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II — A Situação dos Refugiados e Requerentes de Asilo

1. Entrada de Refugiados

A Europa sempre recebeu grandes contingentes de migrantes em busca de melhores condições de vida e também de indivíduos fugindo de conlitos, per- seguições e violência. As principais regiões de origem dessas pessoas são a África, o Oriente Médio, a Ásia meridional e o Leste Europeu. Mas, nos últimos anos, desde o início dos movimentos que icaram conhecidos como a “Prima- vera Árabe” em 2011, o luxo de migrantes e pessoas necessitadas de proteção internacional aumentou e tende a continuar enquanto durarem os conlitos e a instabilidade social e política. Um fator que facilitou a travessia do Mediterrâ- neo a partir da Tunísia, da Líbia e do Egito foi o fato de que, com a queda dos governos e a decorrente instabilidade, o policiamento nas costas desses países também foi enfraquecido, o que representou um obstáculo a menos para as pessoas que desejavam chegar ao continente europeu pelo mar. A chegada desses grandes luxos tem causado impactos de origem econômica, social e politicamente nos países-membros da UE.

Entre janeiro e julho de 2013, um total de 225.000 requerimentos de asilo foram apresentados nos 38 países europeus, o que representa um crescimento de 23% em comparação com o mesmo período de 2012. Desse total, 192.000 foram apresentados aos Estados-membros da UE33. Até meados de 2013, só na

Itália, 30.100 migrantes haviam desembarcado, oriundos de países como Síria, Somália e Eritreia, sendo a Líbia o principal ponto de embarque dessas pessoas rumo à costa italiana34.

O que tem ocorrido é que, com o aumento dos controles sobre as fron- teiras externas, a UE impede que os migrantes possam utilizar os meios de transporte regulares e, dessa forma, obriga-os a apelar para contrabandistas e traicantes, que cobram altas taxas para levá-los até a Europa por meios peri- gosos e ilegais. Como a política migratória da UE busca combater a imigração ilegal, essas pessoas são frequentemente enviadas de volta para seus países ou para os países de trânsito nos quais se encontravam35.

Muitas pessoas que fazem a travessia do Mar Mediterrâneo, o fazem de maneiras muito arriscadas e perigosas, o que tem levado à ocorrência de diver- sos naufrágios e à consequente morte de centenas de pessoas. Esse fenômeno não é tão novo já que se estima que, a partir de meados da década de 1990,

33 2014 UNHCR country operations proile — Europe. Disponível em: <http://www.unhcr.org/

pages/4a02d9346.html>

34 Dado disponível em: <http://www.publico.pt/mundo/jornal/patrulha-do-mediterraneo- -passou-a-ter-prioridade-sobre-todas-as-missoes-do-frontex-27220374>

35 LOCHAK, Danièle. L’Europe, terre d’asile ?. In : La Revue des droits de l’homme [En ligne], 4 | 2013. Disponível em: <http://revdh.revues.org/401>

20.000 pessoas morreram no Mediterrâneo ao fazer a travessia para a Euro- pa36. A ilha italiana de Lampedusa é um dos principais destinos daqueles que

querem chegar à Europa devido à sua proximidade com as costas dos países do norte da África, mais especiicamente da Tunísia. Nela encontra-se um forte controle para a entrada de pessoas e também diversos acampamentos para os refugiados que aguardam análise de seus processos (nos quais eles deveriam passar apenas alguns dias, mas, muitas vezes, acabam ali coninados por tempo indeterminado), e é para onde são levadas as vítimas dos naufrágios.

O que tem ocorrido em Lampedusa ressalta a necessidade de solidarie- dade37. Primeiramente, em relação aos países terceiros que estão lidando com

as revoltas internas e os movimentos que afetam a região. Nesse caso, o apoio da UE ajudou a Tunísia e o Egito a melhor gerenciar a situação e assegurar proteção para milhares de pessoas que fugiram da Líbia. Em segundo lugar, em relação aos próprios Estados-membros que enfrentam a chegada repenti- na desse grande número de migrantes. Por exemplo, em 2011, as autoridades italianas pediram a ajuda da UE, mas não tiveram a resposta esperada e neces- sária. A Comissão Europeia airmou à Itália que ela devia utilizar os fundos já disponíveis e que uma ajuda adicional seria disponibilizada se necessário. Os Estados-membros não consideraram que a chegada de 15.000 tunisianos na costa italiana fosse tão urgente que requeresse a aplicação de procedimentos especíicos, o que mais tarde se mostrou um erro.

