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A identidade corretiva da educação na legislação penal e penitenciária brasileira de hoje

RACIONALIDADE PUNITIVA E DIMENSÃO MORAL DA EDUCAÇÃO NAS PRISÕES BRASILEIRAS

2. DOS QUE ARRENEGAM OU BLASFEMAM DE DEUS OU DOS SANTOS Qualquer que arrenegar, descrer ou pesar de Deus, ou de sua

3.3 A identidade corretiva da educação na legislação penal e penitenciária brasileira de hoje

A primeira norma brasileira a tratar de maneira sistematizada a questão da execução penal foi o Decreto nº. 678, de 06 de julho de 1850, publicada portanto, ainda no contexto do período imperial. Trata-se, do Regulamento da Casa de

Correção do Rio de Janeiro. Segundo o professor Rodrigo Duque Estrada Roig

(2005, p.45-59), em Direito e prática histórica da execução penal no Brasil, este documento pode ser considerado como “a matriz de nosso regramento carcerário”, não só por que, ainda no Império, tenha servido como parâmetro para o funcionamento de outras Casas de Correção espalhadas pelo território nacional, mas sobretudo, “por erigir um arcabouço penitenciário cujas permanências são sentidas até hoje”, daí a importância do estudo de tal regulamento para a compreensão do lugar da educação que a educação na prisão ocupa na legislação brasileira atualmente.

O Regulamento da Casa de Correção do Rio de Janeiro estava dividido em quatro títulos, que dispunham sobre a Casa de Correção, os condenados a prisão

com trabalho, a administração do estabelecimento, e disposições gerais relativas aos procedimentos internos. Em conformidade com o Código Criminal do império, que atribuiu ao trabalho do preso um caráter pedagógico indispensável à correção, o Regulaermento da Casa de Correção do Rio de Janeiro tratou de especificar como as atividades dos presos deveriam ser desenvolvidas. Dispôs, por exemplo, que cada Casa de Correção construísse oficinas, e em que cada oficina houvesse um “mestre com o título de Chefe da Oficina, o qual dirigirá os trabalhos della, e ensinará o officio aos aprendizes”.

Além do Chefe da Oficina, o regulamento atribuía também ao Capelão da Casa de Correção o dever de “ajudar o director na educação moral dos presos, e concorrer quanto em si couber para a sua correção e reforma”, devendo por sua vez, o diretor, “ouvir os conselhos do Capellão na direcção moral dos presos”. Para tanto, deveria o Capelão “visitar os presos, exhortando-os ao trabalho, e bom comportamento, ao menos huma vez por semana, e no meio della, alêm do dia de guarda que possa haver”.

Previa ainda o artigo 17 do regulamento que “nos domingos e dias de guarda, fóra do tempo destinado aos actos religiosos, terão estes presos 3 horas de exercício, durante o qual se occupação em ler, escrever, ou em fazer algum trabalho ligeiro e manual de seu gosto”.

Mais tarde, o regulamento da Casa de Correção do Rio de Janeiro viria a ser reformulado pelo decreto nº. 8.386, de 14 de janeiro de 1882. Tal como o documento anterior, tratou o novo regulamento de reforçar o caráter pedagógico do trabalho para o tratamento do preso, afirmando desde seu artigo 2º que “o systema penitenciario ahi [casa de correção] adoptado é o de encarceramento cellular durante a noite, e de trabalho em commum durante o dia”. Cabia ao diretor do estabelecimento, visitar os presos nas celas todos os dias e dar-lhes bons conselhos; tomar as precauções para que o estabelecimento não se desviasse de seus fins moralizadores, e dirigir os trabalhos na Casa de Correção, dentre outras atribuições. Manteve o novo regulamento à exigência de que o diretor deveria “attender aos conselhos do capellão na direcção moral dos presos”.

Destaque especial é o fato de que o novo regulamento trouxe um capítulo específico sobre o “Regime moral, religioso e escolar”, apresentando pela primeira vez na história da legislação penal e penitenciária brasileira, referência expressa e sistematizada à instrução dos prisioneiros.

