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5.1 Aprendizagem dos gestores

5.1.3 Interação com colegas de trabalho

O objetivo desta seção é discutir os resultados de como os gerentes aprendem interagindo com colegas de trabalho. Nesse processo, ficou evidente a relevância da interação entre os gestores e demais colegas de trabalho no ato de aprendizagem.

Foi constatado no estudo que os gestores demonstram aprender no contexto prático- social do ambiente de trabalho mediante o compartilhamento de informações, conhecimentos e amizades com os colegas, corroborando os postulados da aprendizagem situada, defendidos por Lave e Wenger (1991) e Gherardi, Nicolini e Odella (1998). A maioria dessas interações ocorre diariamente de maneira espontânea nas conversas, telefonemas, correio eletrônico e outros meios informais. Nessas relações, os indivíduos negociam os significados das palavras, ações e situações, buscando, em muitos casos, a resolução de problemas (GHERARDI; NICOLINI; ODELLA, 1998). Percebe-se que os gestores utilizam nessas interações o domínio da comunicação (MEZIROW, 1991, p.75), que se caracteriza pela “compreensão, descrição e explicação das intenções; valores; idéias; questões morais; conceitos sociais, políticos, filosóficos, psicológicos ou educacionais; sentimentos e razões, que são compartilhado pelos indivíduos”.

Alguns gestores relataram o valor, para o ato de aprender, do convívio com pessoas mais experientes, que propiciou o amadurecimento desses então principiantes e influenciou, de certa forma, seus estilos de administrar. Como foi percebido no relato do Noel, gerente de segurança, que afirma que seu estilo gerencial foi influenciado por um determinado

superintendente, que serviu de modelo e é reconhecido por ele, como alguém que influenciou sua formação como gestor.

Percebe-se que estes gestores tiveram o que Lave e Wenger (1991) definem de participação periférica legítima, ou seja, desempenharam o papel de “aprendizes” e, por meio da convivência com profissionais mais experientes foram, paulatinamente, sendo legitimados pelo grupo. Esses mestres facilitaram o processo de aprendizagem por meio da interação social, a fim de que aqueles no papel de discípulos adquirissem os conhecimentos e as habilidades necessárias para o desempenho de suas atividades. Isto ocorreu, por exemplo, no caso do Paulo, gerente de tecnologia da informação, quando aborda seu processo de aprendizagem e legitimação junto a um grupo de profissionais da Universidade de São Paulo (USP), que foi contratada para instalação de um determinado equipamento no Aeroporto de Congonhas (seção 4.3.3).

Tavares, por exemplo, enfatizou em seu relato a idéia de que compete aos mais experientes orientar os mais jovens na tomada de decisões. Dessa forma, nota-se que esses gestores reconhecem a necessidade dos novatos serem socializados com a ajuda dos mais antigos, visando à aprendizagem por meio da observação das atividades dos demais membros das diversas comunidades de práticas existentes na empresa (LAVE; WENGER, 1991; EASTERBY-SMITH et al, 2003). O estudo revela que esse tipo de aprendizagem que ocorre no contexto prático-social é adquirido no trabalho desenvolvido diariamente sob a supervisão e orientação dos chefes e também de outros colegas.

Neste estudo, percebe-se que a aprendizagem dos gestores, em geral, não se restringe à interação com os colegas de trabalho da regional. Foi revelado que existem redes de relacionamentos estabelecidas pelos gestores com outros profissionais das demais dependências — aeroportos, regionais e sede da INFRAERO. A maioria desses contatos é realizada de maneira informal, principalmente, por meio do uso do correio eletrônico da empresa, o que é uma forte evidência da existência de comunidades de prática na empresa, devido ao seu caráter informal e a troca de práticas dentro de um contexto social, suas principais características.

Para Wenger (2004), o que define uma comunidade de prática é a interação regular de seus membros, visando a aprender como melhorar a execução de suas atividades. No entanto, quando os entrevistados foram questionados se participavam de algum grupo formal ou informal de aprendizagem, todos responderam que não. Os fatos de eles não se perceberem inseridos em grupos, times ou networks não significa que não participem de comunidades de prática, pois existem indícios em seus relatos (conforme detalhado no capítulo de resultados)

de que eles trocam informações (tais como as reuniões, conversas telefônicas, correio eletrônico e grupo de estudo – este promovido apenas por um gerente, Renato). Nestas oportunidades os gerentes compartilham práticas de trabalho, conhecimentos e estão constantemente interagindo com colegas de trabalho para aprender e cumprir os deveres profissionais.

Outro aspecto interessante foi a unanimidade dos gestores na afirmação de que não reconheciam as reuniões gerenciais como momentos de aprendizagem. De fato, alguns as consideram apenas informativas ou de cobranças. Normalmente, esses encontros ocorrem semanalmente com a participação do superintendente regional, do superintendente do aeroporto, da assessora da superintendência e do corpo gerencial. Todavia, a autora teve a oportunidade de participar de algumas dessas reuniões no período de 2006 a 2007, quando estava representando sua gerente nessas reuniões e, nessas ocasiões, pôde observar que se tratava de questões de várias áreas da empresa; portanto, eram de interesse comum a muitos gerentes, cujos trabalhos dependiam de soluções a serem desenvolvidas em conjunto com as gerências envolvidas. A autora percebeu que, apesar de os assuntos debatidos serem de caráter geral ou técnico, esses momentos propiciam ao corpo gerencial a troca de informações, sugestão de melhorias e apresentação de dificuldades. Isso significa que existe a partilha de informações e de conhecimentos que geram algum tipo de aprendizagem que, talvez, não seja percebida pelos gestores.

