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1. INTRODUÇÃO

4.3 PELA DÉCADA DE 1970

4.3.8 O Festival de Música Instrumental da Bahia

4.3.8.4 Frutos

O Festival de Música Instrumental da Bahia pôde, apesar das imensas dificuldades, acontecer anualmente e ininterruptamente até 1988. A partir daí, as

dificuldades na obtenção de patrocínio foram insuperáveis, o que causou a sua

interrupção116. Só seria retomado em 2001 até a presente data, e mesmo assim, não

aconteceu em 2002.

Ao longo desses anos inúmeros instrumentistas e grupos locais se destacaram, como a Oficina de Frevos e Dobrados, Grupo Garagem, Raposa Velha, Banda Livre, Sexteto do Beco, Vivaldo Conceição, Corpo e Alma, Grupo Pulsa, Mou Brasil, Andrea Daltro, Rumbaiana, Operanóia, e muitos outros. Grandes nomes da MI do Brasil participaram do Festival, dentre eles Walter Smetak, Armandinho, Hélio Delmiro, Heraldo do Monte, Grupo Pau Brasil, Grupo Alquimia (com Zeca Assumpção e Mauro Senise), Paulo Moura, Nelson Ayres, Raul de Souza, Wagner Tiso, César Camargo Mariano, Duofel, Sivuca, Nivaldo Ornellas e diversos outros, além de alguns nomes internacionais como o pianista Jeff Gardner e o flautista / pianista Nicola Stilo117.

A idéia central do Festival de Música Instrumental da Bahia não é ser apenas devotada ao jazz. Outras vertentes musicais são aí contempladas. Orquestra sinfônica, quartetos e quintetos de sopros, pianistas da música erudita, grupos vocais, grupos de choro, violeiros, sanfoneiros, grupos de música eletrônica, grupos de percussão, tudo isso já esteve no palco do Teatro Castro Alves durante esses dias.

O Festival é um evento que pretende reunir e estimular o desenvolvimento do que há de melhor da música instrumental na Bahia, abrangendo todos os gêneros, além de promover o intercâmbio de influências e informações através de grandes atrações de renome nacional e internacional. Nossa intenção é que o Festival se torne parte integrante da rede dos maiores festivais instrumentais do mundo [afirmam os seus organizadores. Veja no site, já mencionado].

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Mudanças no cenário musical levaram a isso. A ascensão da chamada Axé Music foi um dos fatores que acarretaram estas mudanças. Mas trouxe, também, outras contribuições. Veremos isso mais adiante.

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Texto baseado e re-trabalhado, oriundo do site

O compositor Tom Tavares, que também foi apresentador dos primeiros festivais, faz um balanço desse legado:

O Festival de MI foi um grande laboratório pra os instrumentistas que hoje estão aí, trabalhando na música popular da Bahia. Quase todos eles passaram, grande parte deles passou pelo Festival de música instrumental, viu o Festival; muitos não eram sequer músicos, e tendo a oportunidade de ver o Festival de música instrumental, se interessaram por um instrumento ou outro, passaram a tocar e tem muita gente aí que é cria do Festival de Música Instrumental da Bahia (TAVARES, depoimento, 2006).

No início da década de 80 muitos grupos locais se formaram para participar desse festival. Era uma honra, especialmente para os mais jovens. Havia muito empenho na busca do aprendizado do jazz e da MI e do conhecimento das obras dos grandes artistas da época. A troca de informações que se deu entre os artistas visitantes e os músicos locais deixou sementes e a própria retomada do Festival é um de seus frutos. E o clima geral é que aquilo tudo era uma grande festa.

4.3.8.5 Informativos

Alguns poucos meses antes de acontecer uma temporada do Festival de MI em Salvador, era possível ficar sabendo sobre as possíveis bandas e artistas convidados para

aquele ano. Refiro-me ao informativo do Festival, o Jornal Uuhh.118 Fred Dantas e o

produtor Nicolau Rios eram os escritores responsáveis. Além de informar sobre as atrações vindouras, o Jornal Uuhh trazia notícias sobre as bandas e personalidades locais, além de entrevistas com artistas de destaque. A distribuição era gratuita. O aspecto visual do

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informativo era feito de uma maneira escrachada, deliberadamente tosca, num estilo inspirado nas publicações contraculturais119 de anos anteriores.

