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Nos maiores problemas que os jovens enfrentam

Muitas vezes, os jovens chamam a atenção da sociedade, seja por seus modos extravagantes de viver a vida, pelos constantes riscos decorrentes do seu jeito de ser, e ainda como vítimas ou protagonistas de problemas sociais. Todos os problemas que afetam os jovens, de uma forma ou de outra, vão estar presentes no interior da escola. Raramente a escola está preparada para ajudar o jovem, e, por pensar que esta não é a sua função, acaba por relegar os conflitos da juventude. Os professores entrevistados expressam o seu ponto de vista sobre os problemas que os jovens enfrentam:

Eu acho que eles querem crescer muito depressa, falta estrutura, eles querem ser... Eles querem pular as fases e aí eles começam com que... É pulando essas fases muitas vezes que eles encontram desafios que eles ainda não são capazes, então eles entram em contradição consigo mesmo, eu acho que é o maior problema. (Ana Maria, 32 anos, professora de Língua Portuguesa, da escola Província).

A juventude tem sido identificada como a fase etária intermediária entre a infância e a vida adulta, nessa fase da vida há uma complexidade muito grande, geralmente marcada pelas mudanças físicas e psicológicas no início desse período, e pela dependência econômica dos pais. Quando a professora afirma que “eles querem pular as fases”, é muito provável que ela se refira à transição da juventude para a vida adulta. Vários fatores demarcam essa fronteira e a que mais atinge os jovens do ensino médio é a dependência econômica. No entanto, aí também reside outro conflito, cujo significado pode estar na fala da professora, o ingresso no mercado de trabalho.

A partir da proibição do trabalho para a faixa etária de até 15 anos, os jovens vêem postergada a sua independência financeira. Por um lado, obtiveram grandes benefícios, pois foram obrigados a permanecer na escola, porém, desfrutam de muito tempo livre, sem

ocupação, na ociosidade, pois no Brasil a permanência na escola pública é pequena, em média cinco horas diárias. Esse fato é gerador de descontentamento por parte dos jovens, como foi verificado nos questionários e nas entrevistas realizadas com os jovens dessa investigação, afirmando que gostariam de trabalhar para conquistar logo sua independência.

Mais importante que conquistar a independência financeira em atividades com baixa remuneração, ou na informalidade, é preciso preparar os jovens para que sua inserção no mercado de trabalho se faça em ocupações com remunerações dignas. Pochmann demonstra a necessidade de políticas públicas para financiar a inatividade juvenil:

[...] a postergação da inatividade juvenil possibilita a ampliação da escolaridade e a melhor preparação para o ingresso no mercado de trabalho o mais tardiamente possível. Para isso torna-se fundamental o fim da condenação ao trabalho precoce para a maior parte dos jovens brasileiros, o que somente é possível com a implementação de um programa nacional de transferência de renda capaz de financiar a inatividade, assim como ocorre privadamente aos jovens pertencentes às famílias ricas. (POCHMANN, 2004, p. 231-232).

Aqueles que trabalham e estudam, que conquistaram essa independência financeira, estão no centro de um outro conflito, por terem a independência financeira, em alguns aspectos já se sentem adultos, e por outro, não querem perder a identidade de ser jovem, geralmente marcada por vocabulário próprio, por maneiras específicas de vestir, pelo gosto pelas músicas, danças e namoros.

A jovem Gabriela, 17 anos, aluna do 3º ano do ensino médio da escola Metrópole, com cabelos cortados como “a mocinha da novela” e tingidos de vermelhos com mechas azuis, camiseta de uniforme da escola e calça jeans rasgada, quando indagada se tinha pressa em ser adulta, com toda segurança respondeu “já sou adulta”, afirmando que trabalha desde os 14 anos, e que é financeiramente independente.

Nesse contexto, é fácil entender a fala da professora que consegue visualizar alguns conflitos que atingem os jovens, uma vez que, para a maioria da sociedade, a condição juvenil é identificada tão somente pelo critério etário quando, na verdade, o “ser jovem” é constituído por uma série de características já descritas anteriormente e que estão em constantes modificações. Quaisquer alterações na estrutura econômica e na temporalidade da vida vão repercutir direta ou indiretamente sobre o modo de ser do jovem.

