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Liberdade exilada e liberdade situada

No documento Ontologia e moral na obra ficcional de Sartre (páginas 117-128)

1.3 Les mouches: liber(t)ação e autenticidade

1.3.2 Liberdade exilada e liberdade situada

A história inicia com o retorno de Orestes a Argos, acompanhado do seu tutor, depois de aproximadamente 15 anos de ausência. Orestes havia deixado Argos ainda criança e não tem lembranças da sua cidade natal. O que antecede a chegada de Orestes e do Pedagogo a Argos, como o assassinato de Agamenon por Egisto e Climnestra, não é narrado.

O autor supõe que o leitor/espectador conheça a mitologia grega e, portanto, os fatos ocorridos na história189.

Graças à educação recebida do Pedagogo, Orestes concebe a liberdade como a ausência de engajamento, a recusa de pertencimento a uma pátria, família ou ideologia, como podemos perceber logo no início da peça : “Pedagogue : À présent vous voilà jeune, riche et beau, avisé comme un vieillard, affranchi de toutes les servitudes et de toutes les croyances, sans famille, sans patrie, sans religion, sans métier, libre pour tous les engagements et sachant qu'il ne faut jamais s'engager […]”. (M, p. 122). O Pedagogo acompanhou Orestes pelo mundo para que o jovem conhecesse a diversidade das opiniões humanas e a variedade dos costumes dos homens, a fim de torná-lo sábio a ponto de recusar todo gênero de engajamento e permanecer livre como um fio que o vento arranca das teias de aranha: “[...] tu m'as laissé la liberté de ces fils que le vent arrache aux toiles d'araignée et qui flottent à dix pieds du sol ; je ne pèse pas plus qu'un fil et je vis en l 'air” (M, p. 123).

Orestes crê que há um gênero de homens muito particular do qual ele não faz parte, que já nascem engajados por decreto do destino, a esses não cabe escolha, eles não podem fazer nada a não ser esperar pelo dia em que serão consagrados por meio do seu ato: “Oreste : Il y a des hommes qui naissent engagés : ils n'ont pas le choix, on les a jetés sur un chemin, au bout du chemin il y a un acte qui les attend, leur acte; ils vont, et leurs pieds nus pressent fortement la terre et s'écorchent aux cailloux”. (M, p. 123). Esses homens que nascem engajados com sua ação à espera e à espera da sua ação, são homens que pesam190

sobre a terra, têm a sina de modificar o mundo ao mesmo tempo em que o mundo os modifica. Orestes pertence a outro gênero de homens: completamente independentes de todas as coisas e, segundo crê, livres:

Je savais déjà, moi, à sept ans, que j'étais exilé ; les odeurs et les sons, le bruit de la pluie sur les toits, les tremblements de la lumière, je les laissais glisser le long de mon corps et tomber autour de moi ; je savais qu'ils appartenaient aux autres, et que je ne pourrais jamais en faire mes souvenirs. Car les souvenirs sont de grasses nourritures pour ceux qui

189Podemos creditar a expectativa de Sartre a dois principais motivos: o primeiro deles pela já citada frequência

com a qual a história original era exibida e reencenada; o segundo deve-se ao fato da elitização do teatro, fenômeno que Sartre alerta em diferentes obras e procurou, em alguma medida, opor-se.

190A simbologia do pesado, duro, sólido, que aparece também em outros textos, aqui acompanha a ideia de

engajamento, de concreto, de decidido e responsável ao passo que as figuras de leveza, etéreo, fio de aranha estão vinculadas à abstração, ao desengajamento, à ideia de liberdade para nada.

possèdent les maisons, les bêtes, les domestiques et les champs. Mais moi ... Moi, je suis libre, Dieu merci. Ah ! comme je suis libre. Et quelle superbe absence que mon âme. (M, p. 123; grifos meus).

As primeiras páginas apresentam um Orestes livre num sentido muito parecido com o de Mathieu, em A idade da razão191. Uma liberdade para nada – como diz o próprio

personagem Mathieu. Um tipo de liberdade que consiste em sentir-se livre no desprendimento, na ausência de compromisso. Quanto menor o grau de engajamento, maior a liberdade. Nessa concepção, o comprometimento é visto como o antônimo da liberdade.

