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CAPÍTULO 2. GERENCIANDO ORGANIZAÇÕES NO SECULO XXI

2.3 NOVAS PERSPECTIVAS EM ADMINISTRAÇÃO

2.3.1 Liderança e gestão

A percepção da alta administração organizacional – como função e como estrutura – surgiu, de acordo com Drucker (1975), entre 1870-1880 na Alemanha, quando, na fundação do Deutsch Bank, Georg Siemens organizou uma “administração de cúpula” na qual, para

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Constantes das obras Prática da Administração de Empresas, de 1954, Fronteiras do Amanhã, de 1959 e The Age of Discontinuity, de 1969

65 Sobre esse tema ver Carvalho et al (2010); Saraiva (2007); Gonçalves et al (2011); Barney (1991); Drucker

cada atividade básica do banco, havia um membro de alto nível da equipe responsável por sua coordenação. Essa estrutura, considerada como “o primeiro órgão desse tipo na história da economia e dos negócios”66

, foi vista como uma inovação, pois compreendia uma equipe de alta administração baseada nas funções e não nos estatutos das sociedades alemãs. Esta equipe era coordenada por um líder no papel de presidente, com suporte de um secretariado executivo responsável por manter informados os membros da equipe e evitar o desmembramento do banco em feudos semi-independentes.

Drucker (1975) considera que o que destaca a importância da alta administração para as organizações não é sua relação de autoridade e poder, mas sim as tarefas realizadas e decisões tomadas por esse grupo que abrangem o negócio de uma forma global. Para o autor, não há “tarefa” de alta administração, mas “tarefas”, que compreendem a determinação do objetivo da organização e o desenvolvimento de estratégias para alcançá-lo, o acompanhamento do desempenho entre o que a organização pretende fazer e o que ela realmente faz, a representação da organização frente ao mercado, ao governo e à sociedade e a responsabilidade em atuar como um órgão de prontidão em situações de crise, representando a organização e conduzindo-a prontamente.

Essas tarefas de cúpula diferem fundamentalmente das tarefas dos outros grupos administrativos por serem multidimensionais, o que implica na necessidade de acesso a informações específicas para sua realização. Uma alta administração ideal é aquela que faz as coisas certas e adequadas para a organização no momento oportuno, o que implica, dentre outros atributos, a capacidade para ações rápidas e decisivas, além de audácia e coragem intuitiva (DRUCKER, 1975).

As atribuições da alta administração são consideradas tarefas a serem executadas por uma equipe. Entretanto, toda equipe necessita de um líder responsável por gerenciar os esforços desse grupo. Parafraseando as afirmações de Drucker (1975) quando este fala da função do Administrador nas organizações, o líder deve ser alguém que procure criar um todo que seja maior do que a soma de suas partes, ou seja, uma organização que produza mais do

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De acordo com Drucker (1975, p. 669-670), “os livros de administração geralmente mencionam que o aparecimento da estrada de ferro transcontinental nos Estados Unidos durante a década de 1870 criou, pela primeira vez, a necessidade e a consciência da administração. Os livros não mencionam – e seus autores geralmente não o sabem – que, ao mesmo tempo, surgiu no continente Europeu uma instituição, o „banco universal‟, que, embora totalmente diferente da grande ferrovia, apresentava, da mesma forma, o problema da administração de uma grande e geograficamente dispersa organização. O problema das ferrovias era organização e coordenação de operações; o problema do banco universal era a organização e coordenação de alta administração”.

que o total dos seus recursos, bem como procure harmonizar em toda decisão tomada, as exigências do futuro imediato. Deve também estabelecer objetivos e metas e o que deve ser feito para alcançá-los, além de organizar as atividades, decisões e relações, motivar a equipe e fixar normas e padrões que permitam avaliar o desempenho da organização.

