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implementação e trajetória de execução

No documento Pobreza, Desigualdades e Educação Volume I (páginas 105-110)

Daiani Damm Tonetto Riedner Ana Carolina Pontes Costa

Introdução

A extensão durante muito tempo na universidade foi levar migalhas de conhecimentos de pesquisa, de docência para os pobres, para os outros, para as vidas, para os camponeses, para os trabalhadores, era uma dire- ção da universidade para eles, este programa representa uma inversão, não é levar pesquisas da pobreza para os pobres, mas reconhecer que os pobres têm suas teorias, seus saberes. Esses saberes, como falava Paulo Freire, de terríveis e brutais experiências feitas que entram na universi- dade. Não estamos simplesmente levando migalhas de pesquisa para os pobres, estamos invertendo, estamos reconhecendo os pobres e a pobreza. As indagações que chegam desse viver na pobreza interrogam a pesquisa, interrogam a docência. E, consequentemente, mudamos a direção.

Miguel Arroyo (2017) Iniciamos este relato com a transcrição de um trecho da fala do Professor Miguel Arroyo, proferida na conferência de abertura do I Encontro Estadu- al da Iniciativa Educação, Pobreza e Desigualdade Social da UFMS. Esse

projeto trouxe uma inovação e uma mudança de direção para 14 estados brasileiros, por meio de 14 instituições públicas de ensino superior.

Essa mudança de direção, tencionou mudanças institucionais, nas práti- cas dos professores, na percepção dos gestores, nos objetos de pesquisa e nos interesses de pesquisa da comunidade acadêmica. O olhar para os po- bres e para a pobreza mobilizou um projeto inédito, audacioso, desafiador e muito coerente com a defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, de acesso e permanência, de condições de existências dignas, de justiça social, de diminuição das desigualdades sociais.

Este texto tem como objetivo mostrar um pouco da trajetória da Univer- sidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) nesse projeto, dando desta- que às etapas de implementação da proposta, à metodologia da oferta do curso e à realização da pesquisa institucional realizada na instituição, tendo como base as diretrizes nacionais discutidas no âmbito da Secadi/MEC.

A Iniciativa Educação, Pobreza e Desigualdade na UFMS: da

recepção à implementação da proposta

No contexto da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, por meio da Coordenação Geral do Comitê Gestor Institucional de Formação Inicial e Continuada de Profissionais da Educação Básica (Comfor), as discussões sobre o projeto da Iniciativa EPDS, que nesse momento ainda era chamado de Programa, iniciaram no final do ano de 2013.

Nessa época, o Comfor era conduzido pela Coordenadoria de Apoio à Formação de Professores, da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (CFP/ Preg). Com a mudança na administração central e reorganização do organo- grama da universidade em fevereiro de 2017, a CFP foi extinta, e foi criada a Divisão de Apoio à Formação de Professores, Articulação e Aperfeiçoa- mento Pedagógico (Difor), vinculada à Secretaria Especial de Educação a Distância e Formação de Professores (Sedfor).

Assim que a proposta da Iniciativa chegou de forma oficial na UFMS, várias unidades foram consultadas, mas em princípio não houve manifesta- ção de interesse. Chegaram a sugerir a Escola de Administração e Negócios (Esan), mas, como a proposta era voltada para a área da Educação, esse não seria o setor mais apropriado. Como não houve interesse da Unidade de Educação, que hoje é Faculdade de Educação, nem de outros cursos vinculados à formação de professores na Cidade Universitária (Campo

Grande-MS), o convite chegou até o Curso de Pedagogia do campus do Pantanal, na Cidade de Corumbá-MS.1

Em 5 de maio de 2014, quando recebemos o convite para assumirmos a coordenação de um projeto de formação continuada, não tínhamos nenhu- ma ideia da dimensão da proposta e não imaginávamos que ela seria um marco na nossa vida pessoal e profissional, além de ser um divisor de águas para o olhar científico e educacional sobre a pobreza e a desigualdade social no estado de Mato Grosso do Sul.

