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O papel da amamentação na ortodontia

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 167-174)

Sandra Bueno

Baseio-me em quase 15 anos de experiência em clínica de ortodontia — atendendo principalmente crianças e produzindo aparelhos — para estabelecer uma relação entre amamentação, ou a falta dela, e algumas questões ligadas à ortodontia.

Em primeiro lugar, o grupo de músculos faciais exigidos na amamentação é fundamental para o seu correto desenvolvimento, não existindo substituição adequada. Com mamadeiras e chupetas, os músculos movimentados são outros, não harmônicos.

Os lábios das crianças amamentadas têm o tônus (força) ideal para que permaneçam fechados em repouso, favorecendo a respiração nasal. Nas crianças com lábios hipotônicos, a respiração é bucal e nota-se claramente uma postura facial “caída”, com lábios entreabertos e língua protrusa.

O fato de a criança ter sido amamentada, e não ter usado chupeta nem mamadeira, acarreta o desenvolvimento ideal da musculatura facial, dos lábios, da língua e da respiração. Notem como é comum vermos crianças com a boca sempre entreaberta. Muito provavelmente foi pelo uso de chupeta, mamadeira ou pelo hábito de chupar o dedo. Pode até ter sido amamentada, mas não da forma ideal: seis meses exclusivos e até dois anos ou mais, sem uso de bicos artificiais.

Entre os problemas mais comuns associados à respiração bucal, está um maior número de alergias respiratórias, resfriados e gripes, pois o luxo de ar que entra pela boca não é iltrado nem aquecido, como acontece quando passa pelas narinas. Outro problema são as adenoides que in lam (muitas vezes por alergias) e acabam atrapalhando o sono e a alimentação, em consequência da redução do espaço ísico do “assoalho nasal”: o palato ou céu da boca torna-se mais estreito pelo uso contínuo de bicos arti iciais e chupetas, ou pelo hábito de chupar o dedo.

Mesmo a crença de que o uso de mamadeira duas ou três vezes ao dia não interfere na formação da arcada é falsa, e o uso de aparelhos que literalmente racham o osso maxilar ao meio, a fim de aumentar o espaço do “assoalho nasal”, é cada vez maior. Como a criança está em fase de crescimento ósseo, é comum o tratamento falhar e se estender por até dez anos, às vezes — o que, além de angustiante para a criança, é dispendioso financeiramente para os pais.

Por outro lado, uma língua mal projetada é também um problema, pois, além de participar na fonação, mastigação, deglutição e gustação, ela é sede de diversas alterações patológicas. Hábitos disfuncionais linguais são importantes na etiologia de algumas oclusões dentárias. Por ser a língua um órgão essencialmente muscular, torna-se extremamente di ícil — e até mesmo impossível, em alguns casos — fazê-la voltar ao normal.

Alinhar os dentes hoje é até fácil, rápido e quase indolor; entretanto, existem problemas ligados à fonação e à respiração que poderiam ter sido evitados se seguíssemos o que a natureza nos oferece e muitos ignoram ou tentam substituir, sem sucesso: a amamentação.

Sobre amamentar deitada

Amamentar deitada não provoca otites. O problema está relacionado ao oferecimento de mamadeira com a criança deitada. O leite materno inibe a formação de bactérias, enquanto o leite arti icial incentiva a sua

proliferação. Sugar o leite do peito e tomar mamadeira são coisas diferentes, porque a boca do bebê forma um todo com o seio, trabalhando harmonicamente na propulsão do leite. A mãe pode colocar o braço embaixo da cabeça dele ou usar um pequeno travesseiro, para uma inclinação razoável.

A im de evitar otites em bebês que usam mamadeira, é necessário que o bebê esteja em posição bem inclinada, se possível sentado. A mamadeira é, muitas vezes, a causadora de otites de repetição.

Amamentação exclusiva por seis meses: sim ou não?

Até os seis meses de idade, o leite materno supre todas as necessidades do bebê, protege contra doenças (alergias, diarreias, obesidade, doença celíaca ou síndrome de má absorção), favorece a oclusão dentária, fortalece a musculatura da boca e previne problemas na fala, pois é necessário um trabalho harmônico de toda a musculatura da face para sugar o seio.

Até mesmo bebês que não puderam ser amamentados devem receber fórmulas lácteas com exclusividade até o sexto mês, pois essas suprem suas necessidades nutricionais. Só não fornecem os fatores imunológicos que o bebê estaria recebendo em aleitamento materno.

A composição do leite materno é exatamente a que precisamos. A quantidade e qualidade de proteínas e gorduras, a densidade calórica, a relação entre cálcio e fósforo e a disponibilidade do ferro são apenas alguns exemplos de como o leite da própria mãe é nutricionalmente ideal para o bebê. Há uma vontade de introduzir alimentos sólidos muito precocemente, e depois é aquela luta com alergias de todo tipo. Antes dos seis meses: nada além de leite materno ou fórmula.

Antes de um ano, não se deve dar sucos cítricos (laranja, limão, abacaxi) ou qualquer coisa ácida. Mesmo que os bebês gostem do sabor doce e o suco

seja bem fraquinho, pode provocar alergias. Outras comidas a evitar antes de um ano: mel, clara de ovo (gema pode sem problemas) amendoim, nozes, leite de vaca (somente fórmula infantil). Também é aconselhável evitar trigo ou farinha de trigo antes dos nove meses, e o melhor é esperar até um ano. Trigo é causa da maior parte de alergias em crianças. Isso previne muitos problemas futuros.

