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Incentivo à autonomia e autoavaliação

5 A PRÁTICA PEDAGÓGICA DAS PROFESSORAS NA FASE

5.1 Diagnóstico das práticas educativas

5.1.5 Incentivo à autonomia e autoavaliação

Havia um caminho longo a ser trilhado em busca da autonomia e autoavaliação do aluno. As práticas avaliativas eram direcionadas para a realização de provas que tinham como finalidade a avaliação do produto. Não era cogitado o exercício da autoavaliação pelos alunos. Não foi observada a discussão ou o estabelecimento de metas para a aprendizagem dos alunos, tornando difícil para estes fazerem um paralelo entre o que é exigido e os seus desempenhos. Não havia o estabelecimento de critérios que pudessem orientar o aluno na correção de suas produções, até mesmo porque essa autocorreção não era incentivada. Certas vezes as professoras diziam a resposta correta, corrigiam a ortografia pelo aluno, outras pediam para que pensassem mais um pouco. Algumas vezes o aluno era solicitado a corrigir seus erros durante e posteriormente à tarefa, mas o referencial era quase sempre o professor, era ele quem apontava se estava certo ou não. Faltavam ao aluno outros referenciais, como por exemplo, o dicionário, o livro didático, ou seja, o estímulo à pesquisa, de modo que ele se tornasse mais independente e assumisse uma postura autônoma, afinal o conhecimento não pode ser encontrado somente na pessoa do professor.

No que se refere à leitura e compreensão do texto, observamos, principalmente no tocante à professora Elisabete, o uso de algumas estratégias de leitura como predição e inferência. Estratégias metacognitivas, no entanto, ─ como identificar o que aprendeu no texto, identificar as facilidades e dificuldades na leitura e compreensão do texto e estabelecer o que era necessário para melhorar sua aprendizagem ─ não forram observadas.

Observamos uma vez, com a professora Elisabete (2º ano A), a solicitação para que o aluno, em uma atividade de escrita dos números, pesquisasse no livro o nome do número (por extenso). Essa intervenção da professora poderia permitir, a partir de então, que o aluno internalizasse essa estratégia e a utilizasse em outras situações de aprendizagem, recorrendo menos ao professor e buscando outras fontes de informação. Em algumas situações, entretanto, Elisabete corrigia a ortografia pelo aluno, não o incentivando a identificar os próprios erros.

Uma vez essa professora mostrou-se impaciente em virtude de algumas solicitações dos alunos: “Chega, tá bom, não aguento mais!” (verbaliza irritada, porque muitos alunos trouxeram, ao mesmo tempo, a tarefa para ela olhar). Em alguns momentos, eles sufocam as professoras porque, uma vez acostumados a recorrer a elas, esperam que digam se estão acertando ou errando a tarefa. Acreditamos que isso decorre do fato de os alunos terem pouca autonomia e da ausência de um trabalho voltado para esse fim.

Lia (3º ano C) também estimulava pouco a autonomia dos alunos, apontando, muitas vezes, onde estava o erro que precisaria ser consertado: “Tá errado, coloque o VE”. Ela poderia pedir para o aluno rever o que poderia estar errado e deixá-lo chegar por si mesmo a uma conclusão.

Nas salas das professoras Marta (2º B) e Ana (1º ano), que não participaram das etapas subsequentes da pesquisa, a correção era feita, geralmente pelas professoras diretamente no caderno dos alunos: “Sapo não é assim não” ou “Tá todo errado o teu, você não presta atenção” (Marta corrige pelo aluno); “Tá tudo errado” (Ana apaga e corrige pelo aluno). Embora as crianças fossem menores, essa prática de Ana e Marta, assim como a das demais professoras, faz com que os alunos recorram constantemente à professora, dificultando o seu trabalho de intervenção, pois em todas as turmas acontecia de várias crianças se levantarem ao mesmo tempo e irem à mesa da professora em busca de ajuda. Não que isso seja incorreto, mas se houvesse um trabalho no sentido de ajudar as crianças a regular suas aprendizagens, fundamentado na solicitação da localização de seus erros durante a realização da tarefa, elas poderiam agir de maneira mais autônoma em suas aprendizagens, recorrendo ao professor somente nas dúvidas.

Identificamos, contudo, uma estratégia pedagógica utilizada pela professora Elisabete, que não está ligada diretamente à aprendizagem da leitura e escrita, mas que permitia o controle da frequência dos alunos, possibilitando a este fazer uma autoavaliação de frequência na escola: o uso da chamada viva. Esta consistia em uma chamada confeccionada pela professora com o nome dos alunos e os dias úteis do mês. Os próprios alunos preenchiam diariamente com a cor azul o quadrado referente àquele dia que frequentaram a escola. Caso o aluno faltasse, no dia seguinte, ele pintava de vermelho, permitindo um panorama de quando o aluno estava faltando muito ou quando estava assíduo.

