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Inadimplemento e exigibilidade nas obrigações sujeitas a termo ou

3. INADIMPLEMENTO NO DIREITO CIVIL

3.6. INADIMPLEMENTO E EXIGIBILIDADE

3.6.1. Inadimplemento e exigibilidade nas obrigações sujeitas a termo ou

Como bem destaca De Ruggiero, o tempo possui relevante influência sobre as relações jurídicas,306 cabendo-nos a compreensão dos casos em que a produção dos efeitos da relação obrigacional, notadamente o relacionado ao dever de prestar,

305

DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 186-191 passim.

306 ―A influência que o tempo tem sobre as relações jurídicas é bastante grande, bem como a que tem

sobre todas as coisas humanas. E além de grande é também bastante variada. Direitos que não podem surgir senão em dadas contingências de tempo; direitos que não podem ter senão uma duração preestabelecida, quer fixada pela lei, quer pela vontade privada; direitos que não podem exercer-se fora de certo prazo; direitos que se adquirem e direitos que se perdem em consequência do decurso de um certo período de tempo [...]‖ (DE RUGGIERO, Roberto. Instituições de Direito Civil. vol. 1. Tradução da 6. ed., por Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 1999, p. 406).

reste demarcada por um evento futuro, seja ele certo ou incerto.307 Estas são as obrigações condicionais e a termo, que merecerão nossa atenção.

É cediço que o momento de realização da prestação (ou tempo da prestação como ensina Pontes de Miranda) pode ser definido pelas partes a partir da fixação de um evento certo ou de um evento incerto, podendo-se estabelecer um espaço de tempo dentro do qual determinada prestação deva se fazer efetiva ou não.308

Diante disso, o CCB/2002 realiza distinção entre obrigações puras/simples e obrigações condicionais, a termo e modais, conforme se depreende dos arts. 121 a 137 do CCB/2002.

Será condicional a obrigação quando os efeitos e, em verdade, a própria existência ou inexistência do crédito estiverem subordinados a evento futuro e incerto,309 possível,310 lícito, não sujeito ao arbítrio de uma das partes311 (arts. 121 a 124, CCB/2002).

Tal condição, aderida à obrigação, via de regra, por meio de cláusula contratual (conforme art. 121, CCB/2002), pode ser suspensiva ou resolutiva. Será suspensiva quando do acontecimento futuro e incerto principiar o efeito da obrigação; será resolutiva, quando, pelo acontecimento, findar esse efeito.

307

―Un derecho (obligación o crédito) nace tan pronto como se dan, íntegros, los elementos de hecho necesarios para su nascimiento, y principalmente, tan pronto como se cierra el contrato que sirve de base a la obligación; sin embargo, sus efectos pueden aplazarse por medio de una condición suspensiva o de un término inicial‖ (TUHR, Tomo II, 1934, p. 39).

308

TUHR, Tomo II, 1934, p. 40.

309 ―La condition est un événement future et incertain [….] Aussi la condition a-t-elle, à la difference du

terme, une incidence non seulement sur l‟exigibilité, mais sur l‟existence de l‟obligation‖ (MAZEAUD; MAZEAUD, Tome II, 1972, p. 1051); ―La condition consiste dans l‟événement futur et incertain auquel est subordonnée l‟existence de l‟obligation‖ (SAVATIER, 1949, p. 31). Washington de Barros Monteiro, de forma mais analítica, destaca dois elementos formadores da condição: ―a) diz respeito a um acontecimento futuro. Fato passado, ou até mesmo presente, ainda que ignorado, não constitui condição, porquanto, em verdade, nada deixa em suspenso; b) esse acontecimento há de ser incerto, podendo verificar-se ou não. Se o evento fatalmente vai verificar-se, não há condição, mas termo‖.

310

Consideram-se inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível. De outro lado, as física e juridicamente impossíveis invalidam os negócios a elas subordinados quando se tratar de condição suspensiva (arts. 123 e 124, CCB/2002).

