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APORTE TEÓRICO: O FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO

2.1.5 LINGUAGEM, COGNIÇÃO E INTERAÇÃO

O avanço dos estudos linguísticos trouxe novos aportes teóricos à compreensão da língua. Conceitos como cognição, interação, diálogo, troca etc. instalam-se na concepção da linguagem, abrindo espaço para estudos centrados nos fenômenos pragmáticos, comunicativos, argumentativos e textuais como parte de explicação para a questão do sentido.

Além do interesse nos aspectos externos, sociais e históricos da linguagem, a necessidade de se compreender aspectos cognitivos ativados (conhecimento partilhado na produção e compreensão de textos falados e escritos) na interação verbal possibilitou a criação de modelos explanatórios do fenômeno textual. Consequentemente, categorias advindas de outros campos do conhecimento (processamento, memória, representação dos conhecimentos prévios e atenção) foram incorporadas aos vários domínios da Linguística.

A adesão de estudiosos cognitivistas, como Lakoff e Johnson (1980), Lakoff (1987), Langacker (1981; 1986) trouxe para o funcionalismo uma outra concepção da língua. Entre os pressupostos da linguística cognitiva, destaca-se a ideia de que a significação não se baseia numa relação entre símbolos e dados de um mundo real de vida independente, mas no fato de

que as palavras e as frases assumem seus significados no contexto, o que em outras palavras, significa compreender que os conceitos decorrem de padrões criados culturalmente.

Certos de que o pensamento provém da constituição corporal humana, os cognitivistas10, defendem que a linguagem apresenta características derivadas da estrutura e do movimento do corpo e da experiência física e social vivenciada pelas pessoas. Eles descrevem o processo metafórico como estratégia fundamental para a totalidade da organização conceptual e linguística.

Em outras palavras, para compreender conceitos que não são diretamente ligados à experiência física, o homem emprega metáforas e metonímias para expressar o pensamento. É a metáfora que permite ao homem compreender o mundo das ideias em função de um mundo concreto. As línguas possuem um sistema cognitivo de base experiencialista, que opera e determina as regularidades na derivação dos sentidos e na transferência do domínio real para o domínio abstrato.

Conclui-se, portanto, que a estrutura linguística (sintaxe) não é autônoma, mas subordinada a mecanismos semânticos que a mente processa durante a produção linguística em determinados contextos de uso.

Entretanto, a perspectiva funcionalista absorve não apenas noções cognitivas. Além da noção de sujeito, noções como interação, ação, diálogo etc. são apontadas como integrantes do ato comunicativo.

Diretamente conectados à concepção pragmática da linguagem, os estudos de Dik (1989) Gumperz, Goffman, Schegloff asseveram o lugar da interação no processo comunicativo.

Para Gumperz (1982), falar é também interagir. Morato (2004, p. 313) sustenta que toda ação humana procede da interação.

Dik (1989, p. 2) ressalta que, “num paradigma funcional, a língua é concebida, em primeiro lugar, como um instrumento de interação social entre seres humanos, usado com o objetivo principal de estabelecer relações comunicativas entre os seus usuários”.

Assim sendo, o compromisso principal da abordagem funcionalista é descrever a linguagem não como um fim em si mesmo, mas como um requisito pragmático da interação verbal. Ou seja, o fenômeno linguístico deve ser explicado com base nas relações que, no

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contexto sócio-interacional, contraem falante, ouvinte c a informação pragmática de ambos. (Dik, 1989).

Nessa perspectiva, uma questão que se deve, também, observar é como a linguagem se constitui na interação.

Na linguística, a adoção de um enfoque interativo apóia-se na concepção de linguagem como uma atividade “verbal” que se realiza entre duas ou mais pessoas dentro de um determinado contexto, em que um se situa em relação ao outro, levando em conta circunstâncias da enunciação. Torna-se, por conseguinte, necessário explicar o fenômeno linguístico com base nas relações que, no contexto sócio-interacional, contraem falante, ouvinte e a informação pragmática de ambos.

Para Dik (1989), a interação social que se estabelece entre parceiros constitui uma atividade complexa, estruturada cooperativamente, em torno de regras sociais, normas ou convenções. As expressões linguísticas chamadas para intervir na interação verbal, por sua vez, são, também, entidades estruturadas e governadas por regras e princípios que determinam sua formação. Compreende-se, assim, que a expressão linguística tem função mediadora entre a intenção comunicativa do falante e a interpretação do ouvinte manifestando-se carregada dos aspectos cognitivos e pragmáticos circunscritos aos dois.

A análise linguística funcional envolve dois tipos de sistemas de regras, ambos reforçados pela convenção social:

a) as regras que governam a constituição das expressões linguísticas (semânticas, sintáticas, morfológicas e fonológicas);

b) as regras que governam os padrões de interação verbal em que essas expressões linguísticas são usadas (regras pragmáticas).

As regras de uma gramática funcional devem ser formuladas em termos de propriedades funcionais e categoriais dos constituintes da sentença. As categoriais são propriedades internas, enquanto as funcionais especificam relações referentes à construção em que elas ocorrem.

As relações funcionais dizem respeito às funções semânticas, sintáticas e pragmáticas. As semânticas especificam os papéis que exercem os referentes dentro do estado de coisas designados pela predicação, tais como agente, meta, recebedor etc. As funções sintáticas especificam a perspectiva da qual é apresentado o estado de coisas na expressão linguística,

como sujeito e objeto. As pragmáticas especificam o estatuto informacional dos constituintes dentro do contexto comunicativo mais amplo em que eles ocorrem como tópico, foco, etc.

A expressão linguística é determinada por esses níveis funcionais e, mais, tanto a forma quanto o conteúdo semântico das expressões linguísticas podem variar de acordo com a atribuição de funções diferentes aos constituintes em cada um dos três níveis funcionais.

Depreende-se dessa compreensão que a linguística funcional credita em seus postulados a ideia de não-arbitrariedade, assumindo que a linguagem tem caráter icônico e, portanto, que as variações e mudanças ocorrem porque são motivadas por necessidades comunicativas ou cognitivas do homem. Discorro sobre esse aspecto na próxima seção.

2.2 O PRINCÍPIO DE ICONICIDADE

Aos olhos dos funcionalistas, a estrutura é dependente do uso e as formas linguísticas são moldáveis; isto é, são susceptíveis às variações e mudanças produzidas pela rotatividade do uso em diferentes situações comunicativas reais.

Para eles, as palavras e frases (forma) assumem seus significados no contexto e surgem para satisfazer às necessidades do homem. Em outras palavras, a linguagem/estrutura é determinada pela ação intencional do homem ao fazer uso dos termos linguísticos. Esta ação intencional gera alterações no léxico e na gramática, seja no nível fonológico, morfológico, sintático, semântico ou discursivo, possibilitando a funcionalidade do sistema. Portanto, existe uma correlação icônica entre linguagem e uso. Isso significa admitir haver uma relação natural entre discurso e gramática, como foi proposta por Lichtenberk (1991).

Na abordagem funcionalista, costuma-se explicar essa relação através do princípio de iconicidade.

Martelotta (2003) salienta que a arbitrariedade separa, no signo linguístico, o significante (a forma, o visível) do significado (seu correlato mental, o invisível), entendendo significado como referência externa. Continuando, ele argumenta que essa postura nega,