• Nenhum resultado encontrado

PREFIXOS X SUFIXOS: PRINCIPAIS DIFERENÇAS

4.4.6 Graça Maria de Oliveira e Silva Rio-Torto

Rio-Torto também trabalhou com os sufixos em sua tese doutoral, intitulada Formação de Palavras em Português: Aspectos da construção de avaliativos,

defendida na Universidade de Coimbra, em 1993. Contudo, seu estudo limita-se à análise de formação de palavras com sufixos avaliativos, aqueles que servem para a formação de aumentativos e de diminutivos e que manifestam, exclusiva ou essencialmente, afetividade apreciativa ou diminutiva do falante (papel de

manifestação da intersubjetividade). Os sufixos avaliativos diminutivos, ressalta a autora, são bastante mais numerosos que seus congêneres aumentativos.

Segundo a autora, os sufixos avaliativos

Em relação ao português, remonta às suas primeiras gramáticas a atenção dedicada a este domínio derivacional, pois já em 1536, Fernão de Oliveira, na sua Gramática da linguagem portuguesa, assinala os sufixos diminutivos e aumentativos mais significativos do português e, de então para cá, raras são as gramáticas, os tratados de ortografia e/ou de prosódia, ou os dicionários que não lhe fazem referência. (RIO-TORTO, 1993, p. 1)

A análise tradicional que se pratica sobre a formação de palavras, no entanto, mostra-se insuficiente devido a algumas limitações, decorrentes de três fatores: 1) não se apoiar num modelo explicativo que a fundamente; 2) centrar-se nos operadores (derivacionais) afixais (sufixos/prefixos), omitindo-se o papel que as bases e os processos derivacionais desempenham no processo derivativo; 3) as descrições limitarem-se a classificar, formal e/ou semanticamente, as entidades que desempenham o papel de operadores afixais, sem levar em conta os paradigmas derivacionais em que se inscrevem, nem as relações semântico-categoriais instauradas na/pela construção de novas palavras.

Em relação aos sufixos propriamente ditos, Rio-Torto (1993) adverte-nos de que

Por outro lado, frequentemente se identifica o conteúdo associado a um instrumento derivacional com aquele que as palavras com ele construídas veiculam em situação comunicativa, não se distinguindo, portanto, dois níveis de análise essenciais: o nível inerente ao próprio sistema derivacional e o nível de utilização comunicativo-pragmática dos operadores e dos produtos derivacionais. Assim se explica que se atribuam aos sufixos valores semânticos variáveis e diversos que não representam mais do que os sentidos discursivos que as palavras com eles construídas veiculam nos actos de fala em que se integram. (Rio-Torto, 1993, p. 1)

Podemos inferir de sua obra que os sufixos classificam-se, a) quanto à

composição, em: 1) sufixos simples: aqueles que são indivisíveis (cf. –aço, –ão, – eiro,–alho, etc.) e 2) sufixos compostos: apresentam uma configuração complexa;

trata-se de um sufixo compósito (cf. –alhão, –arrão, –alhaz, –arraz, –eirão, –ilão, etc.); b) quanto à proveniência ou origem, em 1) sufixos latinos: aqueles provenientes do latim (cf. –ico, –inho, –ico, –ucho, etc.); 2) sufixos não-latinos: aqueles que provenientes de outras línguas, não do latim (cf. –acho, –ico, –isco, –

eta, –ete, –ote, etc.); na linguagens técnicas, destacam-se os sufixos eruditos (cf. – ulo, –culo (o de maior vitalidade), –ículo, –olo) embora a autora não utilize

explicitamente essa terminologia.37

Quanto às relações categoriais envolvidas no uso dos sufixos, há duas vertentes: a) relação categorial de tipo isocategorial – formam derivados da mesma categoria da base (cf. churrasco > churrasqueira; cerveja > cervejaria;

sorvete > sorveteria; pincel > pincelada, caneta > canetinha etc.); b) relação

categorial de tipo heterocategorial – formam derivados de categoria diferente da

base (cf. astro > astral; relâmpago > relampaguear; campo > campestre (adj.); azul >

azular; grito > gritar; dolor (f. ant. de dor) > dolorido, etc). Ambas as relações

categoriais, no entanto, são instauradas por via do afixo – daí a classificação deles em sufixos nominais, sufixos adjetivais e sufixos verbais, conforme formem nomes (substantivos), adjetivos ou verbos, respectivamente. Quanto ao sufixo

adverbial, em língua portuguesa, existe apenas o sufixo –mente; ele forma

advérbios a partir de adjetivos (uniformes ou biformes); se biformes, a formação se dá através da forma feminina do adjetivo (cf. lindo + –mente > lindamente; triste –

mente > tristemente; passivo + –mente > passivamente; encantador + –mente > encantadoramente; brilhante + –mente > brilhantemente, etc.).

