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O GATO DE SETE VIDAS: O POPULISMO NA POLÍTICA E NO PTB DO ESPÍRITO

Numa leitura outrora consagrada nacionalmente, e agora sustentada sem maior vigor, o PTB seria um dos protagonistas do populismo, fenômeno que teria regido às relações entre Estado e sociedade durante o período estudado neste trabalho. Este tópico trata da apresentação de duas leituras da política capixaba que contemplam o populismo como presente durante algum momento entre 1945 e 1964. Esclarece-se, pois, que serão apresentadas as leituras de Marta Zorzal e Silva (1986) e de Jefferson Alvarenga (2012). No tópico a seguir, tentaremos abordar esse período sob outros enfoques, que não os que discutem a existência ou não do populismo na política do Espírito Santo.

Vinculada a tal leitura, Marta Zorzal e Silva (1986) reporta a criação do PTB no Espírito Santo como reflexo das movimentações pró-candidatura de Getúlio Vargas à presidência da República, em 1945, no Espírito Santo, no movimento que ficou conhecido como Queremismo. Esse movimento fundou, em 21 de agosto de 1945, com o apoio do então interventor Jones dos Santos Neves, o Partido Nós Queremos no Espírito Santo, no qual figuraram como membros da diretoria provisória José Borges de Santa Rosa, Emílio José de Andrade, Nery de Freitas Nascente, Edmundo Sandoval, Alencar Marinho e Adalberto Passos. O potencial eleitoral e a experiência de organização dos apoiadores do Queremismo, segundo Silva (1986),, seriam a principal força organizadora do PTB no Espírito Santo, uma vez que o Estado carecia de número relativamente maciço de trabalhadores urbanos, que constituiriam, ideologicamente, a base de sustentação da agremiação.

Na organização do diretório estadual do PTB figurariam os mais diversos interesses: industriais, exportadores, comerciais, lideranças sindicais, etc. O destaque desse último setor trata-se de Saturnino Rangel Mauro, à época, ferroviário, que estaria representando os trabalhadores urbanos. Na leitura de Silva (1986), os elementos que formavam o PTB ou eram pertencentes à classe de políticos que não se alinhavam às lideranças ingressantes no PSD e UDN, ou eram adeptos da proposta varguista de atacar a influência comunista nos setores urbanos e operários, “[...] assegurando, em benefício da classe dominante, o voto da classe trabalhadora” (SILVA, 1986, p. 264).

Assim, na concepção de Silva (1986), o PTB nasceu como uma espécie de partido astuto, em que a classe trabalhadora, por algum motivo (populismo), o veria como seu legítimo representante e ali depositaria seu voto. Entretanto, ao invés de fazer valer suas reivindicações, estaria, na verdade, dando fôlego a classe dominante. Essa leitura retrata os elementos que formaram o PTB/ES determinados à sua criação por motivos que não são se relacionam a afinidade com os pressupostos da agremiação, mas que se constituem, unicamente, da negação de uma ligação com outro grupo – uma espécie de “não somos ligados a políticos do PSD e UDN,

criamos o PTB”.

Entendemos ser essa uma interpretação enviesada, em que a afirmação da negação (petebistas como os anti-PSD e UDN/ anti-comunistas/ anti-classes trabalhadoras), deixa escapar a complexidade da experiência de formação do partido trabalhista capixaba. Ao optar por uma leitura diversa e diversificada, não descartamos que o comportamento de oposição - sou PTB, porque não sou PSD e UDN -, mais que de afirmação, presidiu a filiação de alguns elementos ao partido nascituro. Da mesma maneira, não caímos em leitura inocente ao não abordar que membros de uma elite dominante – que não quer dizer totalmente dominadora – adentraram ao partido com interesses diversos aos das classes populares e operárias urbanas – se dominadas, não totalmente -, pretensas bases do partido.

Mesmo que se registre membros da elite capixaba na formação do PTB do Espírito Santo, não acreditamos que a classe trabalhadora seja passiva e facilmente ludibriada por um partido a serviço de lobos, vestidos, porém, de cordeiros.

