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INSTRUMENTOS PARA CONSTRUÇÃO DOS DADOS

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A observação do sistema didático objeto de nosso estudo ocorreu entre fevereiro e agosto de 2017. Embora sua preparação tenha acontecido desde novembro de 2016, a etnografia ocorreu efetivamente no ano de 2017. Realizada no componente curricular Introdução à Probabilidade no curso de licenciatura em Matemática do Campus VI da Universidade Estadual da Paraíba.

Correspondendo ao segundo momento da etapa II, durante a fase de preparação do estudo, valemo-nos dos resultados dos estudos exploratório 1 e 2 que fundamentaram a problematização da pesquisa e das reflexões teóricas no primeiro momento das etapas 01 e 03.

A observação foi dividido em três fases. Na primeira, lançamos mão das ferramentas teóricas da TAD, relativas ao estudo das práticas institucionais em torno do ensino de Probabilidade na formação de professores. Esse passo foi fundamental para que pudéssemos, a partir do ponto de vista teórico, delinear a ecologia que possibilita o funcionamento de sistemas didáticos em torno do objeto Probabilidade. Essa análise praxeológica e o delineamento das organizações matemáticas para o ensino de Probabilidade nos conduziu à construção dos

instrumentos pensados na segunda fase do estudo, na qual fizemos o desenho metodológico da construção de dados e tomamos decisões acerca da escolha do cenário de investigação.

Na terceira e última fase do estudo piloto, fizemos o registro desses dados e o seu tratamento. A partir desse tratamento, compomos a análise empírica. A primeira fase correspondeu a elaboração do capítulo 5 e a segunda ao capítulo 6.

O primeiro instrumento de coleta de dados foi a videografia que teve o objetivo de registrar o funcionamento do sistema didático nos momentos de interação entre professor, estudantes e o saber em jogo, a partir das transcrições das falas desses sujeitos. A videografia da sala foi apoiada na observação com registro em diário de bordo e a captura do áudio com gravador auxiliar. Esses instrumentos nos ajudaram no registro etnográfico.

De acordo com Fiorentini e Lorenzato (2009), a gravação de áudio e vídeo pode dar ao pesquisador um valioso instrumento de reconstrução dos fenômenos que ocorrem na sala de aula. Além do olhar sobre o funcionamento do sistema didático, nossa preocupação era com o contrato didático estabelecido neste sistema, logo nos interessavam gestos, ações e os discursos do professor e dos alunos.

Utilizamos dois equipamentos de filmagem. O primeiro focado nos estudantes e o segundo no professor. Utilizamos também um gravador de áudio digital para captar com mais fidelidade os diálogos entre professor-aluno e aluno-aluno, conforme gabarito preliminar:

Figura 14 – Gabarito videografia sala de aula.

Fonte: próprio autor.

Como método auxiliar, ainda tomamos notas de campo para a constituição de nosso diário de bordo. De acordo com Bogdan e Biklen (1994), o diário de bordo é um instrumento primordial para que o pesquisador possa fazer anotações de fenômenos que foram percebidos durante a observação.

Além da observação, realizamos entrevistas durante todo o processo e a composição de portfólio individual. Com o portfólio que chamamos de “Cadernos de Probabilidade dos alunos”, o objetivo era obter um registro escrito das praxeologias pessoais desenvolvidas pelos estudantes, a fim de identificar a dinâmica das posições assumidas pelos sujeitos e os indícios de mudanças na relação individual com a Probabilidade e seus conceitos básicos.

As entrevistas foram realizadas de forma coletiva e individual, usando um roteiro aberto com os sujeitos, e foram aplicadas em três momentos distintos conforme quadro 9:

Quadro 9 – Descrição dos instrumentos de coleta de dados.

Instrumento Finalidade

Entrevista Preliminar Conhecimento das relações que os sujeitos mantêm com a Probabilidade e seus conceitos;

Investigação da identidade dos sujeitos quanto ao ensino de probabilidade, o seu lugar na instituição, as expectativas em relação ao componente curricular e ao curso, além de outras sujeições externas ao curso de licenciatura em Matemática. Entrevista

Complementares

Realização de videografia das aulas, como complemento das observações;

Observação do movimento das posições dos sujeitos; Discussão sobre as praxeologias utilizadas durante as aulas;

Entrevista final Realização de videografia a partir de dois momentos: o primeiro coletivo; o segundo individual, a fim de observar o movimento das relações e o processo de identificação dos sujeitos como futuros professores que deverão atuar no ensino de Probabilidade.