Dialogando com o Pedagogo sobre sua história, suas experiências e seus sentimentos em relação à sua vida, Orestes inicia um processo de reflexão sobre si, no qual põe em dúvida o verdadeiro sentido da liberdade. Orestes confessa uma certa sensação de falta por não ter nada de seu, não ter um lar, família, pátria, ou seja, de ter sido privado de tudo aquilo que o Pedagogo lhe ensinou como sendo entraves para a liberdade. Pouco a pouco, Orestes se dá conta da importância da noção de situação e como ela é fundamental para a verdadeira ideia de liberdade192.

Orestes muda seus planos e decide encontrar seu lugar no mundo. O jovem sabe que isso desagradá o seu tutor, mas não esconde do Pedagogo o desejo de ter uma família, de pertencer a algum lugar, de partilhar lembranças e experiências com este povo ainda estranho, mas que no fundo é seu povo. O Pedagogo reprova esse desejo frustrado de Orestes de ter vivido no palácio da família, de ter pertencido a um lugar, estar preso em um solo e a um povo. Se fosse assim, diz o Pedagogo, hoje não teria nada mais que um arrependimento abjeto igual ao de todos os cidadãos de Argos. Orestes revida justificando que, ao menos, esse arrependimento seria seu arrependimento.

Orestes entrevê, então, que deve haver a potencialidade de um ato que seja ao mesmo tempo suficientemente criador e destruidor para expurgar o mal já feito e permitir a criação de uma Argos e de um povo novos, que acabe com o antigo Orestes para inventar um novo Orestes. Um ato pelo qual pudesse ser restituído o lugar que sempre deveria ter sido seu. Não é vingança o que o jovem deseja, mas construir sua identidade, pertencer a um solo e engajar-se na sua situação:

191Cf. a análise dessa obra no segundo capítulo desta tese. 192Esse processo pode ser acompanhado em M, pp. 124-125.

Oreste : Ah ! s’il était un acte, vois-tu, un acte qui me donnât droit de cité parmi eux ; si je pouvais m'emparer, fût-ce par un crime, de leurs mémoires, de leur terreur et de leurs espérances pour combler le vide de mon cœur, dussé-je tuer ma propre mère ... (M, p. 126).

Electra entra em cena blasfemando sua vivacidade e juventude contra a estátua de Júpiter, deus dos mortos e senhor do luto, esperando que a festa dos mortos, que se aproxima, aconteça pela última vez, pois aquele que ela espera virá com a sua grande espada vencer o mal193. Orestes e o Pedagogo estão à margem da cena e ouvem o que Electra fala à

estátua de Júpiter sem que ela os perceba. Ao final do discurso, ela os vê e vai ter com os dois. Orestes descobre que aquela é sua irmã e que ela foi feita servente194 dos assassinos do

seu pai, como punição por não se render aos mandos de Agamenon e Climnestra. Orestes não quer que Electra o reconheça e se apresenta como Philebo, da cidade de Corinto. Sem saber que fala ao seu irmão, Electra confessa ao estranho que espera alguém. Subitamente, Electra faz uma pergunta hipotética a Orestes que não poderia ser mais real:

Et dis-moi encore ceci, car j 'ai besoin de le savoir à cause de quelqu'un ... de quelqu'un que j'attends : suppose qu'un gars de Corinthe, un de ces gars qui rient le soir avec les filles, trouve, au retour d'un voyage, son père assassiné, sa mère dans le lit du meurtrier et sa sœur en esclavage, est-ce qu'il filerait doux, le gars de Corinthe, est-ce qu'il s'en irait à reculons, en faisant des révérences, chercher des consolations auprès de ses amies ? ou bien est-ce qu'il sortirait son épée et est-ce qu'il cognerait sur l'assassin jusqu'à lui faire éclater la tête ? (M, p. 135).