Ainda com pouquíssimo tempo de universidade, quase nenhuma expe- riência de gestão e algum conhecimento das normas de funcionamento da universidade, dos trâmites dos processos e dos setores com os quais tería- mos que trabalhar, aceitamos o desafio e embarcamos numa aventura cheia de surpresas, percalços, dificuldades, mas de muito aprendizado.

Uma semana após o aceite do convite, aconteceu a primeira reunião téc- nica, no período de 13 a 15 de maio de 2014. Como não havia mais tempo há- bil para irmos, o professor da Escola de Administração e Negócios da UFMS (que era a indicação inicial para a gestão do projeto) participou da reunião e nos trouxe a memória da reunião. De posse das informações básicas sobre a implementação da proposta, iniciamos as articulações necessárias e, com elas, as viagens para a Cidade Universitária.

O campus do Pantanal fica a 430 quilômetros da Cidade Universitária em Campo Grande, onde estão situados as Pró-Reitorias e o setor de Educação a Distância, que na época era Coordenadoria de Educação Aberta e a Dis- tância (CED/Preg) e com nova administração passou a ser uma Divisão de Educação a Distância (Diead), vinculada à Sedfor. Durante toda a trajetória da Iniciativa, fizemos esse trajeto inúmeras vezes, a fim de resolver questões administrativas e pedagógicas da implementação da proposta.

Nos meses de maio e junho de 2014 trabalhamos, às pressas, em um documento chamado "Plano de Trabalho", para que pudéssemos dar início ao processo do "Termo de Execução Descentralizada". Pela primeira vez estávamos ouvindo essas terminologias, e o prazo era extremamente curto para a apresentação desse documento em um sistema totalmente desco- nhecido, o Simec. Foi apenas nesse momento que ficamos sabendo que o

1 A UFMS é multicampi e possui mais nove Unidades Setoriais no interior do estado de Mato Grosso do Sul, nos municípios de Aquidauana, Chapadão do Sul, Corumbá, Co- xim, Naviraí, Nova Andradina, Paranaíba, Ponta Porã e Três Lagoas.

projeto tinha um recurso, que seria enviado à universidade por meio de uma Nota de Crédito.

Os nossos esforços voltaram-se à elaboração e junção dos documentos que comporiam o TED, para que o recurso fosse descentralizado no ano de 2014. Enviamos o PTA do TED em 21 de maio de 2014, via Simec no módulo SPO-TED, e em 27 de junho ele foi aprovado para execução.

Com a Nota de Crédito ainda era preciso empenhar os recursos para execução, mas, como o curso teria início somente no ano de 2015 e não ha- via certeza de que os recursos ficassem disponíveis após o fim do exercício financeiro de 2014, nossa alternativa foi buscar a parceria da Fundação de Apoio à Pesquisa, ao Ensino e à Cultura (Fapec). Iniciou-se então uma discus- são interna sobre a viabilidade dessa parceria, e, após um longo processo de tratativas administrativas, financeiras e jurídicas, foi firmado em dezembro de 2014 um instrumento jurídico na forma de contrato com a Fapec, para prestar apoio administrativo e financeiro à gestão da Iniciativa EPDS na UFMS.

Em paralelo, tínhamos outro desafio muito importante: construir um pro- jeto de curso de especialização. Da primeira reunião técnica, nós tínhamos a versão do projeto básico do curso produzido pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Procuramos as normativas internas e consegui- mos um modelo de projeto de curso de especialização lato sensu da UFMS. A partir desse modelo e com o projeto básico da UFSC construímos uma proposta, quase "no escuro", pois tínhamos muitas dúvidas sobre possíveis mudanças de nomenclatura, de carga horária dos módulos ou de inclusão de um módulo de metodologia científica, por exemplo.

Na dúvida, resolvemos manter a proposta original, seguindo ao pé da letra a proposta da UFSC, que posteriormente até apresentou uma mudança no nome dos módulos, mas nosso projeto já tinha sido aprovado, fato que gerou um retrabalho de alteração das resoluções de aprovação da estrutura curricular do curso.

