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Nós, nossos bebês e nossa cultura

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 192-197)

O bebê humano é o mais indefeso dos recém-nascidos. Seu cérebro ainda não se completou, ele é incapaz de icar de pé ou de buscar o próprio alimento. Essa dependência exige alto investimento dos pais para criar um ilho. Para tanto, precisam estabelecer um vínculo íntimo como o bebê, já que este dispõe de poucos meios para expressar suas necessidades.

A própria natureza determinou assim a relação simbiótica entre os pais e a prole, criando esse vínculo característico da biologia humana para o crescimento e desenvolvimento do bebê. As maneiras de cuidar do bebê variam de cultura para cultura, mas giram em torno do trio: sono, cuidados e alimentação. A etnopediatria é o ramo que estuda a in luência da cultura sobre a biologia, comparando as estratégias parentais ao longo da evolução. Quando nasce um animal quadrúpede, ele é capaz de icar de pé imediatamente. Os humanos são incapazes de sentar, de icar de pé ou de buscar o próprio alimento. Eles nascem com o cérebro imaturo, incompleto, com alta exigência calórica para seu metabolismo, já que seu crescimento continuará acelerado após o nascimento.

Na maior parte das culturas, em qualquer época, o recém-nascido passa aos braços da mãe logo após o nascimento. É relativamente recente a ideia de separá-los e levá-los para o berçário. Foi em 1896 que Martin Cooney inventou a incubadora e passou a advogar a separação de mãe e ilho. A ideia logo se ampliou: idealizada para prematuros, passou a ser usada para todos os bebês. A hospitalização do parto, a im de salvar as mães de hemorragias e infecções, tornou a gestação parte do modelo médico- hospitalar, ou seja, o parto passou a ser tratado como “doença”, sujeito a normas hospitalares e à separação mãe- ilho. O bebê só ia para a mãe 12 a

24 horas após o parto e, depois, com intervalos regulares para mamar, a maioria chegando nos “carrinhos” com as respectivas mamadeiras.

O movimento feminista dos anos 70, as observações de Bowlby & Harlow sobre “attachment” e a observação de dois obstetras, Laus & Kennel, é que começaram a retomar o direito de o bebê icar com sua mãe e estabelecer o que lhe é primordial: o vínculo. Depois, passou-se a admitir o alojamento conjunto ou ‘rooming-in’, que hoje é aceito universalmente.

Durante a gestação, a mãe produz uma quantidade enorme de hormônios, que culminam na liberação de oxitocina e prolactina no parto, que propiciam a maternagem. Embora a bastante citada Elisabeth Badinter negue o “instinto materno”, a gestação induz na mãe uma atitude de proteção e de cuidado para com o bebê, que se acentua quando ela o toca, sente, cheira e oferece-lhe o seio. Só que, tão logo o bebê nasce, “nasce” ao mesmo tempo uma legião de pitaqueiros, querendo ensinar a mãe a cuidar de seu bebê: suas irmãs, sua mãe, cunhadas, tias, vizinhas, e até desconhecidos dão-lhe conselhos. Sem falar no monte de revistas e livros especializados e nos profissionais da saúde.

A grande diferença entre as culturas primitivas e as ocidentais modernas é o objetivo determinado para o ilho. As mães mais “primitivas” não se preocupam com “independência”: carregam o ilho junto ao corpo o tempo todo e até vão trabalhar com ele nas costas, no sling, canguru etc. O bebê necessita de assistência contínua e de contato para organizar e regular seu sistema interno e até sua respiração: pelo toque, pelas mamadas, pelo jeito de ser carregado e pela comunicação por meio de sinais ou da própria voz da mãe. As mães modernas estão voltando a buscar na natureza o que foi perdido pela cultura: mais contato corporal, mais colo, dormir junto com o bebê e – a grande sacada – amamentar! Simples assim. Grande assim.

Resumo do livro de Meredith Small, Our Babies Ourselves, por Andréia K. Mortensen e Dra. Relva.

Muitas pessoas têm medo de carinho, principalmente quando explícito entre pessoas da família. Há uma vontade de “ferrar” os ilhos para consertar aquilo que foge das expectativas, por total desconhecimento do que é uma criança ou pelas pressões sociais.

Na idade em que o bebê não dorme direito (três primeiros meses) , trocando o dia pela noite, ele precisa ser manuseado. Quando dorme muitas horas seguidas, pode estar com hipoglicemia, que é danosa ao cérebro. Quando cresce mais, a criança brinca e se exercita, então ‘dorme feito pedra’. Esse componente de brincar

isicamente está em extinção e a criança não gasta a energia que seu crescimento exige.

Para criar um ilho é preciso sabedoria com inteligência, competência e amor. A criança tem direito ao colo e ao acalanto ou ela icará se embalando ritmicamente e/ou chupando o dedo desesperada. A criança precisa do colo ou da presença materna para adormecer, até que seja capaz de dominar seus medos. Con iante nos cuidados maternos, ela se desenvolverá com alegria, autonomia e resiliência, em sua progressão para ser um adulto pleno. Dra. Relva Referências Bibliográficas O acalanto e o horror – Ana Lúcia Cavani Jorge, Editora Escuta. 1988. Dolto, Françoise. Dificuldade de viver. Porto Alegre, Artes

Médicas Sul, 1988.

Dolto, Françoise. Psicanálise e Pediatria. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 1974.

O embalo e o acalanto, segundo Françoise Dolto

O ritmo de dois tempos do ninar é uma metáfora do coração pendular da criança, do qual esta tem que fazer luto após o nascimento. Ao nascermos, fazemos o luto desse coração pendular, não temos mais coração, já que o que ouvíamos era o coração de nossa mãe. Quando embalamos o bebê, fazemos retornar o movimento pendular, que relembra o ritmo fetal do coração. Embalar dá ao sujeito o desejo, a relação, a segurança dessa época. E restabelece a comunicação entre o espírito do ser humano, no estado fetal, e o do adulto que o cuida. O embalar con irma na criança a sensação: eu estou bem, eu sou eu, eu sou o outro e eu mesmo. É um asseguramento do seu ser profundo, que vai além das trocas sólido-líquidas. Aí está a base da segurança narcísica que o embalar restaura. As modulações da canção, a voz da mamãe, que a criança ouvia in utero , dão-lhe certeza de que sua solidão é uma solidão animada, entre seres que se comunicam.

Dolto, F. Dialogando sobre crianças e adolescentes , Ed. Papirus.

Por que não se aceita a vida

No documento O Livro Da Maternagem - Thelma B. Oliveira (páginas 192-197)