A imprensa alternativa (conhecida também como nanica) eclodiu no Brasil principalmente após o golpe de 1964, e com mais ênfase entre 1968 e 1978. Sua intenção geral era cobrir dados ignorados (intencionalmente ou não) pela mídia hegemônica. Geralmente estava associada a ideologias de esquerda, à luta política ou ao movimento da contracultura120. Nem tudo que era “contracultural” era, necessariamente, de esquerda. Muitos artistas, devido às dificuldades em veicular suas idéias e atitudes estéticas optaram por caminhos “subterrâneo”, meios mais rudimentares,

mais artesanais de produção e comunicação – jornais de circulação restrita, edições limitadas de livros e textos – até a mais moderna tecnologia, como a câmera Super-8 ou a guitarra elétrica. (...) Aparece como um protesto geral que engloba tudo, desde que estabelecido: a cultura, a história, a política, a desumanização, a poluição, as normas morais etc. (GASPARI et alii, 2000, pp. 63-64).

Os movimentos contraculturais modificaram comportamentos, principalmente de grupos urbanos, influenciando a forma de se expressar e de fazer cultura. Misticismo oriental, retorno à Natureza, movimento de mulheres, pacifismo, “o pansexualismo, os discos voadores, o novo discurso amoroso, a transformação do here and now do mundo” (RISÉRIO, 2005.p. 26) foram algumas de suas saídas.

Gileide VILELA, Gustavo FALCÓN, Rosa B. GONÇALVES, Ruy A. DIAS e Terezinha FLOR (1996), após discutirem os termos empregados a esse tipo de imprensa

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Nicoulau Sevcenko mostra um interessante panorama do surgimento das manifestações contraculturais, remontando à Europa, especialmente à França, da virada dos séculos XIX para o XX, no capítulo

Configurando os anos 70: a imaginação no poder e a arte nas ruas, in Risério et al., Anos 70: Trajetórias, pp.13 à 21. Ver referências.

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Enfim, designava “práticas não ligadas à cultura dominante”. Veja mais em http://www.webartigos.com/articles/2551/1/imprensa-alternativa/pagina1.html.

(contracultural, nanica, alternativa), investigam o contexto em que tais publicações surgiram, além de analisarem diversas publicações do gênero tanto em nível nacional121 (como “O Pasquim”, “O Bondinho”, “Opinião”, “Ex”, “Coojornal”, “Movimento”,

“Versus” e “Repórter”)122 como local (“Verbo Encantado”, “Boca do Inferno” e

“Invasão”). Os órgãos de repressão, obviamente, se encarregaram de estrangular a imprensa nanica, com mais veemência durante o governo Geisel, especificamente entre 1976 e 1978, como comprovam documentos sigilosos da extinta Divisão de Segurança e Informações do Ministério da Justiça (DSI-MJ) mostrados em O Estadão de 04 de maio de 2009123.

Dispositivos como linguagem e diagramação próprias, conteúdos contraculturais (na veiculação de artigos sobre cinema, teatro, música, política, assuntos locais), tiragem relativamente pequena (alguns tinham distribuição gratuita) são características comuns a essas publicações.

Sabe-se que o Grupo de Compositores da Bahia (aquele ligado à UFBA), a partir de 1967, “começou a registrar suas atividades nos Boletins Informativos, seu meio de comunicação oficial, enviados a pessoas interessadas e instituições” (NOGUEIRA, ver referências). Pode ser que este fato tenha inspirado os músicos que estudavam naquele local a tomarem a mesma iniciativa para divulgar a sua produção, seus pensamentos e projetos. Tal era o caso também do grupo CREME, fundado pelos compositores Moisés Gabrielli e Jaime Sodré, cujo primeiro boletim informativo apareceu em junho de 1975.

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Em Os baianos que rugem... Veja referências.

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Exemplos mais recentes são Caros Amigos, Bundas (já extinta) e Piauí.

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Acompanhe a reportagem de Wilson Tosta em

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090504/not_imp364917,0.php. Caso conhecido, ocorrido na Salvador daqueles anos, foi o incêndio da Banca Graúna, que vendia muitas publicações alternativas. Situava-se quase na esquina da av. Araújo Pinho com o Campo Grande.

Voltando ao nosso Jornal Uuhh, o seu conteúdo era basicamente ligado à MI. Era o prenúncio do Festival vindouro. Como mencionado, trazia também algumas entrevistas com personalidades do mundo musical do momento: Widmer, Smetak, Raul Seixas, Lennie Dale, Alfredo Moura, Tuzé Abreu foram alguns dos entrevistados. O folheto veiculava, também, reclames comerciais de empresas colaboradoras e outras entidades incentivadoras.

No documento Caminhos da música instrumental em Salvador (páginas 122-127)