311

VAMPRÉ, Spencer. Manual de Direito Civil Brasileiro. vol. 1. Rio de Janeiro: Briguiet & Cia, 1920, p. 97.

Portanto, no caso de ser resolutiva a condição, a obrigação produzirá, desde logo, os seus efeitos, e, uma vez verificado o implemento da condição, perderá sua eficácia retornando as partes ao estado anterior (CCB/2002, art. 128).

Pode-se dizer, então, que a relação obrigacional se constitui e se desenvolve como se tratasse de obrigação pura e simples,312 e, uma vez ocorrido o implemento da condição, ―a obrigação desfaz-se retroativamente, como se nunca houvera existido‖ (art. 128, ab ovo, CCB/2002).

De outro lado, acrescenta o autor, ―frustrando-se a obrigação é como se fosse pura e simples desde o começo‖, na forma do que dispõe o art. 127, CCB/2002. O estudo do inadimplemento em tais casos se mostra de menor complexidade (e, também, de menor interesse para este tópico), uma vez que a obrigação se comportará como se pura e simples fosse durante o lapso concebido entre a formação da relação obrigacional e o implemento da condição resolutiva. Desse modo, eventual inadimplemento seguirá o regime normal, relativo às obrigações puras e simples. Interessa-nos, com efeito, as condições suspensivas, em relação aos quais, bem explicita Caio Mário da Silva Pereira, ―o efeito do vinculum iuris está suspenso, não adquirindo o sujeito ativo o direito a que visa‖. Em termos mais precisos, enquanto pendente a condição suspensiva, ―a obligatio ainda não exprime, nem pode exprimir,

312 ―L‟obligation sous condition résolutoire prend naissance et se trouve immédiatement exigible dès la

conclusion du contrat‖ (MAZEAUD; MAZEAUD, Tome II, 1972, p. 1056); ―L‟obligation sous condition résolutoire est très différente de l‟obligation affectée d‟une condition suspensive. Alors que l‟existence de celle-ci est douteuse, l‟obligation sous condition résolutoire existe pleinement et le créancier eut notamment en exiger l‟exécution. Ce serait une obligation pure et simple se elle n‟était menacée de résolution‖ (MARTY; RAYNAUD; JESTAZ, 1989, p. 78).

um débito – nihil interim debetur [...]‖.313 Ou seja, ―tant que l‟on n‟est pas fixé sur

l‟arrivée de la condition suspensive, l‟obligation ne se forme pas”.314

Em outras palavras, pendendo condição suspensiva, tem-se um direito ―não deferido‖, isto é, ―enquanto ela não se verificar, não se terá adquirido o direito, a que o ato visa‖, sendo permitido apenas exercer atos com intuito de conservação.315

Diferente da condição, o termo, conquanto seja também evento futuro, é certo,316 sendo modalidade temporal que tanto pode estabelecer o momento em que se devem iniciar os efeitos da obrigação, como o momento em que estes devem cessar,317 podendo tal termo ser fixado enquanto um dia no calendário (denomina-se termo certo) ou ainda enquanto um fato que, conquanto futuro, seja necessário, isto é, cuja ocorrência seja certa (o chamado termo incerto).

Na terminologia do direito comum, ensina Andreas Von Tuhr, ao termo se dava o nome de ―dies certus an‖, ou seja, momento que haveria de ocorrer com toda a certeza, distinguindo-se da condição, chamada de ―dies incertus an‖. O termo (dies

certus an) ainda era distinguido em ―dies certus quando‖ e ―dies incertus quando‖, a

depender de se o evento certo ocorreria em data específica fixada no calendário ou se haveria certa margem de incerteza quanto à quando o termo iria se verificar,

