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2.   METODOLOGIA 69

2.2   Instrumentos e Procedimentos para Coleta e Análise de Dados 72

característicos da vida diária dos participantes sociais (professores e alunos) na sala de aula de línguas na tentativa de compreender os processos de ensinar/aprender línguas. Para fazer este tipo de pesquisa é necessário participar na sala de aula como observador participante, escrever diários, entrevistar alunos e professores, gravar aulas em áudio e vídeo etc. [...]

Vale ressaltar que as metodologias das investigações etnográficas diferem dos estudos de natureza etnográfica que não abarcam todos os elementos da primeira. André (2008) esclarece que, para os antropólogos, pesquisa etnográfica está relacionada ao estudo da cultura e da sociedade, ou seja, o interesse primordial dos etnógrafos é descrever a cultura de determinado grupo social. Para que isso seja feito, é necessário que o pesquisador permaneça um longo tempo em campo, estabelecendo contato com outras culturas, o que não ocorre nas pesquisas de cunho etnográfico na área da Educação e Linguística Aplicada. Assim, a autora argumenta que trata-se de uma adaptação desse tipo de pesquisa, pois fazemos estudos do tipo

etnográfico e não etnografia no seu sentido estrito”. (ANDRÉ, 2008, p. 28)

Em consonância com a perspectiva de André, Ducatti (2010) destaca que a centralidade dos procedimentos de base etnográfica está no ponto de vista dos participantes

da pesquisa, suas crenças, valores, expectativas, sentimentos, além da consideração do contexto educacional como um todo (p. 29). Salientamos que esses fatores vão ao encontro de

nossos objetivos e, por isso, os julgamos pertinentes à metodologia desta pesquisa. Passamos à apresentação dos instrumentos e procedimentos utilizados na coleta e análise de dados deste estudo.

2.2 Instrumentos e Procedimentos para Coleta e Análise de Dados

Tendo em vista a necessidade de triangulação dos dados da pesquisa, utilizamos os instrumentos e procedimentos que estão descritos no quadro a seguir. Neste subitem, detalharemos a escolha desses instrumentos e como eles auxiliaram a coleta de dados deste trabalho.

Quadro 3. Procedimentos e instrumentos da coleta de dados PROCEDIMENTOS

E INSTRUMENTOS

OBJETIVOS

Entrevista A Identificar o perfil dos participantes e suas concepções acerca do ensino-aprendizagem de gramática e dos contextos de atuação.

Observação de aula Descrever a prática dos participantes com relação ao ensino-aprendizagem de gramática, tendo em vista a formação teórica desses professores. Observar a relação do fazer docente com o contexto de ensino.

Notas de campo e diário da pesquisadora

Anotar e descrever como os participantes abordaram a gramática.

Sessões de visionamento Analisar as explicações e justificativas dos participantes sobre sua própria prática, observando as relações entre o dizer e o fazer de cada participante. Investigar possíveis influências do contexto de atuação.

Questionário Analisar as considerações dos participantes sobre o modo como ensinavam gramática e a natureza do contexto de atuação.

Entrevista B Obter registro de impressões dos participantes sobre o envolvimento deles com esta pesquisa.

Assim, os dados foram coletados seguindo os pressupostos de Borg (2003, p. 102):

O conhecimento de gramática dos professores pode ser medido através de instrumentos similares a testes; as crenças dos professores podem ser levantadas por meio de questionários e entrevistas; e a cognição de professores pode ser examinada em maior complexidade por meio de práticas reais de sala de aula e discussões sobre as mesmas.69

69 Tradução nossa: “Teachers’ knowledge of Grammar can be measured through test-like instruments; teachers’

beliefs can be elicited through questionnaires and interviews; and teachers’ cognitions can be examined in greater complexity through analyses of actual classroom practices and discussions with researchers about these”.

É válido esclarecer que este trabalho é um desdobramento do estudo conduzido por Augusto-Navarro70 em 2010, no qual a pesquisadora investigou a influência das discussões teóricas apresentadas por Larsen-Freeman (2003) e Batstone (1994) na concepção de professores em formação sobre o ensino de gramática. Nove participantes, alunos de graduação que cursavam uma disciplina fundamentada pelas teorias de gramática como habilidade, foram entrevistados sobre suas cognições a respeito da instrução gramatical antes e logo após a conclusão da disciplina (60 horas). Após o curso, eles assumiram uma nova visão a respeito do que é ensinar gramática e tornaram-se mais sensíveis ao perfil de diferentes aprendizes, mas ainda apresentavam dúvidas sobre como colocar em prática a teoria estudada.

Tomando como base os dados obtidos no estudo de Augusto-Navarro (2010), nossa proposta foi observar a prática de 5 desses 9 participantes, analisando a relação entre o dizer e o fazer, além da influência exercida pelo contexto de atuação na cognição desses professores. Por se tratar de um desdobramento de tal pesquisa, esses 5 foram mantidos, pois estavam de acordo com os critérios estabelecidos para seleção dos participantes: ter cursado a disciplina “Avaliação e produção de material didático em língua inglesa” e atuar em dois contextos de ensino distintos.

