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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS EMPÍRICOS

1. O processo de avaliação externa na escola E.B.2,3: breve enquadramento

1.3. Funcionamento da escola durante o processo de avaliação:

Tendo em linha de conta as práticas da escola e as atitudes dos atores, procurou-se perceber como responderam os atores organizacionais à presença da equipa inspetiva na escola durante a avaliação externa.

A partir das entrevistas tomou-se conhecimento que a maioria dos entrevistados, dez (62,5%), rejeita a possibilidade da presença da equipa inspetiva influenciar as práticas habituais da organização, a não ser algum cuidado acrescido na abordagem de algumas situações, conforme se pode verificar em duas das dez entrevistas:

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Não, só tivemos de ter um cuidado mais especial para a sala onde estávamos, por onde existe uma passagem muito grande dos alunos (E8a: 86).

Ficou praticamente tudo igual. Apenas esta porta de entrada para a sala do aluno, uma hora antes, ficou fechada para não interromper, não fazer barulho, mas de resto correu tudo normalmente (E5a: 69).

Todavia, merece destaque o contributo prestado por um dos entrevistados ao considerar esse momento uma oportunidade importante para a mudança da atitude dos atores, nomeadamente no que se refere à aproximação dos pais/encarregados de educação à escola para participar nas atividades aí desenvolvidas. Em função deste contexto, sublinhou a importância da continuidade dos procedimentos ocorridos durante o processo avaliativo no sentido da sua institucionalização para que os efeitos se possam refletir na escola. Caso assim não seja, constituirá um momento de ritualização apenas para garantir a conformidade com o determinado.

Se estávamos a ter o trabalho para haver um processo avaliativo, então que fosse posto em prática continuamente. Porque passar o dia da avaliação e depois voltar outra vez ao dia anterior não faz sentido. Deve haver uma continuidade de trabalho feito antes e depois (E10: 103).

A relação que se criou com a associação de pais era um dos fatores que tinha de ser alvo de alteração…houve a necessidade de aprofundar…e penso que foi envolvida, foi positiva. Agora, tem de haver uma continuidade (E10: 104).

Embora a maioria dos entrevistados não admita que as práticas comuns tenham sido objeto de mudança, denunciam o recurso a cuidados especiais na preparação e duração do processo:

Eu penso que não, quer dizer, é evidente que estas coisas… quando se trata de uma avaliação há sempre... eu não digo receio... até pode ser o próprio receio, quer dizer, nós queremos dar sempre o nosso melhor e, se calhar, às vezes, até somos mais, ou tentamos ser mais cuidadosos, já o éramos não é? Porque há sempre gente que vem de fora, e nós também queremos dar o nosso melhor (E6: 74). Naturalmente, não me preparei nada de especial, quer dizer, leis, documentos, é evidente que li tudo, mas com o maior à vontade (E6: 74).

As pessoas estavam preocupadas e sempre se preocupam para que tudo corra bem, correr bem dentro da normalidade, não há aqui nenhum disfarce, nenhuma forma mais cuidada, porque por mais que a gente faça é quando as coisas acontecem ...houve muita descontração (E8a: 87).

De acordo com estes discursos, pode inferir-se que as mudanças de práticas se inscrevem no âmbito da preocupação em exercer as suas funções o melhor possível para dar uma boa imagem enquanto profissionais. A preocupação dos atores surge na sequência de uma resposta a uma ameaça que a avaliação externa pode representar ao dar visibilidade a aspetos da organização que podem pôr em causa a imagem da mesma.

Apesar da presença da equipa inspetiva desencadear alguns cuidados acrescidos à organização, para fazer face a alguma preocupação e receios, o ambiente vivido pelos atores era de aparente normalidade.

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Funcionando a avaliação externa como um instrumento de controlo ao serviço dos resultados, é compreensível que a avaliação dos resultados dos alunos constitua o domínio central para a ação da equipa inspectiva durante a avaliação externa, como se pode demonstrar pela afirmação constante na ata:

O Coordenador do Departamento informou que durante Auditoria Externa foi interpelado e questionado pelos resultados tão baixos obtidos nas disciplinas de Ciências da Natureza42 e Ciências Naturais43 (A1:

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Cruzando o conteúdo da ata com alguns discursos dos entrevistados, quatro dos inquiridos (25%) confirmam que a ação da IGE interessou-se por informações relacionadas com os resultados dos alunos, nomeadamente os critérios de avaliação aplicados na organização, no sentido de verificar e controlar os resultados, sobrevalorizando indicadores e resultados quantificáveis. Com este procedimento, a IGE procura que se reflita na relação de coerência e de distância entre o resultado obtido pela escola (o referido) e o resultado esperado (referente) (Figari, 1993). Essa avaliação faz-se por comparação referenciada a resultados e indicadores mensuráveis. Segundo este entrevistado, infere-se que a IGE, como um agente de fiscalização no processo, procura mostrar ao exterior o que deve e como deve ser feito:

A ter de apontar é a questão dos documentos. Nós tivemos os critérios de avaliação. Por outro lado, a existência de documentos, critérios de avaliação que nós utilizamos, … é a questão das ponderações que, ainda hoje, nos causa, às vezes, alguma dificuldade. …parece que vivemos uma era da quantificação. A inspeção tem uma tendência, de facto, a levar as escolas a fazer a reflexão no sentido de a própria escola encontrar um instrumento que seja capaz de mostrar ao exterior como é que aquela avaliação foi feita, mesmo em termos quantitativos (E9c: 98).

Neste conjunto de ideias, o resultado de uma das entrevistas aponta no sentido de considerar positiva a presença e a ação inspetiva na escola na medida em que contribui para a valorização da mesma, sendo entendida pelos alunos como uma boa escola. Tendo por base o conteúdo desta resposta, a avaliação confere credibilidade e (re)conhecimento à organização, contribuindo para o reforço da confiança dos pais/comunidade na escola e dos atores no sistema educativo.

Deste modo, a avaliação informa a comunidade/pais sobre a qualidade da escola, mostra a instituição ao exterior, condição indispensável para a introdução de mecanismos de mercado ou de quase-mercado, como referem alguns autores. O processo de avaliação, segundo

42 Corresponde a 2º ciclo. 43 Corresponde a 3º ciclo.

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a lógica dos entrevistados, pode funcionar como mecanismo da escolha parental bem como contribuir para o reforço da imagem positiva da escola:

À nossa escola podia não fazer diferença…, porque a nossa escola, eu considero, que é uma boa escola (E5a: 70).

Eu acho que é positiva. Porque, assim, as pessoas que estão no exterior, fora da escola, vão reconhecer que temos uma boa escola. Dá para incentivar mais as mães e os pais a trazerem os filhos para a escola (E5b: 70).

Se calhar ajuda a pequenos pormenores que não se notam e ajuda a mudar coisas que podem fazer a diferença (E5c: 70).

A avaliação, considerada como um instrumento muito valioso de informação, surge associada a funções de reforço do controlo social sobre a escola e expõe-se a mecanismos de regulação mercantil, ainda que implícitos.

Pelo que foi possível depreender das narrativas dos entrevistados, durante o processo avaliativo, o funcionamento da escola integrou-se dentro dos parâmetros considerados normais, apesar da preocupação e receios sentidos pelos atores devido à presença da equipa inspetiva. Para fazer face a esta situação, os atores da organização adotaram alguns cuidados que pudessem assegurar um ambiente de tranquilidade, de segurança e de qualidade no sentido de mostrar e promover um ambiente considerado normal, contudo não os admitem como mudanças. Os discursos dos intervenientes parecem denunciar satisfação face ao ambiente, logo não se justificava a mudança.