313 ―La condition est un événement dont dépend l‟existence même de l‟obligation. Ainsi achève de

s‟exprimer la différence entre la condition et le terme. La realisation du terme étant certaine, l‟obligation à terme peut avoir d‟ores et déjà une existence véritable, le terme n‟en affecte que l‟lexigibilité ou la durée. Au contraire l‟avènement de la condition est, par hypothése, doutex, l‟existence de l‟obligation qui en depend est ele-même incertaine‖ (MARTY; RAYNAUD; JESTAZ, 1989, p. 63). Destaque-se que, para o autor, ―Le droit conditionnel est un véritable droit et en cela il se distingue de la simple espérance [...]‖. Em sentido diverso, Caio Mário da Silva Pereira aduz que, antes de verificada a condição suspensiva, não há direito, mas mera ―expectativa de direito, sem ação correspondente‖ (PEREIRA, 1987). No mesmo sentido, René Savatier, para quem ―Tant que la condition est pendante, si cette condition est suspensive, la créance est censée ne pas exister. Mais le créancier posséde, du moins, une esperance qui constitue un droit‖ (SAVATIER, 1949, p. 34).

314

MAZEAUD; MAZEAUD, Tome II, 1972, p. 1052.

315

MONTEIRO, 1984, p. 238; VAMPRÉ, 1920, p. 98.

316 ―A distinção entre termo e condição acha-se feita, em torno da ocorrência do evento, que naquele

é certa e incerta nesta‖ (PEREIRA, vol. II, 1997, p. 83). A distinção é bem traçada por Manuel Inácio Carvalho de Mendonça ao definir que nas obrigações condicionais ―a incerteza se dá no se e no quando ou no se e não no quando”; enquanto que nas obrigações a termo, a incerteza toca apenas no quando, nunca no se (MENDONÇA, Tomo I, 1956, p. 200). No mesmo sentido, DINAMARCO, 2009, p. 202.

317 ―O termo é a modalidade temporal que pode acompanhar a obrigação, estabelecendo o momento

em que há de começar ou há de cessar a produção de seus efeitos. Chama-se prazo o tempo que medeia entre o nascimento da obrigação e a superveniência do termo‖ (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 83).

distinção que pode ser bem explicitada a partir da comparação do termo enquanto um dia do calendário (termo certo: dies certus an, dies certus quando) ou, por exemplo, na data da morte de determinada pessoa (termo incerto: dies certus an,

dies incertus quando).318319

Além da certeza que o termo traz consigo (em oposição à incerteza da condição), outra diferença substancial se atribui ao fato de que a fixação de termo afeta apenas a exigibilidade dos seus efeitos, sem interferir na existência do direito.320 Caio Mário da Silva Pereira esclarece que o termo ―não atua sobre a validade da obligatio, mas sobre os seus efeitos, somente, pois ainda quando suspensivo (ex die), e, ao contrário da condição desta espécie, não obsta a que se adquira o direito a que visa‖.321

Assim, o termo demarca, sem qualquer interferência na existência da relação obrigacional e da aquisição do direito a que visa, o começo da eficácia do ato jurídico (termo inicial; a quo; ex die) ou o fim da eficácia do ato jurídico (termo final;

ad quem; ad diem).

Dito isso, e ressalvadas as distinções acima traçadas, o que nos importa tanto em relação às condições suspensivas, quanto aos termos iniciais, é que, enquanto não verificados, o credor não poderá exigir do devedor a prestação.322

Em relação às obrigações condicionais suspensivas, ―enquanto se não verificar a condição, o credor não tem o direito de receber a prestação‖ (art. 125, CCB/2002). De outro lado, ocorrendo a condição, no exato momento em que implementada, a prestação se torna exigível.

318

TUHR, Tomo II, 1934, p. 40.

319 ―Quando se fixa uma data do calendário o termo é certo; quando se refere a um evento certo,

porém, incerto quanto à época de sua verificação, como a morte de uma pessoa, o termo é incerto‖ (DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 240).

320 ―Il termine sospensivo, a differenza della condizione, sospende soltanto l‟adempimento, non

l‟esistenza del vincolo‖ (CHIRONI, vol. II, 1912, p. 34). No mesmo sentido: ―Le terme est une modalité de l‟obligation qui affecte celle-ci dans son exigibilitè ou dans sa durée, sans mettre en cause son existence même‖ (MARTY; RAYNAUD; JESTAZ, 1989, p. 44).