Destaca-se que, apesar de o ambiente organizacional ter se alterado profundamente desde as análises iniciais de Peter Drucker sobre a administração e gestão na década de 1940, alguns conceitos trazidos por este autor possuem premissas que ainda continuam atuais, referendando seus postulados. As mudanças que ocorrem no contexto social e organizacional são consideradas por Drucker (2006) como um fenômeno natural – visto que o universo das ciências sociais não possui leis no sentido postulado pelas ciências naturais67 - e que as adaptações nos conceitos, quando ocorrem, são necessárias e desejáveis. Considera-se, nesta pesquisa, que uma das premissas cujo conceito se mantém atual se refere à necessidade de um líder à frente dos negócios da organização.

É interessante observar que a habilidade de liderança tem sido investigada desde o ano 1.300 d.C. e sob perspectivas variadas, conforme retrospecto apresentado por Bergamini (1994). A autora destaca que alguns teóricos procuraram entender o que o líder é; outros, o que o líder faz; uma terceira corrente de estudos procurou analisar as circunstâncias que determinam a eficácia do líder; e outro grupo de teóricos procurou estudar as motivações subjacentes à atividade de dirigir pessoas. Esses estudos demonstram que a função de liderar não é sinônimo de administrar, sendo, contudo, desejável, que os gestores das organizações também sejam líderes.

Essa distinção terminológica entre liderança e gestão encontra uma reflexão na fala de Mintzberg (2006) segundo a qual os gerentes têm que liderar e os líderes tem que gerenciar, pois a gerência sem liderança se torna estéril e a liderança sem gerência é desconexa e estimula a prepotência. Ampliando esta perspectiva, o autor declara que entendimentos tradicionais relacionados à gestão baseiam-se no conceito de que a função de gerenciamento nas organizações vincula-se à análise, especificamente à tomada de decisão e formulação de estratégias deliberadas, o que se apresenta como uma visão distorcida e estreita. Gerenciar

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Drucker (2006) afirma que as ciências sociais, como a Administração, tratam do comportamento das pessoas e das instituições humanas, ao passo que as ciências naturais tratam dos comportamentos dos objetos. Nessa perspectiva, a realidade de uma ciência natural, ou seja, seu universo físico e suas leis não se alteram, ou, se alteram, são em lapsos de milhões de anos, e não de séculos ou décadas. O universo social não tem leis naturais deste tipo e, portanto, está sujeito a mudanças contínuas, o que significa que suposições que antes eram válidas podem se tornar nulas ou totalmente errôneas em um tempo muito curto.

implica em obter das ciências e de outras fontes todo o conhecimento necessário, mas também está ligada ao insight, visão e intuição.

A liderança se exerce em um contexto relacional. Não corresponde à denominação de um cargo ou emprego, mas relaciona-se à competência para o desempenho de tarefas de alto nível. Essas competências, sistematizadas por Oliveira e Marinho (2006) em cinco categorias gerais (identificadas como pessoais e educacionais, interpessoais, organizacionais, cognitivas e profissionais)68, perpassam questões como ética e responsabilidade social, desenvolvimento organizacional, informação, conhecimento e tomada de decisão, mudança, inovação e relacionamento interpessoal.

No ambiente organizacional, a função de liderança de alto nível pode ser exercida em cargos de diversas denominações: Administrador, Diretor, Gerente, Gestor, CEO (Chief Executive Officer), Presidente, dentre outras várias, de acordo com a estrutura hierárquica da

organização. Independente do porte da organização, a função existe independente do cargo, podendo se concentrar muitas vezes na pessoa do proprietário da empresa. Barroso (2006, p.175) enfatiza que, no ambiente organizacional

o papel do líder é o de perpetuar a organização. O exercício dessa função é complexo, pois envolve ao mesmo tempo, a procura por lucros, valores morais e espirituais da instituição, e, em nível mais alto, o posicionamento estratégico da organização dentro de um mercado real, vislumbrando sempre o futuro. Para cumprir todas essas condições, é necessário que o líder tenha certas qualidades raras. É possível comandar organizações sem tais qualidades, embora seja impossível perpetuá-las, já que, sem as institucionalizações das relações, uma organização raramente sobrevive por longos períodos.

