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Televisão Carlos Lacerda e companheiros

1. INTRODUÇÃO

4.1 CONTEXTUALIZANDO

4.2.3 Televisão Carlos Lacerda e companheiros

Nos primeiros anos da televisão em Salvador (TV Itapuã, canal 5), música era uma constante. Aliás, como no Brasil: programas de calouros abundavam. Gilberto Gil tornou-se conhecido dos primeiros telespectadores baianos, acompanhando, ao violão ou ao acordeom, muitos calouros. Naquele ano de 1962, boa parte de suas aparições “se davam no Show dos Novos, seção do programa de variedades apresentado por Jorge Santos, JS Comanda o Espetáculo, que se estendia por toda a tarde de sábado, na TV Itapoã” (CALADO, 1997, p. 23). E ainda cantava jingles, ao vivo:

“Parece incrível, mas é flexível / é a bossa nova que você gostou / é bossa nova

exclusiva da Calba / é bossa nova que a Calba criou!” Calba era uma fábrica de

calçados que tinha aqui. Tinha outra: “Nas lojas O Cruzeiro o seu dinheiro ainda

tem cartaz / Nas lojas O Cruzeiro o seu dinheiro vale mais!” Tinha outra

também: “Milesan tem crediário popular / Milesan – an – an tem roupa feita

sua espetacular da sua Milesan!” E ele fazia ao vivo! Ele tinha “recém-deixado”

de tocar acordeom e passado pra o violão, por causa de João Gilberto, como todo mundo na época. Ah, Gil era conhecido na cidade! (ABREU, depoimento, 2007)

Havia diversos programas na TV Itapuã que apresentavam músicos locais. Os pianistas Lacerda e Gondim tocavam com Raimundo Primeiro, Vivaldo Conceição, Kamel Abras e outros solistas.

O pianista Carlos Lacerda arregimentava muitos músicos da orquestra da UFBA para tocar em programas de música popular nas rádios (especialmente a Rádio Sociedade), na televisão ou alhures. Paulo Gondim relembra o amigo pianista:

Lacerda tinha uma orquestra de cordas, escrevia muito bem pra orquestra popular. Ele fazia um arranjo “na perna”, como se diz, em 15 minutos. Lacerda era “um monstro” pra escrever música, escrevia numa rapidez danada. E todo mundo me chamava pra tocar popular por causa dele, ele botava o meu nome como se eu fosse o melhor pianista do mundo.[...] E na televisão ele era influente. Ele tinha uma orquestra na televisão. O que é que ele fez uma vez? Um arranjo pra Rhapsody in Blue, de cinco minutos, piano e orquestra, e ele regendo, ao vivo, na TV Itapuã, naqueles anos 60, 61. Fora isso, muitas vezes eu fui chamado pra tocar na televisão. Programas, assim, 3, 4 músicas. Programas noturnos. Toquei com a orquestra dele. Lacerda também tinha conjuntos populares, e eu tive, às vezes, que substituir Lacerda. Uma vez, mesmo, fomos tocar em Ilhéus. Com Moisés, tocava violino na orquestra. Todas as cordas daqui da Escola, ele levava na Rádio, pra tocar com ele. De certa forma ele ajudava muito os músicos daqui, porque todo mundo ganhava cachê (GONDIM, depoimento, 2007).

Na verdade Lacerda teve várias orquestras45. Ou melhor, nenhuma, como disse Tuzé Abreu em seu depoimento:

Então, tinha aqui a orquestra de Carlos Lacerda, que era formada com os músicos da Reitoria, da orquestra de onde hoje eu faço parte, e os melhores músicos da cidade na orquestra de Lacerda, os melhores saxofonistas, trompetistas... Só que a orquestra de Lacerda não existia, o que existia era um monte de arranjos – que ele escrevia muito bem, e rápido! (ABREU, 2007)

Lacerda começou a estudar piano aos seis anos de idade. Nos Seminários de

Música da UFBA, estudou piano com Pierre Klose46, harmonia e contraponto com Yullo

Brandão, regência e orquestração com Koellreutter. Gravou dois discos, deixando alguns sucessos como “Giboeirinha”, “Menina dos olhos tristes (com Jocafi), “Vou chorar”, Tema de abertura do I Festival Nacional da Canção Popular da TV Excelsior (ambas com Carlos Coqueijo) e muitos outros. Era para muitos um músico erudito. Dedicou-se à música popular, foi bastante influenciado pela bossa nova, vindo a falecer aos 40 anos.

Cabem aqui algumas palavras sobre Carlos Coqueijo Torreão da Costa (1924- 1988), parceiro de Carlos Lacerda e Alcyvando Luz em diversas canções: foi compositor, maestro, jurista, jornalista, poeta, letrista, homem de teatro, cronista e cantor. Nasceu em Salvador (BA), filho de mãe pianista e pai, médico, violoncelista amador. Faziam saraus e reuniam em casa músicos, intelectuais, poetas, artistas plásticos e escritores. Formou-se em Direito e em Filosofia. Estudou violino no Instituto de Música da Bahia.

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Saiba mais em http://www.dicionariompb.com.br/carlos-alberto-freitas-de-lacerda.

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Suíço de Altstaetten, Pierre Klose (1921-2006) chegou à Bahia em 1955, convidado pelo então reitor Edgar Santos e pelo maestro J. Kollreuter para lecionar piano nos Seminários de Música. Aposentou-se em 1990 após 35 anos de dedicação. Klose ajudou a formar mais de duas gerações de alunos, além de gravar álbuns com interpretações de Mozart, Bach, Villa-Lobos e Chopin. (informações extraídas de

<http://www.uefs.br/portal/arquivo-de-noticias/2006/uefs-reverencia-trabalho-do-pianista-pierre-klose>. Em 1988, Pierre Klose esteve alojado por uns dias no mosteiro beneditino de Affligem (Bélgica), onde eu morei. Apesar da idade, era bastante vigoroso e bem humorado. Percorremos de bicicleta várias localidades flamengas, nos arredores de Aalst. Sempre atento à música, pesquisando e descobrindo partituras para cravo, clavicórdio, órgão e piano-forte, queria ir a todos os concertos! Fomos a alguns, na companhia dos

Multiinstrumentista, tocava violino, piano, violão, órgão, "escaleta", bandolim, entre outros. Entre os artistas que gravaram suas canções estão o maestro Gaya, por Agostinho dos Santos, Clara Nunes, Quarteto em Cy, MPB4, João Gilberto. Participou de diversos festivais da canção, classificando algumas de suas composições. Foi cronista do “Jornal da Bahia” e do jornal “A Tarde”. Lecionou Filosofia, Sociologia e Direito do Trabalho na Universidade de Brasília. Recebeu diversas condecorações, inclusive do governo francês. Foi presidente da Fundação Teatro Castro Alves, promovendo apresentações de artistas internacionais como Henry Mancini e Quincy Jones. Na Associação Atlética da Bahia, clube do qual foi também presidente, convidou para shows renomados amigos como Vinicius de Moraes, João Gilberto, Silvinha Telles, Nara Leão, Quarteto em Cy, Carlos Lyra, Elis Regina e outros tantos. Exerceu a presidência do Clube de Cinema da Bahia. Correspondia-se acerca de música e cultura com Carlos Drummond de Andrade (seu parceiro em "Cantiguinha"). Foi juiz47 do Tribunal Regional do Trabalho, ministro do Tribunal Superior do Trabalho, juiz do Tribunal Administrativo da Organização dos Estados Americanos (OEA) até 1988, quando faleceu48.