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H ISTÓRIA DAS M ENTALIDADES E H ISTÓRIA C ULTURAL

No documento Dominios da Historia Ciro Flamarion Cardos (páginas 102-129)

Ronaldo Vainfas

Pour en finir avec les mentalités: eis o tulo da tradução francesa X do livro do historiador britânico Geoffrey Lloyd, resenhado por Roger Char er no Le Monde de 15 de abril de 1994. O próprio tulo dá bem a medida dos obje vos do autor: suprimir as mentalidades como objeto da história, sob a alegação de que elas exprimem um equívoco teórico. Segundo Lloyd, o enfoque das mentalidades supõe erroneamente uma coerência fic cia e estável de sen mentos e idéias numa dada sociedade em prejuízo da pluralidade de sistemas de crenças e racionalidades que coexistem no interior de uma mesma cultura, comunidade ou indivíduo.

A crí ca de Lloyd não é nova. Muitos a fizeram e ainda a fazem de diversas maneiras, alvejando diversos aspectos das mentalidades desde os anos 70, década em que a história das mentalidades procurou afirmar-se como campo ou disciplina específica do conhecimento histórico. Nos anos 70, por exemplo, era o grande historiador francês Pierre Vilar quem condenava seu colega Michel Vovelle por estudar a “festa revolucionária” e não a própria Revolução Francesa e a luta de classes nela presente. Nos anos 80, para retornar aos exemplos britânicos, foi a vez de Stuart Clark duvidar da competência antropológica dos historiadores franceses da fei çaria, cri cados por esposar, desde Bloch e Febvre, um conceito ultrapassado de “mentalidade pré-lógica” (ou primi va), herança da obra de Lévy-Bruhl, ao tratarem da alteridade cultural no tempo.1 Entre nós, historiadores brasileiros, a crí ca só veio no final da

década, porque foi também tardia a difusão das mentalidades na pesquisa universitária nacional. Foi Ciro Flamarion Cardoso quem a fez de maneira mais aguda em um de seus Ensaios racionalistas, acusando os historiadores das mentalidades de se dedicarem ao estudo do periférico, de iluminar fantasmas e, sobretudo, de negar as totalidades sinté cas da história, renunciando a posturas explica vas e propagandeando uma história “reacionária” desprovida de contradições.2

A história das mentalidades, disciplina genuinamente francesa, tem cumprido, pois, uma trajetória peculiar. Contestada desde o início, na França e alhures, quer por afastar-se da tradição dos Annales, quer por dela herdar os defeitos. Cri cada por ser “demasiadamente antropológica”, ao privilegiar a estagnação das estruturas na longa duração, ou condenada, pelo contrário, por ser “insuficientemente antropológica”, ao

julgar o ou llage mental de sociedades passadas à luz da racionalidade contemporânea. Acusada de ser pretensiosamente “nova”, seja por instaurar modismos tão atraentes quanto passageiros, seja por reeditar o an go es lo historizante de fazer história, o factualismo, a narrativa memorialista etc.

Não resta dúvida de que, ao menos aparentemente, os crí cos das mentalidades triunfaram, pois é raríssimo hoje em dia algum historiador francês admi r ser um “historiador das mentalidades”, sem falar nos que se refugiaram em outros campos (história da cultura, da vida privada etc.) ou conceitos (cultura popular, imaginário etc.), reconhecendo a ambigüidade ou fragilidade teórica das mentalidades. No entanto, é notável o contraste entre o desgaste da noção de mentalidades no vocabulário dos historiadores e o extraordinário vigor dos estudos sobre o mental, ainda que sob novos rótulos e com outras roupagens. A bem da verdade, as mentalidades prevaleceram e con nuam a inspirar inúmeros programas de pesquisa em diversos países — e não só na França —, não obstante a assimilação das crí cas que há mais de 20 anos têm sido feitas a esse campo do saber histórico.

