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3 FRAMEWORK TEÓRICO E HIPÓTESES DE PESQUISA

3.2 Hipóteses de moderação

Grupos de usuários, que dão origem a comunidades de marca se formam com o propósito de trocar experiências, resolver problemas, aprender sobre novas tecnologias e até fofocar sobre o setor em que estão envolvidos. Esses grupos de usuários virtuais podem se formar espontaneamente ou por iniciativa da marca ou empresa que os une/suporta, sendo que os grupos formados espontaneamente tendem a ter suas origens em entusiastas da marca (MCWILLIAN, 2000). Dentre as muitas diferenças existentes entre as comunidades gerenciadas pelos consumidores e pela empresa, provavelmente a mais latente delas resida no próprio motivo de sua criação, gerando um novo tópico de interesse dentro do tema comunidades de marca. Essa diferença principal se dá não apenas pelo foco ou força que origina a comunidade, mas também pelo propósito a que as mesmas se prestam devido a sua origem. Enquanto as comunidades gerenciadas pelas organizações são criadas para cumprir determinados objetivos de marketing (LI e BERNOFF, 2008), aquelas criadas pelos consumidores geralmente baseiam-se em uma grande paixão pela marca. Nasceram e cresceram apenas para propósitos sociais e informacionais com relação a essa.

A questão sobre criar ou deixar que sejam criadas comunidades de consumidores está na pauta de muitos gerentes de marketing atualmente. O fato de as comunidades gerenciadas pelos consumidores muitas vezes estarem fora do controle das empresas, inclusive em termos de conteúdo, tem feito com que muitas organizações estejam auxiliando indiretamente comunidades suportadas pelos consumidores. O que pode ocorrer através da disponibilização de recursos e locais para eventos ou através da participação de seus funcionários no auxílio à solução de dúvidas e problemas propostos pelos membros da comunidade (ALMEIDA et al, 2006).

Outras empresas ainda preferem unir seus consumidores através das chamadas comunidades patrocinadas pela empresa, para que os grupos formados pelos próprios consumidores on-line não venham a ameaçar a identidade e reputação da marca. Um exemplo disso é o que ocorreu com a notoriedade do comportamento fora da lei dos motoqueiros da Harley-Davidson. Como resposta a esse comportamento, a Harley criou os Harley User Groups (HOGs) com uma imagem mais respeitável e dentro da lei (MCWILLIAN, 2000).

Assim, o fato de as comunidades serem criadas e gerenciadas pelos próprios consumidores ou pela organização é uma questão fundamental sobre a qual estas mostram as suas diferenças. Claramente, os dois tipos de comunidades também compartilham alguns aspectos comuns, como o fato de serem formadas por fãs da marca. Além disso, muitas empresas atualmente possuem comunidades de marca oficiais, ou seja, patrocinadas pela empresa, e não-oficiais, ou seja, gerenciadas e mantidas por grupos de consumidores entusiastas, como o software SPSS e produtos da National Instruments. Isso porque muitas comunidades de marca, sobretudo baseadas em produtos de alta tecnologia, têm surgido independentemente da ação da empresa (GRUEN et al, 2005). Resultados do estudo exploratório desenvolvido para este trabalho também revelam que no caso dessas organizações com os dois tipos de comunidades, alguns participantes mantêm-se ativos em ambas as comunidades, principalmente aqueles interessados em novidades e informações sobre a marca e seus concorrentes. Entretanto, Gruen et al (2005) ressaltam que o fato de a comunidade ser patrocinada pela empresa ou gerenciada pelo consumidor pode gerar diferenças nas trocas entre os consumidores, afetando, inclusive, a força dos efeitos positivos das trocas sobre os resultados comportamentais esperados.

Muitas empresas utilizam as comunidades como fonte de idéias para desenvolvimento de novos produtos; como espaços de cocriação e coprodução de design de produtos; como laboratórios de teste de protótipos de produto ou serviços de suporte ao produto; e para discutir as suas funções, dando informações e sugerindo melhorias (NAMBISAN e BARON, 2007). Esta última função é a mais comumente observada. Com base nessas atividades, as comunidades também se mostram efetivas como avenidas para aumentar a lealdade dos participantes à marca ou à empresa (MCALEXANDER et al, 2002; ALGESHEIMER et al, 2005) e o comportamento de consumo (ALGESHEIMER e DHOLAKIA, 2006; ALGESHEIMER et al, 2005).