Estabelecia o regulamento que compreendia as atividades do serviço religioso o dever do Capelão de, além de administrar os cultos, ensinar aos presos a religião, “explicando as verdades essenciaes do catholicismo”, procurando “incutir ou fortificar o espirito religioso nos presos”. Impende destacar também que,conforme dispunha o artigo 265, após as missas, caberia ao Vedor, uma espécie de auxiliar do diretor do estabelecimento, ler aos presos os artigos do regulamento, ensinando-os seus deveres.

A seção terceira do Capítulo XI era reservada inteiramente à instrução escolar de natureza não religiosa, a ser realizada sob a responsabilidade de um Preceptor. Segundo o artigo 282, o ensino aos presos estava centrado na alfabetização, devendo compreender a leitura, a escrita e finalmente noções de aritmética básica. A freqüência às aulas era obrigatória, fazendo parte da rotina disciplinar do estabelecimento, contudo, deveria ser compatível com as demais normas de segurança e com eventuais dispensas concedidas pelo diretor, segundo o artigo 283.

Tem-se ainda que era dado ao Preceptor o poder de excluir das aulas qualquer preso que se comportasse de maneira inconveniente, comunicando o fato ao diretor para que as penalidades disciplinares pudessem ser impostas. Para o desempenho das atividades educativas, o Preceptor também poderia contar com a ajuda do Capelão, este último, responsável seria pelo ensino das regras morais, religiosas e das regras de civilidade.

A quarta seção da norma era destinada ao regulamento das atividades de leitura e de acesso à biblioteca. Dispunha os artigos 286 e 287 que, nas Casas de Correção e estabelecimentos similares, deveria haver uma sala destinada a biblioteca “composta de livros de leitura amena e edificante, para o uso dos presos, segundo os gráos de intelligencia e disposições moraes decada um”. Para os presos que não soubessem ler, a leitura poderia ser feita “pelo capellão ou outro empregado designado pelo director, em voz alta, acompanhada de instrucções familiares áquelles que não puderem aproveital-a individualmente”.

O artigo 327 do regulamento expressa com clareza a vinculação que a instrucção dos presos mantinha com o conjunto das técnicas penitenciárias de controle e correção, ao dispor que “todos os exercicios e movimentos dos presos, como o de levantar-se, deitar-se, da refeição, trabalho, passeios, ida para capella, para escola, etc., serão annunciados pelo som da sineta interior”.

Com a proclamação da república em 1889, e a seguinte publicação do Código Penal de 1890, a prisão, como já fora dito no item anterior, assume de vez o protagonismo das formas punitivas no Brasil. Porém, as críticas ao novo código penal levaram a publicação de um conjunto significativo de legislações extravagantes, muitas delas, que viriam a editar fragmentariamente, normas relativas à execução penal. Dentre essas normas, é possível citar o Decreto nº. 16.588 de 06 de setembro de 1924, que introduziu a suspensão condicional da pena no direito brasileiro; o Decreto nº. 16.664 de 05 de novembro de 1924 que designava as galerias das casas de correção como espaços para prisão de detenção quando do estado de sítio; e finalmente, o Decreto 16.665 de 06 de novembro de 1924 que criou o Conselho Penitenciário e tratou do livramento condicional.

Em relação a este último decreto, merece destaque passagem constante da exposição de motivos do projeto apresentado, justificando a necessidade de reformas na legislação penal “tendo em vista os fins do regimen penitenciario mederno, como encara a sciencia, para a qual a pena não passa de um remedio para a reforma moral do criminoso”, consubstanciando assim, ainda mais, a idéia de prisão e das técnicas penitenciárias, dentre as quais a educação, como meios para a reforma do condenado.

A multiplicação do número de normas de execução das penas fez com que o desembargador do Distrito Federal Vicente Piragibe, publicasse o trabalho Codigo

Penal Brasileiro, completado com as leis modificadoras em vigor, que viria a ser

adotado como Consolidação das Leis Penais no Brasil, através do Decreto nº. 22.213 de 14 de dezembro de 1932. Mais tarde, já em 1933, sob as influências das discussões realizadas por ocasião do X Congresso Penitenciário Internacional, realizado em Praga no ano de 1930, e que havia definido a necessidade de busca pela autonomia do direito penitenciário em relação ao direito penal, seria apresentada a primeira proposição de uma consolidação de normas de execução penal, o Anteprojeto de Código Penitenciário da República, pela 14ª Comissão Legislativa do Congresso Nacional, encabeçada por Cândido Mendes de Almeida (BARBOSA, 1982, p.300-301).

