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Lei da Alavanca Derivada a partir do Conceito de Torque

Vimos nas Seções 7.5 e 8.2 que a primeira condição de equilíbrio para que um corpo fique parado em relação à Terra, com a atuação da gravidade, é que o peso atuando para baixo sobre ele seja contrabalançado por uma outra força N atuando para cima, de intensidade igual ao peso. Isto evita o movimento do corpo como um todo em relação à Terra. No caso da balança ou da alavanca temos um eixo horizontal fixo em relação à Terra, o fulcro. Logo, o peso dos corpos colocados sobre a haste da alavanca, juntamente com o peso da própria alavanca (do seu travessão, por exemplo), têm de ser contrabalançados por uma força normal N atuando para cima sobre o fulcro, exercida pelo suporte da alavanca. Apesar disto, ainda existe a possibilidade da balança girar ao redor do fulcro.

Já vimos que para o equilíbrio de uma alavanca não basta o conceito de peso, pois dois pesos iguais atuando a distâncias diferentes do fulcro não se equilibram. Neste caso o peso que atua a uma maior distância do fulcro vai tombar aproximando-se da Terra, com o outro peso afastando-se dela, embora o fulcro possa continuar fixo em relação à Terra. Ou seja, pesos iguais atuando a distâncias diferentes do fulcro tendem a girar a alavanca.

Vemos então que precisamos de um outro conceito, além do peso do corpo ou da força resultante sobre ele, para estabelecer as condições de equilíbrio de um corpo rígido como o travessão de uma alavanca. A partir da lei da alavanca pode-se então definir um novo conceito relacionado à rotação de um corpo rígido em relação a um eixo horizontal fixo em relação à Terra. Vamos supor o caso mais simples em que o fulcro da alavanca (isto é, o eixo horizontal ao redor do qual ela pode girar), está verticalmente acima do CG da alavanca. Vamos então supor que duas forças FAe FBpassam a atuar no mesmo sentido, verticalmente

para baixo, a distâncias horizontais dAe dB, respectivamente, do plano vertical

passando pelo fulcro, plano este que também contém o CG do travessão. A lei experimental da alavanca nos diz que se a alavanca for solta do repouso, podendo girar ao redor do fulcro, ela permanecerá em repouso sob a ação destas duas forças apenas se FA/FB = dB/dA.

Definimos então que o que causa a rotação de um corpo rígido ao redor de um eixo fixo em relação à Terra é o “torque ou momento de uma força.” Vamos representar este torque ou momento de uma força pela letra T . A lei experimental da alavanca nos permite definir de maneira quantitativa a razão TA/TB entre as intensidades dos torques exercidos pelas duas forças FA e FB

já mencionadas, como sendo dada por TA TB ≡ FA FB dA dB . (9.3)

Esta definição foi sugerida por um resultado experimental. Mas agora que já temos esta definição, podemos inverter o procedimento. Neste sentido, o procedimento usual é postular que a alavanca vai permanecer em equilíbrio se TA = TB. Este postulado e a definição anterior da razão das intensidades dos

dois torques nos leva à lei da alavanca, isto é, (FA/FB)(dA/dB) = 1. Caso

TA/TB > 1 e a alavanca for solta do repouso na horizontal, postula-se que

o corpo A vai se aproximar da Terra e o corpo B vai se afastar dela. Caso TA/TB< 1, postula-se que o corpo A vai se afastar da Terra e o corpo B vai se

aproximar dela.

Pode parecer que não se ganha nada com esta dedução teórica. Afinal de contas, estamos definindo a razão de torques em conformidade com a lei da alavanca, para no final chegar à própria lei, postulando que são iguais os torques atuando dos dois lados de uma alavanca em equilíbrio. Mas como já mencionado, este procedimento pode ser vantajoso se o utilizarmos não apenas para a lei da alavanca, mas também como a base para se estudar o movimento de rotação de corpos rígidos ou outros casos mais complexos.

