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5 OS ESTUDANTES E SEUS PAÍSES DE ORIGEM

5.4 CABO VERDE

5.4.1 Informações sobre o país

Cabo Verde é formado por dez ilhas localizadas na faixa costeira ocidental do continente africano. A capital, cidade de Praia, situa-se na

ilha de Santiago. A independência de Cabo Verde foi proclamada em 1975, tem, portanto, 38 anos de história como país autônomo.

Do grupo de estudantes entrevistados, Carlos e Henrique nasceram na capital, cidade de Praia, enquanto Flávia e Tatiana são da ilha de São Nicolau e Santo Antão, respectivamente. As duas comentam sobre as dificuldades que as ilhas menores enfrentam e a constante necessidade de migração, principalmente para Santiago, onde há mais oportunidades de trabalho para a população (passagem: país):

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Y1: E sobre o país de vocês, o que vocês poderiam falar assim (2) sobre

Cabo Verde, como que é morar lá, que mais vocês gostam?

Flávia: Bem.

Y: Bom, por exemplo, assim essa é uma pergunta que vocês podem falar

a vontade ta? Podem ficar a vontade.

Flávia: Meu país tipo assim: tem dificuldades sim, como todos os lugares,

mas como Cabo Verde é dividido em ilhas, na minha ilha praticamente em termos de emprego é muito difícil, aí muitas pessoas saem de lá, aí muitas pessoas vão sair do país pra, da ilha, pra trabalhar nas outras que tem mais trabalho, mas em termos da minha família não, meu pai trabalha faz 19 anos na mesma empresa e em relação às outras pessoas têm muitas pessoas que tem mesmo muita dificuldade em (2), em encontrar emprego pra sobreviver melhor na ilha aí tem que sair pra ir pras outras ilhas como Ilha do Sal, Santiago tem mais tra-, mais emprego.

Henrique: O que eu acho de Cabo Verde assim um país recentemente

independente, foi colônia de Portugal há 35 anos atrás, assim ta naquela fase de crescimento e desenvolvimento assim, é na base de (interferência no gravador) de recursos naturais nenhuma a não ser pesca, a exceção é o setor de, setor público que gira em torno do crescimento do país; é que nem ela ta falando assim, o país tem 10 ilhas, nem todas as ilhas tem oportunidade de emprego pra uma vida estável, senão uma vida boa assim digamos, acho que dá pra, é, mas você pode ser feliz sem ter muito dinheiro, aí posso comparar assim é que nem o país tem 10 ilhas, Santiago é maior que a capital comparado com outras ilhas é que nem o interior do Brasil todo mundo vai pra capital pro centro, os nordestinos vem pro centro de Brasília ou pro centro de São Paulo procurar uma vida melhor ((abre porta)), e ultimamente tem melhorado bastante, pode se melhorar mais ainda e ta assim, começou o país, assim começou a ter estudantes curso superior assim 10, 20 anos atrás era uma raridade uma pessoa com, com mestrado, doutorado, agora já tem, assim o pessoal ta tudo voltando pro país e ta crescendo assim tem dia que ta indo bom, a oposição fala que não, que precisa melhorar, precisar melhorar mais um pouco sim, eu reconheço isso, mas pra mim é tudo de bom, nada melhor que ta em casa no país com as famílias.

Tatiana: Em relação ao que ele falou, precisa melhorar um pouco tem

muito a melhorar ainda, porque Cabo Verde - eu não conheço todas as ilhas - mas é uma coisa que você, pra quem conhece ou pra quem assim ( ) o desenvolvimento tá mais concentrado na capital, na Ilha de Santiago, se você vê as outras ilhas, principalmente Santo Antão que é minha ilha, tá praticamente esquecida se não fosse a ajuda externa, (4) o pessoal tava enfrentando muita dificuldade por isso, assim, é um dos motivos que o

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pessoal sai das outras ilhas pra procurar trabalho principalmente na Ilha de Santiago onde fica a capital e enfim, mas é um país..

Y1: ∟ Essa ajuda vem de onde?

Tatiana: Oi? Y1: Essa ajuda?

Henrique: Vem de países como Luxemburgo.

Tatiana: Luxemburgo, Itália, Portugal, Espanha, muitos países europeus

tem, Estados Unidos também.

Flávia foi a primeira a se pronunciar sobre o seu país trazendo uma particularidade em relação aos problemas considerados comuns (“tem dificuldades sim, como em todos os lugares”, linha 6), que é a desigualdade de oportunidade nas ilhas que formam o arquipélago. Apesar de seu pai ter um emprego estável como topógrafo, muitos moradores da ilha de São Nicolau migram em busca de melhores condições de vida. Henrique, oriundo da capital, recupera o histórico de Cabo Verde pela condição recente de ex-colônia em fase de pleno desenvolvimento. Nota-se que a formação superior, nos níveis de graduação e pós-graduação, é um dos critérios adotados pelo jovem para confirmar o crescimento do país e ainda mais, o retorno dos estudantes que saem do país para estudar está diretamente vinculado a esse crescimento (“assim o pessoal ta tudo voltando pro país e ta crescendo”, linhas 30-31). Sobre a questão apontada por Flávia, ele concorda, mas de certa forma suaviza um pouco a situação quando diz “você pode ser feliz sem ter muito dinheiro” (linha 22), quase afirmando que a migração não seria estritamente necessária. Adiante ele reconhece que o país “precisa melhorar mais um pouco sim” (linha 32), expressão que Tatiana retoma e diferencia em sua fala, ao afirmar que Cabo Verde tem “muito a melhorar ainda” (linha 35). A estudante representa também uma ilha periférica, Santo Antão, em que vivencia essa realidade da população, em um lugar, como ela define, “praticamente esquecido” (linha 39).

