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3. FORMULAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DO PROJETO DA TV BRASIL E DA EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO

3.1. ANTECEDENTES: O GRUPO DE TRABALHO INTERMINISTERIAL E A FORMULAÇÃO DO PROJETO DA TV PÚBLICA

3.1.1 O Grupo de Trabalho Interministerial

Ratificando o empenho do Presidente Lula, em pouco menos de uma quinzena após a realização do Fórum, no dia 25 de maio, é novamente realizada uma reunião com ministros para apresentação dos primeiros estudos acerca do projeto de criação da TV pública. Desta vez, estiveram presentes Dilma Rousseff, Franklin Martins, Fernando Haddad, Juca Ferreira

(como interino da Cultura), e um representante do Ministério das Comunicações, cujo nome não é citado no texto. (POSSEBON, 2007a)

Quatro dias depois, o Poder Executivo institui, mediante decreto sem número do dia 29 de maio de 2007, um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI). Formado por representantes da Secom-PR, que o presidiria; Casa Civil; Ministério da Cultura; Ministério da Educação; Ministério das Comunicações; e da Radiobrás, assim como da Acerp, a iniciativa tem como objetivo “propor diretrizes e medidas para a implantação do sistema brasileiro de televisão pública, no âmbito do Poder Executivo Federal, e da rede nacional de televisão pública” (BRASIL, 2007d, online). O relatório de gestão da EBC, intitulado Quatro anos de um ideal democrático detalha sua composição:

Este grupo técnico que elaborou os estudos preliminares sobre a EBC e a TV Pública foi coordenado por Delcimar Pires, então assessor do secretário- particular do presidente Lula, ministro Gilberto Carvalho. Dele participaram fundamentalmente pessoas ligadas ao Ministério da Cultura e à Secom. Representando a pasta de Gilberto Gil, Orlando Senna, Mário Borgneth e Leopoldo Nunes. Do campo da Secom: Beth Carmona e Rosa Crescente, dirigentes da TVE-RJ. Eugênio Bucci, presidente da Radiobrás, e seu sucessor, José Roberto Garcez. O assessor de Franklin Martins, Eduardo Castro, e o assessor da ministra Dilma Rousseff, André Barbosa. Algumas figuras externas ao Governo também participaram, informalmente, agregando conhecimento sobre o tema, como o professor Laurindo Lalo Leal Filho. (EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO, 2011, p. 32, grifo nosso)

Ainda sobre a conformação do Grupo, os documentos acima citados negligenciam três relevantes aspectos. Inicialmente, cabe destacar o progressivo afastamento do Ministério das Comunicações do processo. Neste sentido, mesmo com a determinação por decreto de que um representante deste órgão componha o GTI, tal participação é omitida no relatório de gestão da EBC, assim como nos documentos posteriores. Em segundo lugar, constatamos a divergência de nomenclatura entre o decreto e o relatório, no que diz respeito à presidência ou coordenação pela Secom-PR, então representada por Delcimar Pires. Acreditamos que isto decorre da utilização de uma linguagem simplificada, e por vezes reducionista, por parte do relatório. Por fim, quanto à participação de agentes não estatais, Jonas Valente (2009a) acrescenta que, além do Prof. Laurindo Leal Filho, também contribuíram para as discussões outros profissionais, a exemplo do jornalista Florestan Fernandes Júnior, que posteriormente veio a ser integrado à equipe da EBC.

Por fim, no prazo de 60 dias, renovável por igual período, o Grupo deveria entregar ao Presidente da República um relatório contendo a “proposta da natureza jurídica, modelo de gestão administrativa e diretrizes para o financiamento” (BRASIL, 2007d, online) do sistema e da rede nacional de televisão pública, no âmbito do governo federal. Estas eram, conforme ilustrado no decreto, e as principais questões a serem consideradas.

3.1.1.1 Premissas e embates no interior do GTI

Criado o Grupo de Trabalho Interministerial, são realizadas “sessões diárias de oito, dez horas de discussão por dia, durante meses, com a Advocacia Geral da União, com a Casa Civil, com os setores...”, (BORGNETH, 2013, p. 10) com o propósito de “adequar aquilo que foi a Carta de Brasília, que foi o relatório final do Fórum de TVs, ao projeto de lei para criar uma TV pública” (idem, p. 11). A Carta de Brasília e os diagnósticos disponíveis nos cadernos do I Fórum reúnem parâmetros e diretrizes que abalizam, no plano conceitual, as recomendações ali explicitadas, mas não trazem subsídios consistentes para a efetivação desse projeto.