Considerado o estado atual do debate, no qual o declínio da expressão mentalidades convive paradoxalmente com um campo de estudos cada vez mais prolífico a elas dedicado, o presente capítulo deter-se-á na exposição de quatro questões centrais: (1) a contextualização da história das mentalidades no quadro maior da historiografia francesa filiada ao movimento dos Annales; (2) o exame dos pressupostos conceituais da história das mentalidades, suas potencialidades e insuficiências, com atenção à diversidade de tendências que a história das mentalidades sempre apresentou, desde o começo, apesar da tenta va de muitos de seus crí cos em caracterizá-la de forma homogênea, quando não estereo pada; (3) a delimitação dos campos que, em certo sen do, sucederam a história das mentalidades, dela diferindo teoricamente ou simplesmente reeditando seus pressupostos com outras denominações, enfa zando-se especialmente a chamada história cultural, também ela muito diversa em tendências; (4) uma avaliação sumária da adoção das mentalidades e da história cultural pela historiografia brasileira a par r dos anos 80, considerando as possíveis relações entre a importação das problemá cas da Nova História e certas abordagens da tradição historiográfica nacional.

As mentalidades no quadro da historiografia dos Annales

História das mentalidades, filha dileta da “escola dos Annales”, eis um juízo várias vezes reiterado e apregoado pelos historiadores franceses nos anos 70, tempo em que, bem ou mal, celebrava-se a história das mentalidades como a prima donna da chamada Nova História. Trata-se, na realidade, de um juízo só parcialmente verdadeiro. Verdadeiro porque, queira-se ou não, a preocupação com “os modos de sen r e pensar” ocupou a atenção dos annalistes desde os primórdios da revista Annales, quando não antes, nos estudos de Marc Bloch e de Lucien Febvre produzidos na década de 1920. Além do mais, é preciso lembrar que, apesar das várias mudanças por que passou a historiografia francesa nos úl mos 60 anos, os estudiosos das mentalidades sempre se reconheceram como herdeiros contemporâneos de Bloch e de Febvre, por muitos

chamados de “os pais fundadores” da chamada Nova História produzida na França. Enfim, conforme diz Roger Char er em seu A história cultural, o próprio termo mentalité, usado para exprimir algo próximo a uma psicologia histórica cole va, sempre foi de di cil tradução em outras línguas que não o francês, prestando-se a confusões e indicando, por isso, ser uma fórmula tipicamente francesa de pensar as questões.3

Mas o reconhecimento das mentalidades como herdeira preferida dos Annales não deve ser exagerado, pois também é certo que, em algumas de suas tendências, a história das mentalidades realmente rompeu com o espírito de síntese que animava os annalistes ao tempo em que ques onavam a história “historicizante” na passagem do século XIX ao XX. No mínimo por apegar-se a temas inscritos no “terceiro nível” da estrutura social, para usar a expressão com que Vovelle se referia às mentalidades, a historiografia francesa da década de 1970 em diante afastou-se tema camente dos recortes sinté cos valorizados por Febvre, Bloch e, sobretudo, por Fernand Braudel, historiador-mor dos Annales desde meados dos anos 50 até 1969, ano em que se aposentou.

Denominada por muitos como “Escola dos Annales”, o grupo de historiadores liderados por Bloch e Febvre se cons tuiu, antes de tudo, como um movimento, conforme destaca Jacques Revel.4 Uma sensibilidade, um conjunto de estratégias

voltadas para combater o po de história que se fazia na França e que dominava a universidade no início do atual século. A esta história os “fundadores” dos Annales chamavam de historicizante ou événementielle, e alguns qualificam um tanto impropriamente de posi vista. Febvre e Bloch comba am, pois, uma história somente preocupada com os fatos singulares, sobretudo com os de natureza polí ca, diplomá ca e militar. Comba am uma história que, pretendendo-se cien fica, tomava como critério de cien ficidade a verdade dos fatos, à qual se poderia chegar mediante a análise de documentos verdadeiros e autên cos (ficando os “men rosos” e falsos à margem da pesquisa histórica) — história que nha na Introduc on aux études historiques de Langlois e Seignobos (1897) o seu exemplo maior e principal alvo da crí ca. Comba am, enfim, uma história que se furtava ao diálogo com as demais ciências humanas, a antropologia, a psicologia, a lingüís ca, a geografia, a economia e, sobretudo, a sociologia, rainha das disciplinas humanísticas na França desde a obra de Durkheim.