Embora os consumidores escolham a comunidade a que querem pertencer, gerenciada por outros consumidores ou pela empresa, por parte dos administradores das comunidades gerenciadas pelas empresas já é bastante usual usar as ferramentas de marketing direto como convites por e-mail para encorajar determinados segmentos selecionados de consumidores a participar na comunidade (ALGESHEIMER et al, 2005). Consequentemente, os consumidores são recrutados para participar das comunidades, tendo como base procedimentos com um alvo predefinido, e as facilidades dadas aos participantes são desenhadas para cumprir esses objetivos. Não é incomum que as empresas estabeleçam variáveis de segmentação como variáveis demográficas para recrutar participantes (HENNING, 2008), uma vez que as comunidades de marcas suportadas pelas empresas geralmente são parte estruturada do seu plano e política de marketing (ALMEIDA et al, 2006).

As comunidades gerenciadas pelos consumidores, por outro lado, raramente especificam objetivos de marketing. Ao contrário, os administradores dessas comunidades buscam expressar seu vínculo afetivo, dedicação e ligação com a marca através da criação e administração da comunidade, que geralmente é mais um espaço aberto em que todos os fãs da marca são bem-vindos. Entretanto, algumas vezes, essas comunidades criam, muito mais por evolução que por premeditação, uma aglomeração de pessoas com um perfil distinto daquele que é o foco da comunidade suportada pela empresa. Os participantes, nesse contexto, elegem a comunidade e filiam-se a ela por também compartilharem a mesma paixão pela marca, o que geralmente também resulta em valores, hobbies, interesses e estilos de vida compartilhados (SCHOUTEN e MCALEXANDER, 1995; MUÑIZ e SCHAU, 2005). Essas diferenças sugerem a possibilidade de que os consumidores em comunidades gerenciadas pela empresa devam ser mais similares uns aos outros em termos de características demográficas, e aqueles em comunidades gerenciadas pelos consumidores tendem a compartilhar mais características psicográficas.

O estudo netnográfico realizado com membros de comunidades gerenciadas pela empresa e pelos consumidores para o XBOX da Microsoft e LabView (software para uso profissional) da National Instruments, como fase exploratória deste trabalho, concluiu que as comunidades gerenciadas pelos consumidores do jogo Microsoft XBOX, por exemplo, recebem consumidores mais velhos que apreciam o jogo. E, também, que têm poucas conexões de perfil e de interesses para com os consumidores adolescentes que são o consumidor-alvo da

comunidade gerenciada pela empresa. Fato que pode comprovar essa hipótese é que nas comunidades da plataforma XBOX estudadas, a comunidade gerenciada pela Microsoft (FMC5) parecia ser desenhada para um grupo de hardcore gamers com idades entre 15 e 28

anos. Segundo Dholakia (2008), em condições em que um grupo é relativamente homogêneo em uma dimensão em particular, os indivíduos que são diferentes relativamente a esse quesito tendem a desertar. Pesquisas anteriores mostram que tais indivíduos sentem-se menos confortáveis nas interações com os demais membros e menos integrados socialmente ao grupo (BARSADE e GIBSON, 1998).

Em contraste à comunidade gerenciada pela Microsoft, o que se percebeu nas comunidades gerenciadas pelos consumidores estudadas é que os participantes tendiam a ser mais velhos e não relacionados ao perfil tradicional do jogador de videogame focado pela empresa. Esse fato pôde ser evidenciado pelas conversações que eram mantidas entre os participantes, e que discutiam valores e interesses comuns além da marca, através de artigos relacionados aos problemas nacionais e internacionais correntes, inclusive argumentando que os políticos deveriam banir os jogos violentos. Uma implicação prática desse achado é que as comunidades gerenciadas pelos consumidores (CMC6) podem prover informações valiosas no

que tange a grupos de consumidores que estavam sendo deixados de lado pelas empresas em suas comunidades.