As tratativas para oferta do curso iniciaram em maio, e a aprovação do curso se deu pela Resolução do Conselho Universitário no 61, de 4 de agosto de 2014. E logo em seguida começamos a trabalhar no edital de seleção dos cursistas, trabalho este que foi feito antes da composição da equipe e foi um processo muito difícil, principalmente pelo despreparo técnico da UFMS para esse tipo de seleção.

No mês de setembro de 2014 foi feita a composição mínima da equipe, com o supervisor e os dois pesquisadores. Criamos um grupo de trabalho na

instituição, com acadêmicos de graduação, de mestrado e outros docentes interessados no objeto de pesquisa para a construção do projeto.

Nos dias 12, 13 e 14 de novembro de 2014 aconteceu a I Reunião Peda- gógica de Formação Continuada da Secadi/MEC, em que tivemos a oportu- nidade de conhecer os representantes das demais Instituições Públicas de Ensino Superior (Ipes) que estavam ofertando a proposta, mas principalmen- te pudemos conhecer mais a fundo o movimento e as pessoas que se mo- bilizaram em prol da construção de um projeto inovador e muito audacioso. A Profa. Simone Medeiros, da Coordenação Geral de Acompanhamento da Inclusão Escolar (CGAIE\DPEDHUC\Secadi), idealizadora da proposta, falou detalhadamente sobre as ações de formação continuada, pesquisa acadêmica e difusão de conhecimento, que deveriam convergir na Iniciativa EPDS em todas as instituições.

Nesse momento também pudemos conhecer melhor a concepção, os objetivos, a metodologia, as propostas de avaliação do curso de especializa- ção, bem como todo o material pedagógico e o ambiente virtual de apren- dizagem (Moodle EPDS) com o Professor Adir Garcia, do Comitê Gestor da Produção do Material Pedagógico da UFSC.

Várias estratégias e desafios à implementação foram apresentados e discutidos nessa reunião, tais como a criação de um Grupo de Trabalho In- terinstitucional Local (GTIL), que deveria ser composto dos representantes das secretarias municipais e estadual de educação, pela equipe estadual da gestão do Bolsa Família e pela UFMS.

Outro ponto importante da reunião foi a proposta de construção de uma pesquisa interinstitucional para tratar das relações entre educação, pobreza e desigualdade social. Naquele momento algumas experiências de pesquisa já estavam sendo vivenciadas pela UFMA, UFRN e UFPE.

E, por fim, tivemos uma capacitação sobre os aspectos administrativos e financeiros para execução do curso de especialização, que envolvia, além da descentralização dos recursos via TED, a gestão das bolsas, por meio do Sistema de Gestão e Monitoramento da Formação – Simec/Sisfor.

Em dois dias de trabalho em Brasília, nós tivemos que angariar as in- formações necessárias para os dois anos de trabalho subsequentes, que depois se transformaram em três anos, com os desdobramentos da pesqui- sa. No retorno dessa formação, tivemos certo sentimento de desespero, de despreparo, de não sermos as pessoas certas, de que não daríamos conta das demandas. Mas quem seriam as pessoas certas, senão aquelas que

acreditavam na proposta, mesmo sem nenhuma experiência de pesquisa na área, mesmo sem conhecer as pessoas que poderiam nos ajudar, mesmo sem saber por onde começar as articulações? Mesmo com todos esses im- pedimentos, as pessoas certas éramos nós.

O que nos mobilizou? No último dia da reunião em Brasília, encontramos uma pessoa, que também participava de um evento de formação de outro curso, que nos abordou e disse: "Fiquei sabendo que essa pobreza é muito rica. Se eu soubesse que tinha tanto recurso, teria assumido quando passou o convite pela unidade".

Nesse exato momento, tivemos a convicção de que estávamos no ca- minho certo, pois, quando aceitamos o desafio, não sabíamos dos recur- sos, nem das articulações, nem da visibilidade que esse projeto poderia trazer. Nós só sabíamos uma coisa: que teríamos muito trabalho. E fizemos acontecer!

Trajetória da Iniciativa EPDS: desafios do percurso formativo e do

No documento Pobreza, Desigualdades e Educação Volume I (páginas 105-110)