• Nenhum resultado encontrado

Questões abertas

No documento ARI ROCHA DA SILVA 2018 (páginas 155-169)

4 ESPAÇO SOCIAL DE TRABALHO E O PERFIL DO CATADOR EM PASSO

4.1. ADENSAMENTO E ACELERAÇÃO URBANA NA REGIÃO DA PRODUÇÃO

4.2.3 Questões abertas

Esta seção tem como referência algumas questões abertas do questionário socioeconômico e não sistematizadas anteriormente. Os questionados puderam responder livremente ao que era perguntado, gerando um maior volume de dados transcritos por sua maior variação de respostas. Tais questões receberam outro tratamento, embora, assim como aquelas analisadas e articuladas anteriormente, representem uma via de acesso inicial às problemáticas dos catadores. O que nos permite calibrar nossa percepção em relação ao cotidiano e às problemáticas relacionais desses sujeitos ao enaltecerem pontualmente determinadas percepções de suas vivências e trabalhos, bem como desejos e indicações que almejam para o futuro.

Estas questões, dessa forma, também voltarão à tona nos capítulos seguintes na medida em que servem como referência inicial de novas abordagens e ditames para os quais esta pesquisa foi sendo direcionada. Coube-nos realizar uma sistematização dos dados que nos remetem a apreender uma visão geral das relações e condutas dos catadores. Acreditamos, como já exposto, que os vários olhares de um mesmo fenômeno é algo metodologicamente imprescindível para irmos ajustando a análise da sociedade, ou seja, abrindo e fechando o foco de visões da realidade a qual buscamos nos aproximar e compreender.

As questões abertas são aqui comentadas em linhas gerais e relacionadas a algumas informações anteriormente destacadas.37 As questões encontram-se sistematizadas, em seu conjunto, nos apêndices deste trabalho, da seguinte forma:

■ Apêndice E Por que trabalha na atividade de catação (por sexo)

■ Apêndice F Outras atividades de trabalho que realizam (por sexo e escolaridade)

■ Apêndice G Maiores desejos para o futuro (por estado civil)

■ Apêndice H Facilidades no trabalho (por ser ou não associado)

■ Apêndice I Dificuldades no trabalho (por ser ou não associado)

37 Os critérios para relacionar as respostas das questões abertas com as respostas objetivas do próprio questionário socioeconômico foram definidos por uma lógica que nos pareceu pertinente, muito em função de problemáticas e de dúvidas que intuitivamente definimos como relevantes para entender as dinâmicas e problemáticas no interior das relações. Evidentemente que outros cruzamentos e escolhas poderiam ser feitas diante dessas e demais variáveis exploradas pelo instrumento de pesquisa.

Dentro de uma análise geral das informações coletadas, em função do questionário que aplicamos junto aos catadores, podemos observar o quesito “por que trabalha na atividade de catação” como uma variável subjetiva que detém uma espessa margem de respostas por parte dos entrevistados, seja qual o sexo indicado (masculino ou feminino). Porém, ao buscarmos agrupar as respostas em blocos que pudessem representar certa congruência das respostas, constatamos que o bloco “sem trabalho, por necessidade”, tornou-se a mais predominante em ambos os sexos.

Temos ciência de que qualquer ordem de sistematização das respostas é arbitrária e denota determinada ênfase prévia do pesquisador em definir os temas que agrupam as respostas do quesito supracitado. Isso porque os blocos organizados para a análise também possuem uma gama de variabilidade explicativa que não define tão objetivamente a posição dos respondentes quanto ao questionamento feito a eles. Porém, dentro do maior bloco especificado, “sem trabalho, por necessidade”, podemos perceber uma variada gama de justificativas elaboradas pelos questionados que retratam suas necessidades em adentrar à atividade de catação e que dizem respeito às suas necessidades de alimentar os filhos ou, até mesmo, por precisar e ao mesmo tempo gostar do serviço. A justificativa por estar sem serviço (sem emprego), cabe enfatizar, foi referenciada por ambos os sexos. A própria ideia do que seja um serviço para os entrevistados pode, aqui, ser questionada: será que os catadores entendem a catação como uma forma regular de trabalho ou acham que se caracteriza por ser uma atividade transitória e imediata para suprir suas necessidades mais prementes? Talvez essa seja uma questão-chave para que possamos entender as lógicas das ações sociais dos atores e suas dinâmicas táticas e estratégicas nos capítulos subsequentes, na medida em que a variedade de respostas a esta questão nos remete a interrogar a própria essência do que seja trabalho para o catador.