No mesmo sentido de Silva (1986), Jefferson Ferreira Alvarenga (2012) disserta com fito de investigar se no Espírito Santo, entre 1930 e 1958, é perceptível a presença de práticas populistas no Espírito Santo. Em seus estudos, aborda que, diferentemente da tese de Octavio Ianni (1978) e Francisco Weffort (2003), que consideram que os acontecimentos de 1930 teriam dado início ao populismo na política brasileira, o Espírito Santo não acompanhou essa dinâmica evolutiva (ALVARENGA, 2012). A Revolução de 1930 não teria modificado as estruturas políticas e econômicas forjadas na formação histórica e social do Espírito Santo. Dessa maneira, as duas elites, com interesses tributáveis ao café, permaneceram hegemônicas na esfera pública capixaba constituindo, portanto, uma guerra de coronéis, em que houve um rearranjo das forças políticas ligadas a essas elites cafeeiras, uma vez que a maior parte dessas lideranças passou a uma situação governista, em face de uma minoria oposicionista (ALVARENGA, 2012, p. 61). Dessa maneira, ao modo da teoria de Ianni (1978) e Weffort (2003), não houve uma crise de hegemonia no seio da elite político-econômica capixaba, que teria como

causa a emergência do populismo, de modo que o Estado aparecesse como um ente capaz de regular os conflitos sociais e despontar como hegemônico na arena política, já que haveria uma classe dominante incapaz de realizar tal processo e uma classe média débil. O que houve foram apenas rivalidades entre os diferentes grupos dessa elite visando ao controle da administração pública. Em linhas gerais, o primeiro interventor federal, após a Revolução de 1930, João Punaro Bley, não governou, ao modo populista, apoiando-se nas massas, mas sim, contemporizando os interesses agrários e exportadores ligados ao café, incorporando os últimos a administração pública (ALVARENGA, 2012).

Além disso, a primeira interventoria de Bley tratou de reproduzir, no estado, a centralização administrativa estimulada pelo plano federal, tal como uma racionalização burocrática em que a participação popular ficaria em segundo plano. O que poderia atenuar essa prática, os sindicatos criados no período, estavam a serviço dos interesses do governo numa relação de corporativismo inclusivo, de modo que a então interventoria não aumentou os canais de participação popular, pelo contrário (ALVARENGA, 2012).

Com as medidas do governo Bley, ampliou-se a cidadania aos grupos que vivem nas áreas urbanizadas, esses, entretanto, eram a minoria da população capixaba (ALVARENGA, 2012). Há que se destacar, ainda, que o Espírito Santo não possuía uma grande complexidade em sua formação social, fazendo com que o comando do Estado permanecesse nas mãos das elites ligadas principalmente ao cultivo e comércio do café (ALVARENGA, 2012). Essa permanência das elites ligadas a uma atividade primária, à revelia da entrada em cena de setores urbanos e populares, seria um dos entraves para a emergência do populismo no Espírito Santo após os eventos de 1930.

Outro entrave elencado para o nascimento de tal fenômeno na política capixaba diz respeito à manutenção das estruturas agrárias, ao invés de substituí-la pelo desenvolvimento do capitalismo mais urbano-industrial. Durante o período de 1930 a 1945, pelo contrário, o governo estadual e as elites políticas e econômicas

privilegiaram as intervenções voltadas às lavouras, ainda que o governo federal tenha contribuído com a formação de indústria de médio e pequeno porte (Chocolates Garoto, Moinho Vitória-ES, Companhia Ferro e Aço de Vitória-ES, entre outras) no Espírito Santo e, também, com a criação da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e de todo o seu aparato de exportação de minério. O esforço capixaba tratou apenas de implementar uma maior diversificação da produção agrícola, de modo que as receitas capixabas não ficassem tão ao sabor dos ventos dos preços do café no mercado. Essa escolha de manutenção das estruturas agrárias não permitiu o surgimento de uma miscelânea de novas forças sociais na sociedade capixaba, tal como não inseriu o Espirito Santo no bojo do desenvolvimento capitalista nacional. Dessa maneira, não houve uma evidente migração campo- cidade, tal como não haviam grandes manifestações de massa na realidade capixaba (ALVARENGA, 2012).

Outro componente do populismo não verificado no Espírito Santo no período posterior a 1930, na análise de Alvarenga (2012), diz respeito ao elemento do carisma como qualidade extracotidiana do líder. A frente do governo, Bley, ao que consta, não possuía uma atuação que o fizesse ligado sentimentalmente às massas, pelo contrário, seu perfil era autoritário e distante dos anseios populares. Ainda segundo Alvarenga (2012, p. 70), Bley “[...] se comportava mais como um soldado que obedecia ao seu líder [...] era uma liderança sem ambição política [...] seguia apenas as diretrizes propostas por Vargas”.