Sentindo-se ignoradas, as autoridades italianas tomaram a decisão de emi- tir permissões de residência e de viagem para os tunisianos que chegavam à Lampedusa para que eles pudessem viajar através do espaço Schengen e ir para outros países. Essa decisão, cuja legalidade em relação às leis de Schen- gen é questionável, gerou uma reação por parte das autoridades francesas, que, temporariamente, restabeleceram o controle em suas fronteiras nacionais. Esse episódio desencadeou uma série de reações que colocaram à prova o princípio da solidariedade entre os Estados-membros e pode ser considerado um dos muitos efeitos desse fenômeno que tem afetado a área de livre circula- ção europeia e tem causado o enfraquecimento da coniança mútua.

A Síria, atualmente, é o país que sofre com a mais grave crise humanitária, já contabilizando 2 milhões de refugiados38. Essa situação teve impactos na

UE, visto que os sírios são responsáveis por grande número dos pedidos de

36 Id.

37 PASCOUAU, Yves. Schengen et la solidarité :le fragile équilibre entre coniance et méian-

ce mutuelles. In: Projet “La solidarité Européenne à l’épreuve”. European Policy Centre,

Policy Paper 55. 2012. Disponível em: <http://www.notre-europe.eu/media/schengen_ solidarite_y.pascouau_ne-epc_juillet2012.pdf?pdf=ok>

38 Dado do ACNUR disponível em: http://g1.globo.com/revolta-arabe/noticia/2013/09/nu- mero-de-refugiados-sirios-chega-2-milhoes-diz-agencia-da-onu.html

asilo no bloco. Dados dos Relatórios Regionais de Operações do ACNUR de 2014 revelam que a Alemanha e a Suécia foram os mais afetados, já que rece- beram mais de 50% dos pedidos sírios. Alemanha e França, seguidas de Suécia e Reino Unido, foram os países da UE que, no geral, mais receberam pedidos de asilo em 201339. O maior número de pedidos vem da Rússia, seguida pela Síria,

Afeganistão, Sérvia, Iraque e o Irã. Os apátridas também constituem um grande grupo de requerentes de asilo, e estima-se que hoje existam 436.000 apátridas na Europa central e ocidental40. Além desses países que enviam grandes contin-

gentes de refugiados, outro importante grupo envolve as pessoas deslocadas ainda como resultado das guerras nos Bálcãs no período entre 1991 e 199541.

Um ponto a ser destacado é que antes do início das revoltas da chamada “Primavera Árabe”, países como Líbia, Egito e Síria eram recebedores de mi- grantes e refugiados vindos de outros países da África e do Oriente Médio42.

Dessa forma, com o início das revoltas, estes também representavam outro grupo que, mais uma vez, deveria migrar para um lugar mais seguro e estável, o que diz respeito também à UE43.

2. Leis de Proteção dos Refugiados e Direitos

A Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados (também chamada Convenção de Genebra de 1951) e o Protocolo de 1967, adicional à anterior, dão grande ênfase à necessidade de integração dos refugiados e enu- meram direitos sociais e econômicos que devem ser observados para que essa integração ocorra de forma efetiva. O artigo 34 da Convenção destaca que os Estados devem facilitar a “assimilação e naturalização” dos refugiados44, o que

é um ponto de extrema importância para que estes se sintam integrados à sua nova sociedade.

De acordo com a Diretiva  2004/83/CE  do Conselho, de 29  de abril de 2004, os Estados-membros da UE devem conceder diversos direitos aos re- fugiados, sendo eles: o direito de não repulsão (non-refoulement), o direito de informação em um idioma que eles compreendam, o direito a uma autorização

39 2014 UNHCR country operations proile — Europe. Disponível em: <http://www.unhcr.org/

pages/4a02d9346.html>

40 2014 UNHCR regional operations proile - Northern, Western, Central and Southern Europe.

