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Imunidades tributárias x direitos fundamentais

Alguns autores defendem a existência de uma íntima relação entre as imunidades tributárias e os direitos fundamentais, que, no magistério de REGINA HELENA COSTA, albergaria os “direitos individuais e políticos (direitos de primeira geração), os direitos sociais, culturais e econômicos (direitos de segunda geração) e os direitos difusos e coletivos (direitos de terceira geração)”.385

Um dos argumentos mais utilizados para fundamentar esta premissa consiste em que as normas de competência constitucional-tributária tocariam, e, às vezes, excepcionariam alguns dos direitos e garantias fundamentais postos na Constituição Federal de 1988. REGINA HELENA COSTA dá como exemplos o direito à propriedade privada e o direito à liberdade, os quais, no seu entender, são obrigatoriamente atingidos pelo exercício da competência tributária.

HUMBERTO ÁVILA, abordando o relacionamento entre os direitos fundamentais e o Sistema Constitucional Tributário, expõe que a influência dos primeiros sobre estes últimos é um dos exemplos de que o “Sistema Tributário não se confunde, quantitativa ou qualitativamente, com o capítulo do Sistema Tributário Nacional: (...)”.386

De todo modo, conclui REGINA HELENA COSTA: “os direitos fundamentais dão suporte à atividade tributante do Estado, ao mesmo tempo em que configuram limites intransponíveis a essa mesma atividade”.387

Diferenciando conceito de definição, normas de competência constitucional-tributária de competência constitucional-tributária, normas de incompetência constitucional-tributária primária de incompetência constitucional-tributária primária, a forma com que estas normas se relacionam fica bem mais fácil de ser compreendida.

Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea” (STF, 2ª T., HC 94.695/RS, rel. Min. Celso de Mello, DJe 025, de 05.02.2009).

385

COSTA, Regina Helena. Imunidades tributárias. Teoria e análise da jurisprudência do STF, p. 76.

386

ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 23.

387

Normas de competência constitucional-tributária e direitos fundamentais, em sua grande parte,388 foram introduzidos pelo legislador constituinte originário.389 Inexistindo diferença espaço-temporal entre o veículo introdutor que lhes pôs no ordenamento, não poderíamos, sem incorrer em grave contradição, afirmar, sem reservas, que os direitos fundamentais influenciam as normas de competência constitucional-tributária: a possibilidade disso ocorrer restringe-se às normas de competência constitucional-tributária introduzidas por Emenda Constitucional.

Agora, esta restrição não implica que os direitos fundamentais, como todas as normas integrantes de nosso ordenamento jurídico, influenciem, semanticamente, o ato de aplicação de normas de competência constitucional-tributária primária: até mesmo porque eles (direitos fundamentais) o fazem.

Essa intercambiaridade de sentidos, como observou o Ministro GILMAR MENDES ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 33-5/PA, dá-se até mesmo com a definição de direitos fundamentais.390 Ei-lo:

“O que significa, efetivamente, „separação de Poderes‟ ou „forma federativa‟? O que é um „Estado de Direito Democrático‟? Qual o significado da „proteção da dignidade humana‟? Qual a dimensão do „princípio federativo‟?

Essas indagações somente podem ser respondidas, adequadamente, no contexto de determinado sistema constitucional. É o exame sistemático das disposições constitucionais integrantes do modelo constitucional que permitirá explicitar o conteúdo de determinado princípio.”391

388

Não estamos afirmando que todas as normas de competência constitucional-tributária e aquelas instituidoras de “direitos fundamentais” foram introduzidas em um mesmo ato de enunciação. Dizemos apenas que grande parte das normas de competência constitucional-tributária e daquelas instituidoras de “direitos fundamentais” foram introduzidas pelo mesmo veículo introdutor.

389

Constituição Federal de 1988.

390

Para o Min. CARLOS AIRES BRITTO, direitos fundamentais são apenas aqueles insertos no Capítulo II da Constituição da República, pois são eles que dariam concretude aos princípios encartados no Capítulo I deste mesmo veículo introdutor, in verbis: “É que tenho tendência de fixar constitucionalmente a expressão „preceito fundamental‟ enquanto direito ou garantia que a própria Constituição chama de fundamental. E a Constituição só usa o adjetivo „fundamental‟ em duas oportunidades: para caracterizar os princípios (Título I – Dos Princípios Fundamentais); e para caracterizar certos direitos e garantias (Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais). Por isso é que me inclino a pensar, cada vez mais, que „preceito fundamental‟ é apenas aquele inserto no Título II da Constituição, é aquela regra que está a serviço de um princípio fundamental da República” (STF, Tribunal Pleno, ADPF 33-5/PA, rel. Min. Gilmar Mendes, DJU 06.08.2004, Ementário 2158-1).

391

Essa, portanto, é a forma que os direitos fundamentais e as normas de competência constitucional-tributária se relacionam: ambas, juntamente com incontáveis outras normas, conformarão um único ato de aplicação.

3.5. Imunidades tributárias, capacidade contributiva e vedação ao confisco

Imunidades são normas de incompetência constitucional-tributária primária. Sua aplicação, antes de instituir relação jurídico-tributária onde o sujeito passivo teria o dever de pagar, ao sujeito ativo, determinado valor a título de tributo, proíbe a incidência de norma desta natureza.

O princípio da capacidade contributiva encontra-se positivado no artigo 145, § 1°, da Constituição Federal de 1988, e prevê que:

“Sempre que possível,392

os impostos terão caráter pessoal e serão graduados

segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração

tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”393

Este princípio, informa-nos LUCIANO AMARO,

“(...) inspira-se na ordem natural das coisas: onde não houver riqueza é inútil instituir imposto, do mesmo modo que em terra seca não adiante abrir poço à busca de água. Porém, na formulação jurídica do princípio, não se quer apenas preservar a eficácia da lei de incidência (no sentido de que esta não caia no vazio, por falta de riqueza que suporte o imposto); além disso, quer-se preservar o contribuinte, buscando evitar que uma tributação excessiva (inadequada à sua capacidade contributiva) comprometa os seus meios de subsistência, ou o livre exercício de sua

392

A expressão “sempre que possível”, muito criticada pela doutrina, foi justificada pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL sob o argumento que o legislador constitucional teria dividido os impostos em reais e pessoais, de forma que a progressividade seria, regra geral, aplicável apenas a estes últimos. O trecho do voto proferido pelo Ministro MOREIRA ALVES nos autos do Recurso Extraordinário 153.771/MG, in verbis:

“(...) 3. Reza o § 1° do artigo 145: (...) Desse dispositivo decorre que a Constituição, adotando a distinção clássica segunda a qual os impostos podem ter caráter pessoal ou caráter real (é a classificação que distingue os impostos em pessoais ou reais), visa a que os impostos, sempre que isso seja possível, tenham o caráter pessoal, caso em que serão graduados – um dos critérios de graduação poderá ser a progressividade – segundo a capacidade econômica do contribuinte.

Por outro lado, em face desse dispositivo, não se pode pretender que a expressão „sempre que possível‟ se refira apenas ao caráter pessoal do imposto, e que, por isso, o princípio da capacidade contributiva seja aplicável a todos os impostos ainda quando não tenham caráter pessoal, como sustentam Américo Lacombe e José Maurício Conti, citados no voto do eminente relator” (STF, Tribunal Pleno, RE 153.771/MG, rel. Min. Carlos Velloso, DJU 05.09.1997, p. 41.892).

393

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