Embora a Constituição Federal publicada em 1934 tenha definido a competência da União para legislar sobre “Normas Fundamentais de Regime Penitenciário” em seu artigo 5º, inciso XIX, alínea c, o projeto de Cândido Mendes não teria seguimento, pois em 10 de novembro de 1937 Getulio Vargas outorgaria a

Constituição do Estado Novo, dissolvendo o Parlamento Nacional, as Assembléias Legislativas e as Câmaras Municipais.

Em 07 de dezembro de 1940 foi publicado o Decreto Lei 2.848, instituindo o Código Penal, de maneira que uma proposta de Código Penitenciário foi momentaneamente abandonada. Viria o código a reafirmar o caráter subjetivo e individual da responsabilidade penal, baseada na consciência e na vontade, ao dispor em seu artigo 11 que “o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa, a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”, e em seu artigo 22 que “é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. Viria também o Código Penal estabelecer o trabalho e o estudo de natureza profissionalizante como elementos do tratamento penitenciário, ao dispor, por exemplo, que “a freqüência a cursos profissionalizantes, bem como de instrução de segundo grau ou superior, fora da prisão, só é compatível com os regimes semi- aberto e aberto”, e que “o trabalho, desde que tenha carater educativo, pode ser escolhido pelo detento, na conformidade de suas aptidões ou de suas ocupações anteriores”.

Um ano mais tarde, com a publicação do Código de Processo Penal de 1941, pelo Decreto Lei 3.689, de 03 de outubro, a execução penal passou a ser disciplinada também no livro IV do referido documento, estabelecendo tal como outras leis anteriores, regras relativas ao trabalho do preso.

Com o restabelecimento da democracia, e o advento da Constituição Federal de 1946, as atenções seriam voltadas novamente à elaboração de um Código Penitenciário. Em 1956, o Ministro da Justiça Nereu Ramos constituiria uma comissão para elaboração de um código penitenciário, cujos trabalhos foram conduzidos por Oscar Penteado Stevenson, que em 1957 apresentou o Anteprojeto de Código Penitenciário. O trabalho não chegou a ser enviado ao Congresso Nacional, substituído pelo Projeto de Lei 636 que havia sido apresentado em 1951 pelo deputado Carvalho Neto, e que viria a ser sancionado em 02 de outubro de 1957, pela lei 3.274, vindo a constituir as chamadas Normas Gerais de Regime

Traria de maneira expressa o novo regulamento penitenciário o princípio da individualização das penas e o tratamento penitenciário, ao afirmar em seu artigo 1º, inciso I, que são normas gerais de regime penitenciário “A individualização das penas, de modo que a cada sentenciado, conhecida a sua personalidade, corresponda o tratamento penitenciário adequado”. No mesmo sentido, o tratamento deveria ser alcançado mediante “o trabalho obrigatório dos sentenciados, segundo os preceitos da psicotécnica e o objetivo corretivo e educacional dos mesmos”. No artigo 9, parágrafo primeiro, fora estabelecido que “visando a habilitar o sentenciado ao aprendizado, ou aperfeiçoamento, de uma profissão, que lhe assegure subsistência honesta na recuperação da vida livre, atenderá o trabalho às circunstâncias ambientais do seu futuro emprêgo: no meio urbano ou meio rural”.

O inciso XIII do citado artigo 1º traria ainda que “a educação moral, intelectual, física e profissional dos sentenciados”, tal como o trabalho, integraria o regime penitenciário. Ainda no que concerne à educação dos prisioneiros, estabeleceu-se que:

Art. 22. Tôda à educação dos sentenciados (art. 1º, inciso XIII), levando-se- lhes em conta os índices psico-pedagógicos (art. 9º) e orientada a sua vocação na escolha de uma profissão útil, objetivará readaptá-los ao meio social.Parágrafo único. Nêsse sentido serão organizados os respectivos programas, de modo que a educação intelectual, artística, profissional e física se processem em equilíbrio no desenvolvimento eugênico das faculdades mentais em consonância com a saúde e fortalecimento do corpo.

Art. 23. Na educação moral dos sentenciados, infundindo-se-lhes hábitos de disciplina e de ordem, também se compreendem os princípios de civismo e amor à Pátria, bem como os ensinamentos de religião, respeitada, quanto a êstes, a crença de cada qual.