Disponível em: <http://www.unhcr.org/pages/49e45bb01.html>

41 2014 UNHCR country operations proile — Europe. Disponível em: <http://www.unhcr.org/ pages/4a02d9346.html>

42 Diretiva  2004/83/CE  do Conselho, de 29  de Abril de 2004. Disponível em  : <http://eu- ropa.eu/legislation_summaries/justice_freedom_security/free_movement_of_persons_ asylum_immigration/l33176_pt.htm>

43 FARGUES, Philippe; FANDRICH, Christine. Migration after the Arab Spring. Disponível em: <http://www.migrationpolicycentre.eu/docs/MPC%202012%20EN%2009.pdf>

44 UNHCR. Integration (refugee rights) and Family Reuniication. Disponível em: <http://www.

de residência com validade de no mínimo três anos, o direito de livre circulação dentro do país que lhe concedeu o asilo e o de viajar para fora desse país, o direito de trabalhar recebendo um salário ou de forma independente, o direi- to à educação aos menores e a cursos de formação para adultos, o direito à assistência médica, inclusive a especializada para atender vítimas de traumas e violência, o direito a um alojamento em condições adequadas, e o direito ao acesso de programas e projetos que visem facilitar a integração do refugiado na nova sociedade ou o regresso voluntário a seu país de origem45.

No que tange ao escopo legal dessa questão, o avanço mais signiicativo em 2013 foi a adoção das alterações na legislação quanto à concessão do asilo e ao acolhimento dos requerentes, que exigiram extensa transposição a nível nacional no ano de 2014 e reforçam as normas de proteção na região46.

3. Condições para se beneiciar de proteção internacional

Podem solicitar a condição de refugiado os indivíduos que, devido a temores fundamentados de perseguição “por motivos de raça, religião, nacionalidade,

por pertencer a determinado grupo social e por suas opiniões políticas, se en- contre fora do país de sua nacionalidade e não possa ou, por causa dos ditos temores, não queira recorrer à proteção de tal país; ou que, carecendo de na- cionalidade e estando, em consequência de tais acontecimentos, fora do país onde tivera sua residência habitual, não possa ou, por causa dos ditos temores, não queira a ele regressar”47.

Na análise dos pedidos de asilo, os Estados da UE devem considerar a origem da ameaça à qual o requerente está sendo sujeito já que, para lhe ser concedido o asilo, a ameaça deve emanar do Estado, dos partidos e organiza- ções que controlam o Estado ou de agentes não governamentais no caso de o Estado não poder ou não querer conceder proteção ao indivíduo. São conside- rados ameaça ou perseguição as seguintes ações que constituem violações dos direitos humanos: violência física ou mental, incluindo violência sexual; medidas legais, administrativas, policiais ou judiciais e ações, e sanções discriminatórias; atos de natureza especíica em relação a gênero ou em relação a crianças48. O

refugiado pode vir a perder sua proteção se conseguir uma nova nacionalida-

45 Diretiva  2004/83/CE  do Conselho, de 29  de Abril de 2004. Disponivel em: <http://eu- ropa.eu/legislation_summaries/justice_freedom_security/free_movement_of_persons_ asylum_immigration/l33176_pt.htm>

46 2014 UNHCR regional operations proile - Northern, Western, Central and Southern Europe.

Disponível em: <http://www.unhcr.org/pages/49e45bb01.html>

47 Convenção Relativa ao Estatuto do Refugiados de 1951. Disponível em: <http://www.hrea. org/index.php?doc_id=511>

48 Directiva  2004/83/CE  do Conselho, de 29  de Abril de 2004. Disponível em: <http://eu- ropa.eu/legislation_summaries/justice_freedom_security/free_movement_of_persons_ asylum_immigration/l33176_pt.htm>

de, se regressar voluntariamente a seu país ou caso as circunstâncias que leva- ram ao seu pedido de asilo tenham se alterado ou deixado de existir a ponto de não ser mais necessária a concessão da proteção49.