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16,67%

23,33%

Tiveram a

experiência de

exploração do

trabalho infantil

Nunca

trabalharam

durante a infância

Não opinaram

Este gráfico evidencia que grande parte de adultos não se alfabetizou durante a infância por sofrerem privações sociais, principalmente a exploração do trabalho infantil. Isto comprova que o analfabetismo tem origens diferentes e não está associado simplesmente ao fracasso escolar ou às dificuldades de aprendizagem apresentadas por alguns sujeitos. As causas sociais e econômicas do analfabetismo refletem o sistema excludente brasileiro, destinando à escola uma grande parcela de responsabilidade para a inversão deste quadro. Esta situação de exclusão social confirma a exploração do trabalho de meninas e meninos brasileiros e de todo o mundo, conforme os dados apresentados por Maurício Silva:

De acordo com a OIT, 250 milhões de crianças entre 5 e 14 anos trabalham em todo o planeta. Desse número, estima-se que 140 milhões sejam meninos e 110 milhões, meninas. Elas, assim como os meninos e as mulheres adultas, continuam sendo explorados em virtude de custarem menos para o capitalista, sendo, portanto, mais hábeis e por possuírem mãos mais delicadas que os homens. (Silva, 2002, p.37).

É necessário ressaltar que os dados anunciados pelo autor não incluem a situação do trabalho infantil doméstico e não-remunerado a que milhares de crianças (principalmente meninas) estão submetidas, sendo impedidas de freqüentarem a escola na faixa etária adequada. A exploração do trabalho infantil é bastante presente nas comunidades rurais de todo o país, onde são encontradas crianças que trabalham no cultivo de cana-de-açúcar, no corte de madeira, na manufatura do sisal, entre outros tipos de serviços braçais a que estão submetidas milhões de crianças brasileiras.

Para quem mora em cidades grandes, como é o caso da cidade de Salvador- local de realização desta pesquisa, não é raro encontrar crianças e adolescentes como trabalhadoras das sinaleiras, pedintes ou ainda exercitando roubos, assaltos e consumo de drogas, conforme destaca a tirinha produzida por Luis Augusto, autor da Série Fala, menino!:

Os quadrinhos demonstram a situação de abandono das classes economicamente desfavorecidas, afetando, inclusive, crianças que estão matriculadas nas escolas. A tirinha aponta também o descaso da população das grandes cidades que se abstém de qualquer responsabilidade em relação à extrema desigualdade social brasileira. Este é o retrato da banalização da exclusão social extrema, bem como da negligência dos poderes públicos voltados para a área social.

Em relação a questões territoriais, constatou-se, por meio da pesquisa, que grande parte desses estudantes analfabetos é oriunda das áreas rurais do interior da Bahia. Além desta questão geográfica, percebe-se, nos relatos, que o analfabetismo tem histórias de dor e abandono, pois muitos estudantes se tornaram órfãos muito cedo, passaram por péssimas condições de subsistência, e, como foi visto, pelo restrito acesso à escola por conta da exploração do trabalho infantil. Tais problemas estão diretamente relacionados às dificuldades econômicas enfrentadas pelas famílias brasileiras e pelo descaso na implementação das políticas públicas nas áreas sociais e educacionais no Brasil. Sobre este assunto, Josias Brandão (estudante) relatou um pouco da sua trajetória social na infância, conforme verifica-se a seguir:

“Morei na roça, quando eu era criança, foi uma vida muito difícil. Tinha que trabalhar para conseguir as coisas, porque eu perdi minha mãe com 8 anos e o meu pai com 9. Foi um sufoco. Fui criado pelos meus padrinhos e tinha que ajudar

na roça. Eu ia fazer as compras na cidade e tinha que trazer tudo o que eles pediam sem errar e como eu não sabia ler e escrever, ficava difícil; tinha de matutar muito para não errar”. (Josias Brandão, 33 anos).

Assim, no trecho, o estudante explica que não sabia ler e que isso lhe causava dificuldades para fazer as compras para os padrinhos, em uma região rural do estado da Bahia. O alimento, abrigo e outros elementos de necessidades básicas eram mais imediatos, do que os estudos, por se relacionarem à luta pela sobrevivência. Aqui, a escola passa a ser vista como algo de necessidade secundária e, às vezes, como elemento supérfluo na vida de sujeitos economicamente desfavorecidos, habitantes de regiões rurais e pouco letradas. Apesar da existência de escolas em áreas rurais, esta representava um privilégio para poucas famílias da comunidade, conforme pode-se perceber no seguinte depoimento:

“Até que tinha escola na roça, mas eu não ia para a escola, não. Eu não estudei quando eu era criança. Só fui para a escola com 18 anos, porque sentia que eu não sabia escrever e precisava saber e eu tinha também inveja dos meus amigos que liam e escreviam. Naquela época, eu trabalhava de manhã e estudava à tarde; de noite fazia alguma coisa para ganhar dinheiro, aí não sobrava tempo para estudar direito. Eu tinha vontade de ir para escola quando eu era menino, mas não podia mesmo. Se eu não ajudasse em casa, não tinha ninguém para ajudar meus padrinhos.” (Josias Brandão, 33 anos).

O relato de Josias demonstra a sua compreensão sobre a necessidade do estudo, atribuindo-lhe um status de qualidade expresso pelo sentimento de “inveja” em relação aos colegas que sabiam ler. Porém, na época da infância, o ingresso aos estudos tornou-se impossível por conta das necessidades financeiras de sua família. Mesmo na fase adulta, tal estudante referiu-se, neste depoimento, à sua dificuldade de ingressar e permanecer na escola, por conta da longa jornada de trabalho para o sustento pessoal, restando-lhe pouco tempo para a atividade de estudo. Por meio da pesquisa, constatou-se também que as meninas sofreram o mesmo problema de exploração do trabalho, porém inseridas no contexto doméstico, conforme conta a estudante do turno noturno da escola pública em questão: