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I 2 A Emigração de Silva Porto para o Brasil (1829)

SILVA PORTO, O SEU MEIO E A SUA ÉPOCA

A GEO-CULTURA DO ITINERÁRIO DE SILVA PORTO

II. I 2 A Emigração de Silva Porto para o Brasil (1829)

Na perspectiva de realizar o seu objectivo, em 1829, António Francisco Ferreira da Silva parte pela barra do Douro, na cidade do Porto, para o Rio de Janeiro, a bordo do vapor “brigue Ave” navio americano designado por Clipper Cutter. O seu ideal era mais tarde regressar a Portugal como proprietário. Neste âmbito, na perspectiva de um estudo biográfico de Silva Porto, foi analisado um conjunto de questões levantadas em redor desta problemática envolvente ao adolescente Silva Porto: A atitude radical que

assumiu na infância ter-se-á devido à conjuntura social, política e económica de Portugal nos anos oitenta? Mesmo com o desenrolar dos factos verificou-se um estado de frustração pelos insucessos com que se deparou no Brasil. O que residia no seu interior ao ver fracassado o seu objectivo?136. A sua mentalidade foi evoluindo, e expressa-se no seu manuscrito, «maldosos e cruéis». Esse conjunto de questões analisadas no estudo anterior mostra um recalcamento da sociedade brasileira, que acelerou o estado de frustração de Silva Porto. Na prossecução do presente estudo constata-se o fenómeno da sua integração em comunidades rurais de origem, de emigração na “diáspora”, focalizado no processo social, cultural e da experiência vivida, dividido num jogo de decisão colectiva e a urgência da sua decisão individual. Nesse contexto veremos como Silva Porto emigra para o país de «D. Pedro V».

Em 1829 Silva Porto chega ao Brasil e escreveu no seu Diário uma ocorrência sobre a situação da população portuguesa no Brasil, em particular da sua própria vida, vivenciada num quadro de desespero, de decepções e aspirações da emigração luso- brasileira no início do século XIX. Em 1885 o emigrante português Silva Porto transcreveu o seu relato ocorrido em Lisboa, referindo-se à forma de saudação de

relacionados a esse tema e períodos específicos, o pensamento africanista português, encarava o problema da formação e vulgarização de uma cultura colonial, como um dos mais importantes da magna colonial. Afigurava-se a reflexão acerca do colonialismo, onde se viria a formar núcleos de pequenos investigadores das “ciências da colonização”. Revendo sempre as mudanças no decorrer do século XIX, até ao percurso do pensamento africanista e colonial português.

136 CEITA, Constança da Rosa Fereira de - A Vida e a obra de Silva Porto no Reino Ovimbundu, Viye, (1839-1890), Porto: [s.n.], 2001. P. 32. Dissertação de Mestrado História Contemporânea, Universidade do Porto, 2001.

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cortesia ao príncipe D. Carlos. Como forma de demonstrar a sua displicência a esse acto, para si já tradicional, foi o momento oportuno para relembrar a época do grande fluxo migratório português para o Brasil: Lembrei-me de a ter feito no Rio de Janeiro

com joelho em terra, ao Avô, Mãe, e tias em carruagens a passar pelo largo de Santa Anna, hoje da Aclamação137. A cultura e ideologia colonial esteve sujeita a um importante processo de regeneração no final das últimas décadas do século XIX. No Brasil, dois anos após a declaração de independência em relação ao Império português, D. Pedro I outorgou, em 1824, a primeira Constituição Brasileira, que lhe deu amplos poderes. Esta manteve-se em vigor até à proclamação da República em 1889.

Após a sua chegada ao Rio de Janeiro, Silva Porto é mal sucedido, pelo vasto número de humilhações a que foi subjugado, desde conflitos entre patrões e colegas à sujeição a ofícios vexatórios, traições de amigos e a doenças. Nesse mesmo ano surgem as revoluções sociais no Rio de Janeiro, conflitos e perseguições políticas. Na sequência de uma longa instabilidade social que assolava, progressivamente, em todas as cidades do Brasil, destacaram-se os choques políticos entre emigrantes de diferentes países (Espanha, Portugal, Itália). A corte portuguesa reagiu repressivamente face à situação política e social que se vivia no Brasil nos anos 30 do século XIX138.