Pode-se relativizar essa falta de ambição política e de comunicação com as massas, analisando como o então interventor, capitão Punaro Bley, racionaliza o uso de seus trajes em aparições públicas. Fernando Achiamé (2010), em considerações gerais, percebeu uma preocupação de Bley em passar mensagens ao povo através de sua indumentária. Em diversas ocasiões, quando o evento era composto em sua maioria por civis, o interventor de Vargas utilizava trajes militares. O contrário, a aparição era com trajes civis. Para Achiamé (2010), uma racionalidade presidia esse comportamento.

Não tendo sido eleito, Bley precisava afirmar-se como uma liderança civil para a população capixaba. Porém, os militares gozavam de grande prestígio como fiadores da política do pós 1930 e, deste modo, não poderia deixar escapar sua condição de um oficial militar. Assim, a escolha nos trajes adequados para cada aparição demonstra que o ator em questão “desejava passar uma mensagem irretorquível: um mesmo corpo físico pode abrigar duas modalidades de poder, o civil e o militar” (ACHIAMÉ, 2010, p 180).

Era como se Bley fosse deveras militar para ser julgado como um simples político, tal como um político em exercício para ser julgado segundo manuais militares. Essa racionalidade demonstra, portanto, um interventor diferente de “um soldado que obedecia ao seu líder”, como aborda Alvarenga (2012, p.70). Ao contrário, a preocupação de um soldado “sem ambição política” seria, certamente, se seu traje militar estava alinhado ou não. Porém, conforme o samba da época, para além dessa visão de alguém que governa à revelia de uma aspiração política, Bley demonstrava na representação política a preocupação profunda de Noel Rosa: “com que roupa eu vou?”.

Em suma, reccorendo a esses parâmetros analíticos, para Alvarenga (2012), o populismo não esteve presente no ínterim 1930 – 1945, diferentemente do que contempla a teoria do populismo para esse mesmo período no cenário federal. Em se tratando do período de nosso interesse (1945 – 1964), Jefferson Alvarenga (2012) concorda com a leitura de Marta Zorzal e Silva (1986) - já anteriormente explicitada - quando ela defende que a mediação entre classe dominante e dominada, tal como o acesso das elites cafeeiras ao aparelho de Estado no Espirito Santo do pós-Vargas, se deveu a lealdades pessoais, a forma coronelística de articulação política e as relações pratrimonialístas entre as partes, ou seja, às táticas ressuscitadas da Primeira República.

– 1950), Jones dos Santos Neves (1951 – 1954)5 e Francisco Lacerda de Aguiar

(1955 – 1958)6 (ALVARENGA, 2012, p. 72). Então, se na reabertura democrática

não houve nenhuma crise política ou econômica, e mais, se houve uma realocação das forças políticas já estabelecidas no aparelho de estado, não havia condições de surgir uma nova relação entre Estado e sociedade (ALVARENGA, 2012).

Já nos contrapomos a essa leitura de permanência do coronelismo para o período pós-1930. Cabe agora discorrer acerca do pretenso populismo na política capixaba. Nesse sentido, os segundos governos de Carlos Lindenberg (1959 – 1962) e de Francisco Lacerda de Aguiar (1963 – 1966) seriam fruto de outra experiência política, com maior independência em relação às elites cafeeiras, sobretudo devido a uma maior diferenciação social ocorrida sob a intensificação das migrações campo- cidade, muito embora a população do Espírito Santo fosse ainda eminentemente rural (ALVARENGA, 2012, p. 72).

Em linhas gerais, nesses dois governos acima citados, o populismo revelou-se como a forma de mediação entre o Estado e a sociedade. Na sua visão sobre o populismo para o Espírito Santo, Alvarenga (2012) discorre que ele não acompanhou o padrão do Sudeste, visto que, no caso capixaba, a economia primária baseada no café permaneceu como motor da economia, tal como as elites ligadas à sua produção e a sua exportação, que eram a base dos governos, que deveriam negociar posições e políticas com essas elites (ALVARENGA, 2012).

Assim, a intensificação do fluxo migratório campo-cidade, a crise cafeeira observada a partir de 1955 e a consequente crise política pediriam respostas que fossem

5 O governo de Jones dos Santos Neves, apesar das lealdades as elites agrárias, esforçou-se por

uma agenda em favor do lançamento das bases de uma maior industrialização do Espírito Santo, entretanto, encontrou grande resistência em sua base de sustentação política e, por isso, não obteve resultados consistentes, ficando apenas na incipiência dos planos (ALVARENGA, 2012 p. 73).