321

PEREIRA, vol. II, 1997, p. 83.

322

Isso quer dizer que a prestação é exigível pelo credor apenas e tão somente quando ocorrido o implemento da condição, e tudo se passará como se estivesse em plena vigência, como se pura fosse, desde o momento de sua constituição. Antes da verificação do termo a quo, seja ele certo ou incerto, ―le débiteur à terme ne saurait

ètre contraint à exécuter, mais non que as dette n‟existe pas d‟ores déjà‖.323

Somente será possível falar-se, portanto, em inadimplemento, uma vez tendo sido verificada a condição suspensiva ou o termo inicial, que são eventos desencadeadores da exigibilidade da prestação.324

Dando um passo adiante, da mesma forma somente será possível cogitar de execução legítima quando, desencadeada a exigibilidade da prestação, o adimplemento não se verificar.325

Em decorrência disso, será nula eventual execução326 proposta sem que, antes, esteja implementada a condição suspensiva ou o termo inicial, cabendo – diga-se, desde já – ao exequente a prova de que se verificou a condição ou o termo (CPC/2015, art. 798, I, c), e de que o devedor teve a devida ciência do referido evento (art. 332, CCB/2002)327.

Em virtude disso, incumbe ao exequente a prova do implemento da condição ou do termo (ou seja, da exigibilidade da prestação);328 sob pena de improcedibilidade do feito in executivis, o que deverá ser pronunciado pelo juiz, inclusive, independentemente de oposição do executado (art. 803, par. único).

323

MARTY; RAYNAUD; JESTAZ, 1989, p. 48.

324

Dinamarco, nesse sentido, ensina que: ―Uma obrigação a termo ou sob condição resolutiva ou suspensiva existe, mas só se tornará exigível se e quando o termo ocorrer ou a condição vier a ser implementada‖ (DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 202).

325 ―Não se pode cogitar de inadimplemento, ou insatisfação capaz de legitimar a execução, enquanto

o dever de satisfazer a obrigação expressa no título executivo estiver ainda na dependência de uma condição, termo ou contraprestação do credor‖ (DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 186).

326

Art. 803. É nula a execução se: [...] III - for instaurada antes de se verificar a condição ou de ocorrer o termo.

327

Art. 332. As obrigações condicionais cumprem-se na data do implemento da condição, cabendo ao credor a prova de que deste teve ciência o devedor.

328

3.6.2. INADIMPLEMENTO E EXIGIBILIDADE NAS OBRIGAÇÕES

BILATERAIS (SINALAGMÁTICAS)

As obrigações bilaterais podem ser assim intituladas a partir de seu aspecto de formação ou em virtude de seus efeitos, de modo que ―não se pode confundir, portanto, a bilateralidade como elemento constitutivo (bilateralidade de manifestação de vontades) com a bilateralidade das consequências produzidas‖,329

conforme alerta Caio Mário da Silva Pereira.

A partir do primeiro critério (de formação, constituição), bilateral é a obrigação que exige, para ser formada, duas declarações de vontade330.

A bilateralidade que nos interessa, contudo, não é esta, mas sim aquela que se verifica diante de obrigações que geram prestações para ambos os contraentes. É nesse sentido que Darcy Bessone destaca que, quanto a seus efeitos, a bilateralidade depende não só de duas declarações de vontade, mas também que cada um dos sujeitos se obrigue para com o outro.331 Mais que isso, contudo, acrescenta Bessone, as obrigações bilaterais devem ser principais e correlativas, apresentando-se umas como causa das outras. É dizer, deve haver ―dependência recíproca de obrigações‖, conforme destaca Carlos Alberto Bittar,332

ensejando aquilo a que a doutrina chama de sinalagma.

