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CAPÍTULO 3 OS MOVA(s) DIADEMA E MAUÁ: UMA MESMA POPULAÇÃO

3.7. O MOVA e os jovens sem voz

3.7.1. Jovens do MOVA: a juventude negada

Em Diadema, foram entrevistados 4 jovens, na faixa dos 20-24 anos, sendo 03 mulheres e 01 homem. Todas as mulheres são amasiadas, 02 delas com 01 filho e não trabalham fora de casa. O rapaz é solteiro e trabalha fazendo bico numa firma.

Em Mauá, foram entrevistados 10 jovens, 05 mulheres e 05 homens. As mulheres, na faixa dos 16-24 anos e os homens, dos 16-28 anos. Destes últimos, só um é casado e tem um filho de 03 anos. Das mulheres, 03 são solteiras e 02 delas amasiadas e mães.

Esses jovens se vêem como jovens-adultos, têm família, são independentes, cuidam de si e muitos deles cuidam também de outros. São jovens pobres, enfrentam condições duras de vida e moram nos bairros periféricos das cidades. As histórias de vida desses jovens revelam os limites e as possibilidades de que sejam reconhecidos como sujeitos de direitos, conforme proposto nas políticas públicas de jovens e adultos, aqui já delineadas.

Gi (22 anos) nasceu na Bahia Viveu lá até 2000, quando veio para Diadema ser babá, num emprego arrumado por uma colega. Vive com um companheiro há 3 anos e procura emprego há dois meses. D (20 anos) nasceu em São Paulo. Sua família tinha vindo da Bahia e chegou a Diadema, fugindo do aluguel na capital. Veio numa invasão, em 1987, com o pai. Hoje, o marido toma conta da filha para que ela possa estudar.

P (24 anos) nasceu no Ceará. Parou de estudar aos 15 anos quando engravidou. Voltou a estudar depois de 08 anos.

G (22 anos) nasceu em Diadema, foi para Pernambuco com os pais e voltou para Diadema, em busca de oportunidade, em 2002. Passou por quatro empregos (lava rápido, ajudante na marcenaria, numa firma de limpeza e agora faz bico numa outra firma, após um tempo desempregado).

L1 (17 anos) nasceu em Pernambuco, veio para Mauá (1991). Voltou para Pernambuco (1997). E novamente para Mauá (2002).

A (24 anos) nasceu no Ceará. Veio para Mauá cuidar da sobrinha para uma tia que trabalhava e estudava à noite. Voltou a estudar incentivada pelo companheiro.

L2 (24 anos) veio da Bahia. Quando os pais se separaram, teve que trabalhar, sempre dormindo no emprego. Agora, essa exigência não existe mais, a patroa e os irmãos a incentivaram a estudar.

Lu (16 anos) nasceu na Bahia. Morava na roça e estudou num povoado próximo, andando todos os dias e pegando depois um ônibus para chegar à escola. Começou a estudar com 10 anos. Foi até a quarta série e depois saiu. Chegou em Mauá em 2004 para tomar conta de criança. Sua tia e a cunhada procuraram escola para ela. Voltou a estudar.

R (18 anos) veio de Alagoas. Entrou na escola em Mauá aos 16 anos. Saiu e depois voltou.

Na (16 anos) julga que nasceu em Santo André. Não tem certeza. Mora em Mauá. Está na escola desde pequeno. Foi até a sexta série. Não concluiu, ficou um tempo sem estudar e voltou para a escola, para o MOVA, levado pelos amigos. Já fez muitos bicos na vila onde mora e hoje trabalha com o pai: lixa carros.

LC (16 anos) nasceu no Recife. Veio para Mauá (1991). Foi para Pernambuco (1997). Em 2002, estava de volta a Mauá. Voltou para a escola. Ele faz bicos: marreteiro, ajudante de pedreiro.

AC (18 anos) é portador de deficiência auditiva. Nasceu em São Paulo, capital, e mora desde pequeno em Mauá. Um outro jovem também deficiente auditivo o chamou para estudarem no MOVA.Ele se sentia um pouco perdido e confuso na escola estadual onde estava antes, numa 4ª. série.

Ma (23 anos) nasceu em Maceió, lá estudando até os 13 anos. Saiu da escola e voltou aos 19 anos. Aos 16 anos, já estava em São Paulo, em São Caetano do Sul. Não estudou e após dois anos, voltou para Maceió. Em 2003, voltou direto para Mauá. Arrumou um trabalho no Carrefour e precisou abandonar a escola. Após ficar sem o trabalho, matriculou- se na escola.