Orestes não responde nada além de Eu não sei, mas a pergunta ecoou em sua consciência e todas as suas convicções sobre liberdade como não-pertencimento e desengajamento, que já não eram mais tão sólidas, terminaram de ser quebradas. Climnestra aparece ordenando que Electra vista-se de luto para a cerimônia dos mortos e o desentendimento entre as duas fornece a Orestes um panorama completo da situação da sua família: Electra é punida e humilhada por Climnestra e Egisto por não se deixar infectar pelo

193“Electre : Bonne fête, va, bonne fête, et souhaitons que ce soit la dernière. […] Mais il viendra, celui que

j'attends, avec sa grande épée. Il te regardera en rigolant, comme ça, les mains sur les hanches et renversé en arrière. Et puis il tirera son sabre et il te fendra de haut en bas, comme ça ! Alors les deux moitiés de Jupiter dégringoleront, l'une à gauche, l'autre à droite, et tout le monde verra qu'il est en bois blanc. Il est en bois tout blanc, le dieu des morts”. (M, p. 127).

194“Electre : La dernière des servantes. Je lave le linge du roi et de la reine. C'est un linge fort sale et plein

d'ordures. Tous leurs dessous, les chemises qui ont enveloppé leurs corps pourris, celle que revêt Clytemnestre quand le roi partage sa couche : il faut que je lave tout ça” (M, pp. 129-130).

remorso de um crime que ela não cometeu, enquanto Climnestra, sua mãe, lamenta a vida que tem e parece arrepender-se do crime cometido com a ajuda do amante contra o marido, Agamenon, mas agora não pode fazer mais nada, pois o mal está feito e ela é subjugada por Agamenon. Diante desse cenário, Orestes não pode permanecer indiferente, não pode mais não se engajar. A situação que se desvela diante de Orestes não o autoriza a continuar agindo independentemente da sua pátria, da sua família e da sua religião. Orestes está numa situação-limite em que é preciso escolher ficar e agir ou partir e negar o que descobriu em Argos.

Electra convida Philebo a participar da festa dos mortos, cerimônia em que os cidadãos de Argos desobstruem a caverna que creem ligar-se diretamente ao mundo dos mortos para receberem-nos em luto, suplicando perdão por continuarem vivos. A primeira cena do segundo ato apresenta a maneira como a cerimônia é temida pelos cidadãos de Argos:

UNE FEMME, s'agenouille devant son petit garçon : Ta cravate. Voilà trois fois que je te fais le nœud. (Elle brosse avec la main.) Là. Tu es propre. Sois bien sage et pleure avec les autres quand on te le dira.

L'ENFANT : C'est par là qu'ils doivent venir ? LA FEMME : Oui.

L'ENFANT : J'ai peur.

LA FEMME : Il faut avoir peur, mon chéri. Grand-peur. C'est comme cela qu'on devient un honnête homme.

[…]

UN TROISIÈME : Quand ils seront rentrés dans leur trou et qu'ils nous auront laissés seuls, entre nous, je grimperai ici, je regarderai cette pierre, et je me dirai : “A présent en voilà pour un an.”

UN QUATRIÈME : Oui ? Eh bien, ça ne me consolera pas, moi. A partir de demain je commencerai à me dire : “Comment seront-ils l'année prochaine?”. D 'année en année ils se font plus méchants. (M, pp. 149-150).

Electra pensa que pode curar os cidadãos de Argos do seu sofrimento e tristeza com palavras, por meio de um discurso de alegria e perdão195. Ela aparece na cerimônia com

seu vestido de festa mais bonito, branco, com felicidade e esperança no rosto. Egisto a reprova, ela argumenta que seu orgulho e sua alegria não serão blasfêmias diante de seu pai, mas que ao vê-la, ele saberá que apesar de tudo o que aconteceu, sua filha mantém a cabeça erguida e isso o fará feliz também196. Electra conta aos cidadãos de Argos que acabou de

aprender com Philebo que pela Grécia toda há cidades felizes em que as mães não lamentam ter colocado filhos no mundo, que eles são a sua alegria; cidades onde as pessoas riem, dançam, passeiam e não têm vergonha de estarem vivas.