Chama-nos também a atenção a perspectiva de que os questionados justificam essa atividade de catador pela liberdade que possuem para trabalhar, por sua maior autonomia em estabelecer suas rotinas de atividades. Os homens, no entanto, se reportam muito mais à perspectiva de ganhar mais renda ou complementar a que já possuem ao realizarem outras atividades simultaneamente. Diferentemente das mulheres que também frisam a possibilidade de trabalharem de forma mais livre, todavia, referendam tal atividade principalmente pela ideia de que

este trabalho possibilita-lhes estarem mais próximas da família e cuidarem dos filhos de forma mais contínua.

A experiência apreendida pela trajetória de outras pessoas é sempre um aspecto dinamizador e aderente por parte dos catadores ao assumir tal atividade. Por parte das mulheres, a influência de outras pessoas está mais condicionada às relações familiares e parentais; os homens, embora enfoquem esse tipo de condicionante ligado à família, frisam as experiências de vizinhos e amigos como apoio a assumirem a condição de catadores de materiais recicláveis, ou seja, estendem mais suas relações de influências além das relações eminentemente familiares.

Além dos aspectos já referidos e que englobam certas circunstâncias e afinidades comuns, outros elementos foram citados como imprescindíveis para que alguns catadores assumissem total ou parcialmente esta atividade laboral, como a falta de estudo, ter uma ocupação, receber ajuda das pessoas, ter idade avançada, realizar menos esforço físico, etc. (para mais detalhes ver o Apêndice E). Observamos que estas últimas justificativas, porém, retratam muito mais a precariedade das condições físicas e emocionais dos indivíduos (como o abandono, a velhice, a doença) e, vinculadas a elas, a carência econômica extrema dos sujeitos em questão.

A pergunta se o catador “realiza outras atividades”, além da catação, é emblemática neste trabalho, pois partimos da hipótese de que o catador é um ator social dinâmico e heterogêneo, sujeito que não se prende a determinados modelos e formas de condutas estreitamente reguladas pelas normas e padrões sociais impostos por outros segmentos da sociedade e/ou do Estado. Porém, o massivo número de respostas “não executam outros trabalhos” é destacado e poderia sugerir, ao contrário de nossas expectativas, que o catador está preso a um sistema de trabalho que delimita rigorosamente a sua área de atuação. Acreditamos, porém, que o aqui apresentado (com maior rigor de detalhes no Apêndice F) deve ser relativizado e melhor aprofundado, sob pena de ficarmos na superficialidade do que é aludido pelos sujeitos catadores em determinado momento de suas experiências de vida.

O erro de uma análise apressada nesse quesito pode estar vinculado a duas questões básicas, até certo ponto, relacionadas. A primeira delas diz respeito a não observância de que uma grande quantidade de catadores abordados para responder

o instrumento de pesquisa são catadores associados a cooperativas de trabalho. Nesse sentido, é possível haver um viés das respostas que pode nos induzir a um erro de entendimento, pois os catadores cooperativados, em seu contexto, avaliam geralmente o momento em que vivem, ou seja, o trabalho eminentemente formalizado nas cooperativas, subtraindo eventuais trabalhos que operam de forma autônoma. Como não quisemos, de nenhuma forma, induzir as respostas, podem ter respondido esta questão dentro dos padrões formais de trabalho, isto é, trabalho no atual contexto em que vivem pode ser apenas aquilo que se refere a um caráter sistemático e formal, vinculado a um empreendimento coletivo de trabalho.

