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Radicalizando o olhar e as atitudes

Ao longo dos 18 meses do CEEPDS, além de dificuldades pessoais dos cursistas (família, trabalho em três turnos) e difícil acesso à internet em muitos locais, tivemos problemas que contribuíram para uma evasão de 36,95%, principalmente em três momentos. Inicialmente, como muitos cur- sistas tinham apenas contratos temporários em prefeituras, em virtude de um concurso para professor, dedicaram-se aos estudos do concurso. Isso

ocasionou uma evasão de 13,86%. Em junho de 2016, com as atividades de reflexão-ação nas escolas, houve outro pico de evasão (atingindo 26,10% de evadidos desde o início do curso), quando muitos cursistas alegavam não ter condições de desenvolver atividades práticas, pois queriam apenas as atividades a distância, por falta de tempo ou interesse. No entanto, essas atividades foram fundamentais para nos aproximar das escolas e possibilitar uma abertura para as atividades de pesquisa de campo e elaboração de TCC que focaram nas formas de pensar, sentir e agir das crianças e adolescentes das escolas públicas do Maranhão (sobre temas como evasão escolar, gravi- dez na adolescência, relação família/escola, afetividade etc.), sensibilizando, ainda mais, todos os envolvidos no CEEPDS para a necessidade de com- preender e intervir sobre essa realidade. Outra fase que gerou um aumento no índice de desistência foi a de elaboração e defesas dos TCC. Um dos principais motivos foi o nível de exigência dos orientadores em relação ao cumprimento de prazos, desenvolvimento de pesquisa de campo e combate ostensivo ao plágio (inúmeros casos identificados). Em todas as situações, coordenação e tutores foram atuantes, dialogando com cada cursista, como já destacamos antes, interagindo por meio do ambiente virtual do curso e das redes sociais (principalmente nos grupos de cada turma). Recuperações e reposições de nota, com visitas aos polos e negociação de prazos, foram importantes para manter 270 cursistas até o final, cuja dedicação e empe- nho como pesquisadores foram exemplares. Quando olhamos a escolari- dade dos cursistas, identificamos que aqueles com outras especializações tiveram o menor índice de desistência (19,23%), por valorizarem o curso em uma universidade federal (conforme depoimentos); os maiores percentuais de desistência foram de cursistas ligados à rede municipal (40%), que eram maioria no início do curso (60% das matrículas), do sexo masculino (45%), sem maior expressão quanto à raça/etnia ou funções. Durante todo o percurso, a parceria UFMA, Undime e Seduc esteve fortalecida, e o Comfor apoiou o funcionamento do curso, agilizando processos, articulando reuniões com a reitoria, secretários de educação e demais instâncias que se fizeram neces- sárias para o êxito do curso.

O formato como o curso foi pensado e explicitado ao longo dos seus módulos possibilitou o desenvolvimento de metodologias participativas, estimulando o envolvimento dos cursistas nas atividades de reflexão-ação e acompanhamento do material escrito e dos vídeos. Tivemos abertura para ampliar essas atividades e adequá-las aos propósitos da equipe gestora no

que se refere a garantir uma maior aproximação com as realidades das es- colas públicas que crianças e adolescentes do Programa Bolsa Família na Educação frequentavam. Os 270 cursistas que concluíram a especialização são de cerca de 100 municípios do estado do Maranhão (de um total de 217 municípios) e realizaram estudos sobre a realidade social e o contexto escolar de escolas públicas, com o desafio de compreender melhor essa realidade a partir da visão das crianças e adolescentes. Esse percurso meto- dológico despertou em nossos cursistas a necessidade de se envolver com iniciativas voltadas para o combate à pobreza e à desigualdade social. Além do material dos módulos do curso, os alunos, que em sua maioria são pro- fessores de escolas públicas, participaram das atividades de reflexão-ação, com a realização de visitas às famílias das crianças e adolescentes (de 6 a 17 anos de idade) que recebem o benefício do Bolsa Família para manter os filhos na escola. Nessas famílias, muitos pais são analfabetos, desejam uma vida diferente para seus filhos, embora outros não valorizem a educação e queiram que os filhos os acompanhem na pesca ou na roça. Nas escolas, os professores reclamam que as famílias não assumem sua parte e querem que a escola dê conta da educação dos filhos deles. Uma das atividades que teve maior impacto sobre os cursistas foi a realização de oficinas sobre sonhos e educação financeira, com o propósito de se aproximar da realidade das crianças e adolescentes pobres nas escolas públicas do Maranhão, desper- tando os sonhos de cada criança e adolescente para acreditar no seu poten- cial e, por meio da educação, definir objetivos e metas que lhes permitam obter sucesso ao longo da vida estudantil e profissional. Os resultados foram surpreendentes e mostraram que, ao instigar essas crianças e adolescentes, eles têm um grande poder de ação. O alcance das oficinas foi além do espa- ço da sala de aula onde cerca de 2 mil crianças e adolescentes interagiram com nossos cursistas e contribuíram efetivamente para o êxito da pesquisa para a realização dos TCC.

Cabe ressaltar o papel dos órgãos gestores e parceiros. O Comfor teve um papel essencial para o êxito do CEEPDS-UFMA. Desde a fase de elabo- ração e tramitação do Projeto Político-Pedagógico, articulou reuniões com a reitoria, secretarias estadual e municipais de educação, participando das reuniões com a Seduc e Undime. Em termos estruturais, foi responsável di- retamente pela estruturação de uma sala exclusiva para a especialização. Participou ativamente da realização do curso, com apoio logístico para as

viagens aos municípios e realização dos encontros presenciais nos oito cam- pi da UFMA.

