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INFLUÊNCIA DOS ORGANISMOS INTERNACIONAIS E O IMPACTO DAS

CAPÍTULO I – EDUCAÇÃO SUPERIOR

1.2 INFLUÊNCIA DOS ORGANISMOS INTERNACIONAIS E O IMPACTO DAS

Para Casanova (2001), o projeto universitário neoliberal não se apresenta sempre abertamente. Nos documentos de organismos internacionais como UNESCO, UNICEF, PNUD e o próprio Banco Mundial, a proposta colocada oficialmente, ainda que ilusória, é a da “educação para todos”.

Entretanto, ou é colocada como proposta que não se pensa em cumprir, ou vem acompanhada de políticas e medidas concretas que impedem sua realização e reduzem as possibilidades de uma educação de qualidade.

Grande inspirador e poderoso provedor dessa concepção de educação é o Banco Mundial:

O peso dessa instituição (bem como de outros organismos internacionais sediados em Washington, como o FMI e o BID) é muito grande como instância reguladora de políticas educacionais. (DIAS SOBRINHO, 1999, p.152).

O Banco Mundial reflete a perspectiva neoliberal, constitui uma instituição central na despolitização e positivação da política-educacional, e exerce um papel central no processo de globalização do capitalismo. (TORRES in GENTILI, apud DIAS SOBRINHO, 1999, p.152-3).

No documento “La Enseñanza Superior: las lecciones derivadas de la

experiência” (BANCO MUNDIAL, 1995), mais especificamente na seção dedicada à

redefinição da função do governo, encontram-se as diretrizes do organismo para obtenção de empréstimos. Segundo LEHER (2001, p. 162) há uma convergência completa do texto com as ações do Ministério da Educação implementadas no Brasil nos últimos anos:

• Nos países em desenvolvimento, a intervenção do banco no ensino superior se limitará, fundamentalmente a procurar que seu financiamento seja mais eqüitativo e eficaz em função dos custos - isto é, com menos custo para o Estado, de maneira que a educação primária e secundária possam receber maior atenção.

• Somente os países que promoverem maior diversificação institucional e uma base de recursos mais diversificada (participação dos estudantes no custeio) continuarão a contar com o apoio do banco.

• Os governos devem criar organismos de fiscalização ou assessoramento para analisar políticas, avaliar as solicitações de financiamento, vigiar o desempenho das instituições e colocar a disposição dos estudantes a informação acerca de seu desempenho.

• O banco apoiará, ainda, a maior diversificação das instituições e novas modalidades de cursos de curta duração e a distância. (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 96, 98 e 100).

A legislação educacional brasileira retratou de forma inequívoca as políticas de ajuste estrutural condicionadas pelos organismos internacionais, a começar pela própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB1 complementada pelas leis que definiram a política de avaliação da educação básica ao ensino superior. 2

O mesmo ocorre com os projetos de autonomia universitária propostos pelo governo às universidades federais nos últimos anos. Longe de atingir a autonomia prevista no artigo 207 da Constituição Federal, os projetos tratam do controle gerencial do governo sobre as universidades por meio de ‘contratos de desenvolvimento institucional’, cujo objetivo central é o aumento do número de vagas. Sobre isso, alguns autores se posicionam:

A tormenta neoliberal, trazida até nós pelas condicionalidades do FMI e do Banco mundial em meados da década de 80, possui forças destrutivas que almejam impedir a autonomia universitária. À autonomia constitucional, o governo brasileiro antepôs a autonomia neoliberal. (LEHER, 2001, p. 174). Diante dos constrangimentos internos e externos da economia (virtual) globalizada, muitos desses países apressaram-se em adotar a receita. No nosso, a forma como estão sendo oficialmente encaminhadas as questões da autonomia, do financiamento do ensino pago das e nas universidades públicas federais, é um claro exemplo de como podem ser adotadas diretrizes de tais modelos e como se pode confundir a idéia histórica de instituição universitária autônoma com organização/empresa competitiva e dócil à mão invisível do mercado. (SGUISSARDI, 1999, p. 115).

A defesa da autonomia universitária pelo governo brasileiro é da lavra do Banco Mundial, que por sua vez, buscou sua inspiração no ideário neoliberal. Para introduzir sua política de autonomia, o governo teve de operar uma contradição: negar a autonomia universitária constitucionalmente estabelecida (art.207) por

1 Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 2 Lei n. 9.131, de 24 de novembro de 1995 - que instituiu o Exame Nacional de Cursos – ENC, Portaria

Ministerial nº 438, de 28 de Maio de 1998 - que instituiu o Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM; e Portaria nº 839, de 26 de maio de 1999, revogada pela Portaria nº 931, de 21 de março de 2005 - que instituiu o Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB.

meio de sua ressignificação: “autonomia diante do Estado para interagir livremente no mercado”. (LEHER, 2001, p. 153).

A adoção dessas políticas trouxe graves conseqüências às universidades públicas conforme apontam Catani e Oliveira (1999, p. 184):

• Ofertas crescentes do curso de graduação em que pese a crescente diminuição no número de professores e servidores técnico-administrativos;

• Oferta crescente de atividades de extensão, especialmente através de convênios e contratos de prestação de serviços remunerados;

• Crescente atendimento das múltiplas demandas locais e regionais, especialmente na forma de prestação de serviços remunerados;

• Crescente oferta de cursos pagos de especialização e outros, que complementam os baixos salários, mas absorvem tempo e energia docente, especialmente daqueles com alta titulação;

• Crescimento de mestrados profissionais autofinanciáveis;

• Falta de priorização e de investimentos substancial na pós- graduação stricto-sensu, com ênfase na pesquisa acadêmica. • Dificuldade de priorizar a atuação dos professores doutores na criação e consolidação dos cursos de doutorado e na ampliação quantitativa e qualitativa da pesquisa;

• Modelação organizacional e ampliação dos mecanismos de avaliação, controle e gerenciamento.

Para Goergen (2002), reside aí o projeto de desconstrução do modelo de universidade pública:

Olhando com atenção para a política governamental que está sendo implantada ao longo dos últimos anos, pode-se constatar que mudanças são introduzidas visando a adaptação da universidade às premissas do modelo neolieral, hoje hegemônico. No centro de todo esse processo encontra-se a desconstrução do modelo de universidade pública e crescente mercantilização da docência e da pesquisa: a exemplo do que vem acontecendo nos demais setores antes confiados à responsabilidade do Estado, estamos presenciando à tentativa de submeter a universidade às leis do mercado com seus princípios maiores da performatividade e da eficiência. (GOERGEN, 2002, p. 73).

O que fazer diante desse quadro? Dias Sobrinho (1999a), já apresentava esse desafio considerando-o uma dupla tarefa:

É preciso reduzir a força da retórica eficientista e produtivista em educação e construir novos significados para a qualidade educativa, direito de todos e não privilégio de uma minoria, valor de cidadania e não mercadoria ao lado de outras, ainda que hoje a mais valiosa do mercado. (DIAS SOBRINHO, 1999a, p. 165).

1.3 A EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA E A REFORMA UNIVERSITÁRIA NA