Uma vez que buscamos investigar possíveis influências do contexto de atuação, era pertinente que a prática de cada participante pudesse ser observada em locais distintos, vislumbrando comparações entre os cenários, bem como entre o dizer e o fazer do mesmo professor em lugares diferentes. Além dos 5 participantes, selecionamos mais 2 professores que tinham se formado em Letras na mesma instituição de ensino e também haviam cursado a referida disciplina. Essa escolha foi pautada na importância dos contextos de atuação desses participantes, tais como escola pública e escola regular particular, já que buscamos analisar a relação entre a formação desses professores e a prática docente em diversos contextos de ensino. No item 2.3 apresentaremos os dados sobre os 7 participantes desta investigação.

Em referência à coleta de dados, esclarecemos que a primeira etapa constituiu-se da fase de diagnóstico, quando os dados foram obtidos por meio da entrevista A71. Os participantes foram entrevistados acerca da visão sobre o que é gramática, o que é ensinar gramática e como, geralmente, abordavam esse conteúdo. Acreditamos na viabilidade desse procedimento por nos ter permitido estabelecer uma conversa com os participantes acerca do

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Profa. Dra. Eliane Hércules Augusto-Navarro é orientadora deste estudo. Tivemos acesso aos dados coletados pela pesquisadora em 2008.

tema em questão. Conforme afirma Vieira-Abrahão (2006), as entrevistas semiestruturadas possibilitam que o pesquisador elabore um roteiro flexível de perguntas, que servirá como guia, além de ser um instrumento que melhor se adequa ao paradigma qualitativo por

permitir interações ricas e respostas pessoais (p. 223).

Ao descrever metodologias de pesquisa, Woods (1996) destaca a importância dos estudos que focam no ponto de vista dos professores, pois eles têm acesso às suas próprias intenções, ao conhecimento que têm dos alunos e às suas percepções sobre o processo de ensino-aprendizagem. Para o autor, nesse tipo de investigação, o observador procura traçar a perspectiva do professor sobre o que está ocorrendo na sala de aula.

Após a entrevista A, iniciamos o procedimento de observação de aulas e anotações de campo. A pesquisadora observou oito (8) aulas de cada um dos sete (7) participantes em dois contextos de atuação distintos – que serão descritos no item 3.4. Assim, foram observadas dezesseis (16) aulas de cada participante, as quais foram gravadas em áudio e vídeo, com exceção de um dos contextos, uma escola regular da rede privada, no qual não houve autorização da direção da escola para nenhum tipo de gravação. No entanto, julgamos que essa falta não prejudicou a recuperação dos dados obtidos nas observações, uma vez que tivemos o auxílio das notas de campo e do diário da pesquisadora.

Ressaltamos que as primeiras aulas de todos os participantes foram gravadas apenas em áudio visando a minimizar os efeitos da presença da pesquisadora na sala de aula. Sabemos que após certo tempo, os participantes tendem a não atentar ao fato de que estão sendo gravados e a câmera não é mais um elemento que pode inibi-los, conforme discutem Larsen-Freeman e Long (1991) e Borg (2006). No entanto, achamos prudente iniciar as observações com a gravação em áudio, que passaria despercebida pelos participantes e, principalmente, pelos alunos, de modo que quando a filmagem fosse feita não houvesse grande estranhamento por parte dos envolvidos nesse processo, o que pôde ser confirmado na prática.

No que tange ao tipo de observação, optamos pela não-participante, na qual, segundo Borg (2006), o pesquisador normalmente senta-se no fundo da sala fazendo anotações sobre a situação em foco e procura não interagir com professores e alunos. Esse modo de observação pareceu-nos pertinente ao escopo deste trabalho, uma vez que não era nossa intenção estabelecer relações de interação com os participantes e alunos. Nosso objetivo consistia em analisar a prática docente com relação ao ensino de gramática, buscando investigar se a gramática era ensinada como habilidade.

As observações de aula foram seguidas de 4 a 5 sessões de visionamento com cada participante. Tais sessões ocorriam, geralmente, uma semana após as aulas observadas, levando em consideração a proposta de Borg (2006) de que o tempo entre as observações e os visionamentos seja minimizado para que esse procedimento gere dados mais válidos. No entanto, o pesquisador nos lembra que, embora na teoria o tempo entre os eventos deva ser curto, os professores têm que cumprir seus horários e cronogramas e os pesquisadores precisam se adequar a eles. No caso desta pesquisa, as sessões tinham duração média de 30 minutos e possibilitaram que os participantes assistissem suas aulas (ou as ouvissem, nos casos em que não houve gravação em vídeo) e discutissem a respeito do seu desenvolvimento.

Ressaltamos que, tendo em vista o foco deste trabalho, ou seja, o ensino-aprendizagem de gramática, os participantes foram convidados a refletir sobre os trechos das aulas nas quais a gramática estava presente. Outros temas também foram discutidos nessas sessões, mas não serão apresentados aqui por não estarem diretamente relacionados ao escopo deste estudo. No contexto em que não houve autorização para gravação em áudio ou vídeo, a participante leu trechos do diário da pesquisadora, comentou sobre os mesmos e respondeu às perguntas feitas. Julgamos que esse procedimento não tenha prejudicado a geração de dados para este estudo, uma vez que Borg (1998) e outros pesquisadores também já utilizaram essa técnica para estimular a discussão sobre as decisões e ações do professor.