A competência do MEC na condução deste projeto, desde a sua ela- boração, foi exemplar. A Coordenação da Iniciativa Nacional acompanhou com responsabilidade cada etapa do planejamento e execução, agilizando as respostas às nossas demandas, dando suporte tecnológico e garantindo a liberação total dos recursos planejados.

Além de acompanhar intensivamente a realização do curso, via sistema e reuniões presenciais, a coordenação viabilizou a nossa participação em reunião com os coordenadores estaduais do Programa Bolsa Família na Educação e sempre nos sensibilizou para conhecer o acompanhamento e o significado do Sistema Presença. Além disso, foi incisiva na criação e manutenção do Grupo de Trabalho Interinstitucional (GTIL), garantindo que UFMA, Comfor, Seduc e Undime se articulassem para o desenvolvimento e êxito do CEEPDS. A realização desta especialização foi de grande relevância para o estado do Maranhão. Os 258 cursistas que finalizaram e defenderam seus TCCs têm uma grande oportunidade de propor ações que contribuam para alterar a realidade das crianças e adolescentes em situação de pobreza e extrema pobreza, nas escolas públicas. Com este curso, alcançamos cerca de 5 mil pessoas, entre coordenação, docente, cursistas, gestores, crianças, adolescentes e familiares.

Participar desse projeto foi, em primeiro lugar, uma lição de vida adquiri- da a cada dia desses três anos, entre a elaboração da proposta e execução do curso; aprendemos que as políticas públicas podem ser totalmente eficazes quando se tem um acompanhamento intensivo e próximo. A CGAIE, com sua competente equipe, por meio da Coordenação da Iniciativa Nacional EPDS, preza pela seriedade das ações e busca pela transformação da realidade. Dessa forma, seguindo o exemplo da coordenação nacional, aprendemos a caminhar com segurança, ousando nas ações de enfrentamento à pobreza no estado do Maranhão, idealizando e realizando oficinas de sonhos e edu- cação financeira com cerca de 2 mil crianças e adolescentes nas escolas pú- blicas de 70 municípios do estado. Aprendemos que cada um é responsável pela mudança dessa realidade de pobreza no estado do Maranhão, o qual dispõe de grandes riquezas (econômica, cultural e social) as quais não justifi- cam a situação que encontramos nas escolas públicas. Muitas vezes é apenas um problema de gestão local e de ausência de acompanhamento das secre- tarias de educação. Tanto os cursistas quanto a equipe gestora encontraram

situações precárias na estrutura das escolas, como telhados quebrados, em risco de desabar, ramos de mato entrando em salas de aula, paredes das salas de aula totalmente riscadas com palavras de baixo calão, muitos livros amontoados pelos corredores e jogados em salas, crianças saindo da esco- la antes do horário por falta de lanche, lanches sem valor nutritivo, dentre outras situações. O olhar e acompanhamento mais intensivo das secreta- rias municipais, das instâncias de fomento e de formação podem contribuir para alterar essa realidade. Aprendemos que não podemos olhar e deixar como está: quando tomamos conhecimento, somos também responsáveis pela busca de soluções. Aprendemos que o espaço da sala de aula é um lugar privado, onde não se troca somente conhecimento, mas afetividade e busca pela realização de sonhos. Identificamos situações de bullying aluno/ aluno, professor/alunos. Ao trabalhar com as oficinas de sonhos e educação financeira, identificamos que crianças e adolescentes sonham em concluir o Ensino Médio e ir para uma universidade. Assim, entendemos o valor da educação para mudar a realidade de pobreza. As ações afirmativas (cotas) são essenciais para que essas crianças e adolescentes acessem o ensino su- perior gratuito, mas é na base que se pode ter uma ação eficaz. Se atrelada a uma educação de qualidade nas escolas, sem esquecer o papel da família na transmissão dos valores, teremos uma grande transformação na realidade. Aprendemos, principalmente, que é preciso discutir abertamente a pobreza no espaço das escolas para enfrentá-la. Os nossos especialistas estão pron- tos para multiplicar todo o conhecimento adquirido. Aprendemos o valor da parceria e que a educação a distância, quando bem conduzida, tem um papel fundamental na disseminação do conhecimento para um número bem maior de pessoas; assim, é sempre possível fazer mais e melhor quando nos comprometemos com o nosso próximo.

Referências

ARAÚJO, M. S. S. As formas de pensar, sentir e agir de crianças e adolescentes de escolas públicas

do Maranhão, sob a condicionalidade da educação: ponderações a partir das ferramentas ana-

líticas de Pierre Bourdieu. Texto orientador disponibilizado para os Cursistas para finalização do projeto de pesquisa. São Luis, 2016.

BARROS, A. J. S.; LEHFELD, N. A. S. Fundamentos da Metodologia Científica. São Paulo: Prentice Hall, 2007.

BRASIL. Curso de Especialização Educação, pobreza e desigualdade social. Projeto Político Peda- gógico. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão/Diretoria de Políticas de Educação em Direitos Humanos e Cidadania/Coordenação Geral de Acompanhamento da Inclusão Escolar. Brasília, 2014.

Ensino e pesquisa em Educação, Pobreza