Em relação às categorias a partir das quais os afixos operam, no nosso caso os sufixos, e que caracteriza a base da derivação, classificam-se os sufixos em

denominais, deadjetivais e deverbais, operando sobre bases nominais, bases

adjetivais e bases verbais, respectivamente.

Em relação ao estatutos dos sufixos, a autora assim se pronuncia:

A ausência de parâmetros homogéneos de identificação do valor funcional de cada afixo repercute-se negativamente na determinação do seu estatuto morfo-lexical, e manifesta-se pela incapacidade de estabelecer

_______

37

A autora não utiliza explicitamente a terminologia “sufixos simples”, “sufixos compostos”, “sufixos latinos” e “sufixos não-latinos”, mas se refere a eles. Cf. RIO-TORTO (1993, p. 35 – 37).

os diferentes conjuntos de operadores isofuncionais que compõem o sistema de formação de palavras duma língua e as diferentes funções que uma mesma forma afixal pode desempenhar nesse sistema. (RIO-TORTO, 1993, p. 37).

Rio-Torto observa também:

As significações de cada um dos afixos não se sobrepõem nem são comutáveis se que daí decorram alterações semânticas distintivas, pelo que esses afixos desempenham diferentes funções significativas que, em princípio, corresponderão a categorias semântico-derivacionais relevantes dentro do sistema da língua: acção (ligação); local de (e/ou) actividade (papelaria); objecto continente (papeleira), quantidade (papelada); aumento (papelão).

Mas quando tais condições não se verificam, e isso acontece, por exemplo, sempre que não há alteração categorial entre base e derivado, são acrescidas as dificuldades na interpretação das formas afixais.

O recurso aos princípios da funcionalidade/oposição distintiva só parcialmente se afigura operatório, uma vez que, por si só, a sua aplicação não encerra as dimensões necessárias à identificação do estatuto que um segmento detém no sistema derivacional de que faz parte. À luz destes princípios, podem ser identificadas como sufixos autónomos entidades de estatuto completamente diverso daquele que em uma perspectiva estritamente sincrónica e estruturalista lhes confere: estruturas linearmente identificadas como afixais podem representar segmentos sem valor de afixo, ou meras variantes isofuncionais. (RIO-TORTO, 1993, p. 58 – 59).

Os sufixos – assim como os prefixos – podem ainda estar em variação livre, e isso ocorre quando eles mantêm entre si os mesmos valores semânticos num mesmo contexto distribucional. Nesse caso, estamos perante duas variantes livres de uma mesma entidade sufixal e não ocorre qualquer alteração semântica relevante. É o que ocorre nos pares abaixo:

–et– , –elh– e –ec–: artigu –ete, artigu –elho e artigu –eco; –óri– e –uch–: em papel –ório e papel –ucho;

É importante ressaltar que há algumas objeções a esse postulado:

a) O fato de dois sufixos serem isofuncionais não implica que constituam escolhas livres. Podem funcionar, nesse caso, em distribuição complementar, ainda que a mesma não seja obrigatória ou sistemática, como ocorre nos pares abaixo:

–eza e –ura: alteza x altura; largueza x largura; fineza x finura; –eir– e –ári–: banqueiro x bancário;

–dade e –ismo: leal–dade x leal–ismo;

–ção e –mento: ligação x ligamento; povoação x povoamento (Cf. *a povoação da região deu-se lentamente).  Embora isofuncionais, ou seja, produzidos pelo mesmo paradigma (ligar) são intermutáveis (Rio-Torto, 1993, p. 59 e p. 73).

b) Não há uma relação de implicação entre a comutabilidade, num mesmo contexto distribucional: pode não haver identidade ou equivalência semântica por parte de duas entidades:

rapazote x rapazito x rapazete x rapagão; narigudo x narigão;

amorzinho x amoreco; murão x muralha; beiçola x beiçudo.

c) Dois segmentos de significação idêntica podem comutar no mesmo contexto, entretanto, não se pode afirmar que se trata de variantes em distribuição

facultativa duma mesma entidade afixal.

mundano x mundanal; campestre x campal.

COSERIU (1976 [1978] e 1982, apud RIO-TORTO, 1993, p. 81), estabelece três grandes tipos de produção lexical: a modificação, o desenvolvimento e a

composição e, baseados neles, pode-se esboçar uma tipologia das funções

paragramaticais implícitas nos processos formativos de palavras, assim representados:

TIPOS DOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DE PALAVRAS