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2 NOÇÕES TEÓRICAS SOBRE AMOR,

4.4 NAMORO E FIDELIDADE

4.4.2 Infidelidade no Namoro Juvenil

No caso dos jovens pesquisados por Maia (2009), restou evidenciada a estratégia de superposição de relações afetivas. Isso quer dizer que muitos deles mantêm duas relações afetivas durante um período breve, que pode ser mesmo de apenas alguns dias, o que pode ser creditado, segundo a autora, ao fato de que os jovens têm medo de ficar sós. Não foi isso o que apareceu nas falas dos jovens desta pesquisa. Quando eles se referem à traição, eles não falam em nenhum momento da manutenção de duas relações de namoro, mas sim de uma relação de namoro e de ficar com outra pessoa enquanto se está namorando.

Sofia (17 anos) acredita na exclusividade, embora ache que atualmente trair seja algo banal. Ela credita isso ao fato de que hoje em dia já tá tão comum tipo, o uso da maconha é… e aí eles ficam chapados e vão lá pegam outras e ficam muito loucos, não se lembram de nada. Apesar disso, ela afirma pensar que ainda existe amor à moda antiga. Ela também entende que, num namoro, é preciso respeito. A jovem não vê motivos para ficar com outra pessoa quando se está namorando e, por esse motivo, ser infiel significa não respeitar o outro. José (16 anos) também afirma que não trair é importante. Para ele, quando se vê que a pessoa é legal, que vai te fazer um bem, não há motivos para ficar com outra pessoa. No mesmo sentido são os dizeres de Laura (17 anos), para quem não há motivos para procurar outra pessoa quando se gosta de alguém.

Na pesquisa desenvolvida por Rieth (2001, p. 221), as meninas falam recorrentemente do namoro como sendo uma relação “„séria‟ porque pautada pelo compromisso de fidelidade entre o casal”. No entanto, também é mencionado que no namoro são exigidos respeito e confiança, categorias a partir das quais serão equacionadas as expectativas relativas à fidelidade e à liberdade individual.

Os meninos pesquisados por Rieth (2001, p. 229) apresentam a infidelidade como algo que se dá pela pressão exercida pelo grupo de amigos e devido ao fato de a traição estar relacionada com a “concepção de sexualidade como aprendizagem técnica”, uma vez que a experiência é adquirida com a quantidade de relações que são mantidas. Tal fato relaciona-se com a descrição de amor líquido efetuada por Bauman (2004), segundo a qual seria possível aprender a amar, o que tornaria relevante o número de relacionamentos mantidos. Assim como o sociólogo entende que, na contemporaneidade, o próximo relacionamento será necessariamente melhor do que o atual, em virtude da experiência adquirida, também para os meninos de Pelotas esse aprendizado parece ser importante, ainda que possa estar mais ligado à sexualidade do que ao amor.

Já no caso das meninas de Pelotas, também investigadas por Rieth (2001, p. 197), resta acentuado o “conflito romântico”, estabelecido “pela preocupação de enlaçar sexualidade e amor em uma relação que se projete para o futuro”. Essa projeção para o futuro encaixa-se muito bem no modelo de amor confluente proposto por Giddens (1993), no qual ocorre a busca pelo relacionamento especial e na abertura em relação ao outro, expressa por essas meninas na noção de “conhecer a alma do outro” a partir da relação de namoro. Nota-se, portanto, que é a intimidade, categoria tão cara a Giddens, que aparece aqui como base de sustentação ao tipo de relacionamento buscado por essas jovens.

Na pesquisa realizada por Souzas e Alvarenga (2001, p. 25), as mulheres de baixa renda de São Paulo compreendem a infidelidade como “uma prática masculina na dinâmica conjugal”, algo não permitido às mulheres. A infidelidade, nesse contexto, consiste numa forma de afirmação da masculinidade e significa que o homem está insatisfeito com a relação conjugal. Por esse motivo, a descoberta da infidelidade do parceiro, para essas mulheres, faz com que elas percebam que a relação está se deteriorando, abrindo caminho também à opressão e à violência conjugal. Para os jovens da periferia de Paris pesquisados por Isabelle Clair (2008), a relação secundária é necessariamente secundária por dois motivos: porque é considerada imoral (sobretudo para as meninas) e porque existe apenas na medida em que confere à primeira relação uma nova luz.

No caso das mulheres entrevistadas por Souzas e Alvarenga (2001), foi verificada a existência de duas estratégias diferentes para perceber a infidelidade do parceiro. No caso das mais jovens, a existência ou não da amizade entre os membros do casal é importante,

enquanto que, no caso das mais velhas, o melhor seria “confiar desconfiando”.

Se os jovens traem, por que isso ocorreria? A maioria (52,6%) dos jovens pesquisados por Jesus (2005) disse ser fiel em seus relacionamentos. A traição ocorreria, sobretudo devido à beleza do outro, justificativa utilizada em 28,9% dos casos.

No Instituto de Educação Patrícia Galvão, os alunos em princípio colocaram-se como contrários à traição, afirmando que quem gosta não trai. Perguntei se não era possível gostar e trair. Eles disseram que sim, às vezes, mas que não valia a pena. Surgiu a questão das diferenças entre mulheres e homens em relação à traição. Eles disseram que os homens traem mais. Eu perguntei por que e um menino respondeu: por instinto. Perguntei por que as mulheres traíam. Um dos meninos disse que era quando ela não recebia a devida atenção do namorado. Uma menina disse que também era para descontar uma traição da qual havia sido vítima.

No caso dos homens casados pesquisados por Silva (2002, p. 43), a fidelidade está atrelada ao comportamento da esposa, que pode levar à satisfação sexual. Se a esposa é capaz de gerar essa satisfação por meio de criatividade e sedução, não há a necessidade de procurá-la fora da relação conjugal. Ao mesmo tempo, também estaria presente a crença de que a necessidade de sexo faz parte da natureza masculina. Assim, “é muito difícil para o homem „negar fogo‟ quando é abordado por outras mulheres, primeiro porque ele „é homem‟ e segundo porque não é „gay‟ nem „boneco‟”. Na fala de Laura (17 anos), do Colégio Rose Marie Muraro, essa ideia de não procurar fora de casa também aparece. Para a jovem, se um não dá ao outro aquilo que ele precisa ou se o sentimento não está presente, não há motivos para continuar a relação.

Na fala do menino do Instituto de Educação Patrícia Galvão também está reproduzida essa crença da dificuldade de “negar fogo” como algo inerente à natureza masculina. Contudo, é interessante perceber que a justificativa utilizada pelos homens casados para a traição, relacionada ao comportamento da esposa, também aparece na fala dos jovens, especialmente na de um menino, que afirma que a menina trai quando não recebe a atenção que merecia. Também aqui a traição é creditada ao comportamento do outro. No entanto, se, para os homens casados, a satisfação está relacionada ao comportamento sexual da mulher, a atenção que a menina deve receber parece ser algo mais amplo. Certamente está ligada não apenas ao afeto, mas também ao fato de não ser traída, o que pode, no dizer de uma aluna da instituição,

também levar à traição dentro do namoro, como uma forma de vingança.

4.4.3 A Ressignificação da Fidelidade: respeito, lealdade e confiança