Elisabete utilizou essa estratégia como tentativa de estimular os alunos a não faltarem. A professora a utilizava sem saber que estava contribuindo para o autocontrole da frequência das crianças e, portanto, trabalhando um aspecto metacognitivo. Essa foi a única estratégia metacognitiva de controle da frequência observada nas salas, mas era utilizada de forma intuitiva pela professora, sem a intenção de trabalhar o desenvolvimento de habilidades metacognitivas nas crianças:

[...] A chamada viva que eu fazia, contabilizava os dias que vinham. Então na minha sala você percebeu que era a turma que menos faltava. Eu não sabia que estava trabalhando a metacognição. E foi uma coisa que surtiu efeito. Muitas vezes a criança precisa ver o concreto porque fazer a chamada pela própria professora é muito abstrato pra ela, enquanto que aquilo que ela está vendo ela se torna mais

responsável. O objeto do aprendizado dela é ela quem domina, está nas mãos dela o fato de ter ou não a presença dela.

Essa fala expressa por Elisabete na entrevista de avaliação das ações da pesquisa demonstra que a intenção da chamada viva era o controle da professora e elevar a frequência dos alunos, mas não o controle das atividades por parte dos próprios alunos. A importância desse autocontrole foi percebida durante as discussões teóricas na formação.

Com relação a ajudar os alunos a identificar suas dificuldades, apenas uma professora havia feito essa solicitação. Lia relatou que pediu, no primeiro dia de aula, para os alunos falarem das dificuldades que eles encontraram no ano anterior referente à disciplina Matemática, os quais apontaram a adição e subtração.

Essa sondagem é essencial para que eles reconheçam em que precisam melhorar, mas é também importante que o professor estabeleça com eles metas para a aprendizagem e possíveis estratégias para superarem as dificuldades apontadas, o que infelizmente não aconteceu. Os alunos precisam estar conscientes, não só de suas dificuldades, bem como do que fazer e como fazer para melhorar. O domínio dessas estratégias metacognitivas, a princípio com a ajuda do professor, permite ao aluno sair de sua posição passiva e tomar uma atitude autônoma diante do conhecimento.

Os aspectos referentes ao controle, regulação e avaliação da aprendizagem, justamente aqueles específicos da metacognição, foram os menos trabalhados pelas professoras em geral. Todas as professoras corrigiam a tarefa do aluno no caderno, apagando ou pedindo para eles apagarem, estando atentas à questão do erro. Não havia, no geral, entretanto, solicitação aos alunos para que eles corrigissem as próprias produções, para que indicassem suas dificuldades e facilidades na realização das tarefas, nem havia realização de sessões de reflexão e avaliação para que avaliassem suas produções e procedimentos. A autoavaliação só seria possível se o professor oferecesse instrumentos em que o aluno fosse gradativamente passando de uma atitude de dependência perante o professor e encontrasse novas formas e estratégias de buscar o conhecimento, tornando-se me menos inseguro e mais confiante em si mesmo.

Já observamos, na pesquisa de Figueiredo (2008), uma fragilidade nas práticas pedagógicas referente ao uso de estratégias que permitam aos alunos desenvolver sua autonomia em situação de aprendizagem. Ao observar as atividades de leitura e escrita de uma professora em uma escola pública de Fortaleza, essa pesquisadora identificou seis categorias relacionadas à diferenciação do ensino ─ mediação, cooperação, heterogeneidade, interação, motivação e autonomia.

A categoria autonomia do aluno foi a que menos apareceu dentre as consideradas relevantes para um ensino diferenciado. Essa categoria − que inclui estratégias como dispor de informações necessárias sobre o material que ele deveria utilizar sem a consulta à professora, utilizar o material de maneira inovadora, saber usar a programação individual e corrigir as próprias tarefas – se manifestou raramente na atuação da docente pesquisada, recebendo pouca atenção. Essa professora apresentou, portanto, pouca habilidade no desenvolvimento de estratégias que demandavam a implicação dos alunos na própria aprendizagem, apesar de que era muito competente em seu metiê.

Esse estudo corrobora os achados de nossa pesquisa, mostrando mais uma vez que a autonomia dos alunos é relegada a segundo plano. Ao exercer um controle maior sobre a aprendizagem, o professor expõe sua dificuldade de permitir que o aluno assuma esse controle para si e exerça sua autonomia em situação de aprendizagem e diante da vida.

5.1.6 Uso de estratégias para ativar e aperfeiçoar os conhecimentos espontâneos dos