Se a mãe precisar ausentar-se por algum motivo, pode ordenhar o leite e armazená-lo. A volta ao trabalho não justi ica a introdução de novos alimentos antes da hora: há tempo su iciente para a introdução gradual de alimentos a partir dos seis meses, e observar o aparecimento de alguma alergia alimentar.

Segundo o UNICEF, a amamentação é importante para o cumprimento dos “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio”. Erradicar a fome e a pobreza é o primeiro desses objetivos. O aleitamento materno pode salvar a vida de 1,3 milhão de crianças no mundo a cada ano. Por isso, promover a amamentação exclusiva durante os seis primeiros meses de vida é uma das principais estratégias apoiadas pelo UNICEF durante a 32ª Sessão do Comitê Permanente de Nutrição das Nações Unidas. Até 2015, o mundo deve reduzir em até 50% o número de pessoas que sofrem com a desnutrição.

Para o UNICEF, o alcance dessa meta só será possível se governos, sociedade e setor privado empenharem-se para criar ambientes favoráveis para que toda mãe possa amamentar seu bebê de maneira exclusiva, durante os primeiros seis meses de vida.

Produção do leite materno

Gostaria de ler opiniões dos pediatras a respeito da não produção de leite materno, já que muitas mães alegam ter o “peito seco”. Isso acontece por fatores hormonais, estresse etc., ou porque elas não estimulam

adequadamente o próprio corpo a fornecer o alimento ao recém-nascido? Dra. Relva: Talvez o estresse dos primeiros dias, até que alguns bebês aprendam a sugar satisfatoriamente, leve pessoas da família a insistir que a mãe ofereça a mamadeira de imediato. Nesse caso, há alguns pontos a considerar: diminuição da frequência ou efetividade da sucção, retardo da produção ou redução do volume de leite, di iculdade que algumas crianças têm de pegar o peito, caso tenham sido alimentadas nas primeiras horas com mamadeira.

Um dos fatores mais positivos é o alojamento conjunto (rooming in) e a devida preparação pré-natal, focalizando os bene ícios da amamentação sob livre demanda. Um dos principais fatores para o leite “secar” é a falta do estímulo da sucção e a ansiedade dos circunstantes. Sem falar que alguns berçários já trazem o bebê ‘mamado’ para a mãe.

A mãe precisa sentir-se apoiada, estimulada, valorizada por amamentar; é importante que as pessoas da família também sintam esse valor. Tipos de apoio: visita precoce da equipe depois do parto, visitas mais frequentes, consultas por telefone, ambulatório de amamentação pré-natal, grupos de mães, apoio familiar, divulgação constante pela TV, apoio dos bancos de leite e redes sociais.

Um aspecto importante é o da legislação trabalhista, que permite 180 dias de licença para o aleitamento e mais 15 dias em caso de necessidade especial do bebê. Há também o direito de sair meia hora antes do trabalho para amamentar. A licença de 180 dias (lei Patrícia Saboya, com apoio da Sociedade Brasileira de Pediatria), que dá incentivos iscais às empresas que aderirem, já é realidade em alguns estados brasileiros, para funcionárias públicas. Nas empresas, o índice é de cerca de 7%. Outro aspecto importante é a implantação de creches nos locais de trabalho, permitindo à mãe amamentar.

A legislação trabalhista permite 180 dias de licença para o aleitamento e mais 15 dias em caso de necessidade especial

do bebê. Há também o direito de sair meia hora antes do trabalho para amamentar.

Em postos de saúde, observa-se que, durante os três primeiros meses, as mães amamentam. Depois chegam com a conversa de que o bebê está “aguando” de vontade de comer outras coisas ou que seu leite é “fraquinho”. Começam a achar que o ganho de peso está insu iciente, fazem comparação com o bebê da vizinha e decidem dar outro tipo de leite. O governo tem que fazer campanhas permanentes na mídia, o que também é feito pela Sociedade Brasileira de Pediatria e pelas ‘madrinhas’ da amamentação, como Cassia Kiss, Claudia Leitte, Dira Paes, Juliana Paes, Luciana Gimenez, Maria Paula. Há pais que preferem comprar leite em pó para mostrar a nota iscal ao juiz, como prova de “cuidado” com o ilho. Um fator que pode diminuir as chances de a mãe amamentar é a falta de apoio do companheiro ou dos familiares, além da falta de incentivo dos profissionais de saúde.

O que deve ser avaliado é o ganho de peso do recém-nascido, que deve estar adequado às novas tabelas que contemplam dados de bebês amamentados ao seio. Existem fases em que o corpo da mãe muda a produção de leite, procurando estabelecer um equilíbrio conforme a necessidade do bebê. É cíclico: acontece agora e poderá voltar a acontecer durante outras fases da amamentação. É imprescindível que a mãe ofereça o peito em livre demanda, e não dê complemento. O bebê é quem deve ‘comunicar’ à mãe quanto leite quer ingerir, assim a produção se ajustará naturalmente.

Durante o dia, a criança mama com maior frequência do que à noite, assim não dá tempo de encher o peito. Muitas vezes o leite só desce quando o bebê suga; aliás, o que promove a produção de leite é a amamentação frequente. É importante lembrar disso, se ela quiser amamentar até os seis meses exclusivamente.

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 167-174)