De forma semelhante, ao abordar os não cooperativados, devemos dar a devida atenção a seus processos de empregabilidade. E, dessa forma, interpretar o nível de importância que estabelecem a determinadas tarefas que executam e deixam de executar em diferentes momentos de suas vidas. Assim, teremos mais oportunidade de observar certa hierarquia de atividades e o teor de suas manifestações. Acreditamos que a própria dinamicidade das rotatividades de tarefas e vínculos que os catadores possam estabelecer serão melhor identificados nas trajetórias de vida de cada um, dentro de uma dimensão diacrônica e atitudinal dos entrevistados que teremos a oportunidade de enfocar nos capítulos 5 e 6.38

De qualquer forma, aqueles que responderam que executam outras atividades paralelas à catação ou possuem outra profissão em momentos diferentes são relativamente variados. As mulheres vinculam-se mais a trabalhos domésticos (costureiras, babás, faxineiras, etc.), assim como venda de objetos e serviços de capina em quintais; os homens, por sua vez, possuem um rol de atividades mais elástico, dentro da dimensão que definem como serviços gerais ou biscates (jardineiro, mecânico, auxiliar de construção, descarregador de caminhão, etc.).

A pergunta “quais são seus maiores desejos (sonhos) que você espera atingir no futuro” foi relacionada com o estado civil dos questionados (Apêndice G). Nossa intenção em relacionar essas duas variáveis objetivava perceber se havia alguma diferença de desejos futuros a serem atingidos pelos catadores e suas relações civis e conjugais. Com isso queríamos sondar se existe um nível de compromisso e

38O aspecto da rotatividade no trabalho associado, por exemplo, é uma característica muito saliente nos grupos organizados em Passo Fundo, em uma Cooperativa de trabalho já foram montadas nos últimos três anos quatro equipes de trabalho. O que vai ao encontro de outras análises acadêmicas que abordam as associações formais de catadores, incluindo os relatórios do IPEA, ao abordar as características e rotatividades dos associados nas organizações.

responsabilidades materializado nos desejos dos sujeitos sob a influência de laços formais de afetividade conjugal. Tal relação mostrou-se muito fraca em termos de confluência das posições. Existe uma variedade de ideias e desejos futuros em todas as posições relacionadas aos estados civis dos questionados, porém percebemos que alguns desejos são mais recorrentes e fazem parte de todas as segmentações que criamos, principalmente ao que concerne ao “local de moradia’, “conseguir desenvolver o seu trabalho atual ou outro que venha a realizar”, “estar engajado na associação de trabalho e vê-la desenvolver-se”, “ajudar os filhos e netos a crescerem e terem uma profissão”.

Queremos frisar o caráter da moradia como um dos aspectos que priorizaremos na sequência deste trabalho, pois percebemos que o desejo por um lugar que seja de sua propriedade (que seja meu) torna-se uma questão-chave que modula a condição de vida dos trabalhadores e lhes dá uma identidade, na medida em que eles podem melhor exercer o seu trabalho utilizando o espaço doméstico como depósito de materiais ou utilizar suas casas como propulsor de mobilidade social, uma vez que o terreno e a casa são bens de uso, assim como também são bens de troca e status social. Ter disponível um bem que possa negociar (vender ou trocar), postulando determinadas vantagens alocativas, na transição de um espaço pelo outro na comunidade ou na cidade, é um “recurso” e uma garantia para quem necessita deslocar-se de um lugar para o outro ou fixar-se almejando uma base de segurança. Segurança, em certo sentido, também é estar vinculado a algum lugar e movimentar-se apenas quando for viável e taticamente condizente com sua realidade. Processos de “pular de casa em casa” ou “viver de favor” é sempre algo degradante e motivo de vergonha, embora necessário, principalmente em momentos de transição migratória de um espaço a outro.

Tivemos a oportunidade, nesse sentido, de perceber a importância da casa como espaço-base e módulo de segurança, principalmente quando tratamos de sujeitos que, muitas vezes, estão na fronteira de uma condição de vulnerabilidade econômica e social. Nesse caso, o lar é o lugar mais seguro, refúgio e fonte de aporte estrutural do qual se dispõe para reorganizar a vida, base de recolhimento tático e de ações de reciprocidades e ajuda mútua entre parentes e vizinhos de forma geral.

As variáveis “facilidades” e “dificuldades” na execução do trabalho de catador serão aqui analisadas de forma conjunta e articuladas com “ser ou não ser

associado de uma cooperativa de trabalho” (Apêndices H e I). Esses blocos, de certa forma, tornam-se um pouco repetitivos, pois as facilidades e dificuldades no trabalho também são elementos que fazem as pessoas entrarem para esta atividade e terem o interesse (o desejo) de que as coisas possam melhorar nas suas vidas, aspectos retratados em blocos anteriores desta mesma seção.