Acredita-se que essa falta de percepção dos gestores de que as reuniões gerenciais propiciam oportunidades de aprendizagem, se deve, pelo menos parcialmente, a alguns fatores apresentados pelas autoras Gherardi, Nicolini; Odella, (1998) que advogam que nas organizações, há uma visão muito limitada com relação a aprendizagem, causada por algumas razões. A primeira delas é a de que a aprendizagem é percebida como algo separado de qualquer outra atividade na organização, associando-a com momentos específicos como assistir uma aula, ler um livro ou assistir a um vídeo instrucional. A segunda razão para isto é a concepção de que aprendizagem é uma ação totalmente individual. Contudo, nas organizações de trabalho, pessoas e grupos criam conhecimento, negociam o significado das palavras, ações, situações e artefatos materiais (GHERARDI, NICOLINI; ODELLA, 1998). Essa também parece ser a percepção da Ana, gerente de controle empresarial, ao relatar que:

Eu acho que ela [reunião gerencial] tem a função informativa, e tem também a de aprendizado. Então quando o Cel. França [Gerente de Navegação Aérea], por exemplo, começa a falar, eu fico muito atenta, porque a atividade dele para mim, apesar de ter tanto tempo de INFRAERO, ainda é uma atividade que eu não conheço. Então eu aprendo

muito naquele momento, a mesma coisa é uma atividade do Aoun [Coordenador de Meio Ambiente]. Então são coisas que realmente chamam a atenção e são oportunidades de conhecimento, de aprendizagem. (ANA)

Portanto, a aprendizagem no contexto prático-social dos gestores da INFRAERO revela certo grau de complexidade, uma vez que é marcada pelas inúmeras interações entre os gestores e os diferentes stakeholders — pares, subordinados, superiores, órgãos governamentais, comunidade aeroportuária e empregados terceirizados.

5.1.4 Educação formal

Percebe-se pelos resultados que os gestores envidaram esforços nas suas formações mediante participação em treinamentos, cursos, seminários e pós-graduações. Eles reconhecem os benefícios advindos da educação formal para o desempenho de suas atividades e para o amadurecimento profissional. A prova disso é que a maioria dos gestores entrevistados apresenta formação acadêmica de nível superior, inclusive muitos fizeram pós- graduação (incluindo-se MBA´s), em alguns casos foram financiados pela empresa, que apresenta programas de incentivo na área de ensino fundamental, ensino médio, graduação e pós-graduação. O aperfeiçoamento profissional dos gestores por meio da educação formal coaduna-se com a proposta de Fox (1997), que advoga que a aprendizagem gerencial envolve o mundo da sua prática, educação e desenvolvimento. Sendo assim, a interface entre a realidade concreta vivenciada diariamente pelo executivo no ambiente de trabalho e suas atividades de desenvolvimento e educação são realizadas por meio da aprendizagem gerencial.

Grande parte dos cursos e treinamentos dos quais os gestores participaram foram promovidos pela empresa e são de caráter técnico, ou seja, voltados para suas respectivas áreas de atuação. Isso ficou comprovado na análise do plano anual de treinamento dos últimos três anos, no qual consta que a maioria dos treinamentos é, principalmente, na área de operações, segurança, navegação aérea e de caráter técnico (que são as áreas fins da empresa). Não existe a previsão de cursos específicos para a formação dos gestores, o que foi muito criticado por eles. Essa necessidade da formação gerencial é defendida por autores como Burgouyne e Reynolds (1997) que advogam que a aprendizagem gerencial é uma área, tanto da prática profissional, quanto de investigação teórica, cujo intuito é diminuir as lacunas existentes entre estes dois domínios. Sendo assim, a aprendizagem gerencial refere-se às

atividades como treinamento, educação e desenvolvimento gerencial e as demais formas de aprendizagem que ocorre no dia a dia do trabalho.

No entanto, a empresa investe amplamente na formação técnica dos seus empregados, principalmente os que trabalham nas áreas fins da empresa (operações, segurança e navegação aérea), a fim de que possa não só atender as normas e regulamentos do setor de infra-estrutura aeroportuária, mas também garantir a operacionalidade e a segurança dos aeroportos e dos passageiros. Tal concepção está em consonância com as idéias progressivas de Dewey (1976), que defende a relação íntima e necessária entre os processos de nossa experiência real e a educação. E, outrossim, com as de Akin (1987), que declara que a real aprendizagem completa-se apenas com a aplicação de teorias e conceitos nas experiências da prática. A priorização da formação técnica dos gestores apresentada neste estudo estão em consonância com o que Mezirow (1991) denomina de domínio instrumental da aprendizagem. Esse domínio representa a forma de controle e manipulação do ambiente, incluindo outras pessoas. As ações são baseadas em conhecimento empírico, governado por papéis técnicos (MEZIROW, 1991). La Paro (1991) constatou em seu estudo conduzido com 20 gerentes da área de saúde, a importância da aprendizagem técnica para o desempenho das funções gerenciais.

Verifica-se que a empresa apresenta uma estrutura consolidada de formação técnica dos seus empregados, cursos e treinamentos. Os gestores reconhecem que a maioria dos seus conhecimentos técnicos foi fomentada pela empresa. Ademais, eles relatam a necessidade de a empresa ofertar cursos e treinamentos de formação gerencial. Desse modo, nota-se que os gestores são unânimes sobre a importância da formação gerencial específica para lidar com pessoas e processos. A partir deste entendimento será dada continuidade à discussão dos resultados, na próxima seção, sobre as competências existentes e desejáveis dos gestores