Fonte: próprio autor (2018)

Complementando a primeira fase sobre análise das condições ecológicas para a vida do ensino de Probabilidade na instituição investigada, acrescentamos às organizações praxeológicas matemáticas as organizações didáticas, completando o estudo praxeológico. Essas organizações foram investigadas junto ao docente responsável pela disciplina, seguindo a proposição dos momentos de estudo, conforme Chevallard (1999).

Ainda durante a observação, utilizamos mais dois instrumentos para a coleta de dados: questionário formal sobre a Probabilidade e seus conceitos (ver anexo) e resolução de questões sobre as concepções de Probabilidade.

O questionário formal que utilizamos foi adaptado do questionário piloto validado por Silva (2002) que, aplicado para alunos do ensino médio, tinha o objetivo de verificar como estudantes se relacionavam com os conceitos elementares de probabilidade. Dentre essas noções estavam: acaso, espaços amostrais, equiprobabilidade, concepção laplaciana e concepção frequentista de probabilidade. Aplicado individualmente, o questionário visava explicitar as relações que esses sujeitos mantinham com esses objetos. No questionário original havia 13 questões, mas, em nossa pesquisa, adaptamos 05 delas, que tratam das noções já citadas.

Apesar do questionário ter sido pensado para alunos do ensino médio, seguimos o argumento de Guisasola e Barragués (2002) que destacam que, embora a maior parte da produção da pesquisa para o ensino de probabilidade seja em pesquisas para o ensino secundário, reconhece-se essa produção como útil para pensar o ensino universitário, e destacam, ao mesmo tempo, uma necessidade de aproximação entre os resultados dessas pesquisas e a formação docente.

A opção por usar questionários ou questões já validadas em outras pesquisas repousou no argumento de que a literatura corrente sobre o ensino de Probabilidade dispõe de diversos trabalhos no âmbito nacional e internacional. Essas pesquisas, além de trazer recomendações práticas para o ensino de Probabilidade, nos fornecia parâmetros fundamentados para refletir sobre a dinâmica das relações dos sujeitos com a probabilidade.

O segundo instrumento foi a resolução de questões envolvendo probabilidade. Aplicado juntamente com a primeira entrevista, esse instrumento era composto de duas questões que levavam em considerações a percepção dos sujeitos quanto às concepções de probabilidade. Aqui, utilizamos as concepções de Azcárate Goded (1996) que podem ser agrupadas em quatro categorias103: 1. Não Probabilística da Realidade (NPR); 2. Probabilística Intuitiva (PI); 3. Probabilística Emergente (PE); e 4. Probabilística Normativa (PN).

As questões foram divididas em duas partes. Na primeira, apresentamos, após a entrevista preliminar e antes do início das aulas de probabilidade, três questões que tratavam do cálculo de probabilidades simples variando apenas as amostras e a noção de equiprobabilidade em duas questões. Na primeira “Lançamento de dados”, simulamos a

situação de um lançamento de dois dados distinguíveis e não viciado, para garantir a equiprobabilidade nos lançamentos. Aos sujeitos foi solicitado responderem a quatro itens com probabilidades simples. As técnicas para sua solução envolviam a descrição do espaço amostral e a aplicação da definição formal de probabilidade. De maneira análoga, a questão seguinte tratou das probabilidades em relação ao “Planejamento Familiar”. Nesse caso, os estudantes foram convidados a estimar a probabilidade em relação a esse planejamento.

Essas duas primeiras questões não exigiam noções probabilísticas avançadas, porém requeriam ao menos que os sujeitos manifestassem traços de uma concepção probabilística emergente, ou ainda que estivessem na transição entre a intuição probabilística e níveis mais elevados. Essa escolha encontra respaldo nos estudos de Azcárate Goded (1996), que, além de modelar as características dessas concepções, alerta-nos para o fato de que as investigações sobre a Probabilidades revelam um conhecimento frágil tanto em crianças como adultos:

As investigações nos mostram que o raciocínio dos indivíduos em situações aleatórias, tanto crianças como adultos é muito frágil; sem alcançar, a maioria das vezes, um nível formal de conceitualização. Se detectam claramente o funcionamento de concepções intuitivas e o uso de esquemas heurísticos, ditas concepções, ainda que dão origem a numerosas direções e obstáculos em seus raciocínios, apresentam uma grande resistência ao ser modificadas104 (AZCÁRATE GODED, 1996, p. 32).

Esse foi um dos fatores que nos levou à escolha de contextos mais superficiais para a aplicação da probabilidade, assumindo que o contexto do lançamento de dados e a questão do planejamento familiar podem trazer contextos conhecidos dos estudantes e, consequentemente, permitir que estes revelem traços das suas concepções, uma vez que as questões permitem serem modeladas tanto a partir raciocínio mais intuitivo ou mais complexo, quanto do ponto de vista da formalidade no emprego de técnicas.

