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CAPÍTULO 3 OS MOVA(s) DIADEMA E MAUÁ: UMA MESMA POPULAÇÃO

3.5. As Concepções do MOVA: entre a transformação e a auto-estima

3.5.2. MOVA Mauá: a auto-estima como déficit

O MOVA nasceu com a perspectiva do direito do cidadão. Assim como em Diadema, a existência de 18.420 analfabetos maiores de 15 anos impunha a necessidade de:

“superar o analfabetismo no município e que alfabetização é instrumento para a ampliação da capacidade de ler, compreender e interferir no mundo. Considerando que o analfabetismo fere direitos fundamentais do cidadão e marginaliza milhares de pessoas nas cidades convidou-se para parceiros, os diferentes segmentos da sociedade municipal”. (MOVA-MAUÁ, 2004).

Contudo, apesar desta concepção estar registrada, ela não foi apropriada pelos profissionais responsáveis pela coordenação do MOVA-Mauá, pois, quando indagados sobre esta questão, assim se manifestam:

O objetivo maior é estar resgatando a auto-confiança pra ele (aluno do MOVA) prosseguir. (El, coordenadora do MOVA Mauá).

O MOVA é um projeto de inclusão, é tanto dos alunos quanto da sociedade, porque às vezes o educador está desempregado, mas quando chega aqui no MOVA, a formação inicial, depois a formação continuada, e ele acaba descobrindo que ele é uma pessoa, que ele é um educador e que depois pega até como profissão, passar a ser professor da própria rede. Todos os meses, entra um, sai outro, então nós temos dinâmica. (G, coordenadora técnico-pedagógica do sistema de ensino de Mauá).

Segundo os coordenadores, o MOVA busca a produção da auto-estima do educando, parecendo, muitas vezes, que esta idéia está descolada da de sujeito de direitos e mais próxima de uma concepção psicologizante da educação, sem discutir o sentido da “inclusão”. Nesse sentido, há o risco de ficarem aprisionados à idéia de que aqueles que têm baixa escolaridade estão excluídos da sociedade e não são produtos de uma inclusão mal sucedida, decorrente de políticas públicas empobrecidas que, a exemplo da educação, criam uma relação intermitente com o cidadão e garantem serviços de baixa qualidade. Por isso, os atores envolvidos correm o risco de serem “culpabilizados” pela situação que vivem, sem questionar a lógica do capital que permeia as políticas (MARTINS,1997; CASTEL, 1998).

Reconhecemos que há uma expectativa de adquirir conhecimentos que possam ajudá-lo no processo de inclusão. Geralmente querem aprender a ler, a escrever e a contar ou aperfeiçoar esses conhecimentos. Nota-se, no entanto, que chegam com sua auto-estima em níveis muito deficitários. (POLÍTICA PÚBLICA DE EDUCAÇÃO DA CIDADE DE MAUÁ – GESTÃO AMOR PELA CIDADE, s/data).

Fica evidente nas entrevistas e nos materiais de formação de alfabetizadores a presença da influência da teoria construtivista, em função da presença de termos e temáticas como: letramento, hipóteses da escrita, hipótese silábica, hipótese alfabética, erro construtivo etc. Além disso, também há a presença dos chamados temas transversais: educação ambiental, alimentação da família, numa clara influência das idéias contidas nos PCN’ s.

A questão do letramento, da escrita, da leitura. Trabalhamos também com um pouco dos temas transversais. (El, coordenadora do MOVA).

Hipóteses da escrita: 1- pré- silábica – Não consegue relacionar as letras com os sons da língua falada. [...] 2- silábica – Interpreta a letra a sua maneira, atribuindo valor de sílaba a cada letra. [...] 3- Silábica-alfabética – Mistura a lógica da fase anterior com a identificação de algumas sílabas. [...] 4- Alfabética – Domina enfim, o valor das letras e sílabas. (PREFEITURA MUNICIPAL DE MAUÁ, 2005c). Significativo notar que o MOVA Mauá nasceu sob a égide do MOVA ABC, a partir de uma decisão da Câmara Regional. Mesmo havendo uma coordenação centralizada na região, conduzida pelo Sindicato dos Metalúrgicos, com uma clara concepção pedagógica baseada no pensamento de Paulo Freire, com entrada no campo do construtivismo para a discussão sobre aquisição da escrita e da leitura, tal como o MOVA Diadema, essa visão não se espraia para Mauá. Há que se ressaltar que a coordenação regional promove reuniões mensais, envolvendo todos os municípios que aderiram ao MOVA ABC, para a discussão de questões dessa natureza, dentre outras.

Segundo visão expressa em publicação do MOVA ABC:

A concepção metodológica do MOVA, que pressupõe a construção coletiva do ato de alfabetizar, está fundamentada em Paulo Freire: “Ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho, os homens se educam em comunhão”. [...] A formação dos educadores populares tem como referência teórica, além de Paulo Freire, as pesquisas de Piaget, Vygotsky, Ana Teberosky e Emília Ferreiro. (MOVA REGIONAL, 1999, p. 45-46)

Especialmente a perspectiva freireana não aparece de forma clara na fala da coordenação. É preciso assinalar que, diferentemente de Diadema, em Mauá, os professores

da EJA e os educadores do MOVA desenvolvem atividades conjuntas por iniciativa deles próprios, uma vez que não há proposta de trabalho coletivo por parte da coordenação. Os professores e educadores apontam para o papel significativo que a diretoria da escola exerce nesse processo, atuando como mediadora:

... a gente, pela gente mesmo, se reuniu e fizemos esse trabalho coletivo, cada um colocando a sua disciplina... eu, a Elaine, mais um professora do MOVA, mais dois da EJA. (V, educador do MOVA – Mauá).

... na nossa escola não tem essa diferença entre MOVA e EJA. Temos um grupo de estudo, a gente estuda alguns autores, fazemos algumas reflexões [...] é um horário fora, é tipo um HTPC, mas é um horário fora. (W, educador do MOVA).

A problemática que existe na escola em que eu trabalho, são 6 salas de EJA e mais 9 de MOVA36, então tem gente que a gente nem conhece, porque é espalhado pelo bairro, não é tudo próximo da escola. Todos são perto do Feital, mas são vários, então a gente nem conhece o pessoal. (C, professora da EJA – Mauá, bairro Feital).

3.6. Da operação de guerra à institucionalização do MOVA, o empobrecimento da