Assim, especificadamente, o que se espera é que os efeitos positivos da homogeneidade demográfica percebida nos participantes sejam mais fortes para os membros das FMC e que as suas médias sejam mais altas. Esse fenômeno também deve se manifestar através de ligações positivas mais significativas na relação entre homogeneidade demográfica percebida e nível de participação na comunidade e identificação com a comunidade para membros da FMC. Com relação à homogeneidade psicográfica percebida, o que se espera é um efeito positivo mais forte para os membros da CMC, conforme embasamento teórico elucidado anteriormente. Novamente, esse fenômeno resultaria em ligações positivas mais significativas para membros da CMC. Dessa forma, o conjunto de consideração analisado dá suporte à proposição das seguintes hipóteses de pesquisa:

5

FMC = firm managed communities - a sigla será utilizada para referir-se a comunidades gerenciadas pelas organizações.

6 CMC = consumer managed communities - a sigla será utilizada para referir-se a comunidades gerenciadas

H10: A percepção de Homogeneidade Demográfica será maior para participantes da comunidade gerenciada pela empresa.

H11: A percepção de Homogeneidade Psicográfica será maior para membros da comunidade gerenciada pelos consumidores.

H12: O impacto positivo da Homogeneidade Demográfica Percebida (a) no Nível de Participação na Comunidade e (b) na Identificação com a Comunidade será mais forte para membros da comunidade gerenciada pela empresa.

H13: O impacto positivo da Homogeneidade Psicográfica Percebida (a) no Nível de Participação na Comunidade e (b) na Identificação com a Comunidade será mais forte para membros da comunidade gerenciada pelos consumidores.

A segunda diferença entre os dois tipos de comunidades aqui discutidos refere-se ao papel desenvolvido e às restrições impostas pelos seus administradores. No caso de a comunidade ser patrocinada pela empresa, ela deverá gerar benefícios tangíveis para a marca, e os gerentes profissionais dessas comunidades são guiados pelos objetivos de marketing da mesma, sendo que muitas vezes buscam consistência entre a comunidade e outros programas de marketing organizacionais. Dessa forma, algumas vezes, a ênfase dá-se no ajuste entre o tom e o conteúdo da comunicação dos membros da comunidade e as outras formas de comunicação da empresa (WEBER, 2007).

Porter e Donthu (2008) mencionam que os consumidores estão cientes do contexto comercial das comunidades gerenciadas pelas empresas e não reduzem o seu nível de confiança por isso. Entretanto, para que a confiança não seja reduzida, Pitta e Fowler (2005) observam que o fórum de discussões da comunidade deve permanecer neutro para as ações e discussões da comunidade, pois um fórum independente mantém a sua credibilidade. Assim, Bickart e Schindler (2001) sugerem que a empresa pode satisfazer as necessidades de seus consumidores por discussões virtuais, provendo ligações para fóruns de discussão dos produtos da empresa, para comunidades suportadas pelos consumidores ou para comunidades suportadas pela própria empresa. Entretanto, na última opção, deve-se tomar cuidado para não manipular as discussões, e também para lidar com os aspectos negativos do produto que podem aparecer. Tomar parte em uma discussão de maneira parcial pode destruir os fóruns de discussão das empresas e a credibilidade das comunidades.

As comunidades de marca suportadas pela empresa devem encontrar um balanço entre a liberdade de discurso dos consumidores e a moderação. A não-permissão de comentários negativos pode fazer como que a comunidade seja vista como tendenciosa e seus membros queiram migrar para as comunidades mantidas pelos consumidores. Para tanto, a melhor alternativa é, segundo McWillian (2000), neutralizar os comentários negativos de alguns consumidores com os comentários positivos de outros consumidores. Por exemplo, uma discussão na comunidade criticando um produto recentemente lançado e apontando seus pontos fracos pode não ser vista como consistente com as estratégias de comunicação da empresa que enfocam seus pontos fortes. Entretanto, essa crítica feita pela comunidade pode ser suavizada pela apresentação dos pontos de vista de outros consumidores que elencam pontos fortes do produto.

Ainda que as FMC sejam bem-sucedidas em não limitar os tópicos de discussão de seus membros, ou vetar as suas colocações negativas com relação ao produto e à marca, resultados do estudo netnográfico realizado encontraram outras diferenças no que tange à liberdade de expressão nas comunidades estudadas. Os resultados do estudo mostraram que as FMC tendem a ser mais focadas em tópicos instrumentais relacionados ao uso do produto e da marca, ao passo que as CMC desenvolvem-se sem ter esse tipo de restrição. Elas existem para que os consumidores possam mostrar comprometimento com a marca e trocar informações através da interação com seus pares, sem compromisso com uma relação direta com a lucratividade. Nesse sentido, as CMC tendem a permitir mais interações sociais “fora de tópico”, ou seja, fora do tópico instrumental do uso do produto ou da marca. A inexistência dos funcionários da empresa agindo como moderadores nesse tipo de comunidade permite que as conversações fluam nos tópicos mais livres.