6 Apesar de estabelecer uma relação mais personalista com a população capixaba e, por isso,

introduzindo práticas populistas em seu governo, Lacerda de Aguiar possuía como base de sustentação de seu primeiro governo as elites cafeeiras. Seu governo, nesta leitura, se trata apenas de uma introdução do populismo no Espírito Santo, consolidado a posteriori (ALVARENGA, 2012, p. 73).

capazes de trazer novos horizontes para a realidade capixaba, em temos políticos, econômicos e sociais, o que foi obtido através da conciliação entre o desenvolvimento industrial, associado à defesa do café e o pacto populista (ALVARENGA, 2012, p. 93).

A compreensão do conceito de populismo por Alvarenga (2012) parte das análises de Mário Petrone e Maria Moria Mackinnon (1998) apud ALVARENGA (2012), que são postulantes de algumas condições de existência do populismo num determinado espaço e tempo. São estabelecidas, então, determinadas características para verificação da existência do populismo, tais como: uma crise que faz emergir o fenômeno; a mobilização popular ser a forma de participação das massas; a existência da verificação de ambiguidades nos movimentos populistas; a existência de dinâmica de incorporação-exclusão dos segmentos sociais; a percepção da base social do movimento populista; e a formação histórica e social de cada Estado populista como pré-condições para o surgimento do populismo. Além disso, Alvarenga (2012) incorpora a transição de uma sociedade agrária para uma sociedade urbano-industrial como outro requisito para o populismo.

Diferentemente da tese de Gino Germani (1979), que percebe essa transição numa análise etapista, Alvarenga (2012) retrata o populismo enquanto experiência histórica, algo como uma concretude histórica e, nesse sentido, amplia também seus postulados para a verificação de lideranças carismáticas que incorporem setores populares, a ampliação da cidadania e o desenvolvimento capitalista (ALVARENGA, 2012).

Assim, partindo dessa unidade analítica, o autor postula a crise do café, iniciada em 1955, como fator determinante para uma mudança de paradigma na política capixaba. O Espírito Santo, à época, produtor de café de baixa qualidade e de cotação baixa no mercado, fora drasticamente atingido pela política de erradicação dos pés de cafés improdutivos, levada adiante pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC), durante o Governo de Juscelino Kubitscheck, obrigando grande contingente de desempregados a migrarem do campo para a cidade, fenômeno que se desenrolará

a partir desse período e terá seu ápice na década de 1980. Diferente dos estados mais desenvolvidos (São Paulo e Rio de Janeiro), o café era produzido por pequenas propriedades familiares e o Estado não possuía uma economia diversificada, impossibilitando, dessa maneira, a substituição de uma economia primário-exportadora, pré-capitalista, para uma economia industrial, inserida no capitalismo brasileiro. O Plano de Metas e o esforço de industrialização do governo JK só respingariam no Espírito Santo a partir de 1960 (ALVARENGA, 2012).

Antes disso, o que ocorreu foi uma crise econômica e social, qual seja, a intensificação (lenta e gradual) da migração campo-cidade, o que tornou a cidade de Vitória-ES (posteriormente, a Grande Vitória-ES) um novo lócus de demandas sociais emergentes (habitação, saneamento básico, infraestrutura etc.) (ALVARENGA, 2012). Na concepção do autor, essas novas demandas foram importantes para o surgimento do populismo no Espírito Santo, visto que as lideranças políticas não teriam sua atuação pautada somente pelos interesses das elites ligadas ao café, mas deveria abarcar a miscelânea de reivindicações dos setores populares e urbanos.

Nesse sentido, seria natural que os partidos remodelassem sua atuação e sua relação com a sociedade visando a sobreviver a um novo ambiente. Assim, por exemplo, o PSD, nas eleições de 1958, incorporou os novos segmentos populares e urbanos principalmente através da instalação de subdiretórios nas áreas rurais e bairros da Grande Vitória-ES, os quais eram comandados e mantidos por elementos locais, colocando em contato as lideranças políticas de maior envergadura com as massas populares, bem como inserindo os novos segmentos sociais na participação política e partidária (ALVARENGA, 2012).

