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Validade em Herbert L A Hart

1.8 Validade

1.8.2 Validade em Herbert L A Hart

Ao discorrer sobre a validade jurídica, HERBERT L. A. HART inicia sua exposição fazendo uma crítica às teorias que sustentam ou definem o sistema jurídico como um conjunto de normas que prescrevem condutas em caso de ocorrência de determinados fatos e sanções em caso de seu descumprimento. Os sistemas jurídicos modernos, em razão de sua complexidade, não poderiam ser entendidos apenas com o apoio deste tipo de instrumental.

Como solução HERBERT L. A. HART propõe que se aceite a existência de um contexto social mais complexo, onde a identificação das normas primárias de obrigação seria realizada por meio de normas jurídicas secundárias de reconhecimento. Estas regras forneceriam a todos, indistintamente, os critérios necessários à identificação das normas primárias de obrigação.

Como a forma de apresentação das normas de reconhecimento se daria, nos sistemas jurídicos modernos, das mais variadas formas,151 haveria, na maior parte dos casos, mecanismos ou instrumentos destinados a solucionar possíveis conflitos quando de sua aplicação: isso seria possível mediante hierarquização das normas de reconhecimento segundo uma ordem de subordinação e primazia relativas.152

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Cf. STF, Tribunal Pleno, RE 390.840/MG, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 15.08.2006, p. 25 (definição de faturamento e receita bruta para fins de tributação por contribuições para a seguridade social); STF, Tribunal Pleno, RE 116.121/SP, rel. Min. Octávio Gallotti, red. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, DJU 25.05.2001, p. 17 (definição de serviço para fins de tributação pelo ISS); STF, Tribunal Pleno, RE 166.772/RS, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 16.12.1994, p. 34.896 (definição de folha de salários para fins de incidência de contribuição previdenciária); STF, Tribunal Pleno, RE 94.580/RS, rel. Min. Djaci Falcão, DJU 07.06.1985, p. 8890 (definição de usucapião para fins de tributação pelo Imposto sobre Transmissão inter vivos).

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Como exemplo HERBERT L. A. HART aponta a constituição escrita, a legislação infraconstitucional e os precedentes jurisprudenciais.

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HERBERT L. A. HART diferencia, neste ponto, primazia relativa de derivação, ao passo que nem todos os elementos integrantes do sistema de direito positivo resultariam do exercício de atividade legislativa (ex.: costume e precedente no common law). Neste caso ele cita como exemplo os costumes, que mesmo retirando sua força normativa da aceitação de uma norma de reconhecimento, não derivaria do exercício de uma atividade legislativa. Caso entendamos que outros órgãos produtores de direito que não apenas o Poder Legislativo são aptos a introduzir normas no respectivo ordenamento jurídico, esta discussão perde completamente sua razão de ser. Caso se entenda que o

O fato das normas de reconhecimento não serem, na grande maioria dos casos, enunciadas expressamente não prejudicaria a sua identificação: sua existência ficaria demonstrada na dinâmica do sistema de direito positivo, ou seja, pela forma com que os órgãos produtores de direito identificariam (aplicariam) as normas jurídicas primárias (obrigação).

Estas regras, denominadas por HERBERT L. A. HART de secundárias, exerceriam a função de definir quais seriam os órgãos competentes para produzir e derrogar normas primárias, o procedimento competente e a forma de solução de eventuais conflitos. Surgiriam, então, as regras de reconhecimento, as regras de alteração e as regras de julgamento.

Definidos os elementos constitutivos do sistema de direito positivo,153 HERBERT L. A. HART passa a discorrer sobre os problemas vivenciados pela doutrina ao deitar-se sobre o tema da “validade”. Para HERBERT L. A. HART, o ponto nodal desta análise residiria na distinção entre enunciado interno e enunciado externo.