Contra a tal história historicizante, Febvre e Bloch opunham uma assim chamada história nova, uma história problema zadora do social, preocupada com as massas anônimas, seus modos de viver, sen r e pensar. Uma história de estruturas em movimento, com grande ênfase no estudo das condições de vida material, embora sem qualquer reconhecimento da determinância do econômico na totalidade social, ao contrário do proposto pela concepção marxista da história. Uma história preocupada, enfim, não com a apologia de príncipes ou generais em feitos singulares, senão com a sociedade global, e com a reconstrução dos fatos em série passível de compreensão e explicação.

Animava os fundadores dos Annales a perspec va de construir uma história interdisciplinar, mo vação nutrida nos contatos de Febvre ou de Bloch com o geógrafo Paul Vidal de la Blache, o antropólogo Lucien Lévy-Bruhl, o lingüista Antoine Meillet, o historiador da arte Émile Mâle e muitos outros estudiosos igualmente preocupados com

a interdisciplinaridade. O espírito de síntese interdisciplinar que inspirava os fundadores da história nova apareceu resumido no ar go de um sociólogo, François Simiand, que no seu “Méthode Historique et Science Sociale” propôs um programa des nado a situar a história no seio das demais ciências sociais, o que fez combatendo acidamente o “discurso tradicional” de Seignobos na sua úl ma versão de 1901 (Méthode historique appliquée aux sciences sociales). O ar go de Simiand foi publicado em 1903 na então novíssima Revue de Synthèse Historique, revista fundada por Henri Berr na qual Bloch e Febvre colaboraram até 1926.

Foi com base neste ânimo de combate e renovação da pesquisa histórica que Febvre e Bloch fundaram, em 1929, a revista Annales d’Histoire Économique et Sociale, primeiro nome do famoso periódico que acabaria por se estender ao próprio movimento d a história nova francesa. Não resta dúvida de que a fundação dos Annales foi movimento dos mais pro cuos na historiografia mundial, tão pro cuo que Peter Burke o chamou de “a Revolução Francesa da historiografia”, sub tulo de seu recente livro sobre os historiadores franceses.5 Sem desmerecer outras correntes, nem tampouco os centros

e publicações historiográficas que se afirmaram em outros países, antes e depois dos Annales, a história nova francesa talvez tenha sido a que mais irrigou e inspirou a pesquisa e a reflexão historiográfica mundial nas últimas décadas.

No entanto, vale dizer que os combates de Bloch e Febvre e o movimento historiográfico que es mularam nos anos 20 foram em parte injustos com a historiografia do século XIX e mesmo com a que havia no início do século. Se um historiador como o alemão Leopold Von Ranke realmente marginalizou o que se poderia chamar de história sociocultural (embora também ele se interessasse pela arte, religião e sociedade, e não só pelo polí co), inúmeros historiadores do século XIX e início do XX deram contribuição ines mável à renovação dos estudos historiográficos. Sem eles não se poderia compreender nem o surgimento dos Annales, nem a preocupação com as mentalidades, que desde cedo se fez notar. Foi o caso de Burckhardt e de seu estudo sobre o Renascimento (1860), no qual a história aparece interpretada à luz da interação do Estado, da religião e da cultura. Foi o caso do inglês Edward Gibbon com sua história sociocultural do império romano, e de muitos autores não-franceses. E, mesmo no caso da França, não faltam exemplos de autores que problema zaram a história em diversos campos do social, e isto em pleno século XIX: Michelet e seus estudos sobre o Renascimento e sobre a ação popular na Revolução Francesa; Fustel de Coulanges e sua obra clássica sobre religião e família na An güidade grega; Henri Sée e a história econômica do An go Regime... A lista seria infindável, de modo que não resta dúvida de que os primeiros annalistes estereo param, em parte, a historiografia oitocen sta com o fito de acentuarem a novidade de suas propostas.

