desaparece após se tornar apenas um ponto brilhante no espaço. Todo esse espetáculo tem
origem em algo que fica armazenado no combustível do foguete, como se estivesse adormeci-
do nos seus tanques. De repente, no momento do lançamento, uma pequenina faísca dá início a
uma extraordinária transformação na estrutura desse combustível, que incandesce ruidosa-
mente e se torna capaz de elevar ao espaço essa sofisticada máquina tecnológica de dezenas
de toneladas. Os físicos chamam de energia essa incrível qualidade que os combustíveis têm de
transformar-se em luz, som, calor e, também, de levar o foguete ao espaço. Neste capítulo ini-
ciamos o estudo da energia e de uma de suas formas básicas — a energia cinética.
Bill Ing
alls/NA
S
A
Lançamento do foguete do Cabo Canaveral, na Flórida (Estado Unidos), em 5 de agosto de 2011.
capítulo
15
196
U N I DA D E 4 – l E Is D E cO NsE rvAç ãO1. A energia e suas formas
Os dicionários registram alguns significados para a palavra energia, nem todos relacionados à Física. Além disso ainda há dois outros agravantes à compreensão correta do significado que a Física atribui à palavra
energia. O primeiro é a utilização de outras palavras
com esse significado. Um antigo herói de desenho ani- mado, por exemplo, costumava gritar: “Eu tenho a for- ça!”; quando as luzes se apagam, costuma-se dizer: “Acabou a força!”.
Em Física, no entanto, ninguém pode “ter” força; força é ação — e ação é praticada ou é recebida. O que o herói tem e o que acaba quando as luzes se apagam é energia. Energia, como dinheiro, é algo que se pode ter, perder, consumir e também acabar.
O outro fator que interfere na compreensão física da palavra é o reiterado uso dela por todos os que pretendem dar a seu discurso uma conotação cien- tífica. Energia é alguma coisa que parece estar em todo lugar, apresentando-se com os mais diversos significados — quase sempre inadequados do ponto de vista científico.
É importante lembrar que, embora a Física “não sai- ba” o que é energia, ela sabe perfeitamente o que não é energia. Expressões como “captar a energia cósmica” podem ter significado em alguma área do conhecimen- to humano, mas essa área certamente não é a Física.
Observe as fotos a seguir. Elas ilustram duas for- mas fundamentais de energia.
Gabriel Bouys/Agência F rance-P resse P aul Gilham/Agência F rance-P resse/Get ty Images
O trabalho da força muscular da atleta transfere à bola de metal a energia que faz com que ela se movi- mente. Essa energia, ou capacidade de realizar tra- balho por causa do movimento, é chamada energia
cinética (EC). Já a força muscular da atleta ao alongar
o arco origina uma energia de posição: quanto maior o alongamento, maior o trabalho que o arco pode rea lizar. Essa energia, ou capacidade de realizar tra- balho por causa da posição, é uma energia potencial
(EP). Do ponto de vista da Física clássica, só existem
na natureza duas formas de energia: a cinética e a potencial. Todas as outras são diferentes manifesta- ções dessas formas fundamentais.
conexões: química e biologia
A palavra energia pode aparecer também em dife- rentes contextos científicos, como, por exemplo, na Quí- mica e na Biologia. Na Química, ouvimos falar em energia de reação, energia de ativação, energia de ligação, etc. Na Biologia, fala-se em energia dos alimentos, energia metabólica, fluxo de energia na cadeia alimentar, entre outros. Todavia, é importante entender que se trata do mesmo conceito de energia estudado pela Física, que pode receber diferentes denominações de acordo com o campo do conhecimento em questão.
É interessante verificar, com a ajuda de seus profes- sores, como um conceito que envolve energia, estudado na Biologia (ou na Química), por exemplo, é compreendi- do sob a ótica da Física.
c A p í T U lO 1 5 – E N E rg I A
197
2. Energia cinética
Vimos que energia cinética é a capacidade que os corpos têm de realizar trabalho por causa do movimento.
Por isso, para obter o valor dessa energia, devemos retomar o conceito de trabalho e relacioná-lo a grande- zas dinâmicas.
Veja a figura abaixo:
v& v0 FR τ FR& & FR&
O trabalho da força resultante FR& faz o corpo de
massa m, com velocidade v0&, adquirir velocidade v&.
Pode-se demonstrar que esse trabalho é dado pela expressão: τFR5 1 2 mv 22 1 2 mv 2 0
Essa expressão pode ser interpretada deste mo- do: o corpo de massa m possuía “alguma coisa” de
valor 1
2 mv
2
0 e o trabalho da força resultante trans-
formou esse valor em 1
2 mv
2.
Como esses valores estão ligados ao movimento e resultam de trabalho, podemos concluir que eles representam energia de movimento, ou seja, energia cinética.
Assim, define-se a energia cinética de um corpo de massa m, com velocidade de módulo v, pela expressão:
EC5 1
2 mv
2
A partir dessa definição de energia cinética, ambos
os termos da expressão τ FR 5 1 2 mv22 1 2 mv 2 0
passam a representar energias cinéticas do corpo. O segundo termo, correspondente à velocidade inicial de
módulo v0, representa a energia cinética inicial (EC 0); o
primeiro termo, correspondente à velocidade final de
módulo v, representa a energia cinética final (EC).
Então podemos escrever:
τFR5 EC2 EC 0
A diferença EC2 E
C 0 é a variação da energia cinéti-
ca devida ao trabalho da força resultante exercida so-
bre o corpo.
