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Mais reforços de fora

No documento Caminhos da música instrumental em Salvador (páginas 100-103)

1. INTRODUÇÃO

4.3 PELA DÉCADA DE 1970

4.3.6 Mais reforços de fora

Salvador atraía gente de outras plagas. Vieram na frente os eruditos da Escola de Música, como já sabemos: Koellreuter, Smetak, Widmer e muitos instrumentistas. Em 1972 Roland Schaffner assume o comando do Instituto Goethe. Aloja em sua casa, em 1976, o violonista, professor e compositor Leonardo Boccia (*1953), nascido na Itália, chegado de Berlim, onde estudara. Este desejava integrar-se rapidamente com os músicos locais:

Queria que a Bahia me conhecesse não apenas como um músico que tocasse Villa-Lobos, que tocasse Bach, mas que eu também fosse reconhecido como alguém ‘da família’ (BOCCIA, depoimento, 2008).

E logo formaria seus próprios grupos, mesclando o seu violão erudito aos ritmos do Recôncavo baiano:

Havia duas bandas: uma bem baiana, afrobaiana, que era Sangue e Raça, com Raimundo Sodré e Roberto Mendes; e tinha essa proposta que era erudito- popular, que era Macchina Naturale, que eu dirigia; um grupo com Sarquis, no contrabaixo, que iniciava, naquela época; com Rubem Dantas, foi pra Espanha, tocou com Paco de Lucia por muitos anos; com Kitty [Canário], que cantava; Veléu Cerqueira, no sax. Então fizemos, durante oito meses, experimentos de música, digamos, erudita mais experimental, com equipamentos... o Rubem criou um instrumento chamado berimvolks, que era feito com calota de Volkswagen.... e esse grupo Macchina Naturale deu vida a diversos shows no ICBA (Idem).

Boccia viria a lançar um LP a convite da WR, em 1984, no qual participaram os músicos Tustão Cunha (percussão), Sueli Sodré (voz), Lourival (berimbau), Alfredo Moura (teclados). Trata-se do disco Homenagem, que traz fotografias de Mário Cravo Neto. Entre suas composições destaca-se Arquétipos, “uma peça para conjunto misto, da época em que coordenava o grupo ‘Lendas e Crenças’ de violões, flautas, percussão e cello, do qual Tustão também participou”. (BOCCIA, por e-mail, 2010). O compositor também gravaria um CD independente, o Imago Animae, contendo improvisações realizadas entre 1986 e 2000. Este disco foi remasterizado por seu ex-aluno e também violonista Alex Carlyle, um dos integrantes do grupo Nau Catarineta (anos 90).

Boccia tornou-se professor na Escola de Música da UFBA. Atua como professor e pesquisador na área de Comunicação e Culturas.

O flautista Nicola Stilo (1956) é outro italiano que passou por Salvador, vivendo alguns meses, mas contribuindo bastante na cena musical local. Após iniciar a sua carreira com um grupo folclórico na Itália91, descobriu o jazz, chegando a trabalhar por oito anos ao lado de Chet Baker. Tocou com inúmeros músicos brasileiros, entre os quais aqueles que ele chama de “mon quintet”: Teco Cardoso, Guilherme Vergueiro, Sizão

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Machado, Bobby Wyatt. Gravou com Toninho Horta. Apresentou-se ainda com Hélio Delmiro, Mauricio Einhorn, Ricky Pantoja, Zimbo Trio, Nivaldo Ornellas, chegando a participar de um dos Festivais de MI da cidade. Ficou pouco tempo em Salvador, mas deixou muitas lembranças musicais em quem desfrutou da sua companhia: entre eles, Mou e Jorge Brasil, e principalmente alguns músicos do grupo Garagem (o compositor e baixista Ivan Bastos contou-me algumas confusões envolvendo Stilo).

Outros músicos europeus vieram morar em Salvador a partir da segunda metade da década de 70. Klaus Joecke, saxofonista e flautista formado em jazz pela escola de Colônia, Alemanha, foi morar na Boca do Rio, e mantinha jam sessions em sua casa. Muitos músicos nativos apareciam para conhecer os jazzistas que lá se reuniam – Carlinhos Brown, por exemplo, freqüentou essas sessões92. Gini Zambelli, um guitarrista suíço, também aparecia por lá. Fundaram o grupo Camaleon em 1975, após viajarem pela Jamaica, Haiti, Alemanha, Suíça e França. Tocaram muitas vezes no ICBA até 1980. Aí fundaram o bar Vagão, no Rio Vermelho93 (voltaremos a este tópico mais tarde).

O compositor Tom Tavares recorda-se:

Gini Zambelli foi meu colega na Escola de Música no 1o ano; porque eu cheguei atrasado pro vestibular, então fiz o curso preparatório pra não ficar parado, em 1975. E Zambelli fazia também composição junto comigo, com Lindembergue Cardoso. Era um guitarrista que tava chegando, era na época um dos melhores guitarristas daqui (TAVARES, depoimento, 2006)

Corrado Nofri94 (1948-2007), outro italiano, pianista, veio estabelecer-se em Salvador a partir de 1978, participando de inúmeros trabalhos, como por exemplo, a Banda Livre, com Paulinho Andrade – esta foi uma das grandes atrações da MI soteropolitana no

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Informação pessoal concedida pelo baixista Keko Villaroel em 2002.

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Dados contidos no Jornal Uuhh, de informativo do Festival de Música Instrumental da Bahia.

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início dos anos 80. Ainda na Itália do início dos anos 70 fundou a Folk Magic Band. Sua iniciação jazzística remete a nomes como Steve Lacy e Mal Waldron. Conheceu pessoalmente Charles Mingus, de quem guardou influências. Partcipou de grandes eventos musicais europeus, como o Umbria Jazz (1976) e o Encontro de Música Nova de Berlim (1977). Faleceu em Roma, em 2007.

Outros reforços vieram de tierras hermanas: Guimo Migoya, baterista argentino, recém-chegado a Salvador, em 1978, aprendeu as músicas do Sexteto do Beco em pouco mais de uma semana, pois o baterista previsto precisou viajar de última hora. Migoya viria a se estabelecer na cidade, onde passou a ser convidado por diversos artistas locais, inclusive estrelas da Axé Music. Dentre aqueles que vieram do Chile, mais tarde, destacamos Alejandro Fuentealba (guitarras, trombone, teclados). Integraria a Rumbahiana, grupo de salsa fundado por Klaus Joecke e amigos, e que duraria por mais de dez anos. Outros chegariam bem mais tarde, como o guitarrista argentino Diego Bruno (2003).

No documento Caminhos da música instrumental em Salvador (páginas 100-103)