Ao distingui-los, diz HERBERT L. A. HART154 que o enunciado interno representaria o ponto de vista do sistema jurídico, onde uma pessoa aceitaria determinada norma de reconhecimento (sem descrever esta conduta) para aplicá-la, e, com isso, reconhecer a validade de outra norma pertencente a este mesmo sistema. Diferentemente, o enunciado externo consistiria em uma proposição expedida por um sujeito localizado fora do sistema jurídico, que, negando sua própria norma de reconhecimento, reconheceria que outros a aceitam.

Mantendo coerência a seu discurso,155 pondera HERBERT L. A. HART que a validade enquanto aplicação do direito se daria mediante produção de enunciados internos: aos enunciados externos caberia apenas descrever este fenômeno. Em outras palavras, apenas os participantes deste jogo (produtores de enunciados internos) abordariam a validade enquanto aplicação do direito. Os observadores (produtores de enunciados externos) se limitariam a explicar uma reação hostil em termos de probabilidade, de modo que seu ponto de vista não seria suficiente para compreender a regra jurídica enquanto tal.

processo de derivação normativa tem esteio justamente na ideia de fundamento de validade, a diferença apontada por HERBERT L. A. HART perderia, por mais este motivo, sua utilidade prática. Cf. O conceito de direito, p. 130/131.

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Seriam as normas primárias (obrigação) e as normas secundárias (de reconhecimento, de alteração e de julgamento).

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HART. Herbert L. A. O conceito de direito, p. 132.

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A distinção preconizada por HERBERT L. A. HART nos parece bastante útil, pois permite diferenciar as normas segundo seu “uso” e “menção”. Os enunciados internos (participantes) abordariam o tema da validade usando normas (ato de aplicação), enquanto os enunciados externos descreveriam a validade mencionando a sua aplicação (uso) ou não (desuso).

Pegando de empréstimo a doutrina de HERBERT L. A. HART, reforçamos que a nosso ver a doutrina não constrói norma jurídica: apenas menciona-a. Construção (uso) de norma jurídica é tarefa privativa dos órgãos autorizados pelo ordenamento jurídico para produzi-las.156

Ao relacionar a validade com a última norma de reconhecimento,157 HERBERT L. A. HART distingue a pressuposição de sua “existência” da pressuposição de sua “validade”: assim o faz pelo ambiente em que cada uma destas análises é perpetrada.

Para HERBERT L. A. HART, apenas mediante expedição de um enunciado externo (factual) se poderia afirmar a existência de uma norma jurídica. Aos enunciados internos restaria reconhecer a validade das normas jurídicas:158 assim o faria aplicando-as.159

A validade desta última regra de reconhecimento, advirta-se, não poderia ser questionada interna ou externamente: ela simplesmente é aceita como apropriada para esse fim.

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Esta regra, advirta-se, não se aplica àqueles que entendem estar a Ciência do Direito alocada no interior do sistema de direito positivo. Dentre estes podemos citar LUHMANN, Niklas, in Sociologia

do direito. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983, vols. I e II.

157

A regra última de reconhecimento de HERBERT L. A. HART se assemelharia à norma hipotética fundamental de HANS KELSEN. Sua localização no ápice da pirâmide jurídica dá-se pelo fato de que ela não se reporta a nenhuma outra regra de reconhecimento.

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“No sistema simples de normas primárias de obrigação, delineado no último capítulo, a afirmação de que determinada norma existia poderia ser apenas um enunciado factual externo: ou seja, um enunciado que um observador que não aceitasse as normas poderia fazer e confirmar, observando se determinado tipo de comportamento era de fato geralmente aceito como padrão e se fazia acompanhar das características que, como já vimos, distinguem uma norma social dos meros hábitos convergentes” (HART, Herbert L. A. O conceito de direito, p. 142).

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Desse modo, existência e validade para HERBERT L. A. HART diferenciam-se ao menos pelo ambiente em que cada uma destas análises é realizada e pelo respectivo veículo introdutor.

1.8.3. Pressuposto de validade e pressuposto de compatibilidade, pressuposto de

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