Em relação ao financiamento do sistema público de televisão, a Carta de Brasília (I FÓRUM..., 2007) e o Caderno de Debates Vol. 2, do I Fórum Nacional de TVs Públicas (BRASIL, 2007a) reivindicam que a TV Pública deve ser independente em relação aos governos e ao mercado, com fontes múltiplas de receita, obtidas por meio da participação significativa de orçamentos públicos e de fundos não contingenciáveis. Em conformidade com estes documentos, o GTI, opta por uma ampla gama de receitas e pela diversificação do financiamento.

Quanto à natureza jurídica e institucional, visto que os materiais resultantes do Fórum não sugerem uma configuração específica (BRASIL, 2007a), o GTI encomenda um estudo à Fundação Getúlio Vargas, que apresenta cerca de 14 modelos jurídicos existentes que poderiam se adequar a uma emissora de televisão. No estudo, a modalidade mais citada é a fundação pública de direito privado (VALENTE, 2009a). Este tipo de entidade se caracteriza por: a) possuir personalidade jurídica de direito privado, b) sem fins lucrativos, c) criada por lei, d) voltada para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, e) com autonomia administrativa, f) patrimônio próprio gerido por órgãos colegiados de direção, e g) funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes (SABO PAES, 2010).

Apesar de reunir diversas características que tornam esta a configuração jurídica mais apropriada para o estabelecimento de um sistema público de comunicação, a fundação pública de direito privado não se encontra satisfatoriamente regulamentada pela legislação federal169, situação que se mantém até os dias de hoje. Em que pese a impossibilidade da adoção deste modelo, sua defesa é mantida por alguns protagonistas, a exemplo de Orlando Senna, conforme se depreende de seu depoimento: “Na minha opinião, podia ser uma Fundação, como é a Fundação Padre Anchieta. Ou seja, um formato muito mais leve do que uma estatal...” (2013, p. 25)

Contribuindo para este debate, Eugênio Bucci adverte que, dentre os requisitos para se considerar uma emissora como pública, sua propriedade não pode ser particular. E dentre as figuras jurídicas possíveis, indica, além das fundações, as Oscips (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) e ONGs (Organizações Não Governamentais).

A instituição não pode ser comercial, não deve ter o lucro por finalidade, nem estar sujeita à interferência governamental. Ela pode até ser estatal — como, por exemplo, as universidades —, desde que sua gestão esteja inteiramente protegida de ingerências do poder Executivo. Apesar disso, o modelo de órgão estatal está longe de ser o mais indicado. (2010, p. 11)

A possibilidade de ingerência estatal é de fato um dos principais problemas enfrentados pelas emissoras de caráter público no Brasil. No entanto, sua solução se mostra mais complexa, pois, mesmo entre os formatos que estão submetidos ao direito privado, verifica-se a dependência do financiamento estatal, o que interfere sobremaneira na consolidação do caráter autônomo destas entidades. É o que demonstra, por exemplo, a experiência da Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto. Como já visto, embora constituída como uma Organização Social durante o governo Fernando Henrique Cardoso, suas instâncias administrativas permanecem sob o controle do poder executivo, por meio da indicação da maioria dos membros nos órgãos colegiados e da indicação e nomeação do seu diretor- presidente. No período, a Acerp é progressivamente sucateada, mediante a redução do financiamento via contrato de gestão. Já durante o Governo Lula, apesar dos avanços conquistados pela entidade no primeiro mandato, a entidade acaba por perder, com a

169 A autorização para a instituição de fundação pública pelo Governo Federal, com base em lei ordinária de

1967, é controversa (SABO PAES, 2010), considera-se, portanto, seu condicionamento à aprovação do Projeto de Lei Complementar 92/2007, que regulamenta o inciso XIX do Art. 37 da Constituição Federal, definindo as áreas de atuação deste tipo de entidade. Embora tenha sido requerido regime de urgência desde junho de 2013, o projeto segue aguardando votação na Câmara de Deputados. Cf:

instituição da Empresa Brasil de Comunicação, não apenas a operação de suas emissoras, mas seus bens, cuja transferência para a nova entidade é estipulada por lei170.

