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1.4 Os paradigmas que envolvem a juventude

1.4.1 Juventude: período de preparação

Esse paradigma evidencia a juventude como um período de preparação para a vida adulta, Krauskopf (2000, p. 121) explica que esse paradigma:

[...] identifica la adolescencia como un periodo preparatorio, los adolescentes son percibidos fácilmente como niños grandes o adultos en formación. Tal enfoque se sustenta en el paradigma que enfatiza a la adolescencia como un periodo de transición entre la niñez y la adultez. Le corresponde la preparación para alcanzar apropiadamente el status adulto como la consolidación de su desarrollo17.

Dessa forma, há uma preocupação na preparação para atingir o status de adulto com a consolidação de seu preparo para o mercado de trabalho. Pode-se afirmar que esse é um modelo que atende às necessidades do mundo capitalista.

Nesse contexto, há uma postergação dos direitos dos jovens, uma vez que são considerados carentes de maturidade e inexperientes, sendo-lhes negado o reconhecimento como sujeitos sociais, prolongando a sua dependência e limitando sua participação como cidadãos.

As mudanças ocorridas na sociedade contribuem para validar esse período como sendo de preparação. A infância tornou-se menor, encantoada por uma adolescência que começa muito cedo e uma juventude que se prolonga até mais tarde, por volta dos trinta anos, sendo assim, quase um terço da população possui o rótulo de jovem.

Porém, é possível identificar diferenças de vivências na espera por alcançar a vida adulta entre os jovens das classes subalternas e os jovens das classes médias. Os primeiros desfrutam de um excessivo tempo livre, mesmo em se tratando de tempo de espera, desocupado, fútil, em razão da falta de atividades, como trabalho, estudo ou lazer. Trata-se de um tempo não reconhecido e também não valorizado pela família e nem mesmo pela sociedade. Corresponde a um tempo de ansiedade, de debilidade, um tempo que não é ocupado pelo ócio enriquecedor, o que pode favorecer a aproximação com a marginalidade e a exclusão. É o tempo de ficar “marcando bobeira”, “vendo o tempo passar”, “jogando conversa fora” na rua ou numa esquina, expostos aos perigos da malandragem, dos traficantes, ou, ainda, dos agentes disciplinadores e protetores da sociedade.

Para os jovens dessa camada social, o acesso ao trabalho é dificultado, seja pelo baixo nível de instrução, seja pela falta de experiência, ou mesmo pelo endereço que ocupam18. Assim, as perspectivas de um futuro melhor em comparação à vida dos seus pais, estão cada vez mais distantes.

17 [...] identifica a adolescência com um período preparatório, os adolescentes são percebidos facilmente

como crianças grandes ou adultos em formação. Tal enfoque se sustenta no paradigma que enfatiza a adolescência como um período de transição entre a infância e a idade adulta. E corresponde à preparação para alcançar apropriadamente o status adulto com a consolidação de seu desenvolvimento. (Tradução da autora).

18 NOVAES. Regina. Juventude, exclusão e inclusão social: aspectos e controvérsias de um debate em

curso.In. FREITAS, Maria Virgínia de. PAPA, Fernanda de Carvalho. Políticas públicas: juventude em pauta. São Paulo: Cortez, 2003. p. 122-123, argumenta que hoje certos endereços são indicadores de

Já para os jovens de classe média, há possibilidade de adiamento legitimado das responsabilidades adultas, o período de formação torna-se cada vez mais longo, em decorrência da exigência de conhecimentos cada vez mais complexos, para inserção profissional que atenda às expectativas de sua classe, havendo um prolongamento das trajetórias escolares. Após o término do curso superior, inicia-se o mestrado, em seguida doutorado, os estágios, e assim por diante. Encontrar-se-á capacitado para inserção no mundo do trabalho por volta dos 30 anos.

Nos dois casos, os jovens procuram esquivar-se do futuro, até porque sabem que nesse futuro deixarão de ser jovens. Porém, não sabem se esse futuro é próximo ou se encontra distante, muito menos conseguem imaginar qual futuro os espera. Muitos jovens alimentam sonhos razoáveis em relação ao futuro porque o mundo real é cheio de incertezas. O melhor é depositar as esperanças no futuro, procurando ampliar a experiência por meio da extensão indefinida da espera, sob forma de “sonhos”, de esperanças, de expectativas e, dessa forma, o futuro tende se atualizar no presente.