Araken de Assis, em obra na qual analisa a resolução do contrato em virtude de inadimplemento, assenta a necessidade de que se cumpram dois requisitos para que se possa cogitar de contratos bilaterais333 (quanto aos seus efeitos): a existência de duas prestações e a ―interdependência de prestações respeitante à própria

329 PEREIRA, 1997, p. 38. 330 PEREIRA, 1997, p. 38. 331 BESSONE, 1960, p. 97. 332

BITTAR, Carlos Alberto. Direito dos Contratos e dos Atos Unilaterais. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p.89.

333

Merece ser salientada a ressalva feita por Araken de Assis, com base na doutrina de Pontes de Miranda, no sentido de que não é o contrato bilateral que faz as obrigações serem bilaterais, podendo, inclusive, haver dívidas dele irradiadas que não sejam bilaterais. Assim é que ―a extensão do instituto não equivale à do contrato bilateral, e, sim, à da reciprocidade prestacional‖ (ASSIS, 1999, p. 21.)

conformação do negócio e perpassada, dinamicamente, a todo seu desenvolvimento e à sua eficácia‖.334

Nesse mesmo sentido, ensina Karl Larenz que a bilateralidade se verifica quando ―ambas as partes contraen obligaciones y en que al menos algunos de los deberes

de prestación recíprocos están vinculados entre sí, de modo que la prestación de una representa, de acuerdo con la voluntad de ambas as partes, la contraprestación, la compensación por la de la otra‖.335

A partir dessa constatação que Von Tuhr propõe a distinção entre obrigações ―bilateralis aequales‖ e ―bilateralis inaequales‖, isto é, essencialmente bilaterais e não essencialmente bilaterais, com o destaque para o fato de que ―analizando bien

las cosas, se vé que no todos los créditos nacidos de contratos bilaterales en sentido estricto guardan entre sí una relación de intercambio, y viceversa, que esta relación de intercambio entre las prestaciones se da también en ciertos contratos que pertenecen, por su tipo, a la categoría de los impropriamente bilaterales‖.336

A relevância da distinção entre obrigações bilaterais (quanto a seus efeitos) e obrigações nas quais não se verificam obrigações recíprocas e dependentes, vinculadas entre si, está no que tange à exigibilidade de cada uma das prestações e como isso interfere no ajuizamento do processo de execução ou no requerimento do cumprimento de sentença.

As chamadas obrigações bilaterais relacionam-se intimamente com os negócios jurídicos, nos quais pode restar pactuada a precedência de uma prestação em relação à sua recíproca ou a necessidade de que as prestações sejam realizadas contemporaneamente pelos sujeitos da relação jurídica. Nesse contexto, conforme lição de Dinamarco, ―o credor que por sua vez seja obrigado perante seu devedor por alguma contraprestação devida a este, e que deva ser cumprida em primeiro

334 ASSIS, 1999, p. 19. 335 LARENZ, 1958, p. 297. 336

lugar, só terá o poder de exigir a satisfação de seu crédito quando ele próprio houver cumprido sua obrigação‖.337

Isso se dá, porque, antes de realizada a contraprestação, falta ao crédito exigibilidade,338 de modo a ser possível afirmar que o marco da exigibilidade de uma prestação é o adimplemento da contraprestação pelo outro sujeito da relação obrigacional.

A situação é muito bem analisada por Andreas Von Tuhr, ao destacar que, em caso de simultaneidade entre as prestações contrapostas e entre si vinculadas, somente se poderá exigir a contraprestação que lhe é devida se também prestar a própria,339 de modo que (i) havendo precedência da prestação do credor, em relação à prestação do devedor, deverá aquele provar o cumprimento de sua prestação para requerer a realização da que incumbe ao devedor; e, de outro lado, (ii) havendo precedência da prestação que incumbe ao devedor, a este não será lícito exercer exceção de contrato não cumprido, caso demandado pelo credor.340