Da mesma forma, no contexto acadêmico e de pesquisa em ciências sociais aplicadas, as denominações dos cargos de liderança são múltiplas, assim como as atribuições e papéis.

Algumas definições seguem modismos de determinadas épocas, nem sempre se atentando para uma homogeneização conceitual, mas há autores que diferenciam as características gerais dos cargos como, por exemplo, atribuindo ao Administrador a responsabilidade pela execução de tarefas operacionais e ao Gestor a execução de tarefas intelectuais. Nesta pesquisa optou-se por conservar a denominação original dos autores no referencial teórico, o que pode ocasionar uma miríade de expressões para a mesma função, mas que será unificada nos demais capítulos no termo “Gestor” se referindo ao cargo da estrutura organizacional

68Além destas, Oliveira e Marinho (2006) citam em sua obra as competências que foram elencadas pela Agência

de Recursos do Governo Federal Americano como atributos pessoais e profissionais de um líder e as competências de liderança identificadas pela Associação para o Desenvolvimento de Supervisão e Currículo dos Estados Unidos.

responsável pela tomada de decisão estratégica e pelo exercício da função de liderança em cargos de hierarquia superior.

Uma denominação clássica do papel do gestor pode ser vista nos estudos de Mintzberg (1973) que identificou diferentes papéis exercidos pelo gerente, divididos em três categorias: interpessoal (Testa-de-ferro, Líder e Conexão), informacional (Monitoramento, Transmissão e Porta-voz) e decisório (Empreendedor, Gerenciador de conflitos, Alocação de recursos e Negociação). Essa tentativa de personificar e caracterizar o responsável pela coordenação dos mais altos níveis organizacionais encontra respaldo na importância que um gestor possui nas organizações. Sua competência na condução da organização é o diferencial entre o sucesso e o fracasso. McCarthy (1994) atribui ao gestor a responsabilidade pelo desempenho organizacional: para a pergunta “Por que as empresas fracassam?” a resposta dada pelo autor é “porque os gerentes falham”. McCarthy (1994, p.1) justifica essa afirmativa ao dizer que “As coisas não acontecem por acaso. Os homens fazem com que aconteçam ou impedem que aconteçam; e esses homens são gerentes ou estão sob a supervisão de gerentes”.

Tanto na perspectiva da liderança quanto na de gestão, um dos pontos mais complexos, como declara Kuazaqui (2006), está relacionado à “construção de meios que possibilitem que o processo decisório se efetue e que sejam tomadas as decisões que levem às ações mais profundas e assertivas”. Para Levy (1992), para analisar uma organização deve-se analisar o comportamento de seus membros. No tocante ao gestor, o autor destaca que a eficácia deste está diretamente relacionada com a qualidade de suas decisões: “O seu trabalho de estratégia, planejamento, organização, liderança e avaliação se baseia em decisões. A ação é complementada pelas decisões. Os esforços de seus subordinados são predeterminados e guiados por suas decisões (LEVY, 1992, p. 37).

Nesse aspecto, considera-se oportuno resgatar o pensamento de Mintzberg (2006) que considera as organizações como fenômenos complexos para os quais o gerenciamento implica inúmeras nuanças, o que exige todos os tipos de conhecimento tácito. Como afirma o autor (2006, p.14), “o gerenciamento é importante demais para ser reduzido à maior parte do que aparece nas prateleiras das livrarias. Fórmulas fáceis e as soluções rápidas são hoje os problemas da administração, não as soluções”. Isto demonstra que decidir não cabe apenas em

fórmulas prontas, sistemas informatizados ou em receitas ensinadas em cursos de MBA69, principalmente aquelas tomadas em nível estratégico nas organizações.