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Capítulo V – Formação de palavras.

PRINCIPAIS SUFIXOS NOMINAIS DE OUTRAS ORIGENS:

4.2.3 Manuel de Said Al

A Gramática Histórica da Língua Portuguesa de Said Ali (1931), dividida em duas partes, vai tratar dos sufixos na 2ª. parte, assim dividida: a) Formação de Palavras; b) Sintaxe.

No capítulo Derivação em Geral, o autor nos traz o seguinte conceito de sufixo:

[...] A derivação, por outra parte, toma palavras existentes e lhes acrescenta certos elementos formativos com que adquirem sentido nôvo, referido contudo ao significado da palavra primitiva. Por êstes elementos no fim do vocábulo derivante (geralmente com a supressão prévia da terminação dêste), chamam-se sufixos, e o processo de formação toma o nome particular de derivação sufixal. (SAID ALI, 1931, p. 229)

Said Ali (1931, p. 229), ao comparar prefixos e sufixos, acrescenta que “[...] não está bem demarcada a fronteira entre a derivação prefixal e a composição” e ressalta que os prefixos (ex.: pre-, ob-, dis-, re-, in-) não são usados como palavras isoladas, mas representam partículas inseparáveis que são ou foram preposições ou advérbios em latim e nada se sabe sobre sua existência em vocábulos independentes nem em latim nem em qualquer língua indo-européia.

Em relação aos sufixos, Said Ali (1931, p. 230) ressalta que “[...] a lingüística admite e por vêzes claramente demonstra, procede também de expressão que a princípio se usou como palavra independente.”

Em relação à derivação sufixal, declara:

1130. Que mesmo na derivação sufixal nem sempre é fácil determinar a linha que a separa do processo de composição, vê-se pelo histórico dos advérbios em -mente. Enquanto em latim só se usaram dizeres como fera mente, bona mente (ou feramente, bonamente, pois se pronunciariam ligando as palavras), em que se combinava o substantivo com qualificativos adequados à sua significação, o processo em vigor era, quando muito, a composição, formavam-se palavras compostas. Desde porém que com igual facilidade puderam vogar combinações como ràpidamente, recentemente, já a palavra mente tinha perdido a significação e valor de substantivo e, de têrmo componente, passava a funcionar como sufixo creador de advérbios. (SAID ALI, 1931, p. 230)

A seguir, no capítulo sobre DERIVAÇÃO SUFIXAL4, o autor faz o levantamento dos principais sufixos que contribuíram para a expansão do léxico do português: sua origem, produtividade e semântica, assim distribuídos5:

“ DERIVAÇÃO SUFIXAL

a) Substantivo e Adjetivo

–aria (–eria): artelharia, artilheria, cavalaria, confraria, correria, feitiçaria,

frontaria, gritaria, montaria, rouparia, sovinaria, tafularia, tapeceria, zombaria.

–ez, –eza, –ícia, –ice, ície: altivez, altiveza, ardidez, ardideza, beatice,

bebedice, blandeza, calvície, carícia, delícia, dobrez, dobreza, escassez, escasseza, favoreza, gatunice, igualeza, maleza, milícia.

–ança, –ença, –ância, –ência: benquerença, convença, doença,

esperança, fiança, folgança, herança igualdança, licença, malquerença, perdoança, significança, tença.

–agem, –ádego, –ádigo, –ático: achadego, aprendizagem, barcagem,

compadradigo, ferragem, follhagem, padroadigo, pastagem, plumagem, selvagem.

–dor, –tor, –sor, –or, –dura, –tura, –sura, –ura: amador, armadura,

atadura, benzedor, benzedura, censura, clausura, fechadura, ferradura, fratura, genitura, genitura, grossura, longura, mordedor, mordedura, pintor, torcedor, torcedura, tristura.

–douro (–doiro em português antigo): ancoradouro, batedouro, cingidouro,

dobadoura, escoradouro, suadouro. Alguns penetraram na língua por via erudita, mantendo a terminação –tório (~ –ório): auditório, diretório, divisório, dormitório, escritório, genuflexório, ilusório, laboratório, refeitório, suasório, transitório.