Vieira-Abrahão (2006, p. 227) define as sessões de visionamento da seguinte forma:

As sessões de visionamento, também chamadas por outros pesquisadores de sessões reflexivas, envolvem a exposição das gravações em vídeos das aulas observadas aos participantes, professores e alunos, esperando levantar, com tal exposição, a perspectiva dos actantes sobre suas próprias ações e provocar a conscientização dos mesmos sobre seu fazer.

Ainda que nosso objetivo não tenha sido conscientizar os participantes sobre a sua prática docente, esse procedimento pareceu-nos adequado na medida em que possibilitou a reflexão e explicação do participante sobre suas atitudes e percepções em sala de aula, além de ter permitido ao pesquisador analisar a fala do professor com relação à sua própria prática, observando o que ele pensa, sabe e em que acredita.

Cabe esclarecer que o procedimento em questão não teve o objetivo de recuperar o pensamento interativo, ou seja, entender o que se passava na mente do professor em determinado momento da aula. A finalidade do visionamento foi estimular a lembrança de

eventos para facilitar a discussão de fatores que os influenciam (como as crenças)72 (BORG, 2006, p. 219) e entender as razões que levaram os participantes à tomada de decisão.

Woods (1996) discute a importância de investigar o contexto de atuação em conjunto com a visão dos participantes para que seja possível estabelecer relações entre o que se observa e o que de fato ocorre:

Incluir os contextos dos cursos e dos participantes possibilita reconhecer que o que é observado como eventos iguais formalmente podem ser bem distintos quando percebidos funcionalmente. Em outras palavras, o que na superfície parece ser o mesmo evento pode ser visto como diferente pelos participantes devido à sua relação com os objetivos, intenções, pressupostos e crenças. (WOODS, 1996, p. 17)73

Nesse sentido, percebemos que as sessões de visionamento permitiram que os participantes esclarecessem e justificassem suas escolhas e decisões instrucionais.

Durante o período de observação de aulas e sessões de visionamento, os participantes foram convidados a responder a um questionário semiaberto (Apêndice B). Um questionário piloto foi elaborado pela pesquisadora e respondido por três professores que não estavam envolvidos com esta pesquisa. Com base em suas respostas e dúvidas, além da revisão e sugestões da orientadora deste estudo, reelaboramos o questionário e o enviamos por e-mail. Os participantes tiveram o prazo de um mês para nos enviar as respostas também via correio eletrônico. O objetivo desse procedimento foi viabilizar a possibilidade da escrita reflexiva, de modo que o participante pudesse refletir sobre suas visões e sua maneira de ensinar gramática nos contextos em que estava sendo observado.

Para Borg (2006), questionários são bastante utilizados nas pesquisas de cognição de professores devido a algumas vantagens desse instrumento, tais como a rapidez, a economia de tempo e a possibilidade de coletar dados em grande escala, apesar da dificuldade de elaboração dos mesmos. No entanto, o autor alerta para a limitação que os questionários podem ter para capturar a complexa natureza da vida mental dos professores (p. 174)74. É nesse sentido que os instrumentos de autorrelato75, seguindo a denominação do autor, devem ser combinados com observações e entrevistas. Neste estudo, procuramos garantir que os

72 No original: “(...) to facilitate a discussion of the factors influencing them (such as beliefs).”

73 No original: Including the contexts of the course and the participants makes it possible to recognize that what

are observed as the same events formally may be quite distinct when perceived functionally. In other words, what on the surface seems to be the same event may be viewed by the participants as being different because of its relation to their goals, intentions, assumptions and beliefs.

74 No original: (…) to capture the complex nature of teachers’ mental lives.

dados fossem coletados por meio de diferentes instrumentos e procedimentos por estarmos cientes das limitações presentes em cada um deles, individualmente.

Para encerrar a segunda fase da coleta de dados, fizemos a entrevista B76, também semiestruturada, que ocorreu após o término das observações. Nesse momento, os participantes puderam refletir acerca de todo o processo, fizeram perguntas sobre os resultados da pesquisa e ofereceram sugestões para estudos futuros.

Faz-se importante esclarecer que todos os instrumentos de coleta de dados foram elaborados e aplicados em inglês. Optamos por utilizar a língua inglesa porque esta pesquisadora havia sido selecionada para um estágio de doutorado sanduíche e os dados obtidos foram analisados e discutidos com uma pesquisadora norte-americana. Salientamos que todos os participantes deste estudo eram proficientes na língua inglesa, não apresentando limitações para que as entrevistas, questionário e visionamentos fossem conduzidos nessa língua. Além disso, tivemos o consentimento dos participantes para o uso da LI e, ao final dos procedimentos, possibilitamos um espaço para que quaisquer considerações fossem tecidas em Português.

Tendo discutido os instrumentos e procedimentos usados para a coleta de dados, passamos a apresentar os participantes desta investigação.