Silva Porto encontrava-se num estado decadente a nível moral e económico. Mas sobretudo a pressão política exercida sobre os portugueses, fazia-o sentir-se vitimado pela constante intolerância dos brasileiros. No Brasil, António Francisco Ferreira da Silva, recordava-se da sua terra natal com profunda nostalgia, sempre que se confrontava com situações imprevisíveis, com necessidade de recorrer à sua identidade de origem como forma de auto-afirmação. …O Porto há-de ser sempre a mesma terra (…) A partir do ano de 1829 para cá…139. Ao partir da Barra do Douro para o Brasil,

137 Durante este período persistiam as monarquias reinantes em Portugal e na sua colónia brasileira. Em 11 de Janeiro de 1885 Silva Porto teria visitado vários monumentos de Portugal, aproveitando uma deslocação a Lisboa, como já referimos anteriormente, desta vez a referência coube ao príncipe D. Carlos: “Tive ocasião de ver o herdeiro da coroa de Portugal, o príncipe D. Carlos, em um carro descoberto. Cumprimento da sua passagem por quem lhe tirava o chapéu correspondia essa demonstração de respeito, à sua yerarchia.”

138 Carlos Parreira citado por CEITA, Constança da Rosa Fereira de - A Vida e a obra de Silva Porto no Reino Ovimbundu, Viye, (1839-1890), Porto: [s.n.], 2001. Dissertação de Mestrado História Contemporânea, Universidade do Porto, 2001.

139 PORTO, António Francisco Ferreira da Silva - Viagens e apontamentos de um portuense em África: diário [Manuscrito]. Vol. XI.

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em busca de uma solução para a crise sócio-económica, Silva Porto manteve-se sempre ligado à sua sociedade de origem, no seu imaginário.

Em 1809 o Brasil tornou-se a colónia portuguesa de grande prosperidade desencadeada por uma corrente migratória euro-brasileira ocorrida em vagas sucessivas. Esse período coincide com a instabilidade política na metrópole assente na desordem inadequada do sistema administrativo adoptado, e na permanência da atracção exercida pelo Brasil sobre a grande maioria dos portugueses. A sociedade portuguesa possuía uma vida económica e institucional ligada à existência do império. Neste caso, o papel desempenhado por Portugal, sob o ponto de vista político, foi estratégico. A persistência da tradição foi acompanhada de uma tolerância de emigração legal e clandestina, o que provocou a redução do excedente demográfico. O desequilíbrio social esteve na base dessa “sangria” migratória, como forma de fugir à pobreza em que a população se encontrava.

O fenómeno migratório português tem vindo a ser amplamente estudado. No átrio desses estudos ressaltamos o de Jorge Fernandes Alves: O processo de

urbanização do Brasil torna-se latente nas décadas de trinta e quarenta deste século e recentemente liga-se ao fenómeno de recuperação industrial da Europa. Os emigrantes de retorno constituem um factor de inovação, já dos emigrantes remetem que o seu contacto com outras visões do mundo pôde contribuir para estimular a mudança e o desenvolvimento económico das áreas de partida140. O baixo nível da população, consequência de uma lenta evolução económica e da predominância das actividades agrárias, leva a uma decisão colectiva de emigração: envio de remessas ao país de origem, retorno ao país de origem e ascensão económica. Estas vagas não tiveram o mesmo destino: a ascensão económica de uns e a degradação social de outros que constituíam maioritariamente o fluxo migratório para o Brasil nessa época. A tomada de consciência da nova realidade na colónia brasileira em crise, com que se vão confrontar os emigrantes portugueses, é marcada pela etapa das grandes conturbações políticas e sociais e económicas afectas ao fluxo migratório de 1818 e subsequentes.

140 ALVES, Jorge Fernandes - Os brasileiros: emigração e retorno no Porto oitocentista. Porto: [s.n.], 1993. 2 vol. Tese doutoramento em História Moderna e Contemporânea, Universidade do Porto.

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II. I. 3. As implicações da Crise Sócio-Económica do Império Luso-