Destacamos, todavia, os fatores que dão dinamicidade ao trabalho dos catadores não associados a um empreendimento cooperativo, seguindo suas percepções. Aspectos como “trabalhar por conta própria e ter mais liberdade”, “caminhar”, “vender rápido o que cata” e “ganhar coisas das pessoas quando está catando nas ruas” são elementos que podem ser entendidos como um ganho nessa forma de exercer a catação. O cerne das respostas pode ser entendido pela condição de maior flexibilidade que dá ao trabalhador o exercício da catação, pois ele adquire uma condição de estar na ponta do processo de descarte de materiais pela população, podendo, em certa medida, ter contato com quem descarta e com quem vende, formando certas alianças e estímulos para manter-se na atividade, obtendo maior agilidade, além de contar com certa segurança no seu próprio trabalho para manter sua vida e a dos demais integrantes da família. Em relação às dificuldades dos catadores não associados, os aspectos ligados às condições físicas (do corpo) são os aspectos mais prementes na geração de dificuldades, como o próprio adoecimento, o trabalho cansativo nas ruas e o trânsito perigoso, além das dificuldades em dias de chuva e frio (intempéries climáticas).

Em síntese, os fatores que dão dinamicidade e flexibilidade aos trabalhadores das ruas são aspectos positivos; de forma contrária, os efeitos de trabalhar na rua, na chuva e no frio, de desenvolver um trabalho braçal manipulando lixo impactam nos corpos dos indivíduos de forma negativa, gerando doenças e desconfortos físicos.

Já os associados declaram o envolvimento entre o grupo de trabalho e a união dos associados como uma referência facilitadora da sua condição de trabalho. Alguns observam que o trabalho não é “pesado”, mas necessitam de maior apoio das autoridades e da população em geral para melhor acondicionamento do lixo descartado. Essa última observação é ainda mais reforçada nas dificuldades, pois trabalhar no lixo, “que vem de tudo”, é algo que chega a preocupar, inclusive com perigos à saúde à medida que manipulam materiais de diversas ordens (materiais cortantes e resíduos hospitalares). A manutenção dos equipamentos de trabalho

também tem destaque, pois não depende do grupo associativo, mas da Prefeitura. Esse aspecto quanto a reparos nos equipamentos está mais relacionado à Recibela, cooperativa que recebe o lixo doméstico recolhido na cidade.

As facilidades e dificuldades no trabalho da catação destacadas, assim como os outros quesitos, fazem parte de uma abordagem e percepção imediata dos catadores, muitas delas amplamente discutidas entre eles e disseminadas dentro de um senso prático, o que não deixa de ser um reflexo de seus relacionamentos sociais e atos executados.

Embora possamos notar certas semelhanças entre os catadores, retratando suas homogeneidades, ficou mais claro que eles também se caracterizam por suas experiências próprias e possibilidades encontradas. Foram muito plurais os comentários, as formas de expressão e condicionantes retratadas pelos nossos questionados, como tentamos demonstrar, principalmente nos aspectos que condizem com suas escolhas e formas de engajamento ao trabalho.

* * * * *

Em síntese, a partir desses dados preliminares que nos alçam a pensar nas vivências, problemáticas e trajetórias dos catadores de materiais recicláveis, percebemos nesse segmento social a composição de homens e mulheres de diferentes faixas etárias em Passo Fundo, embora predominem as faixas de idades adulta, meia idade, de 30 a 60 anos. Dividem-se, basicamente, nas formas de trabalho autônomo e associado a cooperativas de trabalho; as mulheres ocupam mais os postos nas cooperativas de trabalho, segundo nosso levantamento exploratório. Possuem baixa escolaridade e as remunerações pelo trabalho que executam é muito variável. Essa variabilidade depende das formas, dos usos de instrumentos e do tempo investido a esta atividade, o que realmente nos faz pensar nas disposições sociais desses atores e de suas lógicas para ingressar e permanecer na catação, bem como na maleabilidade de suas formas de atuação e produção.

