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Influência dos aspectos explícitos, implícitos e conceituais

2.6 Familiaridade com o conteúdo e transparência do material

3.1.3 Influência dos aspectos explícitos, implícitos e conceituais

Em seu estudo pioneiro sobre gráficos, Janvier (1978) define a interpretação de

gráficos como uma tradução para a forma verbal dos fatores representados graficamente. Num estudo posterior, Janvier (1987) oferece um modelo para compreensão e ensino dos sistemas de signos matemáticos baseando-se na idéia de processos de tradução. Por tradução, Janvier designa os “processos psicológicos envolvidos nas mudanças de uma representação para outra, por exemplo, de um gráfico para uma equação” (1987, p. 27). Para que um processo de tradução ocorra, faz-se necessária a existência de no mínimo duas formas de representação.

Perez-Echeverria, Pecharroman e Postigo (2005) realizaram um estudo para verificar, entre outros objetivos, como estudantes de Psicologia formulavam inferências sobre funções com duas variáveis. Ao todo 174 estudantes participaram do experimento. As tarefas envolveram três tipos de problemas: funções lineares congruentes e não congruentes e função inversa. Os problemas foram apresentados em texto escrito, gráficos ou fórmulas e os estudantes foram randomicamente distribuídos para trabalhar em cada tipo de problema e em cada tipo de representação, o que totalizou nove grupos experimentais.

Os estudantes foram solicitados a fazer traduções da forma de representação que eles haviam recebido para as outras duas; por exemplo, se eles fossem alocados para resolver problemas sobre funções lineares congruentes apresentadas graficamente, eles deveriam transformar a informação dada graficamente por meio de fórmulas e do texto escrito. Os estudantes também eram requeridos a responder seis questões envolvendo três tipos de inferências: duas questões sobre inferências explícitas (interpretar um ponto), duas questões sobre inferências implícitas (interpretar o tipo de relação entre as variáveis) e duas questões conceituais (interpretar o conteúdo da função dada).

Os resultados indicaram que as traduções das outras formas de representação para a forma gráfica foram as mais fáceis, enquanto aquelas envolvendo as fórmulas algébricas foram as mais difíceis. Quanto ao tipo de função, as funções lineares foram mais facilmente resolvidas do que as funções inversas. Considerando-se os tipos de inferências, aquelas baseadas nas informações explícitas foram significativamente mais fáceis do que as baseadas

nas informações implícitas, e estas, por sua vez, foram mais fáceis do que as baseadas nas informações conceituais. As inferências explícitas e implícitas eram mais fáceis nos problemas sobre funções lineares do que naquelas acerca de funções inversas.

Os autores observaram que a qualidade das inferências era afetada pela quantidade de traduções que os estudantes realizavam. As inferências explícitas, implícitas ou conceituais foram melhores naqueles participantes que haviam feito as duas traduções. Eles concluem que existe relação entre o conhecimento conceitual medido por número e qualidade das respostas e o número de traduções que o estudante precisa realizar.

O estudo descrito remete para a existência de um nível de complexidade na compreensão das formas de representação e que está relacionada com o fato de a informação estar implícita ou explícita e com o número de traduções entre representações que precisam ser realizadas. O estudo não explora, porém, como as diferentes representações analisadas podem ser mais efetivas como veículos de mediação para entendimento conceitual da informação.

Nos gráficos, os aspectos conceituais da informação, quais sejam, as relações entre as variáveis, estão apresentados visualmente, enquanto nas tabelas, esses aspectos se encontram condensados sob a forma numérica. Em que medida os aspectos visuais do gráfico permite que as pessoas realizem inferências sobre fatores conceituais com maior facilidade do que os aspectos numéricos das tabelas?

Chua, Yates e Shah (2006) realizaram um estudo para investigar se a natureza especial dos gráficos, distinta de dados numéricos, poderia facilitar o entendimento de uma situação de risco em tarefas envolvendo a necessidade de a pessoa evitar o risco. As autoras solicitaram que 293 estudantes de Psicologia julgassem o preço de um produto considerado seguro (ex. um produto que diminuía o risco de uma pessoa contrair uma doença), depois que lhes era fornecido o preço de um produto-padrão. A informação foi apresentada em gráficos e tabelas e os estudantes foram alocados para resolver o problema por meio de uma forma ou de outra. Os autores mostraram que os estudantes julgaram os preços dos produtos em função da sua importância para evitar o risco de a pessoa contrair a doença e também em função do preço do produto-padrão. Os participantes que trabalharam com os gráficos ficaram mais motivados a recomendar o produto seguro do que o produto-padrão, quando comparados aos participantes que trabalharam com os números. Os aspectos visuais do gráfico ampliaram o sentido de risco pelos participantes e eles observaram que opções envolvendo riscos são consideravelmente danosas, devendo, portanto, ser rejeitadas em favor de escolhas mais seguras.

Hardy, Schneider, Jonen, Stern e Moller (2005) conduziram um experimento em sala de aula para testar se o raciocínio com gráficos de linhas por estudantes de terceiras séries podia ser realçado por atividades com representações no currículo, com base na flutuação ou não dos objetos. Os autores hipotetizaram que representando a massa e o volume de objetos em braços opostos de uma balança de trave permitiria a consideração simultânea de ambas às dimensões para uma representação do conceito de densidade, e esta representação por sua vez seria muito útil para os estudantes formularem inferências com base na inclinação das linhas em gráficos de linhas. Um estudo de intervenção com o uso de entrevistas foi conduzido junto a 98 estudantes. Metade da turma na sala de aula investigada trabalhou com uma balança e a outra metade com representações espontâneas (self-constructed representations).

Depois de cinco meses, os estudantes eram solicitados a interpretar gráficos de linhas representando informação a respeito de dois contextos proporcionais – densidade e velocidade. Em ambos, a relação proporcional entre as variáveis mostrada nos eixos tinha que ser considerada. Quanto ao contexto de densidade, os estudantes que trabalharam com a balança apresentaram melhor desempenho do que aqueles que trabalharam com representações espontâneas na interpretação dos gráficos de linhas. Quanto ao conceito de velocidade, no entanto, os grupos não diferiram em suas habilidades para interpretar os gráficos de linhas.

Os autores concluíram que a leitura de gráficos de linhas ancorada na determinação das coordenadas é importante, mas é especialmente a integração de conhecimento conceitual com o raciocínio envolvido na comparação das inclinações das linhas (slopes) que é particularmente requerida na competente interpretação de gráficos.

No caso específico do conceito da velocidade, há um caso de produto de medidas, onde a terceira variável precisa ser inferida pelos estudantes, como discutido exaustivamente neste trabalho; no entanto, essa interação simbólica talvez seja mais efetiva quando os estudantes estiverem trabalhando com essas ferramentas sob determinadas condições, como em situações em que eles sejam encorajados a estabelecer interações entre aspectos visuais e conceituais, a exemplo das tarefas elaboradas nessa tese.