Em meio aos benefícios e prejuízos dos modelos analisados, é escolhido o formato de empresa pública:

[...] ela teria de ficar necessariamente na administração pública federal, o que não era um problema simples, e, certamente, isso é um dos maiores problemas que enfrenta a EBC até hoje porque o direito administrativo federal não tem a figura da fundação pública do direito privado como existe em vários estados. Então acabou que ela é uma [empresa] estatal, pior, ela é uma estatal dependente, como se chama, então ela é uma estatal toda amarrada, porque ela é obrigada a obedecer às determinações da 8.666, da lei com uma rigidez, que a meu ver, se não forem corrigidas, inviabilizam a comunicação pública porque ela não tem, por exemplo, a flexibilidade que tem a Cultura de São Paulo. Ela não tem agilidade, ou seja, ela compete com as TVs abertas que têm agilidade e ela não pode ter agilidade (MARTINS, 2013, p. 03-04).

Ou seja, a configuração jurídica considerada possível, se mostra ainda inadequada aos propósitos e necessidades de uma emissora pública de televisão.

No que diz respeito aos mecanismos de controle da sociedade, cria-se a figura de um Conselho Curador, órgão conformado com maioria de membros oriundos da sociedade civil, de natureza consultiva e deliberativa, a fim de garantir os princípios apontados pelo segundo volume do Caderno de Debates (BRASIL, 2007a). A decisão sobre o modo de escolha e o perfil de seus membros, além de ser alvo de embates no interior do GTI, também mobiliza as entidades que atuam em defesa da democratização das comunicações.

No interior do GT, havia duas posições sobre o assunto. A primeira, patrocinada pelo ministro Franklin Martins, previa a indicação pelo Presidente da República de conselheiros sem vinculação a movimentos ou segmentos, que seriam escolhidos livremente por seus atributos pessoais e pela sua representatividade na sociedade brasileira. A segunda, capitaneada sobretudo pelo professor Laurindo Leal Filho, consistia na nomeação pelo Presidente da República a partir de indicações feitas pela sociedade. (VALENTE, 2009a, p. 124)

Em 24 de agosto, é divulgado o manifesto Pela gestão democrática na TV Pública (2007), assinado por 46 entidades de atuação nacional e 21 de atuação regional. Ademais dos movimentos dedicados ao setor da comunicação, também subscrevem o texto organizações

170Diante da extinção do contrato de gestão com o Governo Federal, a Acerp enfrenta atualmente uma dura

batalha para garantir sua sobrevivência. Cf: Os caminhos da Acerp, de autoria de Arnaldo César Ricci (2013), diretor-presidente da entidade de 2007 a 2013.

voltadas a demandas sociais mais abrangentes171, que consideram preocupante a intenção da Secom-PR de estabelecer mecanismos de gestão vinculados exclusivamente ao Executivo Federal. Mesmo que o Estado representasse a minoria no Conselho Curador, é refutada a indicação de “personalidades” – pelo Presidente da República e sem consulta prévia a qualquer órgão independente, bem como a repetição do mecanismo na escolha da presidência da nova emissora e de seu Conselho de Administração. (PELA GESTÃO..., 2007, online)

O documento sugere, ainda, a observância de modelos já consolidados em outras áreas do Estado para a construção da proposta de um modelo de gestão para a TV Brasil, que preveem a composição “ampla e plural a partir da divisão por segmentos da sociedade e processos democráticos de escolha, seja por Conferência ou por eleição direta” (Idem, ibidem), associada a outras engenharias de controle e participação social. E conclui:

Mais do que propor o exato modelo de gestão da nova instituição de comunicação pública, as organizações abaixo-assinadas reivindicam o respeito aos princípios estabelecidos na Carta de Brasília e entendem que qualquer proposta que dê ao Executivo federal a prerrogativa de indicar a totalidade dos membros do Conselho Gestor da nova TV Brasil comprometerá seu objetivo primeiro de consolidação de uma efetiva rede pública no país. (Id., ibid.)

Valente (2009a) acrescenta – com base no depoimento de Delcimar Pires e Laurindo Leal Filho – que devido à complexidade e a ausência de consenso, a definição da forma de controle público é um dos temas predominantes durante o processo. Porém, em que pesem as pressões advindas da sociedade, e mesmo no interior do grupo, prevalece a posição do Ministro Franklin Martins, tanto na indicação pelo Presidente do diretor-presidente da Empresa, bem como do primeiro Conselho Curador172.

