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Hospital Amigo da Criança

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 180-191)

A Iniciativa Hospital Amigo da Criança – IHAC – foi idealizada em 1990 pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e pelo UNICEF para promover, proteger e apoiar o aleitamento materno. O objetivo é mobilizar os funcionários dos estabelecimentos de saúde para que mudem condutas e rotinas responsáveis pelos elevados índices de desmame precoce. Para isso, foram estabelecidos os Dez Passos para o Sucesso do Aleitamento Materno.

Pela Declaração de Innocenti, na Itália, em 1990, o Brasil, um dos 12 países escolhidos para dar partida à IHAC, formalizou o compromisso de fazer dos Dez Passos uma realidade nos hospitais do País. Em março de 1992, o Ministério da Saúde e o Grupo de Defesa da Saúde da Criança, com o apoio do UNICEF e da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde), deram os primeiros passos.

A IHAC soma-se aos esforços do Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno (PNIAM/MS), coordenado pelo Ministério da Saúde para: informar profissionais de saúde e o público em geral; trabalhar pela adoção de leis que protejam o trabalho da mulher que está amamentando; apoiar rotinas de serviços que promovam o aleitamento materno; combater a livre propaganda de leites artificiais para bebês, bem

como bicos, chupetas e mamadeiras.

Maiores informações:

Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno – PNIAM, Secretaria de Programas Especiais de Saúde – SEPS, Ministério da Saúde, 6° andar, Brasília, DF - cep 70058-900 – telefone: (61) 3224 4561.

Desmame

Mônica Eriko Inoue

A Organização Mundial da Saúde (OMS) aconselha o aleitamento materno em regime exclusivo por pelo menos seis meses. Os recém-nascidos, poucas horas após a chegada ao mundo, são capazes de distinguir sabores de forma mais aguçada que os adultos. Eles, de fato, possuem um maior número de papilas sensoriais que identi icam o gosto: além daquelas localizadas na língua, palato e faringe, possuem-nas também na parte interna das bochechas. Dariam ótimos sommeliers!

Nos primeiros meses, a preferência dos pequenos pelo gosto doce é bastante evidente. Uma explicação bastante convincente é a de que nos primeiros meses o bebê deve exercitar o gosto por um único alimento, o leite, que possui sabor adocicado. Alguns estudiosos, porém, acreditam que o paladar humano foi condicionado ao longo do tempo em um projeto de defesa da espécie; a inal a maior parte das substâncias de sabor doce disponíveis na natureza fornece energia imediata, enquanto as de sabor amargo, muitas vezes, apresentam elementos de toxicidade. Se as plantas venenosas tivessem o sabor do leite materno provavelmente a humanidade não teria chegado ao ponto em que chegou!

Sabemos, entretanto, que nem tudo o que é amargo é nocivo e nem tudo o que é doce é saudável. O ilhote humano, como animal onívoro, precisa de toda a variedade de alimentos, cada qual com seu gosto e suas características nutritivas, para crescer e manter-se em boa saúde. Para aprimorar sua natural sensibilidade gustativa, ele tem que ser introduzido no mundo dos sabores, com os quais terá contato durante a vida inteira.

Esse processo começa em torno dos seis meses, prosseguindo gradualmente nos meses sucessivos e não implica absolutamente no desmame total. De fato, o leite materno continuará exercendo importante papel em termos nutricionais para a criança, porém, sozinho, começa a não ser mais suficiente.

Um bebê que está para duplicar o seu peso do nascimento precisa de mais calorias e de alimentos ricos, por exemplo, em proteína e ferro. Além disso, no segundo semestre de vida, o estômago e o intestino estão mais maduros e sabem “lidar” melhor com certos alimentos que, nos primeiros meses, podem apresentar-se como indigestos ou até mesmo causar distúrbios e alergias. Como o mecanismo neuromuscular da face está bem desenvolvido, o bebê é capaz de realizar outros movimentos além da sucção.

Por último, o aspecto social: a criança está mais integrada com a realidade ao seu redor, seu campo de visão é maior e ela começa a manifestar grande desejo de exploração. Nada melhor que os alimentos, com seus estímulos olfativos, visuais, táteis e, sobretudo, gustativos, para conduzir a criança gentilmente ao mundo dos pais.

O leite materno não precisa sair completamente de cena e ser substituído pela batata, cenoura, brócolis. As duas fontes de alimentação podem ser conciliadas, mas é preciso alguma organização. A tendência moderna da amamentação é a livre demanda, que bene icia a produção de leite e oferece ao bebê a possibilidade de “administrar” as próprias refeições segundo sua própria necessidade. Porém, uma vez iniciado o processo de introdução dos alimentos sólidos, é conveniente criar um esquema de horários a ser seguido de forma mais ou menos rígida, de modo que a mamada e a refeição sólida não iquem muito próximas, pois o sistema digestivo do bebê não difere muito do de um adulto: ele come quando sente fome. Se uma mãe, seguindo o regime de livre demanda, oferece o peito às 11h, a probabilidade de que seu ilho aceite a papa de legumes e

verduras, por exemplo, ao meio-dia, é bastante pequena. A criança precisa de intervalos para digerir tranquilamente o alimento anterior, distraindo- se com outros estímulos, brincando, tirando um cochilo. Só assim ele sentirá fome novamente.