Seja como for, e não obstante o predomínio do espírito de síntese e a busca de uma história totalizante, a preocupação com as mentalidades apareceu muito cedo nos Annales, conforme indica a produção historiográfica dos próprios fundadores. Marc Bloch, por exemplo, celebrizado pelos estudos rurais em perspec va compara va, e par cularmente pelo clássico La société feodale, escrito nos anos 30 (traduzido pela Edições 70 portuguesa), foi verdadeiramente precursor da história das mentalidades e de uma espécie de antropologia polí ca ao escrever Les rois thaumaturges. Trata-se de obra

publicada em 1924 — antes, portanto, da fundação dos Annales —, na qual Bloch examina as crenças populares no poder cura vo do toque real desde a Idade Média ao século XVIII, comparando as monarquias francesa e inglesa. Quanto a Lucien Febvre, que já havia enveredado por algo próximo à psicologia histórica em seu Un des n, Mar n Luther (1928), esboçou uma verdadeira teoria dos modos de pensar e sen r no século XVI europeu através do conceito de ou llage mental — inspirado no conceito de mentalidade primi va ou pré-lógica de Lévy Bruhl, o que fez na sua obra clássica Le problème de l’incroyance au XVIe siècle: la religion de Rabelais (1942).

Bloch e Febvre inauguraram, pois, nos primórdios dos Annales, o estudo das mentalidades, delas fazendo um legí mo objeto de inves gação histórica. Mas não se pense que foram eles os primeiros a se dedicarem ao estudo de sen mentos, crenças e costumes na historiografia ocidental. Para citar apenas alguns autores que lhes antecederam ou foram deles contemporâneos nessas preocupações, vale lembrar o próprio Michelet, autor de La sorcière, em 1862 (traduzido em Portugal), e o importante Georges Lefebvre, autor de La grande peur, livro sobre a onda de pânico que varreu a França rural no contexto revolucionário francês. E se for o caso de dar exemplos fora da França, não se pode esquecer do grande historiador holandês Johan Huizinga, autor de O outono da Idade Média (de que há várias traduções), obra publicada em 1919 sobre sen mentos, costumes e religiosidades na França e nos Países Baixos nos séculos XIV e XV, nem de Norbert Elias, sociólogo e historiador alemão que, antecipando-se a Foucault em décadas, publicou em 1939 o seu 0 processo civilizador, livro sobre a sociedade de corte e o surgimento da etiqueta na Europa moderna.

Precursores à parte, o fato é que Bloch e Febvre se interessaram — e muito — pelo problema das mentalidades na história, embora condicionassem o seu estudo a uma perspec va globalizante e sinté ca de história social. Assim sendo, não é exato dizer que o surgimento da história das mentalidades em fins dos anos 60 tenha rompido totalmente com a tradição dos Annales e com as concepções dos fundadores da história nova. Ao menos no tocante à valorização de certos temas ligados à religiosidade, aos sen mentos e aos rituais, o que parece ter ocorrido foi, não uma ruptura, senão uma retomada, nos úl mos 20 ou 30 anos, de an gas preocupações de Febvre e Bloch quanto ao estudo do mental.

O nó da questão parece situar-se no período que Peter Burke chamou de “a era Braudel” (1956-1969), tempo em que o principal discípulo de Lucien Febvre comandou a produção historiográfica francesa, controlando postos-chave nas ins tuições universitárias e de pesquisa daquele país, a exemplo do Collège de France, da École des Hautes Études etc. A influência de Braudel foi então imensa, quer intelectual, quer ins tucionalmente, imprimindo a sua marca nesta segunda fase da história dos Annales. Numa visão de conjunto, é inegável que a dita “era Braudel” representou um adensamento da problematização teórica dos Annales e uma consolidação do espírito de síntese que animava o “fazer história” de Bloch e de Febvre. No entanto, foi justamente nessa fase que se viram eclipsadas, por assim dizer, as fortes preocupações que os primeiros annalistes sempre dedicaram às mentalidades na história.