Eu era contra porque eleição na sociedade é uma coisa muito genérica. Como você vai organizar e garantir que aquilo representa a sociedade? Quer dizer, ao contrário, eu acho que o governo devia indicar, mas o governo devia indicar procurando ter critérios plurais do ponto de vista político, do ponto de vista de experiências, do ponto de vista regional, etc. Até porque, eu acho que se montou um conselho curador muito representativo, amplo e que, aos trancos e barrancos, com as dificuldades, ajudou muito a EBC... (MARTINS, 2013, p. 07)

171

Dentre as quais, o Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes); a Central Única dos Trabalhadores (CUT); a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ); a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Radiodifusão e Televisão (Fitert); a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel); o Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos (FENDH); o Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações (FNDC); o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH); o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) etc.

172 Ao primeiro Conselho Curador é atribuído o papel de definir e acompanhar o processo de consulta pública

Para Leal Filho, diante do escasso tempo disponível e da necessidade de equacionar complexas questões para a construção da nova entidade, a ênfase no debate acerca dos mecanismos de controle acaba por reduzir a reflexão sobre o perfil da Empresa e seus objetivos. (VALENTE, 2009a) Acreditamos que a superficialidade das discussões sobre estes dois importantes temas influenciam negativamente o projeto de implantação. A ausência de um delineamento preciso quanto aos principais objetivos das emissoras que compunham a Empresa Brasil de Comunicação – centrada em aspectos como missão, programação e modelos de negócio – gera, posteriormente, uma série de divergências entre os protagonistas envolvidos no processo.

3.1.1.2 A escolha dos dirigentes e setores de atuação

A composição da Diretoria Executiva, incluindo o cargo de Diretor-presidente, da entidade que consubstanciaria o projeto de um sistema público de comunicação do Governo Federal, se dá simultaneamente à formulação do instrumento legal que a define. Conforme o depoimento de Franklin Martins,

A indicação dos nomes foi uma visão de fazer participar do processo de construção da primeira diretoria que representasse, na verdade, todas as áreas do setor público que estavam envolvidas no projeto. Quer dizer, a presidente, a Tereza Cruvinel, uma jornalista de grande prestígio em Brasília, uma profissional muito competente, uma pessoa que tinha uma ligação histórica com informação, com comunicação, foi, vamos dizer, a Secom que indicou. Embora, formalmente, tenha sido a Secom que indicou todos os nomes, por exemplo, o diretor geral já era alguém da cultura, aí, uma outra pessoa era da área da antiga Radiobrás, quer dizer, se procurou fazer uma diretoria, que, vamos dizer, conseguisse trazer para dentro do projeto da EBC as diferentes experiências. (MARTINS, 2013, p. 05)

Ao entregar o projeto à Secom-PR, o presidente Lula recomenda que a equipe do Ministério da Cultura seja integrada ao grupo de trabalho e participe de sua implantação (CRUVINEL, 2013). Da equipe oriunda do Ministério da Cultura, são designados três ocupantes para diferentes postos: o então Secretário do Audiovisual Orlando Senna, o assessor Mário Borgneth e Leopoldo Nunes, ex-chefe de gabinete da SAv e então diretor da Ancine. Por sua liderança no decorrer do I Fórum Nacional de TVs Públicas, Senna é nomeado diretor-geral, segundo posto de comando mais alto da empresa, abaixo apenas da presidência. Por sua vez, Borgneth – que além de coordenar o Fórum, possui uma intensa

relação com as emissoras educativas estaduais, especialmente em função de sua atuação no DocTV – torna-se diretor de relacionamento e rede. Por fim, Nunes assume a direção de programação e conteúdo, devido a seu histórico de militância no setor audiovisual e atuação no GTI.

Também a Radiobrás atua de forma destacada na formulação do projeto173. Como a estrutura da futura EBC prevê uma diretoria de serviços, voltada para prestação de serviços a terceiros, por contrato e remuneração, inclusive ao próprio Governo, o jornalista José Roberto Garcez, então diretor-presidente da Radiobrás, é admitido no posto. Já o seu diretor de suporte, Roberto Gontijo, torna-se diretor interino de suporte e operações da EBC, e é efetivado em seguida.