De forma diferente, a professora Neiva aponta três grandes problemas que envolvem os jovens: as drogas, a violência e a falta de oportunidades:

Eu acho que o pior é... Acho que é a droga e a violência, eu acho que no caso a droga puxa para a violência né? Então eu acho assim um grande problema são as drogas e a violência, e também eu acho que a falta de oportunidade, eu acho que esse pessoal que está chegando, eles vão ter muito menos oportunidade que nós tivemos. (Neiva, 29 anos, professora de Biologia, da escola da Metrópole).

Os meios de comunicação não cansam de mostrar como as drogas e a violência afetam os jovens brasileiros, a tal ponto que Soares (2004, p.130) revela que a violência no Brasil atingiu, entre os jovens, índices tão alarmantes que há déficit de jovens do sexo masculino na estrutura demográfica brasileira causado por mortes violentas. Índices que são verificados somente nas sociedades em guerra. É certo que a relação que a professora Neiva estabelece entre drogas e violência é bastante pertinente, posto que, as drogas são capazes de gerar, também, outros conflitos, como uma das causas da violência juvenil, que são muito amplas, e não serão abordadas nesse estudo, por não comporem os objetivos da pesquisa.

Nas entrevistas e nos questionários, os jovens apontam as drogas e a violência como grandes problemas que os atingem, porém o que os jovens indicam como principal problema é a falta de oportunidade, principalmente no trabalho. E a afirmação da professora “eles vão ter muito menos oportunidade que nós tivemos” também é discutida por Pochmann:

[...] a mobilidade social, que consistiu numa espécie de charme histórico do capitalismo no Brasil, tornou-se elemento central da complexa unidade familiar. Na maior parte das vezes, os jovens não conseguem obter condições de vida e trabalho superiores às de seus pais, mesmo possuindo níveis de escolaridade e formação profissional superiores. Quando muito, registra-se imobilidade social, mas a regressão intergeracional no trabalho está se tornando comum, sobretudo no rendimento. (POCHMANN, 2004, p. 223).

Também a professora Marilene indica a questão das oportunidades de trabalho como um problema dos jovens, e da necessidade de que eles façam um curso melhor.

Ah! de trabalho, ou mesmo de fazer um curso melhor, porque a escola tem muita coisa, mas é que tem muita coisa que fica guardada ou mal usada, a escola tem muitos recursos. A diretora mesmo falou que ela quer ver todo mundo usando os recurso que a escola dispõe porque tem, você fala assim: eu não sei usar, eu tenho medo de usar, não é para ter medo, é para buscar quem possa ajudar e ajudar esse aluno né? Dar oportunidade de, de melhorar o estudo dele, e depois ele sai, você vê muitos não tem oportunidade, mesmo de participar, oportunidade de trabalho. (Marilene, 42 anos professora de Inglês da escola Metrópole).

Primeiramente, é importante destacar a conotação de “fazer um curso melhor”, que traz implícito a idéia de que o ensino médio oferecido não é de boa qualidade. E a professora destaca também, o empenho da diretora para que sejam utilizados os recursos que a escola dispõe. Tanto nas entrevistas quanto nos questionários, a maior reclamação dos alunos é a monotonia das aulas: “Todos os dias a mesma coisa, lição na lousa, correção de exercícios, explicação, chamada. Nunca muda!” (Susy, aluna do 3º ano), “As aulas são ‘giz e lousa’, sem muita diversificação, o que é cansativo” (Thaís, aluna do 2º ano), “[...] tem laboratório de Informática e eu nem conheço, também não conheço o de Química” (Fred, aluno do 2º ano). Das duas escolas pesquisadas, essa, a Metrópole, é a mais equipada. De acordo com a Diretora da escola, em cada sala de aula havia televisão e vídeo, mas como os alunos começaram a danificar, foram retirados. Porém, a escola dispõe do equipamento, que se encontra à disposição dos professores.