Autor de vasta e importante obra, Braudel celebrizou-se com a publicação de sua monumental tese de doutorado, em 1949, “La Méditerranée et le monde méditerranéen

à 1’époque de Philippe II”. Vale dizer que a primeira versão da tese, que viria a ser defendida em 1947, fora elaborada durante a Segunda Guerra Mundial, tempo em que o autor permaneceu prisioneiro dos alemães num campo perto de Lubeck, de onde enviava os manuscritos para Lucien Febvre. Sem bibliotecas e contando apenas com sua prodigiosa memória, Braudel concebeu ali a estrutura de sua tese doutorai, o que não deixa de ser absolutamente notável.

O que interessa frisar, no entanto, é que foi no Mediterrâneo que Braudel não só expôs uma pesquisa extraordinária sobre economia e sociedade no mundo mediterrânico durante a segunda metade do século XVI como apresentou a sua própria concepção de história, par cularmente a sua problema zação original do espaço e do tempo históricos. No tocante ao espaço, aprofundou o estudo sobre as relações entre o meio ambiente e a vida material, chegando mesmo, no limite, a sugerir uma espécie de determinismo geográfico na estrutura e dinâmica das sociedades. No tocante ao tempo, desenvolveu, na própria divisão da obra, suas hipóteses sobre os diversos tempos que se cruzam na história das sociedades. Com efeito, a primeira parte do Mediterrâneo é dedicada ao tempo longo, à “história quase sem tempo” da relação entre o homem e o ambiente geográfico; a segunda parte se volta para o tempo médio, à história cambiante das conjunturas econômicas, sociais e polí cas; e a terceira parte se liga ao tempo curto dos acontecimentos, a an ga história événementielle subordinada, porém, à uma visão totalizante das estruturas sociais.

“Meu grande problema, o único problema, a resolver é demonstrar que o tempo avança com diferentes velocidades”, eis o que afirmou certa vez Braudel, ancorado em sua pesquisa e hipóteses teóricas sobre tempo e história. Foram essas preocupações que o levaram a escrever o famoso ar go “A Longa Duração”, publicado em 1958, texto em que formulou com ni dez a sua teoria sobre os três tempos da história, aprofundando o tempo da longa duração: tempo das estruturas, tempo quase imóvel da relação entre o homem e a natureza.6

A problema zação braudeliana do tempo longo é de importância crucial para o assunto do presente capítulo sobre as mentalidades. Afinal, foi no texto de 1958 que Braudel introduziu o estruturalismo de Lévi-Strauss na teoria histórica dos Annales, relacionando as tenazes prisões de longa duração que a geografia impunha universalmente ao homem com a noção de estrutura do antropólogo francês.

E convém não esquecer que a longa duração seria conceito caríssimo à concepção de mentalidades, concebidas como estruturas de crenças e comportamentos que mudam muito lentamente, tendendo por vezes à inércia e à estagnação.

Mas não obstante Braudel tenha fornecido valiosos instrumentos teóricos para os futuros historiadores das mentalidades, “a era Braudel” foi em tudo avessa ao estudo do mental. Em sua vasta obra, incluindo o modelo de história total apresentado no Mediterrâneo, o autor pouco deu atenção aos usos e mores das sociedades estudadas, e concebeu sempre a longa duração como um domínio temporal basicamente ligado às relações entre o homem, a geografia e as condições da vida material. Manteve-se fiel, portanto, à concepção sinté ca da história presente em Febvre e Bloch, conferindo-lhe mesmo uma densidade conceitual antes ausente. Deles se afastou, no entanto, ao “marginalizar” o estudo das mentalidades que tanto agradava aos fundadores da história

nova.

A “era Braudel” caracterizou-se, portanto, pela produção de grandes obras de história total, histórias sinté cas, ainda que recortadas monograficamente, com grande ênfase nos aspectos socioeconômicos e suas relações com o meio geográfico. É nela que se incluem, por exemplo, as obras de Pierre Chaunu, Seville et l’Atlan que (1955-1960) e de Fréderic Mauro, Le Portugal et l’Atlan que au XVIIe siècle (1960), livros muito

inspirados no enfoque braudeliano do Mediterrâneo. É nessa fase que se pode verificar,

No documento Dominios da Historia Ciro Flamarion Cardos (páginas 102-129)