Para muitos jovens, esse tempo de espera conduz a caminhos de rupturas e múltiplos desvios, contribuindo para o surgimento de valores juvenis quase sempre contestados pelos adultos. Os caminhos que os jovens percorrem em direção ao futuro podem ser longos, sombrios, sinuosos e cheios de perigo, principalmente para os das classes subalternas. Os desvios e perigos que caracterizam a realidade juvenil tendem a outorgar forte grau de incerteza ao futuro.

Poucos períodos parecem ser tão imprecisos, como a juventude. Tão problemático que, às vezes, finalizado o período considerado “normal” para efetuar a transição social sem tê-lo conseguido, ele é prorrogado. Embora o momento de alcançar a inserção na sociedade dos adultos não seja igual para todos os jovens, qualquer política econômica,

subalternidade, uma vez que trazem consigo o estigma das áreas urbanas subjugadas pela violência e a corrupção dos traficantes e da polícia. No acesso ao mercado de trabalho o endereço torna-se um critério de seleção, justificadas de três formas, pelo empregador, segundo a pesquisadora “Em primeiro lugar: ‘o jovem

que mora em tal lugar de bandidos é um bandido em potencial: melhor não empregar’. Segunda possibilidade: o empregador reconhece que é apenas uma parte menor dos jovens de uma favela ou de um conjunto habitacional que se envolve com o tráfico de drogas, porém se o jovem que busca trabalho ‘mora

ali, ele não vai poder sair para trabalhar quando houver um conflito entre grupos de traficantes ou entre os traficantes e a polícia: melhor não empregar’. Outra possibilidade: o empregador reconhece que o jovem candidato pode nunca vir a ser bandido, pode conseguir maneiras de não faltar ao trabalho nos momentos de ‘guerra’, porém só pelo fato de ter crescido no lugar, de conhecer e ser conhecido de todos dali, ele pode vir a cometer alguma falta contra o patrão ou a empresa, seja por solidariedade (por exemplo, passar alguma mercadoria em uma caixa de supermercado, para alguém ‘da comunidade’ que está precisando), seja por medo (ser coagido a colaborar com os bandidos). Então, ‘melhor não empregar’”. E acrescenta que para escapar da “discriminação por endereço” no mercado de trabalho, os jovens recorrem a endereços de parentes, de bairros próximos ou caixas postais.

educativa e formativa que se dirija aos jovens há de ser realizada de acordo com a diferente realidade social que representam os jovens.

O prolongamento da condição juvenil ocorre porque uma série de fronteiras demarca os espaços de passagem do mundo juvenil para a vida adulta. Várias são as fronteiras, entre as quais a que mais se destacada é a ampliação das trajetórias escolares, principalmente pela dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Mas outras também podem ser apontadas: adiamento dos casamentos, que cada vez ocorrem mais tarde, em virtude de razões já apontadas como o prolongamento dos estudos e as dificuldades de acesso ao emprego, e, ainda, pela liberação das relações sexuais. Uma outra decorre das dificuldades de acesso à casa própria, ficando muitos jovens confinados à casa dos pais, muitas vezes até mesmo após o casamento; o desemprego juvenil que alonga sua dependência financeira em relação à família também é um dos fatores que contribuem para esse prolongamento.

Para a maioria dos jovens, esse tempo que passa, desde o fim da infância até o primeiro trabalho e a independência financeira em relação aos pais, é longo e indefinido. Essa indefinição constitui-se em mais uma incerteza do papel do jovem, que transita entre limites vagos ou mal definidos. Dessa forma, com freqüência, o jovem não sabe o que se espera dele. Se, por um lado, é um trabalhador em potencial, por outro, é um desempregado, que continua em situação de estudante, muitas vezes, procura se capacitar para futuras responsabilidades ou, simplesmente permanece à espera de um primeiro emprego.

Nesse contexto, retarda-se, cada vez mais, a incorporação dos jovens à vida adulta, tornando-se cada vez mais freqüente encontrar pessoas física e psicologicamente adultas, mas, socialmente não são assim consideradas, pois continuam na dependência dos pais, não se incorporam ao mundo do trabalho, não podem formar uma nova família; não porque não queiram ser independentes, trabalhar ou manter uma relação matrimonial estável e independente, mas porque as difíceis condições sociais de acesso ao mundo do trabalho, o prolongamento da escolaridade, entre outros fatores, tornam impossível a realização desses desejos.

Só é possível alcançar a sonhada identidade desempenhando novos papéis e conquistando o reconhecimento social de sujeito adulto. Assim, o mundo juvenil corresponde a espaços de passagem, que podem ser entendidos como períodos dedicados à preparação, ocupados por perspectivas de espera de oportunidades e reconhecimento, para que possam projetar o futuro, ou seja, o mundo adulto.