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2 NOÇÕES TEÓRICAS SOBRE AMOR,

4.4 NAMORO E FIDELIDADE

4.4.1 O que é Fidelidade para os Jovens?

Isso me levou a questionar especificamente o que eles entendiam por fidelidade e se a consideravam ou não essencial em uma relação de namoro. Diferentemente da pesquisa GRAVAD, na qual a pergunta sobre fidelidade girava em torno da manutenção de relações sexuais (“quando se está numa relação afetiva com uma pessoa, é aceitável fazer sexo com outras pessoas?”), a questão da fidelidade dizia respeito, para os jovens pesquisados, a pegar ou ficar com outras pessoas enquanto se está namorando.

No Colégio Estadual Nísia Floresta, quando perguntei a um grupo composto de um casal de namorados (um menino e uma menina) e mais um menino o que era trair, os meninos afirmaram que era ficar com alguém, mas a menina entendia que trair era querer ficar com alguém, ou seja, ter esse desejo. No entanto, ela afirmou que sonhar com outra pessoa era permitido, já que a gente não controla o sonho. Essa opinião, no entanto, consiste em uma exceção, já que a maioria dos jovens expressou a traição como sendo o ato de pegar ou ficar com outra pessoa quando se está namorando. É o caso de Rebeca (17 anos), do Colégio Rose Marie Muraro, para quem a infidelidade é o ato de ficar, já que pensar ou ter vontade de trair é algo que é comum a todas as pessoas.

Para uma menina do Centro Educacional Municipal Carmen da Silva, o menino que namora e quer ficar com outras pessoas é um cafajeste, pois isso não é correto. Já um menino da mesma turma afirmou que não há problemas em pensar em ficar, pois pensar pode.

O que é, então, para esses jovens, fidelidade? Simmel (2003) compreende a fidelidade como algo que é direcionado para a continuidade da relação, independentemente de qualquer sentimento particular. Para Isabela (16 anos), do Colégio Rose Marie Muraro, fidelidade significa exclusividade, ou seja, não trair a pessoa. Ao mesmo tempo, é preciso dar confiança para o outro e isso deve ser recíproco. Essa confiança refere-se, por exemplo, à possibilidade de sair sem o outro sem ficar com outra pessoa.

Já Eduardo (16 anos) entende que ser fiel a alguém é gostar dessa pessoa, amar apenas essa pessoa e namorar apenas essa pessoa. Para ele, não existe isso de ah, nunca fiquei com mais ninguém depois que eu fiquei com ela ou depois que eu comecei a namorar com ela. Ele entende que a traição ocorreria em virtude sobretudo da curiosidade e que não existe essa de “ah, agora [...] pro resta da minha vida eu sou

teu”. A fidelidade estaria relacionada ao que se sente. Ele pondera, contudo, que é não é preciso por isso extrapolar:

eu não vou tá namorando com a guria e pegar várias, ir numa festa só pra pegar, só pra ficar com um monte de gente. É uma coisa tipo… no calor do momento, é… tipo, tu não vai sair pra procurar uma pessoa… ou pra procurar alguém pra ficar ou alguém pra namorar escondido dela, sei lá, são coisas que acontecem, tu tá lá, ela tá lá daí vai lá e eu peguei, entendeu?

José (16 anos) diz que, dependendo da pessoa, a fidelidade pode ou não ser importante. Ele cita o caso de um amigo que não consegue namorar só uma, que sempre tem que sair e variar. Esse amigo estaria namorando uma menina que também age dessa forma, ou seja, que também fica com outros meninos. Segundo o aluno, eles são fiéis um ao outro, pois na hora que precisar, um vai tá do lado do outro. Por isso ele diz que a fidelidade depende da pessoa: tem gente que gosta de ficar só com aquela, tem gente que gosta de ficar com outras, mas prefere aquela.