Art. 24. Quando pela, classificação dos sentenciados (v e t a d o ) se registrar a presença de retardados mentais, dar-se-lhes-á, em curso separado, e em estabelecimentos ou pavilhão à parte, a educação compatível com as suas faculdades.

Quando da publicação das Normas Gerais de Regime Penitenciário em 1957, o mundo já assistia a consolidação das idéias de direitos humanos e dignidade humana advindos da criação da Organização das Nações Unidas em 1945, e da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Como explica o professor

Giuseppe Tosi (2005, p.22), a partir da Declaração Universal, uma série de pactos, protocolos e conferências desenvolveriam a idéia de direitos humanos a partir de três tendências: universalização, pela qual cada vez mais países reconheciam aqueles princípios e os adotavam nas constituições nacionais; multiplicação, pela qual novos bens ou direitos dos homens foram inseridos no rol dos direitos humanos, como o meio ambiente e a identidade cultural; e finalmente, a diversificação ou especificação, consistente na criação de documentos para proteção de sujeitos específicos (idosos, menores, afro-descendentes, mulheres, refugiados), agora considerados como titulares de direitos humanos.

Inserida nesse contexto de especificação dos direitos humanos, a ONU viria a adotar, no ano de 1955, por ocasião do I Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra, as chamadas Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros, visando estabelecer princípios de organização penitenciária e práticas para o tratamento de reclusos, a serem seguidos pelos seus países membros, conforme já fora tratado no capítulo dois deste trabalho. Tal documento viria a influenciar a produção legislativa sobre execução penal que se gestava no Brasil.

Trataram as regras mínimas de reforçar as finalidades retributiva e preventiva da pena de prisão nos seus itens 58 e 59, dedicando atenção especial ao chamado “tratamento penal”:

58. O fim e a justificação de uma pena de prisão ou de uma medida semelhante que priva de liberdade é, em última instância, de proteger a sociedade contra o crime. Este fim só pode ser atingido se o tempo de prisão for aproveitado para assegurar, tanto quanto possível, que depois do seu regresso à sociedade, o criminoso não tenha apenas à vontade, mas esteja apto a seguir um modo de vida de acordo com a lei e a sustentar-se a si próprio.

59. Nesta perspectiva, o regime penitenciário deve fazer apelo a todos os meios terapêuticos, educativos, morais, espirituais e outros e a todos os meios de assistência de que pode dispor, procurando aplicá-los segundo as necessidades do tratamento individual dos delinqüentes.

A educação e o trabalho foram incluídos nas regras mínimas, como meios indispensáveis para a obtenção de sucesso no tratamento penitenciário. Quanto à educação, dispuseram as regras que:

Devem ser tomadas medidas no sentido de melhorar a educação de todos os reclusos que daí tirem proveito, incluindo instrução religiosa nos países em que tal for possível. A educação de analfabetos e jovens reclusos será obrigatória, prestando-lhe a administração especial atenção.

2) Tanto quanto for possível, a educação dos reclusos deve estar integrada no sistema educacional do país, para que depois da sua libertação possam continuar, sem dificuldades, a sua educação.

Dentre seus artigos, recomendava ainda o referido documento no item 40 que “cada estabelecimento penitenciário deve ter uma biblioteca para o uso de todas as categorias de reclusos, devidamente provida com livros de recreio e de instrução e os reclusos devem ser incentivados a utilizá-la plenamente”.

No ano de 1963, no decurso do governo de João Goulart, João Mangabeira, então ministro da justiça, convidou o jurista Roberto Lyra para presidir a revisão do Anteprojeto de Código Penal de Nelson Hungria76, do Anteprojeto do Código de

Processo Penal de Hélio Tornaghi77, e para elaborar um novo projeto de código das

execuções penais. Devido à revolução em 1964, esse projeto fora então abandonado78.

Em 29 de outubro de 1970, José Carlos Moreira Alves, coordenador da Comissão de Estudos Legislativos encarregada da elaboração de um código penitenciário pelo então Ministro da Justiça Alfredo Buzaid, apresentou o Código de

Execuções Penais, elaborado pelo professor Benjamin Morais Filho e revisado pelos

professores José Frederico Marques, José Salgado Martins e José Carlos Moreira Alves. Era o quarto projeto de regulamentação das execuções penais no país apresentado.

