a precariedade do trabalho e a vulnerabilidade de vida dos indivíduos a partir do que ganham nesta atividade. Temos, entretanto, que perceber outros fatores e, de forma mais ampla, compreender determinadas lógicas das ações desses sujeitos que os fazem integrar este trabalho em determinados momentos e evadir em outros.

O que podemos adiantar, com base na execução da pesquisa, nas entrevistas e observações diretas, é que existem determinados catadores que investem mais neste meio, seja tempo ou recursos financeiros para a compra de equipamentos de trabalho, como carroças e caminhonetes. Alguns movimentam um capital de giro para comprarem de outros catadores as suas produções, tornando-se pequenos atravessadores na rede da reciclagem. Esses mais instrumentalizados, geralmente, possuem um rendimento maior, inclusive agenciando outros catadores para trabalharem em pequenos galpões no fundo do quintal. De qualquer forma, não são apenas as condições físicas e instrumentais que podem alavancar o trabalho dos catadores para obterem uma maior remuneração. Há que pensar-se, portanto, nas próprias lógicas de trabalho desses sujeitos e de suas disposições sociais para que tornem mais rentável essa atividade, ponto que será amplamente trabalhado nos próximos capítulos desta tese.

Um elemento inconteste para a elevação dos ganhos financeiros de uma parcela dos catadores, porém, é a forma como está organizada uma das cooperativas de reciclagem de materiais na cidade: a Recibela. Trata-se de uma cooperativa de catadores que tem o diferencial de estar estruturada no antigo aterro da cidade, onde recebe os rejeitos urbanos que são levados as suas esteiras para a reciclagem. Ou seja, o volume de materiais é contínuo e em grande quantidade em

razão do recolhimento do lixo doméstico por uma companhia da cidade, embora os materiais venham misturados com materiais orgânicos de toda ordem, o que é sempre um problema para o aproveitamento integral do material recolhido.

Com um grande volume de materiais, a Recibela consegue ter um montante de materiais consideravelmente grande, excedendo a capacidade de classificação dos seus catadores, que, em 2015, eram 29 associados. Essa cooperativa reivindica, inclusive, a ampliação de suas atividades para três turnos de trabalho, incluindo o turno da noite, e a responsabilidade de gerenciar o transbordo dos materiais oriundos da cidade, através dos caminhões da coleta regular de lixo. O ganho mensal dos associados da Recibela no ano de 2015 estava em torno de 1.700 reais, valor considerado superior por parte de alguns catadores caso trabalhassem em outras atividades, em outro setor econômico, mesmo com carteira assinada.

Em relação às outras associações (Arevi, Coama e Contraempo), os resultados financeiros caem bastante em relação à Recibela, pois elas têm outro sistema de trabalho, buscam doações pela cidade mediante agendamento de coleta e ficam na faixa dos 600 a 800 reais/mês por pessoa (nov. 2015).

De qualquer forma, como frisamos, este é um elemento muito relativo para que se possa traduzir as condições de vida e as disposições sociais dos catadores, o que merece de nós uma maior atenção e profundidade de análise a partir dos casos concretos, pois só assim poderemos verificar as contingências e motivações dos atores sociais em empreender e executar determinadas formas de trabalho, as quais podem transcender ao aspecto do resultado financeiro imediato.

d) Principais materiais catados

Os principais materiais que são priorizados para a separação na reciclagem, no momento deste levantamento, são as garrafas pet, papelão, plásticos e latas de bebidas, nesta ordem, segundo Gráfico 11. O que pudemos constatar é que alguns catadores se especializam em determinados materiais em detrimento de outros. Há certa avaliação por parte dos catadores do que devem priorizar, muito em função das relações que estabelecem com os compradores e da própria divisão dos trabalhos nos empreendimentos associativos dos quais fazem parte. Isso também está relacionado com a própria disposição do mercado em absorver e pagar pelo tipo de material. Os papelões, por exemplo, são muito mais recolhidos por aqueles

que se especializam neste material e possuem transporte mais adequado para movimentá-los, como veículos motorizados. O valor financeiro dos papelões, como caixas de papel que acondicionam outros produtos no comércio, vem caindo vertiginosamente, o que inviabiliza o trabalho para muitos catadores, principalmente para os que fazem o serviço puxando carrinho. É um esforço muito grande do trabalhador e o preço do material não compensa; “não vale este sacrifício”, afirmam alguns.

Observamos também que muitos catadores estão se especializando em trabalhar com sucatas (metais, principalmente ferro e cobre), vendendo-as em “ferro- velhos” (depósitos de sucatas intermediários da reciclagem de metais). Esse trabalho também exige certo planejamento e instrumentos para captação. Geralmente executam essa tarefa e priorizam os metais aqueles que possuem veículos motorizados ou gaiotas (carroças puxadas por tração animal), estabelecendo parcerias com oficinas automotivas, as quais doam esses materiais para os catadores, na medida em que eles limpam e deixam as oficinas mecânicas mais organizadas, sem material supérfluo. Isso demonstra certa reciprocidade entre oficinas e catadores, sem envolver dinheiro entre as partes, mas a liberação de sucatas condicionada à limpeza do ambiente.

Gráfico 11 – Estratificação por principais materiais reciclados pelos catadores, em números absolutos e em percentuais

PRINCIPAIS MATERIAIS QUE TRABALHAM

Qt. % cit. Pet 76 25,1% Papelão 59 19,5% Plástico 49 16,2% Ferro 26 8,6% Cobre 9 3,0% Lata 49 16,2% Outro 35 11,6% 25,1% 19,5% 16,2% 8,6% 3,0% 16,2% 11,6%

Fonte: questionário socioeconômico elaborado pelo autor (2015).

Já os catadores que trabalham com carrinhos puxados por suas próprias forças, que são a maioria que trabalha nas ruas, priorizam as garrafas pets e latas de bebidas (cervejas e refrigerantes). Materiais mais leves e práticos de

acondicionar em “bags” ou “bergs”, segundo denominações atribuídas pelos próprios catadores aos grandes sacos de linhagem que depositam e acondicionam a produção de recicláveis antes de sua venda definitiva. Muitas empresas que compram dos catadores fornecem esses sacos para que eles guardem os materiais em suas casas até a empresa ir buscá-los.

No documento ARI ROCHA DA SILVA 2018 (páginas 141-148)