Completam a equipe o então assessor da Secretaria da Presidência Delcimar Pires e a jornalista Helena Chagas. Indicado para o cargo de diretor administrativo-financeiro, Pires é economista e mestre em administração pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e, além de coordenar o GTI, também participa ativamente do Fórum. Já Helena Chagas – que havia trabalhado junto ao então Ministro Franklin Martins nas Organizações Globo, assim como à futura diretora-presidente –, assume a diretoria de jornalismo. Este é o único cargo que Martins reivindica ocupar (CRUVINEL, 2013). Jonas Valente (2009a, p. 127) observa que a “negociação entre Secom e MinC não tem apenas caráter numérico, mas reservou aos respectivos indicados as áreas de interesse de cada órgão: o primeiro passou a comandar a produção de informação e o segundo dos conteúdos culturais”.

Embora tenha contribuído para o projeto nas etapas que antecedem a concretização da nova entidade, a diretoria da Acerp é excluída desta divisão de cargos. Em depoimento, Beth Carmona relata que sua participação nas discussões se dá “um pouco à margem”. (2013, p. 16) Acerca das relações entre a entidade que presidia e seu órgão supervisor, a Secom-PR, após a assunção do ministro Franklin Martins, ela relata:

[...] sempre fui muito aberta, franca, mostrei os livros que a gente estava lançando, mostrei o prédio, expliquei tudo, expliquei um pouco o nosso pensamento, mas ele dizia: ‘Isso é passado, agora nós temos que olhar para a frente.’ Então, ele não teve nenhuma relação mais direta, ou não teve, talvez, nenhuma identidade com o trabalho que a gente estava fazendo. E ele já

173 Como visto, durante o I Fórum Nacional de TVs Públicas, a antiga empresa a ser incorporada participa

ativamente do processo, em especial na pessoa de seu ex-presidente Eugênio Bucci, do então diretor de jornalismo José Roberto Garcez, do diretor jurídico Bruno Vichi e Rodrigo Savazoni, editor chefe da Agência Brasil (BRASIL, 2007a). Com o afastamento de Bucci em abril de 2007, José Roberto Garcez assume a presidência da Radiobrás.

deveria ter alguma coisa traçada com Ministério da Cultura tanto que a primeira direção foi compartilhada (2013, p 16).

De fato, naquele momento, a decisão política de se criar uma nova emissora já é notória e corroborada por diversas ações no âmbito do Governo Federal, conforme já citado. Neste sentido, a oposição de Beth Carmona diante da perspectiva de extinção da TVE Brasil, manifestada de forma reiterada (2013), certamente contribui para a ausência de identidade com o projeto do Ministro Franklin Martins.

Em relação à escolha do diretor-presidente da EBC, antes de Tereza Cruvinel, algumas personalidades são consultadas. Dentre elas, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo – que recusa o convite por razões pessoais, mas aceita integrar o Conselho Curador da entidade –, o cientista Ennio Candotti e o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence (JORNALISTA..., 2007). É interessante perceber que todos os indicados são inexperientes quanto à gestão ou militância no campo público de televisão e, à exceção de Tereza Cruvinel, que veio a efetivar-se no posto, sequer atuam no campo da comunicação. Franklin Martins (2013, p. 06-07, grifos nossos) explicita os critérios adotados:

A TV pública também não tinha um nome nacional de peso, que ao mesmo

tempo tivesse experiência. (...) A Tereza era talvez, se não a principal, mas

uma das principais colunistas políticas do país. Era uma pessoa com nome,

uma pessoa com trânsito. Eu lhe digo, eu acho que se não fosse a Tereza eu

não sei se o projeto teria passado no congresso. Precisava ter uma coisa clara, também, que não era, vamos dizer, um militante do PT que estava sendo posto ali. Ela tinha uma respeitabilidade, uma capacidade profissional

absolutamente reconhecida, muita gente se espantou: ‘Como se larga uma

posição que se tem na grande imprensa, para assumir um projeto como esse?’. O que tem a ver, a meu ver, com o caráter dela, com o desprendimento dela, com o espírito público que ela tem. Eu acho que ela foi um nome, eu acho, ótimo para aquele período.

São reforçadas características do futuro dirigente da EBC, que, sob o ponto de vista do ex-Ministro, são necessárias para garantir a legitimidade da instituição: notoriedade; perfil técnico e distanciado da militância político-partidária; e trânsito no poder legislativo. Com base em sua declaração, aferimos que estes atributos prevalecem em relação ao outros como a