Foi possível perceber uma mudança na participação das duas jovens no grupo de discussão a partir desse momento. Se nos dois primeiros blocos do roteiro do grupo de discussão (passagem inicial e passagem país) elas foram as primeiras a se manifestar, no restante do encontro elas pouco se pronunciaram. O discurso masculino prevaleceu

no grupo. Carlos é o mais comunicativo e de fato domina a participação, ele próprio se compara ao irmão “ela já gosta mais de ouvir do que falar, eu já gosto mais de falar do que ouvir” (passagem família, linha 21). Dentre eles, é o estudante mais antigo em Brasília, reúne funções de liderança tal como a presidência da Associação dos Estudantes Caboverdianos em Brasília e a direção de uma empresa júnior de consultoria na universidade.

Sobre Cabo Verde, Carlos elabora algumas proposições já iniciadas pelos colegas, como a questão da centralização na capital, mas avalia positivamente o crescimento do país, tendo em vista ser recém- independente (“é um país que no momento está triunfando bem em muitos dos seus obstáculos”, passagem país, linha 62). Ele complementa (passagem país): 96 97 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 109 110 111 112 113 114 115 116 117 118 119 120 121 122 123 124 125 126 127 128

Carlos: É agora usando mais o contexto econômico, o PIB é

relativamente pequeno também quando se compara com os países, mas isso tudo dado à própria grandeza de Cabo Verde, por ser um país pequeno, de pouca população e, mas agora a renda per capita é, ele já ocupa uma posição mais favorável né? Do que, principalmente Angola, comparado com Angola com outros países da própria CPLP, praticamente seu PIB per capita só perde pra (2) Brasil e Portugal praticamente é o terceiro em termos de renda per capita e o PIB é construído em sua maioria por ajudas externas e também dependentes do turismo e da própria questão ( ) dizem né? Estima-se que existem fora de Cabo Verde um milhão, um milhão e meio de cabo-verdianos, mas isso com certeza são considerados de segunda geração, (inaudível e confuso), e (2) então a população de Cabo Verde ela é assim (1) uma coisa que dizem, dizem muito né? Se é verdade ou não, isso aqui não cabe falar, que é questão que o povo de Cabo Verde tem certa ( ) aberta né? E que seria o espírito mais solidário com o próximo e um povo ale::gre que, sei lá, dispensa as questões burocráticas ( ) e que se apega muito também a questão familiar, o que faz com que quem sai pra procura de melhor condição de vida, sempre envia algum dinheiro, algum tipo de ajuda pra seus familiares né? E (3) agora as outras questões, (2) ah, a questão da educação em Cabo Verde seria o que talvez mais lhe interessa né? (4) a gente sempre teve uma educação ((porta abre)) onde a gente jura que era de qualidade, principalmente ao que tange ao ensino primário e secundário, porque inclusive isso se reflete quando próprio estudante cabo-verdiano sai pra estudar fora, sempre ele se destaca nas salas de aula quer, quer aqui no Brasil, quer em qualquer país do-do, onde se mantém essa cooperação educacional no nível universitário e sempre uma coisa que, eu pelo menos presenciei aqui na universidade de Brasília e outras universidades e pelos relatos de colegas né? Que sempre o estudante cabo-verdiano quando se compara com outros estrangeiros não que estamos aqui comparando, mas já @comparando@, ocupa a posição de nível, de destaque e isso da própria qualidade de ensino;

Carlos assume que, na condição de universitário, tem hoje um olhar mais crítico sobre as condições de seu país e, nota-se que, muitas de suas proposições refletem o conhecimento acumulado da área que estuda, Economia. De acordo com o estudante, há uma estimativa de que exista mais de um milhão de caboverdianos fora do país. A população do país hoje é de 434.263 habitantes e de fato, a população caboverdiana emigrada é maior do que a que vive em Cabo Verde e as remessas de recursos dos emigrados constitui uma das bases da estabilidade econômica83.

O povo caboverdiano também teve destaque, sendo definido como alegre, solidário, que “dispensa as questões burocráticas” e muito apegado à família. Pelo fato dessa pesquisa estar vinculada à Faculdade de Educação, o estudante supõe que este tema é o que mais me interessa (linha 116) e revela a qualidade da educação básica de seu país que se reflete no bom desempenho dos estudantes nas universidades, comparativamente aos dos outros países, diz ele em tom de brincadeira (linhas 124-128).