Thaíse (16 anos) acha que, num namoro, é preciso lealdade. Para ela infidelidade não é sinônimo de desamor. A jovem diz que ninguém escapa da traição e que ela acontece em todos os relacionamentos: por mais bonito que seja, por mais amor que tenha, sempre acontece. Sempre. Se tu teve um relacionamento que não teve, no próximo vai ter. Ser leal, para ela, tem a ver com respeito, significa ser fiel ao outro em outros aspectos que não sejam relacionados à traição. Ela afirma que, quando uma pessoa se relaciona com outra, mas não termina o namoro, é porque gosta do(a) namorado(a) e muitas vezes procura em outras pessoas o que não encontra no namoro, porque ninguém é perfeito. No entanto, ela coloca limites à traição:

se tem uma menina… e ela tem um namorado e ele trai ela… eu acho que uma vez perdoado… não… não faz tão mal assim, tu vai sofrer, tu vai chorar, tu vai ficar com raiva, mas vai passar… Assim como tudo passa. Se tu perdoar a pessoa, tem gente que não perdoa, mas se tu perdoar e ela fizer se novo, aí é outra coisa. Mas enquanto tu gosta dela assim e se tu vê que ela tá

arrependida… acho que não tem porque não… não perdoar.

Nas palavras de Thaíse (16 anos) resta claro que é o sentimento que garante a continuidade do relacionamento. Num tempo em que os amores são líquidos, gostar de alguém pode significar ser fiel e ter uma relação de exclusividade. No entanto, também é interessante pensar que se busca nas outras pessoas aquilo que não se encontra no(a) namorado(a), já que ninguém é perfeito. Isso significa que aquela ideia de completude, própria do amor romântico, personificada na figura da alma gêmea, ainda faz sentido, ainda que ressignificada. É como se, cientes da incapacidade de que o outro nos torne completos, fôssemos capaz de procurar essa completude em mais de uma pessoa. O importante seria completar-se, ainda que, para isso, seja necessário buscar tudo aquilo que não possuímos em várias pessoas diferentes.

Para Ana Clara (17 anos), a fidelidade é a coisa mais importante do mundo e é preciso confiar no parceiro, até que ele te prove o contrário. Caso ele prove o contrário, ela diz que a primeira coisa a ser feita é conversar, perguntar por que ele traiu e ouvir suas respostas. No entanto, ela afirma que quando rola traição não tem mais sentimento. Por isso, se não há mais sentimento, o melhor seria terminar o namoro, dar um tempo e, caso o outro realmente goste, ele vai correr atrás e pedir perdão. Nesse caso, não custa nada tentar de novo. Nem sempre essa nova tentativa é bem sucedida, já que, segundo a jovem, a confiança é abalada: rola a questão de uma desconfiança e tipo qualquer coisa que acontece tu joga na cara “porque tu me traiu, porque não sei o que, tu não tem direito de fazer isso”. Essa desconfiança também aumentaria os ciúmes, tornando a relação mais complicada.

Ana Carolina (16 anos) associa a fidelidade à franqueza. Ser franco significa, para ela, ser transparente em relação aos próprios sentimentos. É preciso, num namoro, dizer quando não está legal: se tu for franco, acho que tu não vai necessariamente precisar ficar com outra pessoa para ter certeza de que é aquela pessoa que tu quer, que tu tá junto. Porque muitas vezes tu busca outras pessoas pra ter certeza se teu namorado é aquela pessoa que tu quer tá junto.

No mesmo sentido é a fala de Laura (17 anos). Ela afirma que a fidelidade é muito importante num relacionamento e que a traição não ocorre apenas quando se fica com outra pessoa. Laura (17 anos) entende que não se deve mentir em nada e que mentir é uma forma de infidelidade: a pior coisa é tu mentir e ser descoberto.

Será que a afirmação de Goldenberg (2006, p. 364), que preconiza que, “como uma pérola rara, a fidelidade permanece como um valor fundamental das modernas e tradicionais conjugalidades na cultura brasileira”, faz também sentido para os jovens pesquisados? Se a resposta é sim ou não, o fato é que “a opinião sobre fidelidade funciona como barômetro da moralidade desejável nas relações afetivas. Trata-se de um tópico sensível para descrever a mentalidade de uma época ou geração” (HEILBORN et al., 2006, p. 212). Por esse motivo, trata-se de um tópico a ser investigado aqui.