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. SANTORO-PASSARELLI fala em confusão de pessoas e confusão de coisas, in Dottrine generali del

diritto civile, pp. 99 ss.

116. Manuale di diritto privato, § 225, p. 390.

de modo que é necessário que haja um esvaziamento do patrimônio social.118 Assim é

porque o inteiro domínio não é mau mas sim o modo pelo qual esse poder é exercido. Deve-se lembrar que a pessoa jurídica nada mais é do que uma técnica de separação patrimonial. Pois se o sócio controlador não respeita esse princípio básico, não há porque a lei ou juiz respeitá-lo.119

Há também um instituo de um caráter mais amplo, trazido por CALIXTO SALOMÃO. Trata-se de confusão de esferas. Ela se dá sob duas formas em que não é possível distinguir claramente a sociedade da figura do sócio:120 a) quando há confusão de patrimônios, denominação social121 ou organização societária ou (b) quando há formalidades societárias necessárias para essa separação que não são seguidas, porque o controlador tratou o patrimônio social como se fosse mero desdobramento do seu acervo próprio.122 São exemplos de desrespeito às formalidades societárias trazidos pela doutrina: ausência de assembléias gerais e reuniões de diretoria e acionistas, depósito de pagamento à sociedade na conta bancária do sócio, a diretoria de uma sociedade controladora que estabelece regras da sociedade controlada.123 Mas é de ressaltar que a observância a essas regras não confere ao controlador imunidade para a suspensão da eficácia da limitação de

118. Haftungsdurchgriff bei Kapitalgesellschaften, pp. 34-35. Logicamente que a mistura por si só não é fator

suficiente que autoriza a desconsideração. Porque se há a confusão mas o credor consegue distinguir patrimônio suficiente da sociedade, falta-lhe interesse jurídico para pedir a desconsideração.

119. C

OMPARATO-SALOMÃO, O poder de controle na sociedade anônima, p. 450.

120. C

ALIXTO SALOMÃO FILHO, O novo direito societário, p. 221. Também MENEZES CORDEIRO, Tratado de

direito civil português, v.I, t. III, p. 628.

121. C

ALIXTO lembra que a confusão da denominação social aproxima-se muito da teoria da aparência, in O novo direito societário, p. 221.DROBNIG traz um interessante caso, que também foi relatado por LAMARTINE CÔRREA: W.S.G. era um comerciante individual de têxteis e sócio único da W.S.G.W. – GmbH, cujo objeto social era o comércio de têxteis, vidros, brinquedos e jogos. O último W era referente à cidade natal do comerciante individual e do local de exercício da atividade da sociedade. O comerciante emitiu determinadas letras de câmbio. Firmou ele a letra como G e acrescentou o carimbo da sociedade mesmo sem ter poder de representação. O título foi penhorado por credor da sociedade e G embargou com a alegação de ser ele o verdadeiro credor e não a sociedade. Mas ele perdeu porque confundiu as barreiras entre o seu negócio comercial e o da sociedade,

in ULRICH DROBNIG, Haftungsdurchgriff bei Kapitalgesellschaften, pp. 32-33; LAMARTINE CÔRREA,

A dupla crise da pessoa jurídica, p. 335.

122. W

ALFRIDO JORGE WARDE JÚNIOR, Responsabilidade dos sócios: a crise da limitação e a teoria da

desconsideração da personalidade jurídica, n. 4.1.2, p. 209. Para mais exemplos, cfr. MENEZES

CORDEIRO, Tratado de direito civil português, v.I, t. III, p. 628.

123. W

ALFRIDO JORGE WARDE JÚNIOR, Responsabilidade dos sócios: a crise da limitação e a teoria da

sua responsabilidade, porque pode ser provada que em realidade é ele o titular do patrimônio social.124

15. Fraude e abuso

Esses são os casos mais tratados acerca da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, que os tribunais mais se dedicaram a decidir e que as legislações mais se preocuparam em positivar, pois em quase todos os dispositivos legais brasileiros constam essas hipóteses (infra, n. 20). A distinção entre fraude e abuso está no fim do ato. O ato ilícito viola de forma frontal a lei e pressupõe a inexistência de direito do agente. Já o ato abusivo significa que, apesar de o condutor ter o direito subjetivo, ele pratica algum ato anormal na sua conduta e, portanto, um desvio de finalidade. Pois, “a irregularidade do ato abusivo está no exercício do direito ou da situação subjetiva. Ademais, reveste-se o ato abusivo da chamada aparência de legalidade, que não está no ato ilícito”, mas ambos são passíveis de reparação, como bem afirma HELENA ABDO.125 Seja por meio de ato ilícito fraudulento ou abusivo, o fato é que ocorre

um mau uso da pessoa jurídica, o que justifica a desconsideração. Lógico que para que a fraude ou abuso ocorra, é necessário que haja a intenção e justamente por isso os azares do crédito e dos negócios não são requisitos suficientes para que ocorra a desconsideração ou mesmo o fechamento irregular da pessoa jurídica. Como diz DINAMARCO, “sem fraude não

se desconsidera a personalidade jurídica, sendo extraordinários na ordem jurídica os casos de desconsideração precisamente porque a fraude e a má-fé não são fatos ordinários na vida das pessoas e no giro de seus negócios”.126

Ao se falar em abuso, CALIXTO SALOMÃO traz uma distinção. Diz ele que há abuso individual e institucional. O primeiro seria aquele uso indevido da pessoa jurídica “com o objetivo específico de causar dano a terceiro”.127 Já o abuso institucional seria aquele que em que há uma geral “utilização do privilégio da

124. W

ALFRIDO JORGE WARDE JÚNIOR, Responsabilidade dos sócios: a crise da limitação e a teoria da

desconsideração da personalidade jurídica, n. 4.1.2, p. 209.

125

. O abuso do processo, n. 18, p. 105.

126. Fundamentos do processo civil moderno, I, n. 660, p. 1183. 127. O novo direito societário, p. 222.

responsabilidade limitada contrária a seus objetivos e à sua função” e tem como diferença a desconsideração em benefício a qualquer credor.128

A fraude é o requisito mais presente na aplicação da teoria da desconsideração da personalidade para fins de responsabilidade (supra, n. 15) e grande parte da doutrina e jurisprudência desenvolveram a teoria pensando em um meio de combater esse elemento. Ela pode se dar sob duas formas. A primeira é a fraude à lei, que ocorre “com a utilização de uma pessoa jurídica sempre que os destinatários de determinada forma jurídica se ocultassem por trás de pessoa jurídica já existente ou criada para tal finalidade específica, subtraindo-se assim à incidência da norma”,129 como afirma LAMARTINE. Também há a fraude a disposições contratuais, que se dá quando o sócio visa a utilizar a pessoa jurídica para driblar determinada vedação a algum contrato. SERICK traz um interessante exemplo. A pessoa assume contratualmente uma obrigação de não-fazer e, para burlar essa cláusula, constitui determinada pessoa jurídica para a prática do ato.130