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4

SAID ALI (1931), p. 232 – 248. Os capítulos na Gramática Histórica de SAID ALI não são numerados.

5

Dado o elevado número de exemplificações para cada sufixo tratado pelo autor, limitar-nos-emos a selecionar alguns. A semântica dos mesmos será tratada em momento e capítulo oportunos. SAID ALI cita em sua exemplificação muitos exemplos do português arcaico.

–ado, –ada, –ido, –ida, –ato, –ata: arcebispado, arremetida, baronato,

bebida, bordado, caçada, canivetada, carrada, chifrada, comida, concordata, dentada, facada, finado, garfada, garotada, goiabada, jogada, jornada, lufada, marmelada, nitrato, nortada, paulada, penada, picada, pincelada, proterado, ramada, serenata, silicato, sonata, triunvirato, viscondado.

–ção, –são: audição, comparação, consecução, coroação, declaração,

fusão, invocação, obrigação, persuasão, solução.

–eiro, –ário (–airo): aviário, barreiro, bebedeira, cabeleira, candeeiro,

canseira, castanheira, castanheiro, cegueira, celeiro, chaleira, contrairo, diário, dinheiro, fadairo, gaioleiro, galinheiro, geladeira, horário, jasmineiro, ladroeira, lavadeira, mosquiteiro, obreiro, operário, perdigueiro, primeiro, roseira, saleiro, solitário, solteiro, sudairo, toureiro.

–edo: arvoredo, brinquedo, folguedo, lajedo, olivedo, olmedo, penedo,

rochedo, vinhedo.

–udo: barrigudo, bicudo, bochechudo, cabeçudo, cabeludo, carnudo,

lanudo, orelhudo, peludo, pontudo.

–ável, –ível, –úvel: admissível, apreciável, corrigível, discutível, durável,

solúvel, perecível, punível, violável, volúvel.

–ês, –ense: bracarense, cearense, conimbricense, eborense, francês,

fluminense, genovês, inglês, maranhense, paraense, português (portugalês), vienense.

–ano: açoriano, alentejano, camoniano, cubano, diluviano, humano,

mundano, napolitano, paraibano, prussiano, shakespeariano, siluriano.

Em sua obra, SAID ALI apresenta um rigoroso levantamento dos sufixos

acordo com a classe de palavras dos derivados, em: a) substantivos e adjetivos; b)

verbos. No entanto, não faz menção ao sufixo –mente, o único formador de

advérbios em nossa língua.

Seu estudo acerca da sufixação portuguesa faz um levantamento exaustivo, baseado em informações históricas acerca da língua; na maior parte de sua exemplificação, mostra o étimo de onde proveio o sufixo. As abonações são ricas, utilizando-se, muitas vezes, de palavras antigas (arcaicas), empregadas nos primórdios da formação do português, como podemos observar nas exemplificações abaixo selecionadas:

Sufixo –ARIA (ERIA)

1137. Ao elemento formativo –aria do português antigo correspondem castelhano –

eria, italiano eria, francês –erie. O seu histórico é comum a estas diversas línguas.

[...]

1139. NOs Lusíadas (edição de 1572) ocorrem: infantaria (7,45), especiaria (2,4),

artelharia (7,12), e também artilheria (1,89), tapeçaria (9,60). [...]

1143. A produtividade do sufixo aria manifesta-se sobretudo na formação de nomes que exprimem:

a) ramos de negócio e indústria e lugares onde êles se acham estabelecidos:

drogaria, luvaria, chapelaria, ourivesaria, alfaiataria, tinturaria, marcenaria, carvoaria, tanoaria, lavandaria, confeitaria.

b) noção de coletividade: sacaria, pedraria, arcaria, fradaria, frascaria, casaria,

confraria, caixaria, armaria, berraria, fuzilaria, gritaria. Diz-se correria, e não corraria, por influência do verbo correr.

c) atos próprios de certos indivíduos, ou o resultado dêstes atos: patifaria,

velhacaria, pirataria, sovinaria, judiaria, zombaria, galantaria, tafularia.