Com este conceito se pode derivar também o resultado empírico de que no equilíbrio o CG de um corpo rígido fica ao longo de uma vertical passando pelo ponto de suspensão. Este ponto de suspensão é fixo em relação à Terra e o corpo rígido é livre para girar ao redor dele. Para demonstrar o resultado empírico é necessário postular também que o peso de qualquer corpo se comporta como se estivesse atuando verticalmente para baixo sobre seu CG. Como a força exercida sobre o corpo rígido pelo fulcro ou pelo suporte não exerce nenhum torque sobre o corpo rígido (pois esta força atua a uma distância nula do suporte tendo, portanto, braço nulo), sobra o torque exercido pelo peso. E este só vai se anular se o P S e o CG estiverem ao longo de uma vertical.

O torque também pode ser tratado de maneira algébrica. Neste caso escolhe- se uma tendência de giro (por exemplo, o giro da alavanca no plano vertical no sentido de abaixar o corpo A, subindo o corpo B do outro lado da alavanca) como sendo devido a um torque positivo, escolhendo-se a tendência de giro no sentido oposto como sendo devida a um torque negativo. No caso da Figura 9.1, por exemplo, o peso do corpo A exerceria um torque positivo sobre a alavanca, enquanto que o torque devido ao peso B exerceria um torque negativo sobre ela. Neste caso, o postulado fundamental seria que a soma algébrica dos torques atuando sobre o corpo rígido tem de ser nulo para que ele fique equilibrado ao ser solto do repouso, sem girar ao redor de um eixo fixo.

A

B

Figura 9.1: Torque algébrico.

Se temos N corpos de um lado da alavanca e M corpos do outro lado da alavanca o postulado básico é generalizado pelo princípio de superposição. Isto é, postulamos que a alavanca vai ficar em equilíbrio se

N X i=1 Pi P0 di d0 = N +M X i=N +1 Pi P0 di d0 . (9.4)

Aqui Pi é o peso do corpo i atuando à distância horizontal di do plano

vertical passando pelo fulcro da alavanca. Além disso, P0 e d0 são pesos e

distâncias escolhidos arbitrariamente (podem ser P1 e d1, ou ...). Caso uma

destas somas seja maior do que a outra, postula-se que o lado que tem a maior soma vai se aproximar da Terra se a alavanca for solta do repouso, com o outro lado afastando-se da Terra.

Embora esta dedução teórica da lei da alavanca começando com o postulado e as definições anteriores esteja correta, vale ressaltar que o conceito de torque de uma força foi sugerido historicamente a partir do conhecimento empírico da lei da alavanca. Isto é, foi o conhecimento experimental de que dois corpos se equilibram em uma alavanca com suas distâncias inversamente proporcionais aos pesos que sugeriu a criação do conceito de torque. Suponha que a natureza fornecesse a lei experimental da alavanca como sendo dada, por exemplo, pela relação PA PB = dB dA α , (9.5)

com α = 2 ou outro valor. Neste caso seria natural definir, em vez da razão de torques usual, outra grandeza proporcional a (Pi/P0)(di/d0)α. Poderia se pos-

tular então que o valor resultante desta nova grandeza se anularia em situações de equilíbrio, para assim se derivar teoricamente a nova lei da alavanca.

No fundo o que queremos dizer é que tanto as definições de torque quanto de CG (como sendo proporcionais à distância entre o ponto de aplicação da força e o fulcro), assim como o postulado de que é nula a soma algébrica dos torques atuando sobre um corpo rígido em equilíbrio, só se justificam por levarem à lei correta da alavanca observada empiricamente. Estas definições e postulados

foram sugeridos pela lei experimental. Se a lei empírica fosse outra, deveríamos criar outros conceitos e postulados. O mesmo ocorre ao se descobrir limites de validade de qualquer lei empírica. Nestes casos os conceitos e postulados têm de ser generalizados ou modificados para se adequarem à nova realidade experimental.

9.3

Lei da Alavanca Derivada a partir do Resul-