Ocorre que, como explica Licínio Barbosa (1982, p.303), a vigência do Código Penal de Nelson Hugria fora prolongada por diversas vezes, tanto que, fora modificado pela Lei 6.016, de 31 de dezembro de 1973, pela Lei 6.426 de 1977, e

76 Nelson Hungria havia sido encarregado da elaboração de um novo código penal em 1961, texto

que só foi efetivamente publicado em 1963 e sancionado em 21 de outubro de 1969, pelo Decreto 1.004.

77 Catedrático da faculdade de direito da universidade federal do Rio de Janeiro, fora encarregado de

apresentar um anteprojeto de Código de Processo Penal em 1962.

78 Os projetos de Nelson Hungria e Roberto Lyra foram considerados os mais técnicos apresentados

até então, sobretudo por combinarem de maneira clara as influências teóricas de seus autores, Nelson Hungria, positivista, liberal e conservador, e Roberto Lyra, socialista-utópico e humanista (SERRA, 2006, p.158).

posteriormente substancialmente derrogado pela Lei 6.578, de 11 de outubro de 1978, sem ter ainda estado em vigência. Diante desse conjunto de modificação na legislação penal, o projeto do professor Benjamin Morais Filho fora deixado de lado, e retomaram-se as discussões para a reforma da legislação criminal por inteiro (Código Penal, Código de Processo Penal, Legislação de Execução Penal).

Finalmente, conforme ensinam os professores Zaffaroni e Pierangeli (2011, p.195), em 1981 o Ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel formou uma comissão para reforma das leis penais, formada pelos professores Francisco de Assis Toledo, Francisco Serrano Neves, Miguel Reale Junior, René Ariel Dotti, Ricardo Antunes Andreucci, Rogério Laura Tucci e Hélio da Fonseca. Em fevereiro de 1981, foi encaminhado ao ministro a anteprojeto de Código Penal; em março, o anteprojeto de Código de Processo Penal; e em julho, o anteprojeto da Lei de Execuções Penais. Após um conjunto de revisões que se iniciaram ainda naquele ano, os anteprojetos de Código Penal ( parte geral) e de Lei das Execuções Penais foram convertidos nas Leis 7.209 e 7.210 respectivamente. Desde sua primeira publicação em 1941, o Código de Processo Penal viria a ser modificado por mais de 60 leis, já o Código Penal original de 1940 seria modificado por mais de 110 outras normas, e por sua vez, a Lei de Execuções Penais de 1984, viria a ser modificada por 28 outras normas, sendo a última, de 06 de outubro de 2015.

No que diz respeito à educação nas prisões, analisando a regulamentação dada pelo conjunto da legislação criminal brasileira em vigor hoje, combinada com o estudo das disposições de natureza penal contidas na Constituição Federal de 1988, e das resoluções do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, é possível inferir, com efeito, a natureza corretiva a partir da qual a educação de presos é pensada no discurso punitivo oficial, herança de toda a tradição jurídico- penal no país.

O fundamento do direito à educação dos privados de liberdade é expresso no artigo 205 da Constituição Federal, ao consagrar o princípio da universalidade da educação, afirmando que ela constitui-se como um direito de todos, que deve ser garantido pelo Estado e da família, promovido e incentivado “com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Tal dispositivo é complementado com o artigo 38 do Código Penal, que estabelece “o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as

autoridades o respeito à sua integridade física e moral”, e pelo artigo 3 da Lei de Execuções Penais, ao afirmar que “ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”.

Sobre o direito do preso à educação, o professor Heitor Piedade Júnior (2005, p.3-5), explica que não se inclui dentre os efeitos da condenação criminal a desconstituição da humanidade do preso, nem tampouco, sua condição de cidadão, assim, pelo menos do ponto de vista normativo, continua ele sendo um sujeito de direitos.

No mesmo sentido ensinam as lições clássicas de Jason Albergaria (1999, p.150) que “o preso não só tem deveres a cumprir, mas é sujeito de direitos que devem ser reconhecidos e amparados pelo Estado”. E continua a explicação, esclarecendo que o indivíduo privado de sua liberdade não está fora do direito, pois