A maioria reside com cônjuge e filhos, perfazendo relações familiares conjugais e com laços de proximidade a demais parentes e afins. Com baixa participação em grupos formais comunitários e voltados a determinados fins, uma boa parte referenda que participa apenas de cultos religiosos, dizendo que não

possuem tempo livre para outros encontros. Por outra parte, é muito incipiente o conhecimento do que significa o MNCR e seus objetivos, pautando-se apenas a algumas ações desse Movimento ou pelo desconhecimento absoluto de suas práticas e pressupostos ideológicos.

Sobre aspectos mais relacionados ao trabalho, temos indicações nas falas de nossos respondentes de que a catação é uma atividade que demanda muito esforço e certo sacrifício de quem anda pelas ruas da cidade ou seleciona material nas cooperativas. Trabalhar no fluxo do trânsito de automóveis e ficar exposto ao tempo, com chuva, sol, etc. são condições desagradáveis para quem trabalha nessa atividade. Por outro lado, a catação tem o potencial de dar flexibilidade ao trabalhador, possibilitando-lhe realizar outras atividades de forma paralela. Outra questão importante para quem executa esse trabalho é a condição de ter rendimentos extras em suas rotinas, pois ganha e acha objetos que pode vender a terceiros e, eventualmente, usar pessoalmente. Isso condiciona determinadas habilidades e decisões dos trabalhadores. Há que pensar-se, assim, nas táticas e estratégias utilizadas por esses indivíduos em suas performances cotidianas, pois as relações se robustecem no campo de ação, desenvolvendo dinâmicas muito variadas. Essa variedade de dinâmicas é acessada de diferentes formas pelos catadores, muito em função daquilo que são, daquilo que vivenciaram e vivenciam no dia a dia, influenciados e demarcados por suas próprias histórias, embora, a princípio, possam parecer muito semelhantes por sua origem rural, pouca escolaridade, reciprocidades parentais, etc.

À medida que avançamos neste trabalho, percebemos o quanto é factível pensar a pluralidade do ator social que congrega a categoria de catadores de materiais recicláveis, seja em suas relações eminentemente locais e comunitárias ou em suas interfaces com o trabalho e com outros atores em outras órbitas territoriais e regionais. Os dados anteriores ajudam-nos a pontuar e refletir sobre certas particularidades do segmento social dos catadores, para além de problemáticas econômicas, estruturais, ambientais e arranjos institucionais. Ajuda a nos posicionarmos a certa distância de ideias preconcebidas a respeito das condições que possam caracterizar e estigmatizar o elemento catador nas sociedades contemporâneas.

De qualquer forma, ao buscar dar melhores contornos a nossa exposição, é imprescindível avançarmos em nossa trajetória epistemológica e retratarmos, de

forma mais substantiva, as lógicas que habitam as relações sociais e que são construídas ao longo das histórias locais e nos cotidianos dos sujeitos. Sujeitos esses que residem e perpassam certos campos de relações, que são e deixam de ser alguma coisa em determinados momentos ou circunstâncias, que amealham experiências comuns e distintas vivendo em sociedades complexas, afeitos à absorção de aceleradas transformações. Somente por essa perspectiva cremos poder dar conta da complexidade da tessitura social, na forma contextual e atitudinal, na medida em que somos semelhantes e diferentes, simultaneamente; ao compartilharmos espaços sociais mais delimitados e amplos ao mesmo tempo, utilizando ora um potencial específico, ora outros, angariados de circunstâncias e ambientes conexos e desconexos, em tempo e espaços relacionados a diferentes formas de atuação.

A proposta do capítulo 5, a seguir, é desenvolver uma perspectiva analítica muito mais fundamentada na ação de determinados atores sociais, mediante suas próprias histórias e experiências, condutas e relações sociais. A origem do elemento trabalhador, os primeiros ajustamentos que são estabelecidos e modulados, criados e recriados ao longo do tempo serão exemplificados nesta parte do texto.

O material organizado tem o propósito de ajudar-nos a perceber a heterogeneidade dos atores sociais, uma vez que suas trajetórias consubstanciam e são consubstanciadas por lógicas sociais, a exemplo dos contornos teóricos estabelecidos por Dubet, em sua Sociologia da experiência (1994).

Aqui, especificamente, pautamos nossa análise em sete biografias de trabalhadores da catação, as quais foram sintetizadas a partir de contatos que estabelecemos com este público-alvo, com o objetivo de dar melhores contornos e

No documento ARI ROCHA DA SILVA 2018 (páginas 155-169)