J (28 anos) é de Salinas, Minas Gerais. Trabalhava na roça e foi para cidade cuidar de um menino que levava e trazia da escola. Fez isso por 3 anos, morando na casa onde trabalhava. Voltou para casa dos pais, ficando no trabalho da roça até 1994. Nesse ano, veio para São Paulo ser ajudante de pedreiro, com parentes. Em 1996, estava em Mauá trabalhando com o comércio de peças velhas. Casou-se 02 vezes e é pai de um garoto de 3 anos. Seus pais também vieram para cá. Estão em Holambra. Eram 12 irmãos e hoje são 08.

A história de vida dos jovens do MOVA traz nela as marcas da pobreza. Para as mulheres o trabalho doméstico, em alguns casos de babá, morando na casa a que presta serviço, impossibilitando a ida à escola. Algumas, em função da gravidez precoce, se responsabilizam muito jovens pelos cuidados com os filhos pequenos, portanto, com jornadas de trabalho doméstico impeditivas. Para os homens, o trabalho precário e incerto, fluído no tempo e no espaço.

Os jovens que transitam de um lugar a outro, de um trabalho a outro (bicos), de uma escola a outra, encontram-se desafiliados, isolados, pois, nas suas vidas, já não se vinculam à seguridade e ao trabalho. Não se trata de jovens aprisionados pelas questões de suas subjetividades, mas sim de sujeitos sem suportes, aqueles garantidos pelo Estado, através das políticas públicas, afirmativas de direitos (CASTEL, 2001). Nessa medida, o trabalho em torno

da auto-estima desses jovens, numa linha psicologizante, não considera que há um suporte, necessário para o desenvolvimento da própria auto-estima, que políticas como o MOVA não podem garantir.

Esses jovens-adultos expressam nas suas trajetórias uma concepção de juventude e de vida adulta, como um tempo de direitos humanos, mas também de sua negação e de políticas públicas para uma inclusão precária, porque marcada pela falta de emprego e de horizontes de sobrevivência.

A Educação de Jovens e Adultos tem de partir, para sua configuração como um campo específico, da especificidade desses tempos da vida – juventude e vida adulta – e da especificidade dos sujeitos concretos históricos que vivenciam esses tempos. Tem de partir das formas concretas de viver seus direitos e da maneira peculiar de viver seu direito à educação, ao conhecimento, à cultura, à identidade, à formação e ao desenvolvimento pleno (LDB, n. 9394/96, Art. 1° e 2°).

No caso de Diadema, é ainda o trabalhador que orienta as ações da educação de jovens e adultos. Não é por outra razão que o MOVA e o SEJA encontram-se na Divisão do Trabalhador.

Nessa medida, a juventude não é considerada como uma fase da vida com peculiaridades e que, pela sua situação, pode polemizar os valores e os projetos da geração adulta, apontando para novas possibilidades de futuro.

Os jovens, por sua vez, ficam submetidos à figura simbólica de aluno, sem que seus interesses e necessidades, marcados pela condição etária, possam vir à tona, definindo o desenho das políticas públicas de jovens e adultos. É preciso recuperar uma visão dos jovens e adultos populares que deixaram marcas profundas nas políticas públicas e nas práticas pedagógicas no interior delas. Naquele sentido, tentar despolitizar a EJA significa colocá-la num espaço vazio. Como nos aponta Arroyo:

O Movimento de Educação Popular trouxe outra marca: fazer uma interpretação política das intrincadas trajetórias dos setores populares. Não aceitar qualquer interpretação despolitizada, nem sequer das truncadas trajetórias escolares, mas vê-las inteiramente atreladas às trajetórias sociais, econômicas, culturais, éticas a que nossa perversa história vem condenando os setores populares. Vê-los como oprimidos será um olhar mais politizado do que vê-los como pobres, preguiçosos ou violentos, ou como reprovados e defasados. (ARROYO, 2005, p. 40).

Portanto, perguntar – quem são os outros – numa referência aos jovens do MOVA, não é casual. Pois ela é feita num tempo de instabilidade discursiva, no qual conceitos, tais como

cultura, identidade, inclusão/exclusão, diversidade e diferença parecem ser facilmente

intercambiáveis, sem custo nenhum para quem assume, se apodera e governa as representações de determinados grupos sociais. (DUSCHATZKY,SKLIAR, 2001, p. 119).

A Modernidade inventou e se serviu de uma lógica binária, da qual denominou de “diferentes modos” o componente negativo da relação cultural.

3.7.2. Os jovens do MOVA: a inexistência do ABC e o mapa da rede de relações por