Há, por parte dos professores, grande resistência em usar as tecnologias e os laboratórios que a escola dispõe, preferindo, por comodidade, utilizar o “giz e a lousa” que não precisa de preparação prévia, dessa forma, as aulas são desmotivantes e, como disse um aluno, “muitas vezes, saio da escola com a mão doendo de tanto copiar lição da lousa” (Alan, aluno do 1º ano).

Essa resistência pode ser justificada pelo medo da perda do controle que a novidade introduz na sua atividade convencional, e ainda há o risco do aluno ter um domínio maior que o próprio professor. A manutenção da aula tradicional provoca queixas e incômodo, gera desinteresse e descaso com aulas nada atrativas, reforçando o tradicional transmitir/memorizar/repetir. Para Gramsci (1968), um professor medíocre pode conseguir que os alunos se tornem mais instruídos, mas não conseguirá que sejam mais cultos; ele desenvolverá, com escrúpulo e com consciência burocrática, a parte mecânica da escola, e o aluno somente sendo cérebro ativo conseguirá organizar por sua conta e com a ajuda do ambiente social, a “bagagem” acumulada. Não se pode esquecer que na trajetória do aluno pelo ensino fundamental ele não adquire autonomia para ser um “cérebro ativo”, portanto continua no ensino médio dependente do professor.

Embora a Diretora incentive os professores ao uso dos recursos da escola, deve ser levado em conta que, em praticamente todas as escolas, públicas os recursos audiovisuais sempre estão em depósitos sob chave, e poucas pessoas têm acesso a elas. Quando o professor precisa de um aparelho de som, de retroprojetor ou TV/vídeo ele perde parte da aula procurando quem possa abrir o depósito para liberar o aparelho que, nem sempre está em condições de uso. O mesmo ocorre com relação aos laboratórios, que só ficam

destrancados quando estão em uso, há ainda racionamento de material de laboratório, de cartucho e papel para impressora, entre outros. Essas dificuldades acabam por acomodar os professores no uso do que têm acesso com mais facilidade, ou seja, giz, lousa e saliva.

A escola não é garantia de futuro, assim como “o domínio das novas tecnologias não garante trabalho e emprego, mas certamente não saber utilizá-las aumenta as probabilidades de exclusão e marginalização” (SILVA, 1999, p. 82). Embora não seja garantia de trabalho ou emprego, pelo menos pode livrá-lo do analfabetismo tecnológico, nesse sentido a Diretora demonstra sua preocupação em disponibilizar os recursos existentes. É importante salientar que esta não pode ser a finalidade única da escola, que deve ter em sua proposta pedagógica, funções mais elevadas. Mas também, cabe destacar que, ao introduzir os alunos no uso de novas tecnologias, há um comprometimento em superar o estado de injustiça social, uma vez que para aqueles que vivem do trabalho há necessidade de se apropriar não só de conhecimentos sócio-históricos, mas também de conhecimentos científicos e tecnológicos.

Como os professores não utilizam os recursos disponíveis na escola, acabam por privar os alunos do direito de acesso a uma educação de qualidade, e as “oportunidades” que as professoras apontam, passam a não existir, assim, os alunos estão condenados ao trabalho precário, à descrença, ao hedonismo e à violência, em virtude da perda de significado da vida individual e coletiva e na falta de perspectiva de que os estudos possam ser a possibilidade de fugir da vida miserável que levam.

Também a responsabilidade não pode ser atribuída unicamente ao professor que, pelos baixos salários que recebem, acabam por ter dois ou mais empregos, geralmente acumulam seu trabalho na rede pública estadual e na rede pública municipal, como também em escolas privadas. Essa sobrecarga de trabalho deixa o professor com pouco tempo para preparar atividades diversificadas, para preparação de laboratório, para ver com antecedência um vídeo. Aliado a tudo isso, deve ser levado em conta, ainda, que o número de alunos em sala de aula é elevado50, o que acaba por dificultar as atividades realizadas nos laboratórios, ou qualquer outra que demande manuseio de material do qual o aluno não dispõe e, geralmente, a escola não oferece em quantidade suficiente.

50 De acordo com a Resolução 125/ de 23 de dezembro de 1998, da Secretaria de Educação do Estado de São