Dessa maneira, quando os novos tempos implicaram em mudança lenta e gradual de uma sociedade agrária para uma sociedade urbano-industrial, sobretudo a partir do segundo governo de Carlos Lindenberg (1959 – 1962), quando esse destinou recursos para amenizar os efeitos da erradicação dos pés de cafés, quando também implementou obras que subsidiariam, a posteriori, uma industrialização incipiente, as

elites tradicionais começaram, igualmente de maneira lenta e gradualmente, a perder espaços para as forças industriais emergentes, sem, entretanto, perder a hegemonia no comando do aparelho estatal (ALVARENGA, 2012). Houve uma maior racionalidade e tecnicidade na atuação do estado. Além disso, na emergência do capitalismo no Espírito Santo, entidades sindicais patronais, como a Federação das Indústrias do Espírito Santo (FINDES), foram frutos de uma organização das forças industriais emergentes ganhando, cada vez mais, protagonismo nos ditames da política capixaba.

Entretanto, além da crescente contemplação dos interesses das elites industriais emergentes e das elites agrárias já estabelecidas, a experiência populista no Espírito Santo, na visão de Jefferson Alvarenga (2012), era sustentada pela ampliação da cidadania aos segmentos populares urbanos e rurais. Se, no plano nacional, Getúlio Vargas ampliou a cidadania através da assistência social via sindicatos, no Espírito Santo, a partir de 1955, a cidadania viria por meio de políticas públicas, tanto para a população rural, quanto para a população urbana (ALVARENGA, 2012, p. 138). Como exemplo, podemos mencionar o acesso à educação pública, que foi um dos destaques da atuação de Lacerda de Aguiar em seu segundo governo (1963 - 1966), tal como instalações para propiciar água encanada e sistema de esgoto rural e urbanos, construção de hospitais e de habitações, entre outras ações (ALVARENGA, 2012).

Conforme Alvarenga (2012), os segundos governos de Carlos Lindenberg e de Lacerda de Aguiar tinham bases sólidas nas elites cafeeiras, entretanto, estabeleceram a dinâmica “incorporação-exclusão” dos segmentos populares rurais e urbanos. No caso de Lindenberg, estabeleceu-se tal dinâmica por meio dos subdiretórios partidários e de políticas públicas voltadas a ampliar os canais de participação política (ALVARENGA, 2012). Já no segundo governo de Aguiar, a inclusão social foi estabelecida através de uma relação de pessoalidade e carisma entre líder e massa, sobretudo por meio das audiências públicas, associações de moradores e abaixo-assinados, bem como através de favores concedidos aos

sindicatos, sem desenvolver canais consistentes de participação popular. Porém, o governo de Aguiar garantiu o atendimento de ganhos materiais aos setores populares urbanos e rurais (ALVARENGA, 2012). Entretanto, essa inclusão não quer dizer, na leitura de Alvarenga (2012), controle absoluto do líder sobre as massas, na medida em que sua capacidade de exercer tal controle, dependeu da sua inclusão, ou seja, “[...] o líder detém certo controle das massas na mesma proporção em que ele mesmo atende às exigências sociais” (ALVARENGA, 2012, p. 142).

O último elemento que fia a defesa da existência do populismo no Espírito Santo diz respeito ao elemento carismático. Para Alvarenga (2012), diferentemente da historiografia oficial, Lindenberg, assim como Lacerda de Aguiar, imbuiu-se desse elemento para a construção de sua imagem pública. O primeiro apresentava-se como um homem comum, do interior, que era próximo das necessidades das classes populares e que, por isso, era reconhecido como “[...] a esperança de melhor qualidade de vida para a população do interior e da Grande Vitória-ES [...]" (ALVARENGA, 2012, p. 149) e como um dos seus. Ou seja, “[...] é como se todos os indivíduos participassem da vida pessoal e pública do líder [...]” (ALVARENGA, 2012, p. 149).

Essa ligação de caráter emocional entre líder e massa, em que a figura desse primeiro é confundida com o Estado, está presente na figura de Lacerda de Aguiar representada no abandono de protocolos, na linguagem simples e direta e, também, nos hábitos comuns, como ressalta Jefferson Alvarenga (2012). A apresentação de si como um homem de alianças e conciliação, numa época de maiores polarizações, sem julgar seus adversários, faziam-no identificar-se com as massas que, então, à sua semelhança, passavam a não mais julgá-lo em suas atividades públicas. Ademais, Alvarenga (2012) defende a sedução do carisma não como um véu que se punha na face das massas cegando-as, mas como algo que lhes era convidativo.