É a compreensão dos momentos de inexigibilidade e de exigibilidade das obrigações bilaterais, nos termos acima destacados, que permite compreender os direitos previstos ao credor e/ou ao devedor de ―rehusar el cumplimiento de su prestación

hasta que se haya efectuado otra que a él es debida, cuando de la misma relación jurídica en que se basa su obligación deriva a su favor en contra del acreedor una pretensión vencida‖.341

Trata-se este de um dos reflexos principais das obrigações sinalagmáticas: a possibilidade de invocação da exceptio non adimpleti contractus, exceção de caráter dilatório, cuja diretriz é a de que nenhum dos sujeitos da obrigação pode exigir do outro a realização da prestação enquanto não satisfeita a que a lhe incumbe prestar.

342

337

DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 203.

338

DINAMARCO, 2009, p. 204.

339

TUHR, Tomo II, 1934, p. 52.

340

TUHR, Tomo II, 1934, p. 56.

341

TUHR, Tomo II, 1934, p. 58.

342

O que é relevante disso tudo é notar que resta impróprio demandar, executivamente, determinada prestação quando o credor também estiver obrigado a prestar simultânea ou precedentemente.343

Tal implica ao credor a necessidade de demonstrar e provar que efetivamente a prestação que lhe incumbe realizar foi realizada, sob pena de não lhe ser aberta a via jurisdicional executiva de atuação da prestação a ele devido (art. 798, I, d, CPC/2015).

A ausência da prestação devida pelo credor deverá, nestes casos, independentemente da oposição de exceptio non adimpleti contractus, ser verificada pelo juízo da execução,344 devendo ser indeferida a petição executiva caso o exequente, intimado para comprovação da realização da prestação que lhe corresponde, não assim proceder (art. 801, CPC/2015).

3.6.3. INADIMPLEMENTO NAS HIPÓTESES DE EXIGIBILIDADE

AUTOMÁTICA OU DEPENDENTE DE INTERPELAÇÃO (EX RE, EX

PERSONA E ATOS ILÍCITOS)

Também relevante sob a perspectiva da influência que o tempo exerce sobre as relações jurídicas, cumpre ingressar na análise do momento em que reponta verificada a exigibilidade da prestação, sob o critério da necessidade ou desnecessidade de interpelação do devedor para tanto.

343 “Nei contratti bilaterali ciascuno dei contraenti è obbligato ed è per ciò un principio di equità che

nessuno possa pretendere dall‟altro la prestazione senza fare la propria [...]. Di regola, le due prestazioni devono esser fatte contemporaneamente, salvo che sia espressamente o tacitamente convenuto un altro ordine di adempimento. Chi ha da fare la prestazione per ultimo può rifutarsi fino a che l‟altro non ha fatto la sua; se le prestazioni debbono farsi contemporaneamente, ciascuno può rifutar la sua se l‟altro non ha fatto o non offre di fare la propria” (CROME, 1908, p. 156).

344 ―A ausência da contraprestação deve ser detectada pelo juiz logo ao despachar a petição inicial

executiva, exigindo do exequente o cumprimento e chegando a indeferir a inicial em caso de não ser atendido‖ (DINAMARCO, vol. IV, 2009, p. 205).

Tal tema se aproxima daquilo que a doutrina geralmente trata a partir da distinção entre mora ex re e mora ex persona, importando-nos menos, contudo, o estudo da mora – já delineada anteriormente – e mais o da exigibilidade.

Como bem ressalta Silvio Rodrigues, antes do vencimento da obrigação, tudo se passa como se débito algum existisse em termos de sua exigibilidade.345

A fixação do vencimento, também como já dito, pode se dar em virtude de (i) estipulação de data certa ou fato certo346 ou, ainda, a partir da necessidade de (ii) interpelação judicial ou extrajudicial por parte do credor, quando não se tenha ajustado a época do vencimento (a exemplo de um termo incerto ou de uma condição).

No primeiro caso, regra no ordenamento civil brasileiro,347 a exigibilidade rege-se pela parêmia dies interpellat pro homine, ou seja, a ideia de que a chegada do dia do