Representando a variação da energia cinética por
ΔEC, temos:
τFR5 ΔEC
Essas duas expressões matemáticas são equiva- lentes e conhecidas como teorema da energia cinética, cujo enunciado é:
O trabalho da resultante das forças exercidas sobre um corpo é igual à variação da energia cinética sofrida por esse corpo.
Como a energia é medida pelo trabalho realizado, a unidade de energia é a mesma unidade de trabalho, o
joule (J), no SI.
TRABALHO É IGUAL A
…
No enunciado do teorema da energia cinética é comum afirmar que “o trabalho é igual à variação da energia cinética”, pressupondo-se que o leitor entenda que esse trabalho é realizado pela força resultante exercida sobre o corpo que sofre a varia- ção da energia cinética. Acontece que a expressão omitida é essencial para a aplicação correta do teo- rema da energia cinética.
Em situações reais é muito comum haver mais de uma força sendo exercida sobre um corpo e todas elas podem realizar trabalho. É a soma algé- brica desses trabalhos que é igual à variação da energia cinética do corpo.
conexões: química
A energia cinética tem grande importância em diferentes áreas do conhecimento. Por exemplo, na Química, ela é fundamental para a ocorrência de rea- ções químicas. A energia cinética das partículas das substâncias reagentes (átomos, moléculas ou íons) possibilita ou facilita a interação entre elas e torna possíveis essas reações. É por isso que o aumento da temperatura, em geral, acelera as reações químicas, pois, como vamos ver no estudo da Termodinâmica, no volume 2, a temperatura mede a energia cinética média das partículas de uma substância — o aumen- to da temperatura da substância reflete o aumento da energia cinética de suas partículas e, por consequên- cia, o aumento das interações que possibilitam ou faci- litam as reações químicas.
198
U N I DA D E 4 – l E Is D E cO NsE rvAç ãOE X E R C Í C I O S R E S O LV I D O S
1. Qual a energia cinética de um automóvel de massa
800 kg com velocidade de módulo 72 km/h?
Marco de Bari/Arqui
v
o da editora
r e so luç ão
Primeiro transformamos o módulo da velocidade em m/s:
v 5 72 km/h 5 72
3,6 m/s 5 20 m/s
Depois utilizamos a expressão EC5 1
2 mv
2:
EC5 1
2 800 202⇒ EC5 160 000 J
Observação: Escrita em potência de 10, a energia
cinética desse automóvel é EC 5 1,6 105 J. Nesse
caso, pode-se dizer que a ordem de grandeza (veja Ordem de grandeza, capítulo 2, página 27)
desse valor é 105. Como os valores do enunciado
são frequentes no nosso cotidiano, esse resultado é útil para que você tenha ideia dos valores habi- tuais de energia cinética.
2. Um automóvel de massa 1 000 kg, com velocidade
de módulo 36 km/h, é acelerado até atingir a velo- cidade de módulo 108 km/h. Qual o trabalho da for- ça resultante exercida sobre o automóvel?
r e s o luç ão
Representando esquematicamente o enunciado, temos: FR& FR& EC0 v0& EC v & FR τ Ilustrações: P aulo Manzi/ Arqui v o da editora
Como mostra o esquema, a variação de energia cinética do automóvel se deve ao trabalho da força resultante exercida sobre ele. Para determinar esse trabalho, basta aplicar o teorema da energia cinética.
Primeiro transformamos os módulos das velocida- des em m/s: v05 36 km/h 5 10 m/s; v 5 108 km/h 5 30 m/s então temos: τFR5 EC2 EC0⇒ τFR5 1 2 mv22 1 2 mv 2 0⇒ ⇒ τFR5 1 2 1 000 3022 1 2 1 000 102 ⇒ ⇒ τFR5 400 000 J
Observação: Como já foi dito anteriormente (reveja páginas 154 e 191), a força que movimenta o carro é exercida pelo motor por meio do atrito entre os pneus das rodas de tração e a pista. A localização da força resultante na figura é apenas ilustrativa; ela depende da localização das forças de atrito exerci- das entre os pneus das rodas de tração e a pista, no sentido do movimento, e das forças de resistência no sentido oposto ao movimento (resistência do ar, resistências internas e atrito entre os pneus das rodas não vinculadas ao motor e à pista).
3. Na figura abaixo um caixote de massa 50 kg, inicial-
mente em repouso, é puxado horizontalmente com
a força F& de módulo 40 N.
F &
Verifica-se que, depois de percorrer 4,0 m na dire- ção da força, o módulo da velocidade do caixote é 2,0 m/s. Determine:
a) o trabalho realizado pela força F&;
b) a variação da energia cinética do caixote.
r e s o luç ão
a) O trabalho da força F& é τF5 Fd cos α. Sendo
F 5 40 N, d 5 4,0 m e cos α 5 1,0 (α 5 0°),
temos:
τF5 40 4,0 1,0 ⇒ τF5 160 J
b) A variação da energia cinética é ΔEC5 EC2 E
C 0.
Como v05 0, EC 05 0, então ΔEC5 EC. Sendo
m 5 50 kg e v 5 2,0 m/s, da definição de ener-
gia cinética, temos:
EC5 1 2 mv2 ⇒ EC5 1 2 50 2,02 ⇒ EC5 100 J Logo: ΔEC5 EC2 EC0⇒ ΔEC5 100 2 0 ⇒ ⇒ ΔEC5 100 J CompreendFisica_Fisica_vol1_PNLD2015_195a205_U4_C15.indd 198 3/7/13 11:35 AM