No modelo brasileiro, o processo de introdução de alimentos sólidos inicia- se com papas de frutas e de legumes e verduras. Cada alimento deve ser apresentado à criança gradualmente para que seu paladar seja respeitado e, principalmente, para evitar risco de alergias ou intolerância. É absolutamente natural que a criança demonstre certa descon iança ou até mesmo aversão pelos novos alimentos; a inal são muitas mudanças ao mesmo tempo: textura, sabor, cheiro, modo de oferecer. As primeiras semanas exigem da mãe grande dose de paciência. Não é necessário ter pressa. Mais cedo ou mais tarde todos os ilhotes humanos vão ao encontro de seu destino onívoro.

Basta, portanto, que a mãe saiba a hora de levar ao ilho o mundo da variedade alimentar. A partir daí, ela pode conduzir o processo serenamente, respeitando o ritmo de adaptação do ilho (que pode levar muitas semanas), sem se preocupar excessivamente com a questão do peso corporal. Cada colherzinha a mais de papa pode ser motivo de sobra para comemoração. É um passo e tanto para quem, até então, estava acostumado a sugar comodamente aquele líquido morno e adocicado, pele a pele com a mamãe.

Uma ideia interessante é oferecer inicialmente só o líquido de cozimento dos legumes/ verduras, pois a maior parte dos nutrientes vai parar nele. O caldo pode ser enriquecido com um io de azeite de oliva e oferecido com a colherzinha. Após algumas semanas, quando a criança tiver assimilado o gosto e a textura do alimento, este poderá ser amassado e incorporado ao caldo. É importante que inicialmente não se misturem muitos legumes e verduras. Um mesmo ingrediente deve ser oferecido à criança ao menos a cada dois dias, para facilitar a identi icação de substâncias alergênicas. A

preparação das papinhas deve ser um simples cozimento em água iltrada. Elas devem conter, gradualmente, fontes de proteínas, de carboidratos, vitaminas, sais minerais, gorduras e ibras. Começa-se pelo almoço e, uma vez que o bebê esteja adaptado a ele, introduz-se o jantar.

A mãe pode continuar a oferecer o peito em momentos especí icos do dia como, por exemplo, quando a criança acorda, no lanche da manhã (após a papinha de frutas ou suco), após o almoço, no lanche da tarde, após o jantar e antes de dormir. Como podemos perceber, mesmo não sendo em regime de livre demanda, o leite materno pode continuar, se assim a mãe o desejar, a ter um papel relevante na dieta da criança.

Para que a produção de leite não seja prejudicada com a redução dos momentos de sucção, a mãe pode extrair o próprio leite e administrá-lo conforme sua conveniência (congelar, doar). Com organização, a amamentação pode prolongar-se por vários meses ou até anos, desde que a criança tenha uma alimentação totalmente variada. Melaine Klein sobre o desmame: “Qualquer coisa que torne menos dolorosa a perda de um objeto bom ‘externo’ e diminua o medo de ser punido, ajudará a criança a preservar a convicção em seu objeto bom ‘interno’. [...] Que podemos fazer para ajudar a criança nessa difícil tarefa? Os preparativos para essa tarefa começam no nascimento. Desde o primeiro momento, a mãe deve fazer tudo que puder para ajudar a criança a estabelecer um relacionamento feliz com ela. Frequentemente constatamos que a mãe faz de tudo ao seu alcance em relação ao estado físico da criança; concentra-se nisto como se a criança fosse uma coisa material que necessita de cuidado constante, como uma máquina valiosa e não um ser humano. Essa é a atitude

de muitos pediatras que se preocupam principalmente com o desenvolvimento físico da criança, e se interessam apenas por suas reações emocionais na medida em que indiquem algo sobre o estado físico ou intelectual do bebê. As mães frequentemente não compreendem que um bebê já é um ser humano, cujo desenvolvimento emocional é da maior importância”.

Ela declara neste capítulo: “Devo agradecer ao Dr. Winnicott por muitos pontos esclarecedores sobre este assunto”.

“Ao mamar, a criança incorpora não apenas o alimento: incorpora também o olhar, a voz e odor da mãe. Ela é alimentada ao mesmo tempo pela boca, pelos ouvidos, pelos olhos, pela pele, pelo nariz. É isso, ou seja, a incorporação de outra coisa que não é alimento, que permitirá à criança um desmame feliz, na medida em que o seio pode ser substituído por outros objetos tais como a voz, o fonema, o olhar. [...] Aos pouquinhos, o tempo em que o bebê fica acordado depois da mamada vai aumentando e ele procura prolongar os momentos de relação. Dolto considera que se a mãe fala ao bebê depois da mamada, pondo objetos na ponta de suas mãos e nomeando os objetos, essa criança não terá necessidade de chupar o polegar. É pelas palavras trocadas que os objetos são simbolizados e que o seio poderá, em seguida, ser rechaçado e substituído por outros objetos, tornando- se objeto de inspiração nostálgica. [...] Dolto pensa que as palavras vocalizadas são talvez objetos transicionais sonoros que a criança guarda na memória no momento de adormecer, antes que se tornem verdadeiras palavras. As crianças que têm palavras suficientes não precisariam de objetos transicionais, enquanto aquelas que não têm palavras de amor e liberdade lúdica suficiente teriam dificuldade para fazer passagem para a simbolização e para a separação”.

Jovem Mãe Amamentando – Renoir (1841-1919)

Dolto chama os objetos transicionais de objetos ‘mamãezados’.

Hiatos de solidão são absolutamente necessários para o bebê entrar no universo da linguagem. “Pelas palavras do Outro, o bebê recebe suas mensagens de volta, o que implica que é reconhecido como objeto de desejo”.

Referências Bibliográficas

Queiroz, Telma C. N. Do desmame ao sujeito. Casa do Psicólogo, SP, 2005 p. 116 e 135. / agradeço a indicação a Adalene Sales, de Salvador.

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 180-191)