Na terceira questão, apresentamos uma situação intitulada de “Brincando com ‘Caixas de Fósforos’”. Diferente das questões anteriores, essa lida com negação da equiprobabilidade, pois o jogo consiste no lançamento de caixas de fósforos e, a partir da observação da ocorrência de determinada face para cima, visa obter uma pontuação. Levando em consideração o formato espacial da caixa (paralelepípedo), ou seja, não existe uma simetria entre a ocorrência das faces,

104 Las investigaciones nos muestran que el razonamiento de los individuos en situaciones aleatorias, tanto niños

como adultos es muy frágil; sin alcanzar, la mayoría de las veces, un nivel formal de conceptualización. Se detectan claramente el funcionamiento de concepciones intuitivas y el suyo de esquemas heurísticos, dichas concepciones, aunque dan origen a numerosas direcciones y obstáculos en sus razonamientos, presentan una gran resistencia al ser modificadas.

a solução envolve, portanto, o abandono de concepções intuitivas, requerendo ao menos elementos da concepção emergente de Probabilidade.

Segundo Azcárate Goded (1996), os indivíduos a quem se apresenta esse tipo de concepção reconhecem as diversas formas de representação de probabilidade e inclusive a frequencial, que se adequa melhor à resolução do problema. A questão da caixa de fósforos foi também proposta por Silva (2002). Apresentada como uma atividade complementar, a questão tinha a intenção de que os sujeitos observassem o problema da simetria na descrição da amostra. A segunda parte do questionário estava prevista para ser aplicada ao final das aulas de Probabilidade e antes da entrevista final. A primeira questão envolve a adaptação de um problema apresentado no estudo de Cavalho e Oliveira (2002)105 que trata de uma situação cujas amostras são diferentes e cujo resultado da experimentação são similares. A solicitação era que os sujeitos julgassem a possibilidade desse resultado ser considerado provável. Um erro comum nesse caso é ignorar o papel das amostras quando a probabilidade é tomada no sentido frequencial (CARVALHO; OLIVEIRA, 2002).

Na segunda questão, os sujeitos tiveram de julgar um experimento simples com moedas, de modo que o conceito de independência entre os eventos era reclamado na resposta.

Na terceira e última questão, revisitamos os lançamentos de dados, repetimos os primeiros itens e acrescentamos mais dois que envolviam também o pensamento condicional sobre probabilidade. Nossa intenção, era obter um parâmetro de comparação entre as técnicas empregadas na primeira e na segunda aplicação, de modo a perceber se houve ou não aquisição ou evolução nas técnicas utilizadas.

Na etapa dois, fizemos também o estudo sobre as organizações praxeológicas matemáticas e didáticas que envolviam o ensino de Probabilidade na formação inicial de professores.

A ênfase recaiu em delinear aspectos do Modelo Epistemológico Dominante – MED que agia sobre o sistema didático. Esses elementos serviram de base para a discussão das observações sobre a sala de aula de Probabilidade, especialmente no que tange à definição da noção de conformidade na instituição investigada e na dinâmica das relações entre os sujeitos com a Probabilidade e suas noções, como veremos no capítulo seguinte.

105 Nesse estudo Carvalho e Oliveira (2002) adaptam questões que foram discutidas por David Green e sua equipe

na década em meados dos anos 80 do século passado. David Green se propôs ao estudo das concepções de jovens ingleses no período de 1978 a 1981 quando o pesquisador desenvolvia o projeto “The Chance and Probability Concepts Project”. O objetivo deste trabalho foi investigar os conceitos ou as intuições aleatórias de jovens ingleses com idade compreendida entre 11 e 16 anos (CAÑIZARES, 1997).

Delineados os principais instrumentos utilizados apresentamos no quadro 10 uma síntese de cada instrumento e a sua relação com os objetivos específicos.

Quadro 10 – Descrição das entrevistas abertas.

ESTUDOS/ INSTRUMENTOS/ ETAPAS OBJETIVO ESPECÍFICO

1º 2º 3º 4º

Estudo das Organizações praxeológicas e Contrato Institucional X X Videografia X Diário de bordo X Cadernos de Probabilidade X X X Entrevistas X X X

Questionário Formal Probabilidade X

Questões Probabilidade X X X

Análise dos dados X X X X

Fonte: próprio autor (2018).

Na seção seguinte, discutiremos o processo de análise que idealizamos para o estudo.

No documento Download/Open (páginas 171-177)