Quadro 4.4 – O sufixo –aria (–eria) em Português (Fonte: SAID ALI (1931, p. 233))

Sufixos –EZ, –EZA, –ÍCIA, –ICE, –ÍCIE

1144. Filiam-se ao latim –itia, –itie, sendo de notar que a alteração em –ez, –eza denuncia serem estas as formas populares mais antigas do idioma. O primeiro dêstes sufixos –ez, parece ter sido menos produtivo que o segundo. Vocábulos há de dupla forma: altivez e altiveza, rudeza e rudez, dobreza e dobrez, pequeneza e

pequenez, intrepideza e intrepidez, escasseza e escassez.

1145. Alguns têrmos em –eza, por efeito de concorrência de outras formações que significavam a mesma cousa, tornaram-se menos usados ou desapareceram de todo. Igualeza (V. Benf. 93, 100, 189, Leal Cons. 281), favoreza (Fernão Lopes, D. J. 1), maleza (V. Benf. 100), crueleza (ib.), liberaleza (Leal Cons. 96, V. Benf. 188),

blandeza (Leal Cons. 96), foram substituídos por igualdade, favor, maldade, crueldade, liberalidade, brandura. [...]

1149. A terminação –ície, moldada sôbre o latim, é própria do português moderno:

calvície, canície, superfície (outrora superfícia), imudície, etc.

Quadro 4.5 – Os sufixos –ez, –eza, –ícia, –ice, –ície em Português (Fonte: SAID ALI (1931, p. 233))

4.2.4 Manuel de Said Ali

Em sua Gramática Secundária da Língua Portuguêsa (1964), SAID ALI

apresenta cinco partes e é na quarta parte que ele apresenta-nos o estudo sobre

Formação de Palavras. Nesta parte, o referido autor nos expõe seu conceito de

sufixo e sua visão sobre o tema, que, segundo ele próprio, está baseada em modernos lingüistas, como Meyer Lübke, Nyrop e outros:

Os elementos formativos que se colocam antes (sic)6 da palavra derivante, (geralmente com a supressão ou alteração prévia da desinência) chamam-se SUFIXOS, e o processo de formação toma o nome particular de DERIVAÇÃO SUFIXAL. (SAID ALI, 1964, p. 107, grifo nosso)

Para Said Ali (1964, p. 107), o sufixo divide-se em duas classes:

a) “os que servem ou originariamente serviram para formar nomes aumentativos ou diminutivos.” Seus derivados são substantivos ou adjetivos;

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6

Assim aparece a definição de sufixo na referida obra (op. cit., pág. 107). Cremos, contudo, ter sido uma falha de impressão e/ou um cochilo do autor / revisor, pois, logo abaixo, em relação aos prefixos, encontramos a seguinte definição: “Os elementos formativos que se colocam antes da palavra derivante, chamam-se PREFIXOS; é o processo da DERIVAÇÃO PREFIXAL.”

b) “os que formam vocábulos novos e denotam outros conceitos diferentes.”

Said Ali termina o referido capítulo tratando da derivação prefixal, dos

principais prefixos, da derivação parassintética e da derivação regressiva. Diferentemente de sua Gramática Histórica (1931), em sua Gramática

Secundária da Língua Portuguêsa (1964) Said Ali não elenca o étimo dos sufixos

tratados, certamente devido ao público a que se destina. Ainda assim, mantém na obra a semântica dos sufixos e traz ampla exemplificação. Vale lembrar que “Tem o presente compêndio por objeto expor as doutrinas e regras gramaticais relativas à nossa língua, atendendo às necessidades e conveniências do ensino secundário7” e as palavras do Mestre Evanildo Bechara: “[...] a Gramática Secundária do Prof. Said Ali que, apesar dos anos, ainda é um compêndio de doutrinas modernas em cuja leitura e meditação mestres e alunos temos muito que admirar e aprender.”8