O discurso de Electra confunde os cidadãos: parte crê nas palavras de Electra e deseja a mesma alegria que ela transborda, parte teme o sacrilégio dos seus atos. Para sanar a dúvida, Electra invoca um sinal dos mortos: que se calem e não permitam sequer uma folha cair ou o vento soprar caso sua dança e sua alegria não os ofendam. Por alguns momentos tudo é silêncio e a multidão começa a erguer-se contra Egisto. Júpiter, então, simula um sinal dos mortos cerrando a caverna com a pedra. Os cidadãos de Argos, apavorados, se voltam contra Electra197. Egisto a expulsa de Argos e autoriza que a matem se a encontrarem na

cidade ainda depois da cerimônia dos mortos198.

Orestes fica ao lado da irmã, propõe que fujam, que partam para Corinto, a cidade feliz. Electra não quer fugir, seu lugar é em Argos. A princesa confessa que se

195“Electre : J'ai voulu croire que je pourrais guérir les gens d'ici par des paroles” (M, p. 170).

196“Prétendez-vous que mon bonheur ne réjouit pas le cœur de mon père ? Ah ! s'il est là, s'il voit sa fille en robe

blanche, sa fille que vous avez réduite au rang abject d'esclave s'il voit qu'elle porte le front haut et que le malheur n'a pas abattu sa fierté, il ne songe pas; j'en suis sûre, à me maudire ; ses yeux brillent dans son visage supplicié et ses lèvres sanglantes essaient de sourire” (M, p. 162-163).

197“La foule : Nous n 'avons rien fait, ça n'est pas notre faute, elle est venue, elle nous a séduits par ses paroles

empoisonnées ! A la rivière, la sorcière, à la rivière ! Au bûcher !” (M, p. 166-167).

198Sobre a cena da cerimônia dos mortos, Sartre explica : “Le dictateur est là, avec la mère d’Electre, et toute la

ville : on attend l’apparition des morts. Or dans cette scène, apparemment objective, tout est lié à la subjectivité. Egisthe et Clytemnestre parlent apparemment des morts avec respect et crainte, mais leurs paroles renvoient à Agamemnon, leur victime, dont on ne parle pas. La manière dont la foule accepte cette journée terrible est aussi une allusion, un cri muet à Agamemnon mort. Peut-être ses deux assassins ne pensent-ils pas clairement à lui, mais c’est toute la situation qui est une pensée du meurtre. Seule Electre peut parler vraiment et rappeler qu’il n’y a pas que les morts, qu’il y a aussi les vivants – parce qu’elle personnifie le remords même de la mort d’Agamemnon, et aussi parce qu’elle vient de retrouver son frère – ce qui lui donne la force de parler ainsi. Toute cette scène tourne donc autour du meurtre d’Agamemnon dont, pourtant, on ne dit rien : ce meurtre est, en quelque sorte, la subjectivité même de la foule. Si Electre peut s’en détacher c’est parce qu’elle, seule, n’a cessé d’y penser. Mais le spectateur doit, lui aussi, sentir Agamemnon comme présent derrière cette foule. Tout se fait en fonction de lui” (DORT, 1990, pp. 881-882).

enganou, que se deixou levar pela conversa de Philebo e seus lugares felizes, que se enganou porque essa não é a realidade do povo de Argos, tampouco a sua. As notícias sobre a alegria espalhada pela Grécia fizeram-na perder a razão e conduziram-na ao equívoco; não é pelo discurso que o povo de Argos será curado do seu arrependimento e do seu mal, nem é de felicidade que esse povo precisa, eles não estão preparados para ela, pois “[...] ils aiment leur mal, ils ont besoin d’une plaie familière qu'ils entretiennent soigneusement en la grattant de leurs ongles sales” (Mu, p. 171). O caminho para libertar o povo do mal é por meio do próprio mal: “C'est par la violence qu'il faut les guérir, car on ne peut vaincre le mal que par un autre mal” (M, p. 171). A violência infligida ao povo de Argos só será superada por uma revolta. Essa ideia é central nos escritos posteriores de Sartre, especialmente no Prefácio a Fanon: “La violence […] peut cicatriser les blessures qu’elle a faites” (Sit V, p. 192). A libertação de Argos deve ter origem na violência que os próprios cidadãos sofreram. Tão habituados ao sofrimento e à violência que não reconhecem outra forma legítima e justa de viver, é preciso dar um passo de cada vez. Electra conta que tem desejos modestos e razoáveis, limitados a querer devolver o mal que lhe foi feito: “[...] je rêvais de voir un jour une fumée, une petite fumée droite, pareille à une haleine par un froid matin, monter de leurs ventres ouverts” (M, p. 170). Por isso, o desejo de Electra é libertá-los por outra violência, que combata e sobrepuja a anterior: só se vence o mal com outro mal e é pela violência que se pode salvá-los tornaram-se seu lema, sua crença e seu desejo.