Todos os fóruns nas FMC estudados na pesquisa netnográfica realizada como fase exploratória deste estudo eram relacionados a questões específicas sobre o produto em si (ex.: dúvidas ou questões técnicas sobre os produtos, como ficar informado sobre novos lançamentos, que tipo de hardware mais se adequou a um determinado software ou plataforma de jogo, comentários, sugestões, etc.), levando a trocas que eram instrumentais por natureza. Em contraste, as CMC tendiam a ter avenidas específicas somente para discutir aspectos não relacionados ao produto ou à marca, como na comunidade gerenciada pelos consumidores para o LabVIEW, LAVA. Esta possuía um LAVAlounge para desejar felicitações aos membros por aniversários, nascimentos de filhos, etc. Devido a essas

distinções, espera-se que as comunidades gerenciadas pela empresa não apenas sejam mais focadas em tópicos restritos e instrumentais nas discussões entre seus membros, mas também sejam mais propensas a encobrir conversações críticas ou controversas, oferecendo, assim, menor liberdade de expressão. Assim, configuram-se as seguintes hipóteses:

H14: A percepção de Liberdade de Expressão na comunidade será maior para membros da comunidade gerenciada pelos consumidores do que para membros da comunidade gerenciada pela organização.

H15: O impacto positivo da Liberdade de Expressão (a) no Nível de Participação na Comunidade e (b) na Identificação com a Comunidade será mais forte para membros da comunidade gerenciada pelos consumidores do que para membros da comunidade gerenciada pela Microsoft.

De acordo com Achrol e Kotler (1999), uma das questões a serem discutidas com relação a comunidades de marca gerenciadas pelos consumidores refere-se a sua manutenção, uma vez que esta requer considerável esforço e recursos. E os últimos devem vir dos esforços e doações dos membros, uma vez que não há recursos de marketing da organização para a sua manutenção. Assim, o que se espera é que as CMC tenham menos recursos para interatividade virtual de seus membros, o que irá traduzir-se em um menor número de avenidas virtuais de alta e baixa interatividade (BAGOZZI et al, 2005) e de outras ferramentas para o exercício da comunidade, como moderadores, eventos off-line, etc.

Os resultados do estudo exploratório realizado também apontam nesse sentido, revelando que as FMC são mais organizadas do que as CMC, e que as primeiras contêm maior disponibilidade de avenidas de comunicação virtual como salas de bate-papo, blogs, fóruns, quadros de notícias, fotos, músicas, e assim por diante. Os consumidores que participam das comunidades gerenciadas por outros consumidores sentem falta desses recursos que as FMC possuem por contarem com verbas de marketing das organizações, que financiam a manutenção de uma maior gama de avenidas virtuais para comunicação. As FMC dispõem, também, de recursos para manter funcionários moderando e interagindo em salas de bate- papo, ou respondendo às questões deixadas em quadros de notícias.

Por outro lado, as CMC podem ter falta de recursos, organizadores para as suas atividades e até organização interna. Por vezes, as mensagens deixadas nos quadros de notícias das CMC

ficam dias sem resposta e, não raro, não recebem retorno algum. Parece que as avenidas disponíveis nas FMC tendem a ser mais adequadas para as comunidades de marca baseadas em redes de indivíduos que Dholakia et al (2004) propuseram, ao passo que avenidas disponíveis nas CMC deveriam suportar as comunidades de pequenos grupos descritas pelos autores. Baseadas nesses argumentos, as seguintes hipóteses são propostas:

H16: A percepção de Disponibilidade de Avenidas Virtuais será maior para membros da comunidade gerenciada pela organização quando comparada à comunidade gerenciada pelos consumidores.

H17: O impacto positivo da Disponibilidade de Avenidas Virtuais (a) no Nível de Participação na Comunidade e (b) na Identificação com a Comunidade será mais forte para membros da comunidade gerenciada pela organização do que para membros da comunidade gerenciada pelos consumidores.