Electra confessa mais uma vez que espera pelo irmão, esse irmão que atenderá o apelo do seu povo, da sua raça, da sua carne, do seu sangue, do seu destino: “Electre : Il viendra, il ne peut pas ne pas venir. Il est de notre race, comprends-tu ; il a le crime et le malheur dans le sang, comme moi” (M, p. 172). Electra anseia por vingança muito mais que por justiça, seu desejo é fazer o mesmo mal que ela recebeu dos seus algozes. O ódio e o rancor que ela guarda contra sua mãe e Egisto são maiores que sua vontade de ser feliz e de ser livre.

Orestes se revela à Electra, mas ele não é como ela imaginava. Crescido numa família feliz, educado como um aristocrata em Atenas, jamais pegou na espada ou sonhou lutar por uma causa, não tem a semente da vingança e da revolta plantada em seu coração. Electra recusa sua ajuda, não é este Orestes que ela esperava e, mesmo depois de revelar-se,

continua a chamá-lo de Philebo: “Ah! Philèbe, je ne pourrai jamais charger d'un tel poids ton cœur sans haine” (M, p. 175). Orestes revida:

Tu dis bien : sans haine. Sans amour non plus. Toi, j'aurais pu t'aimer. J'aurais pu ... Mais quoi ? Pour aimer, pour haïr, il faut se donner. Il est beau, l'homme au sang riche, solidement planté ; au milieu de ses biens, qui se donne un beau jour à l'amour, à la haine, et qui donne avec lui sa terre, sa maison et ses souvenirs. Qui suis-je et qu'ai-je à donner, moi ? J'existe à peine : de tous les fantômes qui rôdent aujourd'hui par la ville, aucun n'est plus fantôme que moi. J'ai connu des amours de fantôme, hésitants et clairsemés comme des vapeurs ; mais j'ignore les denses passions des vivants. […] Je me soucie bien du bonheur. Je veux mes souvenirs, mon sol, ma place au milieu des hommes d'Argos. […] C'est ma seule chance. Électre, tu ne peux pas me la refuser. Comprends-moi : je veux être un homme de quelque part, un homme parmi les hommes. (M, p. 176-177). Orestes se convence da importância do pertencimento e tenta demonstrar para Electra que quer estabelecer laços e vínculos de família, de pátria e de solo. A liberdade abstrata que definia sua conduta até então não faz mais sentido para o jovem. Orestes procura, agora, uma forma de conquistar seu lugar em alguma parte; pede a orientação de Electra sobre o que fazer para recuperar o amor e a cumplicidade da irmã: fugir de Argos, buscar a felicidade, encontrar uma cidade pacífica e pacata ou permanecer na sua cidade natal e lutar. O primeiro passo é conquistar Electra para, juntos, reconquistarem seu solo. Electra não abandonará Argos, portanto, o caminho para conquistar a irmã deve ser trilhado sobre o solo sangrento de Argos. O jovem oferece sua força e seu dinheiro: “Mon bras peut défendre la ville, et j'ai de l'or pour soulager vos miséreux” (M, p. 178). Electra recusa.

Os ensinamentos do Pedagogo sobre o que é ser livre e sábio não fazem mais sentido, e o que ocasionou essa viravolta foi a experiência, a ideia vivida que fizeram face à noção filosófica do Pedagogo de que liberdade é estar indiferente e independente de ideologias, pátria, religião e família. Orestes sabe que sua antiga concepção de mundo, homem e liberdade não é mais compatível com o que ele pensa e sente após a chegada a Argos e o reencontro com Electra, Climnestra e Egisto; por outro lado, ainda não sabe o que

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